Presidente do Supremo defende que texto da lei deveria ser rediscutido na Câmara, e julgamento é interrompido
Toffoli pede vistas do processo; análise de recurso de Joaquim Roriz, barrado pela lei, será retomada hoje
FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cezar Peluso, considerou inconstitucional a Lei da Ficha Limpa, o que provocou um racha entre os ministros e levou um deles a pedir a interrupção do julgamento, que será retomado hoje.
O tribunal começou ontem a julgar um recurso do candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC), barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com base na nova lei.
Ao final do voto do relator, Carlos Ayres Britto, favorável à aplicação da lei nestas eleições, o presidente do Supremo pediu a palavra.
"Temos aqui um caso de arremedo de lei", disse Peluso. Ele afirmou que o texto da Lei da Ficha Limpa foi modificado no Senado pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que alterou, por meio de uma emenda, o tempo verbal de diversos artigos do então projeto de lei complementar.
Peluso argumentou que tal emenda modificou o mérito do projeto e, por conta disso, o texto deveria voltar para análise da Câmara.
Como isso não ocorreu, o presidente do STF argumentou que houve uma inconstitucionalidade. Segundo ele, a tramitação do projeto feriu o processo legislativo.
Com as críticas, Peluso esquentou o clima no STF. Diversos ministros argumentaram que a proposta dele não havia sido pedida pelos advogados de Roriz nem discutida pelo TSE. Ou seja, que ele trouxe uma nova questão para o julgamento.
"Não podemos agir de ofício", afirmou Ricardo Lewandowski, que preside o TSE. "A proposta parece um salto triplo carpado hermenêutico", ironizou Carlos Ayres Britto, provocando risos entre os próprios colegas.
"Isso me parece muito interessante do ponto de vista publicitário, mas não do jurídico", respondeu Peluso.
José Antonio Dias Toffoli, então, pediu vista. A avaliação de ministros ouvidos pela Folha é que a interrupção evitou que fosse gerada uma briga entre eles.
Os ministros foram para o julgamento divididos sobre se a Lei da Ficha Limpa vale ou não para este ano.
A lei surgiu de uma iniciativa da sociedade civil e foi promulgada pelo presidente Lula em junho, após aprovação no Congresso. Sua validade para estas eleições, inclusive com a possibilidade de atingir atos passados, foi aprovada pelo TSE.
VALE PARA TODOS
Antes da questão levantada por Peluso, o tribunal aprovou, por unanimidade, que a decisão sobre o recurso de Roriz será válida para os demais casos de candidatos barrados pela Ficha Limpa.
Ou seja, se o Supremo declarar que a legislação é inconstitucional, como propôs Peluso, estará, na prática, esvaziando por completo a sua validade.
Roriz teve a candidatura barrada pelo TSE por ter renunciado ao cargo de senador, em 2007, para escapar de processo de cassação.
A Lei do Ficha Limpa estabelece que o político que faz isso fica inelegível por oito anos após o fim do mandato que ele cumpriria. Como seu mandato se encerraria em 2014, ele poderá ficar inelegível até o final de 2022, quando terá 86 anos.
Mudança de tempo verbal pôs em xeque alcance da lei
DE BRASÍLIA
Na votação do projeto da Lei da Ficha Limpa no Senado, em maio, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) apresentou emenda que alterou os tempos verbais de artigos da proposta. As mudanças provocaram, durante a votação, dúvidas sobre o alcance da lei para políticos já condenados.
O projeto original previa que se tornariam inelegíveis políticos que "já tenham sido condenados em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado". A emenda do senador alterou a frase para políticos que "forem condenados".
Dornelles disse, em meio à votação, que as alterações foram apenas para adequar "tempos verbais diferentes" no projeto. Os parlamentares aceitaram a interpretação e consideraram a mudança apenas de redação- sem levar o projeto para uma nova votação na Câmara, como ocorre quando muda o mérito da matéria.
O projeto então seguiu para sanção presidencial.
Relator do Ficha Limpa na Câmara, o deputado Índio da Costa (DEM-RJ) disse que as mudanças provocariam novas interpretações da lei. O relator no Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), afirmou que a alteração serviu apenas para "unificar o texto". (GABRIELA GUERREIRO
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