As possibilidades políticas
dessa ferramenta foram amplamente utilizadas para garantir a vitória do Brexit
na Inglaterra, a eleição de Donald Turmp nos EUA e, sem dúvida alguma, para
derrubar Dilma Rousseff no Brasil.
Por
Fábio de Oliveira Ribeiro
-
30/05/2020
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As ambições psicototalitárias
do capitalismo de vigilância
por Fábio de Oliveira Ribeiro
O texto anterior desta série
tratou da expropriação e do uso da voz dos usuários dos novos produtos
idealizados pelos capitalistas da vigilância [aqui]. No item II, do capítulo 9,
segunda parte do livro, Shoshana Zuboff aborda uma questão realmente explosiva:
a exploração psicológica e política do excedente comportamental expropriado pelo
capitalismo de vigilância.
Antes de entrar diretamente no
assunto, farei um pequeno desvio para dar ao leitor a oportunidade de perceber
a verdadeira dimensão do problema levantado pela autora de The Age of
Surveillance Capitalism.
No final do século XIX início
do século XX, Sigmund Freud descobriu um novo continente. Estudando as
neuroses, fixações e outras patologias emocionais dos seus pacientes, ele
desenvolveu uma série de hipóteses científicas sobre o funcionamento da psique
humana e criou um método para descobrir as causas mais profundas e ignoradas
dos problemas que afetavam as vidas deles.
“O surgimento da transferência
sob forma francamente sexual – seja ela de afeição ou de hostilidade -, no
tratamento das neuroses, apesar de não ser desejado ou induzido pelo médico nem
pelo paciente, sempre me pareceu a prova mais irrefutável de que a origem das
forças impulsionadoras da neurose está na vida sexual. A este argumento nunca
foi dado o grau de atenção que ele merece, pois se isso tivesse acontecido, as
pesquisas neste campo não deixariam nenhuma outra conclusão em aberto. No que
me diz respeito, esse argumento continua a ser decisivo, mais decisivo mesmo do
que qualquer das descobertas mais específicas do trabalho analítico.” (Os
Pensadores, Sigmund Freud, A história do movimento psicanalítico, Abril
Cultural, São Paulo, 1978, p. 43)
Além de provar a origem sexual
dos problemas psicológicos, a transferência seria uma evidencia inquestionável
da impossibilidade de cura do paciente. Ao longo de toda sua carreira, Freud
cautelosamente defendeu que autoconhecimento adquirido durante o processo de
psicanálise poderia apenas ajudar as pessoas a conviver melhor com seus
problemas.
Discípulo de Freud, Carl G.
Jung se distanciou do mestre ao defender a tese oposta:
“…É o ego que ilumina o
sistema inteiro, permitindo que ganhe consciência e, portanto, que se torne
realizado. Se, por exemplo possuo algum dom artístico de que meu ego não está
consciente, este talento não se desenvolve e é como se fosse inexistente. Só
posso trazê-lo à realidade se o meu ego o notar. A totalidade inata, mas
escondida, da psique, não é a mesma coisa que uma totalidade plenamente
realizada e vivida.” (O homem e seus símbolos, Concepção e organização de Carl
G. Jung, O processo de individuação, Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2008 p.
213)
Freud pretendia ajudar seus
pacientes a conhecer e a conviver com seus problemas. Jung defendeu a tese de
que seria possível curar os pacientes fazendo-os trazer à realidade dos seus
egos talentos que eles ignoravam. Um via o homem como um ser falho que poderia
minimizar suas falhas. O outro acreditava que o homem podia superar suas
limitações aperfeiçoando-se. Ambos acreditavam que sob a superfície do
comportamento humano observável existia um imenso continente. Freud queria
explorá-lo cientificamente para aperfeiçoar seu método, Jung acreditava que ele
poderia ser conquistado por qualquer pessoa.
Colocando o foco
exclusivamente naquilo que podia ser observado, Burrhus Frederic Skinner
pensava diferente:
“… Uma ciência adequada do
comportamento deve considerar os eventos que ocorrem por sob a pele do
organismo, não como mediadores fisiológicos do comportamento, mas como parte do
comportamento em si. Pode lidar com estes eventos sem presumir que tenham uma natureza
especial ou que devam ser conhecidos de uma maneira especial qualquer. A pele
não é tão importante como limite. Eventos privados e públicos têm o mesmo tipo
de dimensões físicas.” (Os Pensadores, Pavlov/Skinner, Crítica das explicações
alternativas do comportamento, Abril Cultural, São Paulo, 1984, p. 345/346)
Leia também: O capitalismo de vigilância e o rebaixamento
da elite a classe operária, por Fábio de Oliveira Ribeiro
Um pouco adiante, Skinner
esclarece que:
“O problema da privacidade
pode ser abordado numa nova direção ao se inicial com o comportamento ao invés
de partir da experiência imediata. A estratégia não será certamente mais
circular ou arbitrária do que as práticas anteriores, e tem resultados
surpreendentes. Ao invés de concluir que o homem pode conhecer apenas suas
experiência subjetivas – que está sendo atado para sempre ao seu mundo privado
e que o seu mundo externo é apenas um constructo – uma teoria comportamental do
conhecimento sugere que é o mundo privado que, se não for inteiramente
incognoscível, pelo menos tem poucas probabilidades de ser bem conhecido.” (Os
Pensadores, Pavlov/Skinner, Crítica das explicações alternativas do
comportamento, Abril Cultural, São Paulo, 1984, p. 346)
O behaviorismo rejeita as
teses de Freud e Jung e defende que os comportamentos das pessoas são as únicas
coisas que podem ser observadas e estudadas. Eles são adquiridos através de
aprendizado, modelados por regras e se tornam permanentes em razão das
condições de reforço. Alterando as condições de reforço e ensino de novos
comportamentos seria, portanto, possível reprogramar as experiências subjetivas
das pessoas.
Num de seus livros, Skinner
concebeu uma sociedade perfeita em que os melhores estímulos, reforços e regras
produziriam indivíduos produtivos, felizes, satisfeitos e conscientes de suas
obrigações. Walden II fez muito sucesso. O maior deles certamente foi provocar
uma reação literária que se transformou num dos maiores clássicos da literatura
em língua inglesa. Refiro-me obviamente a Brave New World de Aldous Huxley.
Vejamos agora os fatos
narrados por Shoshana Zuboff. Ela conta como a internet começou a ser explorada
de maneira rudimentar por uma empresa interessada em analisar o comportamento
dos empregados. As pessoas sujeitas a esse tipo de tratamento não gostaram
muito do resultado. Afinal, elas começaram a sofrer consequências indesejadas
da utilização pública de informações que poderiam ou deveriam ser privadas.
“A paper published in 2015 broke fresh ground again by announcing that
the accuracy of the team’s computer predictions had equaled or outpaced that of
human judges, both in the use of Facebook ‘likes’ to assess personality traits
based on the five-factor model and to predict ‘life outcomes’ such as ‘life
satisfaction’, ‘substance use’, ou ‘depression’. The study made clear that the
real breakthrough of the Facebook prediction research was the achiefement of
economies in the exploitation of these most-intimate behavioral dephs with
‘automatede, accurate, and cheap personality assesstement tools’ that
effectively target a new class of ‘objetcs’ once known as your ‘personality’.
That these economies can be achieved outside the awareness of unrestrained
animals makes them evem more appealing; as once research team emphasizes, ‘The
traditional method for personality evaluation is extremely costly in terms of
time and labour, and it cannot acquire customer personality information without
their aweranes…’
Personality analyss for commercial advantage is built on behavioral
surplus – the so-caled meta-data or mid-level metrics – honed and tested by
ressearches and destinet to foil anyone who thinks that she is in the control
of the ‘amount’ of personal infermation thar she reveal in social media.” (The
Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019,
p. 275)
Tradução:
“Um artigo publicado em 2015
inovou novamente ao anunciar que a precisão das previsões de computador da
equipe era igual ou superior à dos juízes humanos, tanto no uso de ‘curtidas’
do Facebook para avaliar traços de personalidade com base no modelo de cinco
fatores quanto em outros fatores prever ‘resultados da vida’, como ‘satisfação
com a vida’, ‘uso de substâncias’ ou ‘depressão’. O estudo deixou claro que o
verdadeiro avanço da pesquisa de previsão do Facebook foi a conquista de
economias na exploração desses comportamentos mais íntimos com ‘ferramentas de
avaliação automatizada de personalidade, precisas e baratas’ que efetivamente
visam uma nova classe de ‘objetos’ uma vez conhecida como sua ‘personalidade’.
O fato de essas economias poderem ser alcançadas fora da consciência de animais
irrestritos os torna mais atraentes; como a equipe de pesquisa enfatiza: ‘O
método tradicional de avaliação da personalidade é extremamente caro em termos
de tempo e trabalho, e não pode adquirir informações sobre a personalidade do
cliente sem os alarmes ..’
Leia também: As novas armadilhas criadas pelo capitalismo
de vigilância, por Fábio de Oliveira Ribeiro
As análises de personalidade
para obter vantagens comerciais são baseadas no excedente comportamental – os
metadados chamados ou métricas de nível médio – aperfeiçoados e testados por
pesquisas e destinos para frustrar qualquer pessoa que pensa que está no
controle da ‘quantidade’ de inferências pessoais que ela revela nas mídias
sociais “.
Segundo um documento do
Facebook vazado em 2018, esses recursos foram utilizados pelo Facebook.
“… ‘to predict future behavior’ targeting individuals on the basis of
how they will behave, purchase, and think: now, soon, and later. The document
links prediction, intervention, and modification. For exemple, a Facebook
service called ‘loyalty prediction’ is touted for its ability to analyze
behavioral surplus in order to predict individuals who are ‘at risk’ of shifting
their brand allegiance. The idea is that these predictions can trigger
advertisers to intervene promptly , targeting aggressive messages to stabilize
loyalty and thus achieve guaranteed outcomes by altering the course of the
future.” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs,
New York, 2019, p. 279)
Tradução:
“…’para prever o comportamento
futuro’, visando indivíduos com base em como eles irão se comportar, comprar e
pensar: agora, em breve e mais tarde. O documento vincula previsão, intervenção
e modificação. Por exemplo, um serviço do Facebook chamado ‘previsão de
lealdade’ é elogiado por sua capacidade de analisar o excedente comportamental,
a fim de prever indivíduos que estão “em risco” de mudar sua lealdade à uma
marca. A ideia é que essas previsões possam levar os anunciantes a intervir
prontamente, visando mensagens agressivas para estabilizar a lealdade e, assim,
alcançar resultados garantidos alterando o curso do futuro.”
As possibilidades políticas
dessa ferramenta foram amplamente utilizadas para garantir a vitória do Brexit
na Inglaterra, a eleição de Donald Trump nos EUA e, sem dúvida alguma, para
derrubar Dilma Rousseff no Brasil. Isso ficou absolutamente claro durante o
escândalo da Cambridge Analytica.
“ ‘We exploited Facebook to harvest millions of peoples profiles’, Wylie
admitted, ‘and built models to exploit what we knew about them and target
ttheir inner demons’. His summary of Cambridge Analytca’s accomplishments is a
précis of the surveillance capitalist projetc and a rationale for its
determination to render from the depths. These are the very capabilities that
have gathered force over the nearly two decades of surveillance capitalim’s
incubation in lawless space. These practices produced outrage around the world,
when in fact they are routine elements in the daily elaboration of surveillance
capitalim’s methods and goals, both at Facebook and within other surveillance
capitalist companies. Cambridge Analytica merely reoriented the surveillance
capitalist machinery from commercial markets in behavioral futures toward
guaranteed outcomes in the political sphere.” (The Age of Surveillance
Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 280/281)
Tradução:
” ‘Nós exploramos o Facebook
para coletar perfis de milhões de pessoas’, admitiu Wylie, ‘e construímos
modelos para explorar o que sabíamos sobre eles e atingir seus demônios
internos’. Seu resumo das realizações da Cambridge Analytca é uma prévia do
projeto capitalista de vigilância e uma justificativa para sua determinação de
renderizar a partir das profundezas [da psique humana]. Essas são as mesmas
capacidades que ganharam força nas quase duas décadas de incubação do capital
de vigilância no espaço sem lei. Essas práticas produziram indignação em todo o
mundo, quando na verdade são elementos rotineiros na elaboração diária dos
métodos e objetivos do capital de vigilância, tanto no Facebook quanto em
outras empresas capitalistas de vigilância. A Cambridge Analytica apenas
reorientou o mecanismo capitalista de vigilância dos mercados comerciais em
futuros comportamentais em direção a resultados garantidos na esfera política.”
Leia também: O idílio do salvacionismo judicial, por
Guilherme Scalzilli
No fim deste item do capítulo
9, Shoshana Zuvoff afirma que:
“Billionaires such as Zuckerberg and Mercer have discovered that they
can mucle their way to dominance of the dividion of learning in society by
setting their sights on these rendition operations and the fortunes they tell.
They aim to be unchallenged in their power to know, to decide who knows, and to
decide who decides. The rendition of ‘personality’ wan an important milestone
in this quest; a frontier, yes, but not the final frontier.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p.
282)
Tradução:
“Bilionários como Zuckerberg e
Mercer descobriram que podem abrir caminho para o domínio da divisão da
aprendizagem na sociedade, concentrando-se nessas operações de entrega e nas
fortunas que contam. Eles pretendem ser incontestáveis em seu poder de saber,
decidir quem sabe e decidir quem decide. A interpretação da “personalidade” foi
um marco importante nessa busca; uma fronteira, sim, mas não a fronteira
final.”
Esse é um tema realmente
importante. Por isso fiz questão de fazer uma ligeira digressão sobre as obras
de Freud, Jung e Skinner no início justamente para retomar a questão da
exploração lucrativa e política da psique humana pelo capitalismo de
vigilância.
A psicanálise foi criada por
Freud para ajudar as pessoas a se autoconhecer e a conviver com seus problemas.
Ela ganhou uma nova dimensão com o trabalho de Jung para colocar à disposição
de todos a possibilidade de conquistar as profundezas de sua própria
personalidade para fazer aflorar habilidades adormecidas e desconhecidas pelo
ego. Skinner rejeitou as teses de ambos e se concentrou no estudo do
comportamento humano e das condições que o reforçam para possibilitar uma
melhora das pessoas mediante a reprogramação dos seus costumes.
Com maior ou menor cuidado,
todos os três psicanalistas mencionados se preocuparam apenas com uma coisa: o
bem-estar dos seus pacientes. O bem-estar das pessoas não é objeto de qualquer
preocupação nos cálculos daqueles que utilizam técnicas de análise do excedente
comportamental expropriado dos usuários de internet e de telefonia móvel para
garantir resultados econômicos e políticos. Essa mudança de foco me parece
bastante relevante.
Os pacientes não são e não
podem ser tratados como meios para os fins dos psicanalistas. O dever de não
fazer mal que obriga o médico, impede-o de fazer análises sem o conhecimento
das pessoas analisadas. Também o proíbe de comercializar as análises que ele
fez com a finalidade de garantir os lucros ou a vitória política de quem quer
que seja.
A automatização de
psicanálises em massa não autorizadas e com a finalidade de induzir as pessoas
a consumir ou a deixar de consumir um produto, a apoiar ou rejeitar uma
proposta política, a pensar de uma maneira e não de outra, a ficar felizes ou
tristes em razão do que é colocado na Timeline delas é uma evidente perversão
da medicina e deveria ser tratada como tal. O resultado dessa perversão está
sendo colhida na Inglaterra, nos EUA e no Brasil.
Se os eleitores não tivessem
sido manipulados o resultado das eleições nesses três países teria sido
diferente. A pandemia do COVID-19 mataria a mesma quantidade de ingleses,
norte-americanos e brasileiros se eles não tivessem sido utilizados como ratos
no laboratório de experiências políticas que foi construído e explorado com
lucro por bilionários como Zuckerberg e Mercer?
Observações sobre o
neo-feudalismo hayekiano
Por
Fábio de Oliveira Ribeiro
-
11/05/2020
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Aqui mesmo no GGN fiz algumas
observações sobre o neo-feudalismo https://jornalggn.com.br/opiniao/telecatch-2-0-democracia-cpfs-x-feudalismo-cnpjs/.
Volto ao tema por causa de um Twitter do jurista Rubens Casara.
O binarismo simplório imposto
pela guerra ideológica permanente promovida pelos defensores do “neoliberalismo
a lá Bolsonaro” não deu trégua nem mesmo durante a pandemia. Muito pelo
contrario: os bolsonaristas fascistoides ocupam as ruas para forçar os
trabalhadores a desocuparem a segurança das suas casas.
A explicação para esse
fenômeno não é muito complexa. No período em que o keynesianiamo ocupou uma
posição central, como teoria econômica dominante, as teses de Friedrich August
von Hayek eram consideradas imposturas teóricas e, como tal, relegadas à margem
do debate público.
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Na década de 1970, a teoria de
Hayek começou a ser movida para o centro do palco em razão das políticas
econômicas baseadas nas teses de Keynes não serem mais capazes de impedir o
declínio da rentabilidade do capital. Nas décadas seguintes o neoliberalismo se
tornou dominante.
A partir do momento em que a
maioria dos líderes políticos, jornalistas e banqueiros (não necessariamente
nessa ordem) passaram a exigir uma adesão automática às políticas neoliberais,
as teses de Hayek se tornaram os fundamentos de uma verdadeira teologia.
Na Idade Média contrariar a
teologia dominante era algo perigoso. Potencialmente mortal. Quando o Papa
Inocêncio III ordenou a Cruzada Albigense (1209-1229 dC), os comandantes
militares dele fizeram uma objeção plausível: não seria possível distinguir
entre cristãos e hereges.
A resposta do Papa foi
exemplar: matem todos, Deus saberá escolher os seus. A solução sugerida pelo
presidente do Banco Central do Brasil para o dilema imposto pelo COVID-19
lembra muito as palavras do Papa Inocêncio III: reduzir mortes por coronavírus
é pior para a economia.
Não há outra alternativa. O
postulado neoliberal explica o desprezo do presidente do BC pela vida humana. É
preciso deixar o vírus matar todos os que ele quiser matar, o deus dinheiro não
se importa. A preservação da ortodoxia teológica é mais importante do que
qualquer coisa.
Leia também: Excedente comportamental, o novo mundo a ser
conquistado e possuído
Usando as teses de Hayek como
vetor, o feudalismo retornou de maneira tão avassaladora que as pessoas são
incapazes de perceber o que realmente está ocorrendo. A democracia foi
assassianda, porque ela é incompatível com a hierarquia social do Estado
feudal.
Os cidadãos são divididos em
duas classes: senhores feudempresariais e servos do glebercado. Qualquer pessoa
que desafie a neo-feudalização bancária do cotidiano é sumariamente expulso da
nova sociedade feudal. Quem ficar fora das muralhas dogmáticas não merece
qualquer proteção legal.
Vejam, eles não podem entrar
no nosso castelo. Eles são perigosos. Eles são os outros. Inimigos irredutíveis
da segurança que nós desfrutamos e merecemos. Nós somos fiéis ao capital. Eles
são hereges, Cataros, comunistas, possivelmente sodomitas… E assim começou a
nova Cruzada Albigense “high tech” em defesa da teologia de Hayek.
O capitalismo de vigilância e
o passado medieval à nossa frente
Por
Fábio de Oliveira Ribeiro
-
15/05/2020
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Terminei de ler a introdução
do livro de Shoshana Zuboff. Pelo que entendi, o capitalismo de vigilância, se
carateriza pela exploração unilateral de informações produzidas pelos usurários
de internet.
As empresas que exploram esse
negócio lucrativo sem pagar o usuário pela informação coletada, sabem o que nós
queremos, pensamos e desejamos. Mas nós não sabemos como nossos perfis são
definidos, utilizados e comercializado.
“This new market form is a unique logic of accumulation in which
surveillance is a foundational mechanism in the transformation of investiment
into profit. Its rapide rise, institutional elaboration, and significant
expansion challenged the tentative promise of the inversion and its
advocacy-oriented values. More generally, the rise of surveillance capitalism
betrayed the hopes and expectations of many ‘netizens’ who cherished the
emancipatory promise of the networked milieu.” (The Age of Surveillance
Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 53)
Tradução:
“Essa nova forma de mercado é
uma lógica única de acumulação, na qual a vigilância é um mecanismo fundamental
na transformação de investimento em lucro. Seu rápido crescimento, elaboração
institucional e expansão significativa desafiaram a prometida tentativa de
inversão e seus valores orientados à autonomia. De maneira mais geral, a
ascensão do capitalismo de vigilância traiu as esperanças e expectativas de
muitos internautas que acalentavam a promessa emancipatória do ambiente em
rede.”
A autora esclarece que:
“…Under this new regime, the precise moment at which our needs are met
is also the precise moment at which our lives are plundered for behavioral data,
and all for the sake of others’ gain. The result is a perverse amalgam of
empowerment [of companies that collect and exploit information] inextricably
layered with diminishment [of internet users]. In the absence of a decisive
societal response that constrains or outlaws this logic of accumulation,
surveillance capitalism appears poised to become the dominant form of
capitalism in our time.” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff,
PublicAffairs, New York, 2019, p. 53)
Leia também: Diário da Peste 36
Tradução:
“… Sob esse novo regime, o
momento exato em que nossas necessidades são atendidas também é o momento exato
em que nossas vidas são saqueadas por dados comportamentais e tudo em prol do
ganho de outras pessoas. O resultado é um amálgama perverso de empoderamento
[das empresas que coletam e exploram informações] inextricavelmente mesclado
com rebaixamento [do usuário de internet]. Na falta de uma resposta social
decisiva que restrinja ou proíba essa lógica de acumulação, o capitalismo de
vigilância parece prestes a se tornar a forma dominante de capitalismo em
nossos dias.”
Na Idade Média, a principal
fonte de poder e controle era a confissão. As pessoas contavam seus pecados (e
desejos) aos padres. Ninguem sabia como eles utilizavam o conhecimento que
adquiriam dessa forma.
Me parece evidente que
qualquer pedaço de informação politicamente sensível obtida através da
confissão podia ser utilizada contra a vontade do informante com violação do
dever de sigilo do padre.
Se o poder da Igreja, do Feudo
ou do Reino estivesse em perigo o padre poderia obter vantagens utilizando a
informação colhida. Vida, segurança e riqueza eram objetos importantes de
cogitação teológica.
Zuboff diz que o capitalismo
de vigilância é um fenomeno sem precedente. Eu posso concordar com essa
afirmação. Mas também digo que é possivel ver nesse fenomeno algumas
características medievais que não existiam nos EUA, país predominantemente
protestante (em que a confissão não é praticada).
Foi a Internet transformada no
instrumento politico e religioso virtual através do qual os americanos
renunciaram à Reforma Protestante?
Sobre a medievalização da vida
cotidiana patrocinada pelo neoliberalismo vide
https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/observacoes-sobre-o-neo-feudalismo-hayekiano/.
Leia também: Diário da Peste 37
Ao longo dos dois primeiros
capítulos da primeira parte do seu livro, Shoshana Zuboff usa metáforas
medievais. Ela chega a mencionar autores que se referem à medievalização da
vida cotidiana promovida pelo neoliberalismo em virtude da redução de direitos,
hierarquização da sociedade, esvaziamento da democracia e aumento do abismo
entre ricos e pobres. Todavia, ela se recusa a admitir que a maioria da
população reverteu ou pode reverter à condição servil.
Zuboff acredita que os
benefícios de décadas de individualização moderna impedem a implantação de uma
nova sociedade feudal. Talvez ela esteja enganada. Talvez não. O tempo dirá a
verdade. Nada está definido
Excedente comportamental, a
mina de ouro do Google
Por
Fábio de Oliveira Ribeiro
-
16/05/2020
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Aqui mesmo no GGN, publiquei
algumas considerações sobre a obra de Shoshana Zuboff
https://jornalggn.com.br/artigos/o-capitalismo-de-vigilancia-e-o-passado-medieval-a-nossa-frente/.
Volto ao tema porque me pareceu essencial fazer justiça à maior descoberta da
autora: o excedente comportamental. Esse conceito que está intimamente
relacionado com o de “mais valia” cunhado por Karl Marx para explicar a maneira
como o capitalista acumula trabalho não pago aos operários.
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Para entender a elaboração
desse conceito é preciso refazer o caminho percorrido pela empresa Google. E
foi exatamente isso que Zuboff fez no seu livro:
“Operationally, this meant Google wold turn its growing cache of
behabioral data and its computational power and expertize toward the single
task of matching ads with queris. New rethoric took hold to legitimate this
unusual move. If there was to be advertising, then it had to be ‘relevant’ to
users. Ads would no longer be linked to keywords in a search querry, but rather
a particulara ad would be ‘targeted’ to a particular individual. Securing this
grail of advertising would ensure relevance to users and value to advertisers.
Absent from the new rhetoric was the fact thar in pursuing of this new
aim, Google would cross into virgin territory by exploiting sensitivities that
its exclusive and detailed collateral behavioral data about millions and later
billions of users coud reveal. To meed the new objetive, the behavioral value
reinvestment cycle was rapdly and secretly subordinated to a larger and more
complex undertaking. The raw materials that had veen solely used to improve the
quality of searchs resultes would now also be put to use in the service of targeting
advertising to individual users. Some data would continue be applied to service
improvement, but the growing stores of collateral signals would be repurposed
to improve the profitability of ads for both Google and its adverisers. The
behaviorial data aviable for users beyond service improvement constituted a
surplus, and it was on the strength of this behavioral surplus that the young
company would find its way to the ‘sustained and exponentional profits’ that
would be necessary for survival. Thanks to a perceived emergency, a new
mutation began to gather form and quietly slip its moorings in the implicit
advocacy-oriented social contract of the firm’s original relationship with
users. (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New
York, 2019, p. 74/75)
Tradução:
“Operacionalmente, isso
significava que o Google aumentaria seu cache crescente de dados
comportamentais e seu poder computacional e se especializaria na tarefa única
de combinar anúncios com consultas. Uma nova retórica entrou em cena para
legitimar esse movimento incomum. Se houvesse publicidade, teria que ser
‘relevante’ para os usuários. Os anúncios não seriam mais vinculados a
palavras-chave em uma consulta de pesquisa, mas um anúncio em particular seria
‘segmentado’ para um indivíduo em particular. A segurança desse graal de
publicidade garantiria relevância para os usuários e valor para os anunciantes.
Ausente da nova retórica, na
busca desse novo objetivo, o Google entraria em território virgem explorando
sensibilidades que seus dados comportamentais colaterais exclusivos e
detalhados sobre milhões e, depois, bilhões de usuários revelariam. Para
abordar o novo objetivo, o ciclo comportamental de reinvestimento de valores
estava subordinado rápida e secretamente a um empreendimento maior e mais
complexo. As matérias-primas usadas apenas para melhorar a qualidade dos
resultados das pesquisas agora também seriam usadas no serviço de segmentação
de publicidade para usuários individuais. Alguns dados continuariam sendo aplicados
à melhoria do serviço, mas as crescentes reservas de sinais colaterais seriam
redirecionadas para melhorar a lucratividade dos anúncios para o Google e seus
anunciantes. Os dados comportamentais disponíveis para os usuários além da
melhoria de serviço constituíam um excedente e foi com base nesse excedente
comportamental que a jovem empresa encontraria seu caminho para ‘lucros
crescentes e sustentáveis’ que seriam necessários para a sobrevivência. Graças
a uma emergência percebida, uma nova mutação começou a se reunir e
silenciosamente deslizou seus ancoradouros no contrato social implícito e
orientado para autonomia do relacionamento original da empresa com os
usuários.”
Leia também: Tyrion Lannister e o cachorro louco
brasileiro
Antes de começar a segmentar
propaganda, o Google utilizava as informações colaterais produzidas a cada
busca pelos usuários para melhorar o serviço que era prestado. A partir do
momento em que foi obrigada a enfrentar a crise das empresas .com, o Google
passou a utilizar essas informações para extrair valor econômico do
comportamento dos usuários revelado pelas informações colaterais que eles
produzem. Assim, o Google passou a atingi-los com anúncios personalizados de
bens e serviços que eles provavelmente necessitariam, aumentando a eficiência
da propaganda. Essa operação foi patenteada.
“The techniques described in the patent meant thar each time a user
queries Google’s search engine, the system simultaneously presents a specifc
configuration of a particular ad, all in the fraction of a moment that it takes
to fufill the search query. The data used to perform this instant translation
from query to ad, a predictive analysis thar was dobbed ‘matching’ wen far
beyond the mere denotation of search terms. New data sets werw compiled that
would dramatically enhance the accuracy of these predictions. These data sets
were referred to as ‘user profile information’ or “UPI”. These new data meant
that there would be no more guesswork and far less waste in the advertising
budget. Mathematical certainty would replace all of that.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 78)
Tradução:
“As técnicas descritas na
patente significam que cada vez que um usuário consulta o mecanismo de pesquisa
do Google, o sistema apresenta simultaneamente uma configuração específica de
um anúncio específico, tudo na fração de momento necessário para preencher a
consulta de pesquisa. Os dados usados para executar essa tradução instantânea
de consulta para anúncio, uma análise preditiva que foi adulterada como
‘correspondência’ foram muito além da mera designação de termos de pesquisa.
Novos conjuntos de dados foram compilados para melhorar drasticamente a
precisão dessas previsões. Esses conjuntos de dados foram referidos como
‘informações de perfil do usuário’ ou ‘UPI’. Esses novos dados significavam que
não haveria mais adivinhações e muito menos desperdício no orçamento de
publicidade. A certeza matemática substituiria tudo isso.”
No momento que o usuário faz uma
pesquisa o perfil existente dele é formulado ou consultado. Quando fornece a
resposta à consulta o Google adiciona anúncios de produtos que podem interessar
especificamente àquele internauta. Cada vez que utilizar o Google para
pesquisar qualquer assunto, o usuário fornecerá gratuitamente informações
pessoais que serão acrescentadas ao acervo estocado utilizado para a formular o
perfil individual que possibilitará à empresa obter lucro anexando propaganda
segmentada ao resultado da consulta. Casa usuário do Google é um operário à
serviço da segmentação da propaganda explorada economicamente pela empresa.
Leia também: Diário da Peste 37
“Google would no longer be a passive recipient of accidental data that
it could recycle for the benefit of its users. The targeted advertising patent
sheds light on the path discovery that Google traveled from its
advocay-oriented founding toward the elaboration of behavioral surveillance as
a full-blown logic of accumulation, The invent itself exposes the reasonig through
which the behavioral value reinvestd cycle was subjugated to the service of a
new commercial calculation. Behavioral data, whose value had previously been
‘use up’ on improving the quality of Search for users, now became the pivotal –
and exclusive to Google – raw material for the construction of a dynamuc online
advertising marketplace. Google would now secure more bahavioral data than it
needed to serve its users. That surplus, behavioral surplus, was the
game-changing, zero-cost asset that was divert from service improvement toward
a genuine and highly lucrative market exchange.” (The Age of Surveillance
Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 81)
Tradução:
“O Google não seria mais um
destinatário passivo de dados acidentais que poderiam ser reciclados para o
benefício de seus usuários. A patente de publicidade direcionada lança luz
sobre a descoberta de caminhos que o Google percorreu desde sua fundação
orientada à autonomia em direção à elaboração da vigilância comportamental como
uma lógica de acumulação completa. O próprio invento expõe o raciocínio pelo
qual o ciclo de reinvestimento do valor comportamental foi subjugado a serviço
de um novo cálculo comercial. Os dados comportamentais, cujo valor já havia
sido ‘usado’ para melhorar a qualidade da Pesquisa para usuários, agora se
tornaram a matéria-prima essencial e exclusiva do Google para a construção de
um mercado dinâmico de publicidade on-line. O Google agora protegeria mais
dados comportamentais do que o necessário para atender seus usuários. Esse
excedente, excedente comportamental, foi o ativo de custo zero que mudou o jogo
e foi desviado da melhoria de serviços para uma troca de mercado genuína e
altamente lucrativa.”
Karl Marx definiu a “mais
valia” como uma parcela de trabalho não é paga ao operário. Essa parcela pode
ser aumentada de duas maneiras: aumento da jornada de trabalho sem aumento
correspondente de salário; aumento da produtividade durante a mesma jornada de
trabalho. O empregador administra a empresa e não tem obrigação de prestar
contas ao empregado. Portanto, em qualquer das hipóteses, o trabalhador nunca
está em condições de saber qual foi a diferença exata entre o trabalho dele que
foi pago e a parcela acumulada pelo empregador. Essa ignorância é essencial.
Ela preserva a racionalidade do capitalismo, bem como a hierarquia entre o
empresário e o trabalhador.
Segundo Shoshana Zuboff algo
semelhante ocorre na dinâmica do capitalismo de vigilância. O Google se
apropria das informações colaterais produzidas pelos usuários e obtem lucro sem
pagar por elas O que o Google fornece ao retornar cada pesquisa, é apenas uma
parcela do que foi requisitado pelo usuário (as informações que ele solicitou).
O excedente que foi produzido pelo próprio usuário (informações colaterais das
pesquisas dele) é transformado em propaganda segmentada direcionada à ele com
lucro para o Google.
“Key to our conversation is this fact: surveillance capitalism was
invented by a specific group of human beings in a specifc time and place. It is
not an inherent result of digital technology, nor is it a necessary expression
of information capitalism. It was intentionally construtcted at a moment in
history, in much the same wat that the engenieers and tinkeres at the Ford
Motor Company invented mass prodoction in the Detroit of 1913.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 85)
Leia também: O capitalismo de vigilância e o passado
medieval à nossa frente
Tradução:
“A chave da nossa conversa é
esse fato: o capitalismo de vigilância foi inventado por um grupo específico de
seres humanos em um tempo e local específicos. Não é um resultado inerente à
tecnologia digital, nem é uma expressão necessária do capitalismo da
informação. Foi intencionalmente construído em um momento da história, da mesma
maneira que os engenheiros e pensadores da Ford Motor Company inventaram a
produção em massa em Detroit em 1913.”
Esse é um detalhe importante.
A Google inventou uma maneira de explorar seus usuários sem dar eles qualquer
opção de não fornecer informações colaterais, de impedir o uso delas ou de
receber uma quantia em razão do lucro que a empresa obter explorando-as. Isso
não era e não é inevitável. Todavia, o caminho aberto pelo Google em pouco
tempo passaria a ser explorado pelo Facebook.
“… Once Google’s leadership undertood the commercial power of behavioral
surplus, Schmidt instituted what he called the ‘hiding strategy’. Google
employees were told not to speak about what the patent had referred to as its
‘novel methods, appararus, message formats and/or data strutures’ or confirm
any rumors about flowing cash. Hiding was not a post hot strategy; it was baked
into the cake that would became surveillence capitalism.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p.
88/89)
Tradução:
“… Depois que a liderança do
Google compreendeu o poder comercial do excedente comportamental, Schmidt
instituiu o que chamou de ‘estratégia de ocultação’. Os funcionários do Google
foram instruídos a não falar sobre o que a patente chamava de ‘novos métodos,
aparelhos, formatos de mensagem e/ou estruturas de dados’ ou confirmar rumores
sobre fluxo de caixa. Esconder não era uma estratégia de correlação
coincidente; foi assado no bolo que se tornaria o capitalismo de vigilância.”
O círculo virtuoso se fecha
mediante uma artimanha: ocultação e ignorância. Assim como o capitalista
acumula uma parcela de trabalho não paga que é ignorada pelo trabalhador (Karl
Marx), o usuário do Google deve ignorar como ele mesmo acrescentou valor à
empresa sem receber em troca uma parcela significativa das informações que
produziu e foram utilizadas para segmentar a propaganda que ele recebe junto
com o resultado da pesquisa (Shoshana Zuboff).
O conceito de “excedente
comportamental” mantém assim uma relação com o de “mais valia”, com uma
diferença: o trabalhador é pago por uma parcela do trabalho; o usuário não
recebe absolutamente nada em troca além da propaganda que ajudou a segmentar
fornecendo gratuitamente informações colaterais ao usar o Google.
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