Há uma evidente diferença
entre o que o Facebook e os usuários da rede social plantam e colhem.
Por Fábio de Oliveira Ribeiro
-15/06/2020
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Viciados em ‘Curtidas’ e
vítimas de agressões
morais
programadas,
No texto anterior desta série, vimos como Shoshana
Zuboff explorou as contradições da por Fábio de Oliveira Ribeiro
obra de Alex Pentland, autor que defende a
inevitabilidade dos agrilhões que mantém as apessoas subjugadas ao capitalismo
de vigilância
https://jornalggn.com.br/artigos/as-duas-distopias-em-curso-e-o-renascimento-do-pensamento-utopico/.
Neste, veremos quais são as características destes grilhões.
Ao longo do capítulo 16, a
autora explora diversos estudos científicos feitos sobre o comportamento dos
usuários de redes sociais.
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“…A 2012 survey concluded that
emerging adults devote more time to using media than any other daily activity,
spending nearly twelve hour each day with media of some form. By 2018 Pew
Research reported that nearly 40 percent of young people ages 18-29 report
being online ‘almost constantly’, as do 36 percent of those ages 30-49.
Generation Z intensifies the trend: 95% uses smartphones, and 45 percent of
teens say they are online ‘on a near-constant basis’. If that is how you spend
your days and nights, then the findings of a 2016 study are all too logical, as
42 percent of teenage respondents said that social media affects how people see
them, having adopted what the researchers call an outside-looking-in approach
to how they express themselves. Their dependency penetrates deeply into their
sense of well-being, affecting how they feel about themselves (42 percent) and
their happiness (37 percent).” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana
Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 447)
Tradução:
“… Uma pesquisa de 2012
concluiu que os quase adultos dedicam mais tempo ao uso da mídia do que
qualquer outra atividade diária, gastando quase doze horas por dia com mídia de
alguma forma. Em 2018, a Pew Research relatou que quase 40% dos jovens entre 18
e 29 anos relatam estar on-line ‘quase constantemente’, assim como 36% entre 30
e 49 anos. A geração Z intensifica a tendência: 95% usa smartphones e 45% dos
adolescentes dizem que estão online ‘quase constantemente’. Se é assim que você
passa seus dias e noites, as conclusões de um estudo de 2016 são muito lógicas,
pois 42% dos adolescentes disseram que as mídias sociais afetam a maneira como
as pessoas as veem, adotando o que os pesquisadores chamam de “olhando para
fora” na abordagem de como eles se expressam. A dependência deles penetra
profundamente em sua sensação de bem-estar, afetando como eles se sentem sobre
si mesmos (42%) e sua felicidade (37%).”
Um pouco adiante, a autora
esclarece quais são os efeitos deletérios do botão “Curtir” do Facebook:
“On the demand side, Facebook ‘likes’ where quicly coveted and craved
morphing into a universal reward system or what onde young app designer called
‘our generation’s crack cocaine’. ‘Likes’ became those variably timed dopamine
shots, driving users to double down on their bets ‘every time they shared a
photo, web link, or status update. A post with zero likes wasn’t just privately
painful, but also a kind of public condemnnation’. In fact, most users craved
the reward more than they feared humiliation, and the ‘Like’ button became
Facebook’s signature, spreading across the digital universe and actively fusing
users in a new kind of mutual depedency expressed in a pastel orgy of giving
and receiving reinforcement.
The ‘Like’ button was only the start of what was to be an historic
construction of a new social world that for many users is defined by fusion
with the social mirror, especially among the young. Just as gamblers chase the
zone in fusion with the machine, a young person embedded in the culture of
mutuality with the challenge of the self-other balance, the ‘Like’ button and
its brethren continuously tip the scales towar regression.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p.
458)
Tradução:
“Do lado da demanda, o
Facebook ‘Curtir’ cobiçava e ansiava por transformar-se em um sistema de
recompensa universal ou o que um jovem designer de aplicativos chamou de ‘crack
da nossa geração’. As ‘Curtidas’ tornaram-se aquelas doses de dopamina com
tempo variável, levando os usuários a dobrar suas apostas ‘toda vez que compartilhavam
uma foto, link da web ou atualização de status. Uma postagem com zero curtidas
não era apenas dolorosa em particular, mas também uma espécie de condenação
pública’. De fato, a maioria dos usuários ansiava mais pela recompensa do que
temia a humilhação, e o botão ‘Curtir’ se tornou a assinatura do Facebook,
espalhando-se pelo universo digital e fundindo ativamente os usuários em um
novo tipo de dependência mútua expresso em uma orgia pastel de dar e receber
reforço.
O botão ‘Curtir’ foi apenas o começo
do que seria uma construção histórica de um novo mundo social que para muitos
usuários é definido pela fusão com o espelho social, especialmente entre os
jovens. Assim como os jogadores perseguem a zona em fusão com a máquina, um
jovem incorporado à cultura da mutualidade com o desafio do equilíbrio entre
si, o botão ‘Curtir’ e seus irmãos continuamente inclinam a balança para a
regressão.”
O estrago causado pelo News
Feed do Facebook não é muito diferente:
“Facebook’s science and design expertise aim for a closed loop that
feeds on, reinforces, and amplifies the individual user’s inclination toward
fusion with the group and the tendency to over-share personal information.
Although these vulnerabilities run deepest amont the youg, the tendency to over-share
is not private to them. The difficulty of self-imposed discipline in the
sharing of private thoughts, feelings, and other personal information has been
amply demonstrated in social research and summarized in an important 2015
review by Carnegie Mellon professors Alessandro Acquisti, Laura Brandimarte,
and George Loewentein. They concluded that because of a range of psychological
and contextual factors, ‘People are often unaware of the information they are
sharing, unaware of how it can be used, and even in the rare situations when
they have full knoledge of the consequences of sharing, uncertain about their
own preferences…’ The researchers cautioned that people are ‘easily influenced
in what and how much they disclose. Moreover, what they share can be used to
influence their emotions, thoughts, and behaviors…’ The result is alteration in
‘the balance of power between those holding the data and those who are the
subjects of that data’.
Leia também: Carlos Lessa e o seu legado intelectual, por
Rodrigo Medeiros
Facebook’s has Pentland’s prized God view on its side, an unparalleded
resource that is drawn upn to remake this haturally longed-for fusion into a
space of no escape. Science and capital are united in this long-game project,
Yesterday it was the ‘Like’ button, today it is augmented reality, and tomorrow
will be new innovations added to this repertoire. The company’s growth in user
engagement, surplus capture, and revenue are evidence that these innovations
have hit their marks.” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff,
PublicAffairs, New York, 2019, p. 460)
Tradução:
“A experiência científica e de
design do Facebook visa um ciclo fechado que se alimenta, reforça e amplia a
inclinação do usuário individual em se fundir com o grupo e a tendência de
compartilhar informações pessoais. Embora essas vulnerabilidades sejam mais
profundas entre os jovens, a tendência de compartilhar demais não é particular
para eles. A dificuldade da disciplina autoimposta no compartilhamento de
pensamentos, sentimentos e outras informações pessoais foi amplamente
demonstrada em pesquisa social importante de 2015 revisada pelos professores de
‘Carnegie Mellon’ Alessandro Acquisti, Laura Brandimarte e George Loewentein.
Eles concluíram que, devido a uma série de fatores psicológicos e contextuais,
‘as pessoas muitas vezes desconhecem as informações que estão compartilhando,
desconhecem como elas podem ser usadas e até mesmo nas raras situações em que
têm pleno conhecimento das consequências do compartilhamento, incertos sobre
suas próprias preferências… ‘Os pesquisadores alertaram que as pessoas são
‘facilmente influenciadas no que e quanto divulgam. Além disso, o que eles
compartilham pode ser usado para influenciar suas emoções, pensamentos e
comportamentos…’ O resultado é uma alteração no ‘equilíbrio de poder entre
aqueles que detêm os dados e aqueles que são os sujeitos desses dados ‘.
O Facebook tem a premiada
‘visão de Deus’ de Pentland, um recurso incomparável, elaborado para refazer
essa fusão odiada por um desejo esquecido em um espaço sem saída. Ciência e
capital estão unidos neste projeto de um jogo longo. Ontem foi o botão
‘Curtir’, hoje é realidade aumentada e amanhã serão adicionadas novas inovações
a esse repertório. O crescimento da empresa no envolvimento do usuário, captura
excedente e receita são evidências de que essas inovações atingiram suas
marcas.”
Às doses diárias de
entorpecentes (botão Curtir) e à vulnerabilidade causada pelo compartilhamento
de informações pessoais (News Feed) a autora acrescenta o efeito de comparação
social, que causa ansiedade e depressão especialmente em adolescentes.
“… According to the 302 most significant quantitative research studies
on the relationships between social media use and mental healt (most of them
produce since 2013), the psychological process that most defines the Facebook
experience is what psychologists call ‘social comparison’. It is usually
considered a natural and virtually automatic process that operates outside of
awaraness, ‘effectively forced upon the individual by his social enviroment’ as
we apply evaluative criteria tacitly internalized from our society, community,
group, family, and friend. As one research reviw summarizes ‘Almost at the
moment of exposure, an initial holistic assessment of the similarity between
the target and the self is made’. As we go through life being exposed to other
people, we naturally compare ouselves along the lines of similarity and
contrast – I a like you. I am different from you – subliminal perceptions that
translate into judgments – I am better than you. You are better than I.” (The
Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019,
p. 461)
Tradução:
“… De acordo com os 302
estudos quantitativos mais significativos sobre as relações entre o uso de
mídias sociais e a saúde mental (a maioria deles produzido desde 2013), o
processo psicológico que mais define a experiência no Facebook é o que os
psicólogos chamam de ‘comparação social’. Geralmente, é considerado um processo
natural e praticamente automático que opera fora da consciência, ‘efetivamente
imposto ao indivíduo por seu ambiente social’, à medida que aplicamos critérios
de avaliação tacitamente internalizados de nossa sociedade, comunidade, grupo,
família e amigo. Como a revisão de uma pesquisa resume ‘Quase no momento da
exposição, é feita uma avaliação holística inicial da semelhança entre o alvo e
o eu’. À medida que passamos a vida sendo expostos a outras pessoas,
naturalmente nos comparamos ao longo das linhas de semelhança e contraste – eu
gosto de você. Sou diferente de você – percepções subliminares que se traduzem
em julgamentos – sou melhor que você. Você é melhor do que eu.”
Após fazer uma breve exposição
sobre como a televisão afetou de maneira negativa a vida das pessoas expondo-as
às realidades diversas e, eventualmente melhores, do que aquelas às quais elas
estavam geográfica e socialmente confinadas, Shoshana Zuboff volta a tratar da
comparação imposta pela dinâmica das redes sociais.
Leia também: Esconder números e desaparecer com os corpos,
por Joana Rozowykwiat
“Both television and social media deprive us of real-life encounter, in
which we sense other’s inwardnesss and share something of our own, thus
establishing some threads of communality. Unlike television, however, social
media entails active self-presentation characterized by ‘profile inflation’ ,
in which biographical informaation, photos, and updates are crafed to appear
ever more marvelous in anticipation of the stakes for popularity, sel-worth,
and happiness. Profile inflation triggers more negative sel-evaluation among
individuals as people compare themselves to others, which then leads to more
profile inflation, especially among larger networks that include more ‘distant
friends’. As one study concluded , ‘Expanding one’s social network by adding a
number of distant friends through Facebook may be detrimental by stimulating
negative emotions for users’.
One consequence of the new density of social comparison triggers and
ther negative feedback loop is a psychological condition known as FOMO (‘fear
of missing out’). It is a form of social anxiety defined as ‘the uneasy and
cometimes all-consuming feeling that… your peers are doing, in the know about,
or in possession or more or something better than you’. It’s a young person’s
affliction that is associated with negative mood and low levels of life
satisfaction. Research has indentified FOMO with compulsive Facebook use: FOMO
sufferers obsessively checked their Facebook feeds – during meals, while
driving, immediately upon waking or beforte sleepong, and so on. This
compulsive behavior is intended to produce relief in the form of social
reassurance, but it predictaby breeds more anxiety and more searching.” (The
Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019,
p. 462/463)
Tradução:
“Tanto a televisão quanto as
mídias sociais nos privam do encontro na vida real, no qual sentimos a
interioridade de outras pessoas e compartilhamos algo próprio, estabelecendo
assim alguns fios de comunalidade. Ao contrário da televisão, no entanto, as
mídias sociais envolvem a autoapresentação ativa caracterizada por ‘inflação de
perfil’, na qual informações biográficas, fotos e atualizações são criadas para
parecerem cada vez mais maravilhosas, com antecipação dos riscos de
popularidade, valor pessoal e felicidade. A inflação de perfis desencadeia uma
autoavaliação mais negativa entre os indivíduos, à medida que as pessoas se
comparam a outras, o que leva a mais inflação de perfis, especialmente entre
redes maiores que incluem mais ‘amigos distantes’. Como um estudo concluiu,
‘expandir a rede social adicionando vários amigos distantes pelo Facebook pode
ser prejudicial ao estimular emoções negativas nos usuários’.
Uma consequência da nova
densidade de gatilhos de comparação social e do ciclo de respostas negativas é
uma condição psicológica conhecida como FOMO (‘fear of missing out’, ou seja,
‘medo de perder’ em português). É uma forma de ansiedade social definida como
‘a sensação desconfortável e às vezes consumidora de que… seus colegas estão
fazendo, sabendo ou possuindo ou mais ou algo melhor que você’. A aflição de um
jovem está associada a um humor negativo e a baixos níveis de satisfação com a
vida. Pesquisas identificaram o FOMO com o uso compulsivo do Facebook: quem
sofre de FOMO verifica obsessivamente seus feeds do Facebook – durante as
refeições, enquanto dirige, imediatamente após acordar ou esquecer o sono, e
assim por diante. Esse comportamento compulsivo visa produzir alívio na forma
de reafirmação social, mas previsivelmente gera mais ansiedade e mais procura.”
Há uma evidente diferença
entre o que o Facebook e os usuários da rede social plantam e colhem.
“Facebook entered the world bypassing old institutional boundaries,
offering us freedom to connect and express ourselves at will. It is impossible
to say what the Facebook experience might have been had the company chosen a
path that did not depend upon surveillance revenues. Instead, we confront the
sudden accretion of an instrumentarian power that spins our society in an
unanticipated direction. Facebook’s applied utopistics are prototype of an
instrumentarian future, showcasing feats of behavioral engineering that groom
populations for the rigors of instrumentarianism’s coercive harmonies. Its
operations are designed to exploit the human inclination towarad empathy,
belonging, and acceptance. The system tunes the pitch of our behavior with the
rewards and punishments of social pressure, herding the human heart toward
confluence as a means to other’s commercial ends.
From this vantage point, we see that the full scope of the Facebook
operation constitutes a vast experiment in behavior modification designed not
only to test the specific capabilities of its tuning mechanisms, as in its
official ‘large-scale experiments’, but also to do so on the broadest possible
social and psychological canvas. Most significantly, the applied utopistics of
social pressure, its flywheel of social comparison, and the closed loops that blind
each user to the group system vividly confirm Pentland’s theoretical rendering
of the case. Instrumentarian social principles are evident here, not as
hypotheses but as facts, facts that corrently constitute the spaces where our
chindren ae ment to ‘grow up’.” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana
Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 468/469)
Tradução:
Leia também: #somos70porcento a hashtag bonitinha, mas
ordinária, por Eduardo Borges
“O Facebook entrou no mundo
ultrapassando as antigas fronteiras institucionais, oferecendo-nos liberdade
para nos conectar e nos expressar à vontade. É impossível dizer qual poderia
ter sido a experiência no Facebook se a empresa tivesse escolhido um caminho
que não dependesse das receitas de vigilância. Em vez disso, confrontamos o
acréscimo repentino de um poder instrumentário que coloca nossa sociedade em
uma direção imprevista. As utopísticas aplicadas do Facebook são um protótipo
de um futuro instrumentarista, apresentando proezas da engenharia comportamental
que preparam as populações para os rigores das harmonias coercitivas do
instrumentarianismo. Suas operações são projetadas para explorar a inclinação
humana em relação à empatia, pertença e aceitação. O sistema sintoniza o tom do
nosso comportamento com as recompensas e punições da pressão social, conduzindo
o coração humano à confluência como um meio para fins comerciais de outros.
Desse ponto de vista, vemos
que todo o escopo da operação do Facebook constitui um vasto experimento de
modificação comportamental, projetado não apenas para testar as capacidades
específicas de seus mecanismos de ajuste, como em seus ‘experimentos de larga
escala’ oficiais, mas também para fazer assim, num quadro social e psicológico
mais amplo possível. Mais significativamente, as utopísticas aplicadas da
pressão social, seu volante de comparação social e os ciclos fechados que cegam
cada usuário ao sistema do grupo confirmam vivamente a interpretação teórica de
Pentland do caso. Os princípios sociais instrumentaristas são evidentes aqui,
não como hipóteses, mas como fatos, fatos que constituem corretamente os
espaços em que nossas crianças se empenham em ‘crescer’.”
Num dos capítulos anteriores
do livro, a autora demonstrou como e porque é inútil confrontar o poder excepcional
sem precedentes, a “auctoritas virtual”, dos capitalistas de vigilância no
ambiente que eles criaram. Qualquer coisa que o usuário fizer na internet
apenas reforçará a expropriação de excedente comportamental. A assimetria
garante tanto o sucesso do capitalismo de vigilância quanto sua perpetuação.
Soshana Zuboff termina esse
capítulo com uma reflexão em torno do drama “Sem saída”, de Jean-Paul Sartre,
cujo personagem Garcin chega à famosa conclusão “O inferno é as outras
pessoas.” A saída desse inferno cientificamente desenhado para viciar os
usuários, sujeitando-os às doenças identificadas pelos pesquisadores
mencionados pela autora, talvez seja a responsabilização civil do Facebook.
O serviço que a rede social
presta, supostamente gratuito, somente produz lucro em virtude dos excedentes
comportamentais expropriados dos usuários com a finalidade de otimizar a
propaganda e possibilitar aos engenheiros de software se tornarem engenheiros
sociais. Quando cria um perfil no Facebook a pessoa deseja afirmar publicamente
sua dignidade e não ser rebaixada à condição de rato num imenso laboratório
virtual.
O Código Civil brasileiro
possibilita a reparação de danos em dois casos: a prática de ato ilícito e o
abuso de um direito.
“Art. 186. Aquele que, por
ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato
ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
Não me parece ser
juridicamente impossível levar ao conhecimento do Poder Judiciário uma
pretensão de indenização contra o Facebook se o usuário desenvolver qualquer
uma das doenças psicológicas que a arquitetura da rede social foi desenhada
para provocar a fim de maximizar os lucros da empresa. Não é lício induzir o
vício dos usuários de uma rede social, especialmente porque esse dano poderia
ser evitado com a adotação de uma arquitetura diferente. Fazer as pessoas
adoecerem para maximizar os próprios lucros pode, no mínimo, ser considerado um
abuso do direito de explorar uma atividade economicamente lucrativa.
A gratuidade do serviço não
isenta seu prestador de responsabilidade em relação aos danos que ele causa.
Também me parece juridicamente
plausível, no contexto do Direito Civil brasileiro, um pedido de indenização
fundamentado na violação do princípio do respeito à dignidade humana (art. 1°,
inciso III, da Constituição da República). Nesse caso, pouco importa o que diz
o “manual” do Facebook que foi aceito pelo usuário: a empresa não pode tratar
seus usuários como animais num laboratório, sujeitando-os a modificações
comportamentais ignoradas que eles mesmos não desejariam se tivessem
consciência de que seriam manipulados para garantir os lucros de terceiros.
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