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segunda-feira, 28 de março de 2011

Mercosul: "Los hermanos", 20 anos depois - Carta Maior

Antonio Lassance
:

Vinte anos depois daquilo que se considera a certidão de nascimento do Mercosul (o Tratado de Assunção, de 26 de março de 1991), a integração regional promovida pelo bloco mostrou-se benéfica. O principal saldo não é apenas econômico, mas político, social e cultural.

Mesmo sujeito a idas e vindas, o Mercosul atravessou turbulências e manteve-se como um caso de sucesso. Resistiu a crises internacionais graves, como as de 1999 a 2002 (quando o comércio entre os países do bloco reduziu-se à metade, em relação a seus valores de 1997) e a mais recente e maior delas, de 2008. Foi abalado por situações de profunda instabilidade. A principal atingiu o governo de Fernando de la Rúa, na Argentina, como efeito retardado do desmonte do Estado, privatização e desindustrialização provocados pelo governo de Carlos Ménem, combinados à atrapalhada saída brasileira do regime de paridade do dólar e câmbio fixo, no governo FHC.

Surgido na esteira de um processo de aproximação entre Brasil e Argentina, seus dois maiores países, o Mercosul era também uma resposta à União Europeia, ao Nafta (bloco que reúne Estados Unidos, Canadá e México) e à APEC (“Asia-Pacific Economic Cooperation” ou Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico).

A arquitetura da amizade impulsionada com o Mercosul é tratada como um caso exemplar pelo especialista em relações internacionais, Charles Kupchan (da Universidade de Georgetown), em seu recente livro “Como inimigos se tornam amigos” (1). Ele dedica parte do quarto capítulo de seu livro (págs. 122 a 130) a mostrar como se deu a reaproximação entre Brasil e Argentina, nos anos 1980, e que atraiu, nos anos 1990, Paraguai e Uruguai .

Kupchan enquadra o exemplo sulamericano em algumas lições essenciais. Por exemplo, a de que o mundo hobbesiano da competição interestatal, onde impera o dedo no olho e os golpes abaixo da linha de cintura, pode até ser um ponto de partida para a análise das relações internacionais, mas não precisa ser necessariamente seu ponto de chegada. A competição pode ser superada por arranjos sustentáveis cooperativos, em que antigos inimigos passam a se tratar como atores confiáveis.

A segunda lição é a de que a mão invisível do liberalismo é incapaz de produzir tal arquitetura por geração espontânea. Ela deve ser induzida por projetos nacionais e tudo deve começar com um dos atores, em geral o de maior peso, dispondo-se a fazer concessões. É a diplomacia que impulsiona a economia, e não o contrário. Ela constrói o ambiente que produz saldos comerciais e financeiros positivos no longo prazo, facilita a inserção de empresas e enraíza a interdependência econômica.

Uma terceira lição é a de que as ordens sociais entre os países devem se tornar cada vez mais compatíveis, harmônicas. Ordens instáveis e incompatíveis entre si são um fator inibidor do entendimento.

Kupchan destaca ainda, no caso sulamericano e em outros, que o fundamental nos processos de integração é o surgimento de uma identidade entre os países que supere as rivalidades reinantes. O trânsito de pessoas, o entrosamento cultural, a familiaridade com a paisagem dos vizinhos são um ingrediente dos avanços.

Neste sentido, os sinais do Mercosul são muito promissores. O volume do comércio entre os países do bloco (hoje em torno de US$ 30 bilhões por ano) tem crescido , embora percentualmente ao PIB tenha ocorrido uma estagnação momentânea. A situação se explica, estruturalmente, pela assimetria entre os países e, conjunturalmente, pela estratégia de seus países no sentido de diversificarem seus parceiros e não se atrelarem exclusivamente a alguns poucos (2).

Certos números são surpreendentes. Em quatro anos (2006 a 2009), o número de brasileiros que estudam a língua espanhola saltou de um para mais de cinco milhões (dados do Instituto Cervantes). A razão foi a lei sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2005, que obrigou a oferta do Espanhol no ensino médio.

Praticamente um em cada cinco turistas que visitam o Brasil é argentino. Em contrapartida, em 2010 quase dobrou a quantidade de brasileiros que visitaram a capital portenha.

Os turistas vindos do Mercosul representam 70% do fluxo receptivo do Uruguai, 30% do fluxo receptivo da Argentina, mesmo patamar do Brasil, sendo baixo apenas no Paraguai (pouco mais de 10%) (3).

O projeto de integração é um desafio de grande envergadura e tem obstáculos consideráveis. Grande parte deles é resultante de seus pecados originais. A vertente comercial tornou-se hipertrofiada ao longo de 20 anos, enquanto persiste um déficit de participação democrática e representação política, com um Parlasul que ainda está por se estruturar plenamente. O Brasil, infelizmente, tem negligenciado e protelado esse passo.

Por outro lado, a entrada da Venezuela, que significaria a expansão do mercado comum, tem sido sistematicamente adiada pelo Paraguai, com argumentos que não convencem sequer os opositores venezuelanos do presidente Hugo Chávez, que defendem a entrada de seu país no bloco.

Nos últimos anos, uma agenda intensa de políticas públicas tem se construído setorialmente, nas áreas da agricultura familiar, desenvolvimento social, educação, saúde, infraestrutura, turismo, segurança e defesa, dentre outras. Isso permite vislumbrar ações que contribuam para eliminar a pobreza, reduzir as assimetrias existentes, construir uma infraestrutura que permita ampliar o comércio na região e aprofundar a democracia, desafios destacados recentemente pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Alto Representante-Geral do Mercosul (Agência Senado, 24/3/2011).

No momento atual, o Mercosul reúne mais razões de otimismo que os demais blocos. A União Europeia, sob crise aguda, vive um de seus piores momentos. O Nafta acentou os problemas da economia mexicana (o comércio que mais cresce com seu vizinho, do outro lado do Rio Grande, é o de drogas), e os Estados Unidos patinam para superar a recessão. A APEC, além de muito heterogênea e pouco institucionalizada, pouco avançou diante da competição entre seus países, que disputam muitas vezes o mesmo espaço. A China, por exemplo, tem crescido, além de seus méritos próprios, sobre um declínio relativo do Japão.

Há 20 anos, quem seria capaz de dizer que se chegaria tão longe?

Referências:

(1) ”KUPCHAN, Charles A. How Enemies Become Friends. Princeton: Princeton University, march 2010)

(2) SOUZA, André de Mello e Souza, OLIVEIRA, Ivan Tiago Machado e GONÇALVES, Samo Sérgio. Integrando desiguais: assimetrias estruturais e políticas de integração no Mercosul. Rio de Janeiro: IPEA, março de 2010. Texto de Discussão no. 1477.

(3) TOMAZONI, Edegar Luis. Turismo como Desafio do Desenvolvimento Econômico do Mercosul na Era da Globalização. Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 2008.

sábado, 18 de setembro de 2010

Outra comunicação na América Latina

sábado, 18 de setembro de 201
entrevista concedida à jornalista Natalia Aruguete, do jornal argentino Página 12, publicada no sítio de Instituto Humanitas Unisinos:

Estudioso das transformações comunicacionais e culturais da era digital, Dênis de Moraes adverte que a tecnologia permite maior circulação de vozes, porém ao mesmo tempo reforça as desigualdades. Aqui ele analisa as mudanças em marcha na região, elogia o processo argentino e remarca o papel dos Estados (e suas dificuldades) na tarefa de limitar a concentração de meios e indústrias culturais. Eis a entrevista:

De que modo impacta o avanço tecnológico nos setores comunicacional e cultural?

A mudança digital permitiu a confluência de todas as linguagens, usos e expressões, bem como a fusão de dados, sons e imagens numa linguagem digital única. Este impacto não cessa de manifestar-se em todas as áreas da sociedade e em todos os campos do conhecimento. Vivemos uma época em que a estética, a educação, o mercado e os campos científico, cultural, monetário e social estão sob uma influência completamente desproporcional das tecnologias. Os benefícios são, a meu juízo, indiscutíveis: permitem mais contato, mais intercâmbio, mais avanços científicos, mais expressões culturais e estéticas de uma forma sem precedentes. Porém, há ademais toda uma coleção de problemas.

Como? Quais?

Mantêm-se um abismo entre conectados e desconectados. A sociedade continua sendo extremamente desigual e injusta. As diferenças no usufruto tecnológico acentuam as diferenças entre as classes, os grupos, as comunidades. E isso tem a ver com a hegemonia.

Que fatores devem acompanhar a expansão da digitalização para reverter este cenário desigual, tendo em conta que a tecnologia não pode fazê-lo sozinha?

O capitalismo é uma fábrica de desigualdades, não promove uma distribuição de vantagens e benefícios de maneira igualitária. O próprio modo de produção é, por definição, um modo de diferenças, de desigualdades, de oportunidades totalmente apartadas da harmonia das classes, dos grupos, das pessoas. Sob a influência da ideologia do modo de produção capitalista é muito difícil que a tecnologia se encaminhe para uma conjuntura que facilite e estimule uma divisão mais igualitária dos benefícios e das possibilidades da tecnologia. Porém a expansão do consumo das tecnologias se faz sob o signo das desigualdades, porque, embora se esteja ampliando o mercado tecnológico comunicacional básico, o mesmo se dá de maneira estratificada.

Em que se manifesta concretamente essa distribuição injusta?

Muita gente está utilizando computadores: nas escolas primárias e secundárias, nas empresas, nas organizações não governamentais. Há uma expansão da base de consumo e das possibilidades de uso. Mas, esta expansão se desenrola de maneira desigual, porque há um tipo de tecnologia para os pobres e um tipo de tecnologia para os ricos.

Num cenário de alta concentração econômica como o atual, qual deveria ser o papel do Estado e que tipo de valoração se deve fazer da política para que a expansão tecnológica não contribua a uma apropriação desigual?

O papel do Estado é fundamental, não o digo somente como constatação teórica. Tenho viajado com freqüência pela América Latina, e publiquei inclusive no Brasil um livro intitulado "A batalha da mídia", um trabalho de investigação sobre as novas políticas de comunicação dos governos progressistas latino-americanos. Inclui o governo de Chávez na Venezuela, de Evo Morales na Bolívia, de Nestor e Cristina Kirchner na Argentina, Tabaré Vázquez e Pepe Mujica no Uruguai, Michele Bachelet no Chile, Daniel Ortega na Nicarágua e – com algumas dúvidas – o presidente Lula no Brasil.

Na maioria dos países, os governos estão conscientes da necessidade de desenvolver políticas eletrônicas de comunicação para valorizar o paradigma das redes. O Estado precisa fazer inversões – cada vez maiores, a meu juízo – no desenvolvimento da informação cidadã, a qual tenha como ponto de partida o fortalecimento das redes sem finalidades lucrativas. A maioria dos presidentes progressistas da América Latina tem consciência da necessidade urgente de inversões públicas em tecnologias direcionadas para o meio social, para fomentar as formas de comunicação e expressão cultural por fora da lógica hegemônica das indústrias culturais. Parece-me que o papel do Estado não deve anular a iniciativa privada. Não se trata de instituir ditaduras estatais que impeçam a existência de outras visões de mundo.

Por que faz esta declaração?

Quando defendemos o pluralismo, isso se refere a ambos os lados. O outro mundo e a outra comunicação que desejo viver inclui outros olhares sobre a vida social, cultural, econômica e política. O problema é que a dramática concentração dos meios de comunicação e das indústrias culturais constitui um obstáculo, uma barreira para a emergência de outras vozes na arena social.

Existe algum uso da tecnologia que não esteja subordinado à lógica mercantil por parte de atores não ligados ao mercado?

Este é um ponto que me mobiliza. Está se ampliando o uso alternativo e contra-hegemônico e, portanto, social, comunitário, cooperativo e colaborativo. Podemos observá-lo nas formas de apropriação das tecnologias digitais por fora da lógica comercial da mídia, das formas de controle ideológico e cultural das indústrias culturais. Claro que esta utilização não tem um caráter de massa, nem uma penetração harmônica e ampla em todas as classes, sociedades, países e povos. Mas isso não deve desviar-nos para uma forma de pensamento dogmático que deixe de reconhecer que há possibilidades imprevistas. Uma das consequências mais positivas e estimulantes deste processo de apropriação é que se incrementa a cooperação entre coletivos de periodistas, artistas plásticos, estudantes de diversos graus, grupos de trabalhadores ou desempregados, os quais utilizam, sobretudo, a Internet como centro gravitacional de suas manifestações e relações.

Neste cenário mercantil que você descreve, que capacidade de aproveitamento desta ferramenta tem os meios alternativos?

Está se construindo progressivamente um tipo de comunicação alternativa, mais aguerrida, combativa e estimulante do que a de décadas passadas. Os periódicos alternativos enfrentaram sempre uma dificuldade com os custos do papel, de impressão, de distribuição. Em troca, com as novas formas de comunicação eletrônica, sobretudo o ecossistema da Internet, não se depende mais disso. Com as novas formas de expressão, de comunicação, de interação e participação coletiva, se produziu uma espécie de quebra na relação com os usuários, com os consumidores, com os cidadãos. Essas novas formas estão em processo de formação, discussão e experimentação. É um processo que está ocorrendo fora do campo de visão de cada um de nós.

Em seu livro Mutações do visível você mencionava que é preciso “ganhar a batalha dos fluxos informativos”. Crê que essas possibilidades para a produção e circulação de conteúdos alternativos se vêem, a partir do discurso hegemônico, em termos de ameaça?

Não creio que a palavra correta seja ameaça, porém há uma preocupação crescente nos grandes meios comunicacionais. Não me parece que seja uma ameaça perigosa, no sentido de que possa acontecer algo que mude tudo, porque a lógica mercantil das indústrias culturais e comunicacionais por parte das grandes empresas não me parece que vá ser avassalada pela comunicação digital contra-hegemônica, alternativa, comunitária. No entanto, me parece que existe a possibilidade de um crescimento dessas novas formas de expressão, interação e intercâmbios que vão conviver com a hegemonia da mídia. Isso me parece uma grande novidade. Em décadas passadas, a comunicação alternativa – não digital senão impressa – era um tio de comunicação sedimentada, dirigida a militantes, a pessoas com maior consciência, a grupos organizados. Abrem-se hoje possibilidades para praticamente todos os setores da vida social, incluindo outras formas de organização, participação e construção.

No entanto, as indústrias culturais continuam fixando a agenda de temas, instalando as principais preocupações da sociedade.

Claro que continuam marcando, por isso não me parece que a palavra correta seja ameaça.

Mas você fala de convivência. Creio que tal convivência possa ter algum tipo de impacto na agenda política?

Creio que é uma expectativa perturbadora, porque, por um lado, há uma série de evidências de maior intercâmbio, maior contato, mais expressão e mais civilização. Porém, é cedo para avaliar se essas novas expressões vão canalizar-se em idéias e práticas mais ativas. Há uma diferença entre sociabilidade em rede e participação social e política em rede. Necessitamos ter uma percepção muito clara de que nem todas as expressões de sociabilidade em rede são manifestações ativas da cidadania. Há grupos políticos, sociais e comunitários muito organizados e mobilizados que utilizam as tecnologias digitais e, em especial, das redes com a finalidade de reivindicar a mudança social, a luta política aberta. Minha preocupação é se a sociabilidade em rede vai evolucionar para novas formas de consciência sobre o social, o político, o cultural, o comunitário.

A partir de que lhe surge essa preocupação?

Creio que a forma de organização da sociabilidade em rede se encaminha para uma direção mais relacionada com as questões existenciais ou espirituais, do que para o campo das expressões políticas e sociais mais organizadas e combativas. Parece-me muito interessante que se ampliem os canais de sociabilidade, de intercâmbio dos afetos, das manifestações espirituais e religiosas em rede. Porém, outra coisa é reconhecer a expressão dos afetos, das crenças religiosas e de aspirações existenciais como a única forma de usufruto das tecnologias.

Você mencionou o caso de ouros países da América Latina. Como vê o que está sucedendo na Argentina em relação com o setor comunicacional?

Creio que a nova Lei de Serviços Audiovisuais da Argentina deve ser um orgulho para todos os argentinos e para todos os latino-americanos. Esta legislação – conheço todas as que estão em vigência na América Latina – é a mais avançada do continente. Tem uma noção muito clara dos três setores que devem atuar no campo dos sistemas de comunicação: o campo público, o campo privado comercial e o campo social. Este equilíbrio entre os três setores é algo revolucionário, porque sempre os sistemas de comunicação – não só da Argentina, senão de todos os países latino-americanos – se caracterizaram por um desequilíbrio brutal que favoreceu historicamente o setor comercial da mídia. Temos, pois, um avanço com consequências de longo prazo.

De que modo impactará a nova legislação?

Será uma comunicação mais plural, mais complexa, mais participativa. Com a possibilidade de expressão de várias vozes ao mesmo tempo. Os diferentes setores sociais podem manifestar-se de maneira mito mais rica e estimulante e me parece que a interferência do poder estatal é fundamental para reequilibrar os marcos regulatórios dos meios de concessão pública. Veja, as licenças de rádio e televisão pertencem à sociedade, aos povos e não às empresas de comunicação que são concessionárias temporais. Os canais não pertencem ao Grupo Clarín, O Globo, El Mercúrio e demais grupos de comunicação latino-americanos, geralmente sob o controle de famílias que se reproduzem no comando da mídia, de geração em geração.

Um aspecto chave da lei que está em debate na Argentina é o não reconhecimento dos direitos adquiridos. Até que ponto deve avançar a regulação política num cenário como o argentino para obter uma real desconcentração do setor?

As pressões sobre a lei argentina de meios são similares às pressões que há na Venezuela, Bolívia e Equador. Em todas as partes, os grupos midiáticos estão desenvolvendo violentas campanhas contra as transformações, as mudanças nos marcos legais e nas leis, isto é, das normas que regulam a radiodifusão. As licenças de radio e televisão são “as jóias da coroa” dos grupos midiáticos. Então, essas campanhas tem como centro de sua argumentação o fato de que a liberdade de expressão está sendo agredida, violentada pelas novas regulamentações. É um argumento falso que oculta o que sempre tem sido ocultado pelos grupos da mídia. Os grupos da mídia latino-americana se consideram fora de qualquer tipo de controle, sobretudo do controle público democrático.

Por que crê que se instalou esse imaginário da liberdade de expressão na América Latina?

Ele tem a ver com a idéia mistificadora de que os meios representem a vontade geral e sejam, portanto, a esfera que tem condições de produzir uma espécie de síntese das aspirações sociais e coletivas. Então, se têm qualificação para ser a esfera de síntese do social, não há necessidade de nenhuma submissão a regulamentos, normas, leis. Porque são uma instância que tem relação direta com o povo, com os desejos das sociedades. Claro que tudo isso é uma estratégia argumentativa para ocultar as formas de domínio e hegemonia na formação das mentalidades e do imaginário social.

Que balanços faz do que se está produzindo na região em matéria de comunicação?

Creio que este processo de mudanças na comunicação latino-americana, sob a iniciativa oportuna dos governos, é um processo que põe a comunicação no centro do campo de batalhas pela hegemonia cultural e política. Neste campo de batalha os dois lados têm consciência de que não se podem deixar de lado as lutas pelo controle da opinião pública e do imaginário social. Este processo de ações em cadeia, que se estendem desde Caracas a Buenos Aires, é um processo articulado, muito bem pensado, muito competente do ponto de vista das articulações discursivas e que tem uma diferença crucial em relação com o campo do Estado e da sociedade civil.

Em que sentido se dá essa diferença?

Estes grupos detêm os canais de convencimento que são os diários, as rádios, as televisoras e os Estados não, com alguma exceção, como o caso da Venezuela que tem quatro redes estatais de televisão. Se os Estados e as organizações sociais não têm essa potência de persuasão, de conquista dos corações e da mente do público, temos um processo muito desequilibrado de formação de opinião pública – a meu juízo – sumamente perverso.

Por quê?

Porque o ideal que todos nós defendemos da liberdade de expressão deve ser o de uma liberdade generalizada e não pode concentrar-se em poucas mãos que definam o que é e o que não é liberdade de expressão. Se o governo do presidente Chávez contém erros, tem excessos, bem, vamos pressionar sobre as medidas do presidente Chávez, ele não é Deus. Porém, as mudanças profundas da comunicação venezuelana sob os dez anos do governo de Chávez são significativas.

Pode mencionar alguma dessas mudanças?

No canal educativo e cultural Vive TV, criado pelo presidente Chávez em 2003, todas as agendas informativas das programações culturais são definidas em assembléias de bairros pelo povo. Os executivos, os diretores, os periodistas, o grupo dirigente de Vive TV, vai aos bairros somente para coordenar, organizar as assembléias de bairro em que as comunidades indicam quais são os problemas, as ênfases informativas, que tipo de programação cultural as pessoas desejam. Na Argentina, outro motivo de orgulho para a sociedade latino-americana é o canal Encuentro [Encontro], uma experiência fabulosa de mudança das lógicas informativas, culturais e científicas. Com isso se modificou a concepção de um canal educativo, cultural e científico. Até o momento, só há algumas inserções da programação de Encuentro na televisão pública, no Canal 7, já que a maioria do público só acede a Encuentro nos pacotes de TV paga. Estou mencionando duas experiências de canais educativos, culturais e científicos, criados por governos progressistas, que mudaram a lógica perversa da mercantilização da informação e dos bens culturais.

Participa de algum projeto comunicacional, além de seu trabalho acadêmico na matéria?

Depois de viajar pela América Latina, estou hoje coordenando outro projeto latino-americano de comunicação contra-hegemônico e alternativo. Creio que a palavra esperança não é coisa inútil, é uma palavra de mobilização, de chamado, porque há coisas concretas que se estão construindo em distintos países da América Latina, em direções totalmente diferentes do cenário midiático e cultural que predomina. Em vários lugares da América Latina outra comunicação é possível. Esta é uma palavra de construção que não somente figure num papel, nas bandeiras políticas e retóricas, Vive TV ou Encuentro têm as tecnologias digitais como seus insumos, como recursos indispensáveis. É necessário um pensamento dialético entre os problemas, os bloqueios, as desigualdades e as injustiças de usos e acessos ao tecnológico. Ao mesmo tempo, há necessidade de uma avaliação muito sensível das possibilidades e apropriações, dos usos cidadãos e culturais, sem uma finalidade mercantil, como sucede hoje em nosso continente. Creio que a síntese dessa dialética é a palavra esperança.

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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

OS ACORDOS EUA-COLÔMBIA

1974
Países concordam em continuar mantendo missões do Exército, da Marinha e da Aeronáutica dos EUA na Colômbia, como estabelecido em acordos anteriores

Objetivo é fornecer cooperação técnica e consultiva às forças colombianas

Militares dos EUA e suas famílias terão privilégios e imunidades outorgadas a funcionários administrativos de uma missão diplomática

2009
Militares dos EUA terão "acesso e uso" das bases áreas de Palanquero, Malambo e Apiay; fortes do Exército de Larandia e Tolemaida; e bases navais de Cartagena e Bahía Málaga, mas prevê uso de outras instalações

Americanos poderão portar armas e terão imunidade diplomática, que poderá ser retirada "a pedido das autoridades da Colômbia"

Prevê o aprofundamento de cooperação em áreas como procedimentos conjuntos, logística e equipamento, treinamento e intercâmbio de inteligência

Operação aéreas devem ser "mutuamente acordadas"

Acordo será revisto ou renovado após 10 anos, que não podem ser interrompidos

sexta-feira, 24 de julho de 2009

LULA CONDENA GOLPISMO

"Quero reiterar a condenação mais veemente ao golpe contra o presidente de Honduras, Manuel Zelaya. Trata-se de retrocesso que nossa região não pode tolerar, e não podemos transigir. Repudiamos veementemente a quebra da ordem democrática em Honduras e apoiamos os esforços da comunidade internacional para que o presidente Zelaya possa retornar a Tegucigalpa no mais breve prazo possível e exercer as funções que o voto popular lhe conferiu".

Essa condenação ao golpismo foi feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. quque conversou, por telefone, com o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, no momento em que este chegou à região da fronteira entre seu país e a Nicarágua, na tarde desta sexta-feira.

SOLIDÁRIO

Segundo uma fonte próxima ao Planalto, Lula teria desejado "boa sorte" a Zelaya e recomendado "cuidado" para que não haja derramamento de sangue em Honduras.

Durante a ligação, que teve cerca de 10 minutos de duração, Zelaya parecia tranquilo, segundo o presidente brasileiro.

Lula disse ainda que estava "solidário" ao presidente deposto, mas acrescentou que não poderia avaliar a decisão de Zelaya de voltar para Honduras nas atuais circunstâncias.

APOIO

Em um discurso durante a Cúpula de chefes de Estado do Mercosul, em Assunção, nesta sexta-fera, Lula já havia reiterado seu apoio a Zelaya e a condenação do governo brasileiro à deposição de Zelaya.

Deposto no último dia 28 de junho, Zelaya cruzou a fronteira da Nicarágua com Honduras na tarde desta sexta-feira, acompanhado por correligionários.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

BASES DOS EUA NA COLÔMBIA PROVOCA CRÍTICA DOS VIZINHOS

EUA ampliam presença
militar na Colômbia


Bogotá diz que está "perto" de fechar acordo que permitirá ao Pentágono usar três bases e provoca crítica interna e dos vizinhos
Washington deve levar ao país atividades antidroga da base americana de Manta, no Equador, que Quito fecha hoje após dez anos de uso


O governo da Colômbia anunciou ontem que está "perto" de fechar um acordo com a Casa Branca para aumentar a presença militar dos EUA em três bases colombianas, provocando críticas da oposição e dos vizinhos esquerdistas.
A confirmação das negociações coincide com o encerramento, hoje, das atividades da única base militar americana formalmente instalada na América do Sul, a de Manta, no Equador.
O presidente equatoriano, Rafael Correa, prometera desde a campanha eleitoral, em 2006, que não renovaria o contrato para o uso da base pelos EUA, que expira neste ano. Em 2008, a nova Constituição do país aprovou veto a qualquer base estrangeira no Equador.
Desde 2006, então, os EUA procuravam um local para reinstalar as atividades de Manta, de onde partiam os aviões de monitoramento de plantações de coca e das rotas de narcotráfico, responsáveis, segundo os EUA, por 60% das apreensões de droga da região.
Ontem, o governo da Colômbia fez uma audiência pública com a presença do chanceler, o ministro do Interior e o ministro da Defesa para explicar as conversas em curso com os americanos, ante os pedidos de maior transparência.
Segundo os funcionários, se o acordo for fechado, a Colômbia ampliará a presença americana nas bases de Malambo, no norte, e Palanquero e Apiay, no centro do país.
A Colômbia, que já é a maior receptora de ajuda militar dos EUA fora do Oriente Médio, tem dito que as bases não serão americanas, já que Bogotá terá o controle das operações.
O governo de Álvaro Uribe diz que não é necessária a aprovação do eventual acordo pelo Congresso americano, uma vez que o reforço se dará dentro dos limites já estabelecidos pelos EUA no Plano Colômbia, de combate ao narcotráfico e à guerrilha: até 800 militares e até 600 civis contratados.
Segundo o governo Uribe, os EUA investirão até US$ 5 bilhões em instalações militares que serão herdadas pela Colômbia, além de terem o compromisso de compartilhar informações de inteligência.
Segundo a Associated Press, o acordo incluiria visitas "mais frequentes" por navios americanos em duas bases navais no Caribe. A Colômbia também teria condições especiais para a compra de armas e aviões.

Desconfiança regional
A audiência de ontem foi marcada pelo esforço do governo em aplacar a desconfiança interna e dos vizinhos, pouco mais de um ano depois do ataque de Bogotá a um acampamento das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) no Equador.
Após o bombardeio, que provocou a mais grave crise diplomática regional em dez anos, não faltaram insinuações de que a Colômbia tinha contado com ajuda americana.
"Os políticos latino-americanos que aceitam uma base militar americana são traidores da sua pátria", disse em La Paz o presidente boliviano, Evo Morales. Ele lembrou ter expulsado do país os funcionários da DEA, num outro revés para as atividades antitráfico dos EUA.
O general Freddy Padilla, ministro colombiano da Defesa, repetiu ontem que das bases não partirão missões que "projetem força" em direção a outros países. O Pentágono não comentou as negociações.
No começo de abril, porém, um documento da Força Aérea dos EUA, apresentado num seminário militar no Alabama, citava que a base de Palanquero poderia se transformar num ponto de partida para operações de longo alcance. "Perto de metade do continente pode ser coberta pelo [avião] C-17 sem reabastecer" desde a base, diz o documento.
"É um imenso erro diplomático", diz Rafael Pardo, ex-ministro da Defesa e pré-candidato do Partido Liberal, centrista, à sucessão de Uribe.



Mudança é faca de dois
gumes para o Brasil


IGOR GIELOW


Para o Brasil, a concentração da logística militar americana baseada na América do Sul na Colômbia tem duas consequências principais.
Primeiro, parece marcar um retrocesso na lenta e gradual infiltração de presença militar de Washington na região. Para os militares brasileiros, que nunca gostaram de ver atividades deste tipo sob o manto generalizado de combate ao narcotráfico, é uma boa notícia.
Por outro lado, há um possível desenvolvimento desta concentração de recursos na Colômbia que não pode ser desprezado estrategicamente. E não se trata da paranoia de que "estão preparando a conquista da Amazônia", que sempre pulula nessas ocasiões.
Trata-se de um acirramento da polarização entre a Colômbia pró-americana e o "eixo bolivariano" comandado por Hugo Chávez. O venezuelano não esconde as pretensões de influência além de suas fronteiras, vide sua atuação na crise hondurenha. No ano passado, o ataque colombiano às Farc (Forças Armadas Revolucionárias Colombianas) no Equador e a reação belicista de Caracas deram um gostinho do que poderia acontecer no futuro.
Hoje isso é especulação. Não é certo que os "bolivarianos" sairiam da retórica e iriam às vias de fato contra a Colômbia, por qualquer motivo que seja, com os EUA firmes por lá.
Mas se isso viesse a acontecer, o Brasil teria de lidar com influxo de refugiados, possibilidade de ações dentro de sua porosa fronteira amazônica e, principalmente, seria chamado a assumir o papel natural de líder regional que costuma negligenciar. Mediar conflitos de verdade em sua periferia é bem diferente do que propor a paz no Oriente Médio.




frase
A COLÕMBIA É O MAIOR EXPORTADOR DE COCAÍNA
E OS EUA OS MAIORES CONSUMIDORES -

ALGO A VER?



EUA culpam corrupção
por tráfico venezuelano


Relatório do Congresso diz que Guarda Nacional do
país de Chávez coopera com cartéis colombianos!!!


DO "FINANCIAL TIMES", EM CARACAS

A crescente espiral do narcotráfico na Venezuela vem sendo agravada pela corrupção oficial e a recusa em cooperar com os EUA, indica um relatório do Congresso americano.
Uma cópia do relatório, à qual o "Financial Times" teve acesso, indica que os esforços para combater o contrabando de cocaína passando pela Venezuela, que quadruplicou entre 2004 e 2007, vêm sendo prejudicados pela corrupção na Guarda Nacional, que, segundo o relatório, colabora com o narcotráfico colombiano.
O senador Richard Lugar, líder da Comissão de Relações Exteriores e autor do pedido do relatório, em fevereiro de 2008, disse: "As conclusões desse estudo aumentam meu receio de que a falha da Venezuela em cooperar com os EUA no combate às drogas esteja relacionada à corrupção no governo".
Apesar dos mais de US$ 6 bilhões investidos pelo governo dos EUA para combater o tráfico de cocaína vinda da Colômbia, o relatório argumenta que o esforço vem sendo enfraquecido pelo fato de a Venezuela não impedir grupos guerrilheiros de esquerda, como as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), de usar seu território como refúgio.
Acredita-se que as Farc sejam responsáveis pelo envio de cerca de 60% da cocaína que chega aos Estados Unidos vinda da Colômbia.
Lugar disse que a "atitude de não cooperação" da Venezuela exige uma "revisão abrangente" da política americana em relação a Caracas, num momento em que os dois países procuram melhorar suas relações, abaladas desde que os EUA apoiaram tentativa de golpe contra o presidente Hugo Chávez em 2002.
Em 2008, o venezuelano expulsou o embaixador dos EUA, motivando uma atitude recíproca por parte de Washington, mas os dois embaixadores foram reenviados a seus postos no mês passado, numa tentativa de reparar as relações.
Mesmo assim, Chávez continua a recusar-se a autorizar a DEA, a agência dos EUA responsável pelo combate às drogas, a operar na Venezuela, tendo encerrado a cooperação com o órgão em 2005 devido a suspeitas de espionagem.
Autoridades venezuelanas rejeitaram críticas semelhantes feitas pelos EUA no passado, dizendo que a Venezuela é vítima de um acidente geográfico, pelo fato de situar-se entre o maior produtor mundial de cocaína, a Colômbia, e o maior consumidor, os EUA.
Embora o governo venezuelano diga que as apreensões médias de cocaína aumentaram em até 60% desde que foi encerrada a cooperação com a DEA, os EUA questionam a confiabilidade dessas cifras.



RESCALDOS DO GOLPE DE 2002


GLOBOVISIÓN, A QUE DEU O GOLPE
E TIROU SARRO DE CHAVEZ
MAS NO FINAL SAIU DE FININHO; EMPRESÁRIOS E O BISPO EM FUGA:

PRESIDENTE DE EMISSORA É PROIBIDO DE SAIR DO PAÍS

A Justiça da Venezuela proibiu anteontem o presidente do canal de TV oposicionista Globovisión, Guillermo Zuloaga, de deixar o país enquanto estiver respondendo a processo criminal por promover especulação de preços. Multado e repreendido reiteradas vezes pelo governo Chávez, que chama a Globovisión de "golpista" e ameaça fechar a emissora, Zuloaga se diz perseguido e afirmou que a medida é "terrorismo legal" contra a liberdade de expressão.


Justiça veta saída de opositor de Chávez do país
23/7/2009

Presidente da Globovisión recebe notificação após destituição de juíza do caso, que disse sofrer pressões



A Justiça da Venezuela notificou ontem o presidente da TV oposicionista Globovisión, Guillermo Zuloaga, de que ele está proibido de deixar o país.
Acusado de fraude
, terá de se apresentar ao tribunal a cada oito dias.

Na semana passada, o empresário, que alega ser vítima de perseguição por causa da linha da Globovisión, recebera a mesma ordem, transmitida pela Promotoria de Caracas. Mas horas depois a juíza do caso, Alicia Torres, negou ter assinado a ordem e denunciou sofrer pressão para fazê-lo.

Na segunda, Torres anunciou ter sido exonerada do cargo.
Também ontem, autoridades venezuelanas iniciaram a expropriação de um terreno do líder oposicionista e prefeito licenciado de Maracaibo (noroeste), Manuel Rosales. Ele é acusado de corrupção e está exilado no Peru desde abril.

Enquanto isso, um grupo de opositores busca usar a crise em Honduras a seu favor. Liderados pelo prefeito distrital de Caracas, Antonio Ledezma, o grupo está nos EUA para denunciar o "golpe em câmera lenta" aplicado com intimidação da mídia e da Justiça.

Ledezma foi recebido anteontem pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, José Miguel Insulza. O opositor também disse ter sido recebido por Dan Restrepo, encarregado da América Latina no Conselho de Segurança Nacional dos EUA.
A reunião entra para a série de rusgas recentes entre os americanos e Chávez, para quem o Departamento de Estado dos EUA promoveu o golpe em Honduras -embora tenha afirmado que o presidente Barack Obama não estava a par da atuação de sua diplomacia.
"Se formos escolher um modelo de presidente na região, a atual liderança da Venezuela não seria particularmente um. Se isso é uma lição que o presidente Zelaya aprendeu desse episódio [o golpe], então é uma boa lição", disse anteontem Philip Crowley, porta-voz da Chancelaria americana.



Programa secreto da CIA será investigado
DA ASSOCIATED PRESS

A Comissão de Inteligência da Câmara de Representantes (deputados) dos EUA anunciou ontem que irá investigar se a CIA (agência de inteligência) quebrou alguma lei por não ter relatado ao Congresso a existência de um programa para matar líderes da Al Qaeda.
O deputado democrata Silvestre Reyes disse que a proposta de equipes de extermínio será uma das diversas operações de inteligência apreciadas por um inquérito mais amplo.