É impossível imaginar a
construção do capitalismo de vigilância se o próprio capitalismo não criasse o
temor do fracasso, se a concorrência não punisse as empresas, se as decisões
empresariais erradas não levassem os empresários à falência.
Por
Fábio de Oliveira Ribeiro
-
22/05/2020
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Excedente comportamental, o
novo mundo a ser conquistado e possuído, por Fábio de Oliveira Ribeiro
O prazer de resenhar o livro
he Age of Surveillance Capitalism é inesgotável
https://jornalggn.com.br/artigos/o-florescimento-lucrativo-do-capitalismo-de-vigilancia/.
No capítulo seis da primeira parte da obra, Shoshana Zuboff compara a
expropriação de excedente comportamental à colonização espanhola.
“…The friar Bartolomé de las Casas, whose account bears witness to this
story of Spanish atrocities, wrote that the Requirimiento promised the native
people fair treatment upon surrender but also spelled out the consequences of
defiance. Every act of indigenous resistance was framed as ‘revolt’ thereby
legitimizing brutal ‘retaliation’ that exceeded military norms, including
grotesque torturem the burning of whole villages in the dark of night, and
hanging women in public view: ‘I will do you all the evil and damages that a
lord may do to vassals who do not obey or receive him. And I solemnly declare
that the deaths and damages received from such will be your fault and not that
of His Majesty, nor mine, nor of the gentlemen who came with me’.
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Conqueste by declaration should sound familiar because the facts of
surveillance capitalism have been carried into the world on the strength of six
critical declarations pulled fron thin air when Google first asserted them.
That the facts they proclaimed have been allowed to stand is evident in the
dispossession strategies of Verizon and other new entrants to the surveillance
capitalist firmament. In the raputre of the young firm’s achievements ,
Google’s founders, fans, and adoring press passed over in silence the startling
vision of invasion and conquest concealed in these assertions.
The six declarations laid the foundation for the wider project of
surveillance capitalism and its original sin of dispossession. They must be
defended at any cost because each declatarion builds on the one before it. If
one falls they all fall:
– We clain human experience as raw material free for the taking. On the
basis of this claim, we can ignore considerations of individual’s rights,
interests, awareness, or comprehension.
– On the basis of our claim, we assert the right to take an individual’s
experience for translation into bahavioral data.
– Our right to take, based on our claim of free raw material, confers
the right to own the behavioral data derived from human experience.
– Our rights to take and to own confer the right to know what the data
disclose.
-Our rights to take, to own, and to konw confer the right to decide how
we use our knowlege.
– Our rights to take, to own, to know, and to decide confer our rights
to te conditions thar preserve our rights to take, toown, to know, and to
decide.
Thus, the age of surveillance capitalism was inaugurated with six
declatarions that defined it as an age of conquest. Surveillance capitalism
succeeded by way of aggressive declaration, and its success stands as a
powerful illustration of the invasive character of declarative words and deeds,
which aim to conquer by imposing a new reality.” (The Age of Surveillance
Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 178/180)
Tradução:
“… O frade Bartolomé de las
Casas, cujo forneceu um testemunho dessa história de atrocidades espanholas,
escreveu que o Requirimiento prometia ao povo nativo um tratamento justo em
caso de rendição, mas também explicava as consequências do desafio. Todo ato de
resistência indígena era enquadrado como ‘revolta’, legitimando, assim, uma
‘retaliação’ brutal que excedia as normas militares, incluindo tortura grotesca
pela queima de aldeias inteiras na escuridão da noite e enforcamento das
mulheres à vista do público ‘Farei todo o mal e danos que um senhor possa fazer
aos vassalos que não o obedecem ou o recebem. E declaro solenemente que as
mortes e os danos recebidos serão culpa sua e não da Sua Majestade, nem da
minha, nem dos senhores que vieram comigo ‘.
Uma conquista mediante
declaração deve soar familiar, porque os fatos do capitalismo de vigilância
foram levados ao mundo com base em seis declarações críticas que surgiram
quando o Google as afirmou pela primeira vez. Que os fatos que foram
proclamados terem sido mantidos é evidente nas estratégias de expropriação da
Verizon e de outros novos participantes do firmamento dos capitalistas da
vigilância. Na sequência das realizações da jovem empresa, os fundadores, fãs e
imprensa que adora o Google ignoraram em silêncio a visão surpreendente de
invasão e conquista escondida nessas afirmações.
As seis declarações lançaram
as bases para o projeto mais amplo do capitalismo de vigilância e seu pecado
original de expropriação. Eles devem ser defendidos a qualquer custo, porque
cada declaração se baseia na anterior. Se uma delas cair, todas caem:
– Nós consideramos a
experiência humana como uma matéria-prima livre que pode ser capturada. Com
base nessa reivindicação, podemos ignorar considerações sobre os direitos,
interesses, conscientização ou compreensão do indivíduo.
– Com base em nossa
reivindicação, afirmamos o direito de traduzir a experiência de um indivíduo em
dados comportamentais.
– Nosso direito de receber,
com base em nossa reivindicação de matéria-prima gratuita, confere o direito de
possuir os dados comportamentais derivados da experiência humana.
– Nossos direitos de capturar
e possuir conferem o direito de saber o que os dados divulgam.
Leia também: O capitalismo de vigilância no paraíso da
ausência de Lei, por Fábio de Oliveira Ribeiro
– Nossos direitos de capturar,
possuir e conhecer conferem o direito de decidir como nós usaremos nosso
conhecimento.
– Nossos direitos de capturar,
possuir, conhecer e decidir conferem nossos direitos às condições que preservam
nossos direitos de capturar, possuir, conhecer e decidir.
Assim, a era do capitalismo
vigilante foi inaugurada com seis declarações que o definiram como uma era de
conquista. O capitalismo da vigilância teve sucesso por meio de declarações
agressivas, e seu sucesso é uma ilustração poderosa do caráter invasivo das
palavras e ações declarativas, que visam conquistar impondo uma nova
realidade.”
O fragmento transcrito é
longo, eloquente e esclarecedor. Mas contém um problema que merece ser objeto
de consideração.
A conquista do Novo Mundo não
ocorreu apenas mediante o uso de violência. Como os portugueses no Brasil, os
espanhóis também se fiaram no apoio de indígenas que preferiram se colocar ao lado
deles para destruir seus inimigos tradicionais. Consolidada a conquista, os
aliados dos conquistadores também foram eventualmente destruídos à medida que a
civilização espanhola substituiu quase completamente as culturas tradicionais
que existiam no Novo Mundo espanhol.
O mundo conquistado mediante a
extração de excedente informacional não existiria se a própria atividade
econômica e a internet não tivessem produzido algum tipo de excedente. O
surgimento e consolidação da internet criou mais do que as informações
excedentes que podem ser expropriadas com o emprego de cookies, armazenadas nos
servidores do Google, Facebook, Microsoft, Verizon, etc… para ser exploradas
economicamente mediante a crianção de perfis de consumo ou para influenciar o
comportamento dos consumidores.
A revolução da informática
criou novas oportunidades econômicas. Mas ela também reforçou temores e
incertezas nos meios empresariais tradicionais. Essas incertezas e temores
podem ser considerados os excedentes emocionais que levaram os empresários a
financiar a construção e a consolidação do capitalismo de vigilância. O mercado
para previsões de comportamentos futuros não existiria se os empresários não
tivessem medo de produzir produtos e serviços que serão rejeitados pelo mercado.
Antes do advento do
capitalismo de vigilância, decisões empresariais erradas podiam acarretar o
colapso de multinacionais gigantescas. À medida que as empresas passaram a
decidir o que fazer e quando com base em previsões cada vez mais acuradas houve
uma evidente diminuição da margem de erro. Esse certamente foi um poderoso
incentivo para a consolidação do modelo inicialmente protagonizado por Google,
Facebook, Microsoft, Verizon, etc…
Shoshana Zuboff defende a tese
de que o capitalismo de vigilância não é uma consequência necessária das
inovações tecnológicas. Talvez ela esteja certa. Entretanto, eu tenho a
impressão de que o capitalismo de vigilância é uma consequência da própria
lógica capitalista.
A conquista do novo território
não foi produto apenas da violência. Como no caso das conquistas espanholas e
portuguesas do século XVI, o novo sistema econômico emergiu tanto da violência
suave praticada contra os usuários quanto da colaboração das empresas
interessadas em comprar espaços de propaganda construídos mediante as previsões
comportamentais elaboradas pelo capitalismo de vigilância.
Um pouco adiante, Zuboff se
refere à assimetria entre os capitalistas de vigilância e os usuários:
“Google’s asymmetrical power draws on all the social sources that we
have considered: its declarations, its defensive fortifications, its
exploitation of law, the legacy of surveillance exceptionalism, tur burdens of
second-modernity individuals, and so on. But its power would not be operational
without the gargantuan material infraestruture that surveillance revenues have
bought. Google is the pioneer of ‘hypercale’, considered to be ‘the largest
computer network on Earth’.” (The Age of Surveillance Capitalism, Shoshana
Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 188)
Tradução:
“O poder assimétrico do Google
se baseia em todas as fontes sociais que consideramos: suas declarações, suas
fortificações defensivas, sua exploração da lei, o legado do excepcionalismo em
vigilância, os fardos de indivíduos da segunda modernidade e assim por diante.
Mas seu poder não seria operacional sem a gigantesca infra-estrutura material
que as receitas de vigilância compraram. O Google é o pioneiro da
‘hiperescala’, considerada a ‘maior rede de computadores da Terra’.”
Esse poder foi utilizado para
consolidar o capitalismo de vigilância, pois cada vez que usamos a internet ou
telefonia móvel nós produzimos um excedente informacional.
“Surveillance capitalism’s command of the dividion of learning in
society begins with what I call the problem of the two texts. The specific
mechanisms of surveillance capitalism compel the production of two ‘eletronic
texts’, not jus one. When it comes to the first, we are its authors and
readers. This public-facing text is familiar and celebrated for the universe of
information and connection it brings to our fingertips. Google Search codifies
the informational content of the word wide web. Facebook’s New Feed binds the
network. Much of this public-facing tex is composed of what we incribe on its
pages: our posts, blogs, videos, photos, conversations, music, stories,
observations, ‘likes’, tweets, and all great massing hubbub of our lives
captured and communicated.
Under surveillance capitalism, however, the first text does not stand
alone; it trails a shadow close behind. The first text, full of promise,
actually functions as the supply operation for the second text: the shadow
text. Everything that we contribute to the first, no matter how trivial or
fleeting, becomes a target for surplus extraction. That surplus fills the pages
of the second text. This one is hidden from our view: ‘read only’ for
surveillance capitalists. In this text our experience is dragooned as raw
material to be accumulated and analyzed as means to other’s market ends. The
shadow text is a burgeoning accumulation of behavioral surplus and its
analyses, and it says more about us than we can know about ourselves. Worse
still, it becomes increasingly difficult, and perhaps impossible, to refrain
fron contributing to the shadow text. It automacally feeds on our experience as
we engage in the normal and necessary routines of social participation.” (The
Age of Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019,
p. 186)
Tradução:
Leia também: Defenestrar o terrorista virótico, por Francisco
Celso Calmon
“O comando do capitalismo de
vigilância da divisão da aprendizagem na sociedade começa com o que chamo de
problema dos dois textos. Os mecanismos específicos do capitalismo de
vigilância obrigam a produção de dois ‘textos eletrônicos’, não apenas um.
Quando se trata do primeiro, nós somos seus autores e leitores. Este texto
voltado para o público é familiar e comemorado pelo universo de informações e
conexões que ele traz ao nosso alcance. A Pesquisa do Google codifica o
conteúdo informativo da palavra world wide web. O novo feed do Facebook liga a
rede. Muito desse texto voltado para o público é composto pelo que incorporamos
em suas páginas: nossas postagens, blogs, vídeos, fotos, conversas, músicas,
histórias, observações, ‘curtidas’, tweets e todo o grande tumulto de nossas
vidas capturado e comunicado.
Sob o capitalismo de
vigilância, no entanto, o primeiro texto não fica sozinho; ele arrasta uma
sombra logo atrás. O primeiro texto, cheio de promessas, na verdade funciona
como a operação de fornecimento do segundo texto: o texto sombra. Tudo o que
contribuímos para o primeiro, por mais trivial ou passageiro, se torna alvo de
extração de excedente. Esse excedente preenche as páginas do segundo texto.
Este está oculto da nossa visão: ele ‘somente pode ser lido’ pelos capitalistas
de vigilância. Neste texto, nossa experiência é arrastada como matéria-prima a
ser acumulada e analisada como um meio para atingir outros fins de mercado. O
texto sombra é uma acumulação crescente de excedente comportamental e suas
análises, e diz mais sobre nós do que podemos saber sobre nós mesmos. Pior
ainda, torna-se cada vez mais difícil, e talvez impossível, abster-se de
contribuir com o texto sombra. Ele se alimenta automaticamente da nossa
experiência à medida que nos envolvemos nas rotinas normais e necessárias da
participação social.”
O poder desfrutado pelos
conquistadores do novo mundo era absoluto. O poder desfrutado pelos
capitalistas de vigilância também almeja ser absoluto. Os conquistadores
estavam a serviço dos reis da Espanha e de Portugal. Os expropriadores de
excedente comportamental estão a serviço dos empresários que querem vender seus
produtos e/ou eliminar as dúvidas e os erros fatais que poderiam ocorrer caso
eles não comprassem previsões acuradas sobre o comportamento futuro dos
consumidores que usam internet e telefonia móvel.
Não há como desligar um
fenômeno do outro. É impossível imaginar a construção do capitalismo de
vigilância se o próprio capitalismo não criasse o temor do fracasso, se a
concorrência não punisse as empresas, se as decisões empresariais erradas não
levassem os empresários à falência. O caso do Laserdisc é um exemplo de que
desenvolver o melhor produto não significa conquistar o mercado ou produzir
lucros https://pt.wikipedia.org/wiki/Laserdisc. O sucesso comercial dos CDs de
música foi destruído pelo Napster https://pt.wikipedia.org/wiki/Napster. A
decisão de um hacker foi suficiente para sufocar um poderoso ramo econômico.
A atividade econômica
capitalista gera incertezas. Os investimentos nem sempre se traduzem em lucros.
O capitalismo de vigilância foi criado para diminuir ou, quem sabe, iludir os
temores empresariais. Todavia, por mais que os capitalistas de vigilância
tenham lucrado nos últimos anos eles não foram capazes de prever o estrago
econômico colossal que está sendo causado pela pandemia do COVID-19.
O vírus é um organismo
biológico mais imprevisível do que um “cookie zumbi” da Verizon. Ele produz
reflexos econômicos independente da análise de bilhões de “Likes” pelos donos
do Facebook. O Google pode hackear quase todas nossas atividades “on line” para
vender previsões acuradas aos empresários interessados nos comportamentos
futuros dos usuários de internet e de telefonia móvel, mas ele não consegue
impedir os efeitos negativos de uma pandemia.
Ao final desse capítulo,
Shoshana Zuboff fez um resumo do poder sem precedentes do capitalismo de
vigilância.
“In the absence of a clear-minded appreciation of this new logic of
acumulation, every attempt at undertanding, predicting, regulating, or
prohibiting the activities of surveillance capitalists will fall short. The
primary framworks through wich our societies have sought to assert control over
surveillance capitalism’s audacity are those ‘privacy rights’ and ‘monopoly’.
Neither the pursuit of privacy regulations nor the imposition of constraints on
traditional monopoly practices has só far interrupted the key mechanisms of
accumulation, from supply routes to behavioral future markets.” (The Age of
Surveillance Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p.
194)
Tradução:
“Na ausência de uma apreciação
clara dessa nova lógica de acumulação, todas as tentativas de entender, prever,
regular ou proibir as atividades dos capitalistas de vigilância serão insuficientes.
Os principais enquadramentos através dos quais nossas sociedades procuraram
afirmar o controle sobre a audácia do capitalismo de vigilância são os
‘direitos de privacidade’ e a repressão ao ‘monopólio’. Nem a busca por
regulamentos de privacidade nem a imposição de restrições às práticas
tradicionais de monopólio interromperam até agora os principais mecanismos de
acumulação, das rotas de suprimento aos mercados comportamentais futuros.”
Leia também: O obituário brasileiro na dupla tragédia sem
previsão do tempo, por Álvaro Miranda
A pandemia é cruel. Ela já
matou 328 mil pessoas no planeta, 100 mil delas nos EUA. Qual será a utilidade
dos perfis desses consumidores que não podem mais comprar nada. Como separar o
excedente comportamental produzido por eles do excedente comportamental dos que
estão vivos Algumas pessoas morrem em razão do COVID-19, outras não. O
capitalismo de vigilância tem um novo inimigo: o nome dele é a
imprevisibilidade biológica e suas consequências econômicas.
O capitalismo de vigilância
surgiu como uma anormalidade num mundo de normalidade. A anormalidade criada
pela pandemia sem dúvida alguma vai afetá-lo de alguma maneira. As empresas
serão obrigadas a apertar o cinto. Despesas com propaganda são essenciais ou
podem ser cortadas? Qual o valor do mercado de comportamentos futuros se o
próprio futuro das corporações privadas se tornou incerto?
Os conquistadores devastaram o
Novo Mundo ao transmitir gripe aos indígenas com os quais eles entravam em
contato. Mortos, os índios obviamente não podiam ser escravizados e colocados a
serviço do empreendimento colonial. Não bastasse isso, os conquistadores também
levaram para o Velho Mundo a sífilis, doença que devastou a Europa durante
séculos. O COVID-19 não é um vírus de computador, mas ele pode travar a
engrenagem do capitalismo de vigilância. Impossível dizer se ele produzirá um
estrago duradouro ou permanente.
“Durkheim’s vision was neither sterile nor naive. He recognized that
things can take a darl turn and often do, resulting in what he called an
‘abnormal’ (sometimes translated as ‘pathological’) division of labor that
produces social distance, injustice, and discord in place of reciprocity and
interdependency. In this context, Durkheim singled out the destructive effects
of social inequality on the division of labor in society, especially what he
viewed as the most dangerous form of inequality: extreme asymmetries of power
that make ‘conflit itself impossible’ by ‘refusing to admit the right of
combat’. Such pathologies can be cured only by a politics that asserts the
people’s right to contest, confront, and prevail in the face of unequal and
illegitimate power over society. In the late nineteenth century and most of the
twentieth century, that contest was led by labor and other social movements
that asserted social equality through institutions such as collective
bargaining and public education.
The transformation that we witness in our time echoes these historical
observations as the division of learning follows the same migratory path from
the economic to the social domain once traveled by the division of labor. Now
the division of learning ‘passes far beyond purely economic interests’, for it
establishes the basis for our social order and its moral content.” (The Age of Surveillance
Capitalism, Shoshana Zuboff, PublicAffairs, New York, 2019, p. 185)
Tradução:
“A visão de Durkheim não era
estéril nem ingênua. Ele reconheceu que as coisas podem sofrer uma virada
soturna e, muitas vezes, resultando no que ele chamou de divisão do trabalho
‘anormal’ (às vezes traduzida como ‘patológica’) que produz distância social,
injustiça e discórdia no lugar de reciprocidade e interdependência. Nesse
contexto, Durkheim destacou os efeitos destrutivos da desigualdade social na
divisão do trabalho na sociedade, especialmente o que ele considerava a forma
mais perigosa de desigualdade: as assimetrias extremas de poder que tornam o
‘conflito em si impossível’, ‘recusando-se a admitir a direito de combate’.
Tais patologias podem ser curadas apenas por uma política que afirme o direito
das pessoas de contestar, confrontar e prevalecer diante do poder desigual e
ilegítimo que controla a sociedade. No final do século XIX e na maior parte do
século XX, essa disputa foi liderada por trabalhadores e outros movimentos
sociais que afirmavam a igualdade social por meio de instituições como
negociação coletiva e educação pública.
A transformação que
testemunhamos em nosso tempo ecoa essas observações históricas, pois a divisão
da aprendizagem segue o mesmo caminho migratório do domínio econômico para o
social, uma vez percorrido pela divisão do trabalho. Agora, a divisão do
aprendizado ‘vai muito além dos interesses puramente econômicos’, pois
estabelece a base para a nossa ordem social e seu conteúdo moral.”
Shoshana Zuboff publicou seu
livro antes da pandemia. Seria interessante saber o que ela tem a dizer sobre
as consequências dela para o capitalismo de vigilância. O que dezenas de
milhões de desempregados e desamparados nos EUA e no Brasil podem aprender nesse
momento em que a incerteza e a fome se tornam uma realidade opressiva? Como
eles devem agir para combater a distância social, a injustiça e a discórdia
produzida pelo capitalismo de vigilância antes, durante e depois da pandemia?
A assimetria não salvou a
indústria de CDs de música quando um hacker decidiu desmantelá-la. Em razão de
seu gigantismo os capitalistas de vigilância parecem ser indestrutíveis. Talvez
eles tenham os pés de barro. Talvez eles amarguem prejuízos econômicos em razão
da pandemia e possam sofrer derrotas políticas avassaladoras ao fim dela
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