Livro revela alemão que influenciou Freyre
DO ENVIADO A PARATY
Em suas pesquisas sobre Gilberto Freyre, a historiadora Maria Lúcia Pallares-Burke -cocuradora da homenagem ao sociólogo na Flip- cruzou várias vezes com a figura de Rüdiger Bilden.
Achou o alemão tão fascinante que resolveu dedicar-lhe um livro, que está quase concluído.
Bilden foi colega de Freyre na Universidade Columbia (EUA) nos anos 1920. Tornou-se amigo e influência para o pernambucano, com quem dividia o interesse pela questão da raça na formação da identidade brasileira.
Diferentemente de Freyre, porém, Bilden nunca publicou suas pesquisas, o que intrigou Pallares-Burke.
"Será um ensaio biográfico sobre Bilden e o fracasso." Ela cita o perfeccionismo e dificuldades materiais como hipóteses para o infortúnio do alemão.
Autora de duas biografias de Freyre, Pallares-Burke lembra que Bilden "é mais mencionado do que Franz Boas [influência fundamental de Freyre]" em "Casa Grande & Senzala'". "Mas ninguém sabia o que tinha acontecido com ele", diz ela, que foi aos EUA e à Alemanha para pesquisar. (FV)
Crumb e Shelton agradam com dose de mau humor
Autor de "Fritz, o Gato" elogia grupo de rua em Paraty e fala de "Gênesis"
Crumb diz não ser mais tão obcecado por sexo e diverge sobre quando conheceu Shelton por "fumar muita erva"
IVAN FINNOTI
ENVIADO ESPECIAL A PARATY
Na mesa mais concorrida da Flip 2010, que aconteceu ontem à noite em Paraty, os cartunistas norte-americanos Robert Crumb e Gilbert Shelton divertiram o público por uma hora com tiradas de humor cáustico e histórias da contracultura dos anos 60.
Sérgio Dávila, editor-executivo da Folha, que mediou a conversa, começou perguntando se era verdade que as mulheres é que haviam obrigado os cartunistas a viajar a Paraty.
Crumb prontamente confirmou, aproveitando para reclamar dos fotógrafos. Já Shelton disse que tinha adorado Paraty.
"É muito pitoresca", disse ele, ao que Crumb respondeu, com seu mau humor lendário: "Há muitas cidades pitorescas no mundo...".
Crumb disse em seguida que ter assistido a um show na rua do grupo Os Curandeiros tinha feito valer a viagem. "Muito melhor que a música que todos os bares de Paraty tocam", completou.
O GRANDE ENCONTRO
Shelton lembrou de quando conheceu Crumb: "Foi em Nova York, em 1969". Mas o colega duvidou: "Acho que foi em San Francisco. Mas fumava muita erva e tomava muito LSD naquela época.
Realmente não lembro...".
Em um momento divertido, Dávila perguntou a Crumb, que carrega tanto nas tintas sexuais em suas histórias, se algo mudara nos últimos anos.
"Agora sou velho, não sou mais tão obcecado com sexo. Na verdade, vejo aquilo e digo: "Jesus, que lunático!". É um pouco embaraçoso." Mesmo assim, Crumb lembrou que amigos comentaram com ele que o Brasil era "a terra prometida para quem gosta de bundas grandes. E é mesmo! E as roupas curtas ajudam". Ao que Dávila informou: "E olha que estamos no inverno".
GÊNESIS
Sobre seu último trabalho, "Gênesis", Crumb contou que a ideia era fazer piadas do primeiro livro da Bíblia.
"Eu nem conhecia as histórias. Mas, depois, vi que eram tão bizarras que resolvi apenas ilustrar, em vez de fazer uma paródia. Após 25 páginas, percebi que era um trabalho enorme. Só terminei quatro anos depois."
Informado de que jornais de Israel haviam publicado resenhas positivas sobre essa obra, Crumb não perdeu a piada: "Vendi o livro pra eles. Foi o menor adiantamento que já recebi".
Gilbert Shelton comentou ainda sobre o andamento de dois filmes baseados em seus quadrinhos, um deles sobre os famosos "Freak Brothers", os quais Shelton disse terem sido parcialmente inspirados nos Três Patetas.
Ainda sobre cinema, Shelton comentou que, se fossem retratá-lo nas telas, gostaria de ser interpretado por Clint Eastwood. "Mel Gibson, então, para mim", sugeriu Crumb.
Ao final da conferência, a mulher de Crumb, Aline, subiu ao palco e destilou um pouco de seu humor: "Obrigada por me chamar aqui em cima. Venho sendo ignorada por Crumb há 40 anos".
"Poesia transforma dor em alegria estética", diz Gullar
ROBERTO KAZ
ENVIADO ESPECIAL A PARATY
Se a Flip fosse a Copa e os autores, jogadores, o poeta Ferreira Gullar, 79, teria quem o representasse: Ronaldo Luiz Nazário de Lima.
Ronaldo é o jogador com maior número de gols em Copas. Gullar é o autor com o maior número de participações em Flips.
Há, no entanto, uma diferença crucial entre os dois. Enquanto Ronaldo quer o mundo, Gullar se contenta (e muito) com a companhia de seu gato, o vira-lata Gatinho.
Em sua terceira participação na Flip, o colunista da Folha falou, ontem, de seu gato, seus ossos (sim, os ossos também merecem poemas) e, claro, sua poesia.
Leu trechos de sua obra mais famosa, o "Poema Sujo" (1976), produzido durante a ditadura, além de presentear a plateia com trechos de poemas ainda não publicados. Ao final, foi aplaudido de pé pelo público que lotou a Tenda dos Autores.
Gullar contou histórias da época em que fazia poemas neoconcretos, em que as palavras não seguiam qualquer tipo de regra sintática: "Quis que a escrita nascesse com o poema. Ninguém entendeu, claro, porque a linguagem é algo social".
Sobre a máxima de que "fazer poema é um parto" (também adotada por cineastas, atores, pintores e toda sorte de profissional das humanas), disse: "Vocês estão cansados de ouvir poeta dizendo que escrever é sofrimento. Mentira. É bom. O poema até pode tratar de algo doído, mas ele transforma dor em alegria estética".
Sobre qualquer forma de engajamento literário, ensinou: "Não adianta fazer poesia ruim, engajada, para não mudar nada. Se é para não mudar nada, é preferível fazer boa poesia".
Como exemplo, contou a história de quando foi procurado, na época em que trabalhava no "Jornal do Brasil", para publicar um manifesto sobre a "Poesia de Base".
"Falei que manifesto não publicava, publicava poema. Manifesto é coisa de político. Promete e não faz. Resultado: nunca produziram um único poema de base."
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