A Petrobrás em tempos de FHC
Suely Caldas*
Com o propósito político de derrubar a CPI da Petrobrás, o ministro do
Planejamento, Paulo Bernardo, e outros integrantes do governo Lula têm
declarado que a verdadeira intenção do PSDB é enfraquecer a maior empresa
do País para, em seguida, realizar antigo projeto do governo FHC de privatizá-la.
As declarações chegam em tom emocional e condenatório, como se a privatização
em si fosse um demônio que precisa ser exorcizado, extirpado da alma humana.
Esquecem que o governo Lula tem privatizado rodovias, usinas elétricas, linhas
de transmissão, empresas e outros tantos projetos de investimento que implicam
concessão pública. Ou seja, condenam verbalmente o que praticam na vida real.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso logo veio a público negar, em
nota oficial, ter sido sua intenção vender a Petrobrás ao capital privado,
mas não esclareceu o projeto de seu governo, que não era uma privatização
clássica, mas tinha por objetivo quebrar o monopólio e provocar concorrência.
E nem foi adiante. Mas existia, era real. O PSDB mais calou do que esclareceu.
A primeira parte do projeto foi revelada ao País no final de outubro de 1997
pelo então presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros, em entrevista
ao jornal O Estado de S. Paulo. A segunda parte é tornada pública agora, neste
texto, por meio do mesmo Mendonça de Barros, em conversa que mantivemos na
quinta-feira. "O modelo não era privatizar, mas criar uma segunda empresa
com um pedaço da Petrobrás, com a finalidade de romper o monopólio, criar
competição e avaliar eficiência em gestão", explicou o ex-presidente do BNDES
na conversa. Na época a estatal ainda não era uma empresa pública com 500 mil
acionistas como é hoje e seu presidente era Joel Rennó, de quem eram cobradas
eficiência e transparência na gestão.
Com o título Governo vai iniciar gestão privada na Petrobrás, a entrevista de
Mendonça de Barros anunciava o plano para a estatal: numa primeira etapa seriam
vendidos 30% do capital votante (que excediam os 51% do controle estatal) a grandes
grupos nacionais privados. "Pensávamos em Grupo Ultra, Odebrecht, Votorantim,
grupos fortes de capital nacional, capazes de competir com empresas estrangeiras",
conta hoje Mendonça de Barros. Em 1997 ele afirmava: "A Petrobrás é diferente da
Vale, é uma empresa estratégica para o País e precisa ficar em poder do capital
nacional. Quando for considerada a privatização, ela precisa ser olhada com
cuidado especial."
Só agora revelado pelo ex-presidente do BNDES, numa segunda etapa a Petrobrás
seria dividida em duas empresas: a primeira, estatal, sob controle da União e
detentora de 70% de todos os ativos (as reservas petrolíferas, as refinarias,
os oleodutos, gasodutos, etc.). A segunda, controlada pelos grandes grupos nacionais que haviam adquirido 30% do controle na primeira etapa, começaria a operar com 30% dos ativos da antiga Petrobrás.
Segundo Mendonça de Barros, o verdadeiro objetivo não era vender a Petrobrás,
muito menos desnacionalizá-la, mas resolver o dilema da falta de competição,
por entender que todo monopólio, seja estatal ou privado, é nocivo aos
interesses da população.
Naquele outubro de 1997 a entrevista de Mendonça de Barros caiu como uma bomba
no Congresso. O senador gaúcho Pedro Simon exigiu do presidente Fernando Henrique
um desmentido público às declarações. Pressionado, FHC enviou carta ao então
presidente do Senado, José Sarney, garantindo que a Petrobrás não seria
privatizada "em hipótese alguma". A pressão política sobre FHC e a transferência
de Mendonça de Barros para o Ministério das Comunicações para substituir Sergio
Motta, que faleceu logo depois, acabaram por enterrar o projeto.
Em março de 1999 FHC substituiu Joel Rennó por Henri Philippe Reichstul na
presidência da Petrobrás e iniciou uma nova estratégia, que consistia em
fortalecer a estatal e prepará-la para competir com as grandes petrolíferas
estrangeiras - no Brasil e no exterior. O choque de gestão valorizou as ações,
multiplicou o valor de mercado da Petrobrás e deu a partida para o modelo
de empresa pública que é hoje, com capital pulverizado e mais de 500 mil acionistas
privados, mas sob controle estatal.
O curioso é que nessa entrevista de 1997 Mendonça de Barros defendia a ideia
de formar grandes grupos nacionais por meio de fusões e incorporações,
argumentando ser "essa a tendência do capitalismo moderno". Argumento defendido
pela ministra Dilma Rousseff, 11 anos depois.
*Suely Caldas, jornalista, é professora de Comunicação da PUC-Rio
sábado, 13 de junho de 2009
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