Justiça, mídia e ficção
GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO
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A liberdade literária não pode servir de pretexto para desfigurar a realidade, desautorizando instituições legítimas e democráticas
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A LIBERDADE de expressão artística é valor constitucional irrefragável. Não se concebe a ideia mesma de Estado democrático de Direito sem que se assegure aos artistas em geral o direito de obviar, debater, criticar, censurar ou mesmo escarnecer. Mas haverá limites?
Essa é uma indagação secular, talvez atemporal: era atual nos tempos de Gregório de Matos, crítico atroz da Igreja Católica e dos desgovernos da "cidade da Bahia" no século 17, e continua atual em tempos de José Simão, quando a sátira recai sobre os dotes da bela estrela de novelas.
Decerto que há limites. Nem sempre bosquejados com a precisão que se desejaria, mas há limites.
No plano individual, vamos encontrá-los na integridade do chamado "conteúdo essencial" (os alemães diriam "Wesensgehalt") de direitos fundamentais como a honra, a imagem ou a intimidade. Isto é, a liberdade de expressão ou de informação não pode ser exercida em níveis tais que recuse à pessoa o fiapo de honra ou de privacidade sem o qual ninguém -rico ou pobre, anônimo ou famoso- poderia (con)viver dignamente.
No plano coletivo, vamos encontrar os limites nas boas práticas de comunicação social. É o ponto que me interessa ferir.
A crítica social é sempre bem-vinda e cumpre importante papel na conscientização dos povos. Imbuídos dessa saudável convicção, não é de hoje que os autores de folhetins inserem em seus roteiros personagens, cenas e contextos que concitam a uma conduta socialmente positiva ou politicamente correta. Podem fazê-lo diretamente (incorporando a ação valiosa ao leque de atitudes do galã) ou indiretamente (estabelecendo um vínculo de identidade entre a ação desvalida e certa personagem, que adiante será escarnecida ou malfadada).
Quando, porém, essa última estratégia não se basta na crítica pontual e faz generalização preconceituosa, a medida desproporcional transforma o remédio em veneno. Planta-se no imaginário popular uma falsa percepção de mundo, não raro com efeitos nocivos para a própria sociabilidade.
É o que ocorre, hoje em dia, com algumas novelas de grande audiência que resvalam na imagem do Judiciário e de algumas das chamadas funções essenciais à administração da Justiça (como a advocacia). E, de todas, a que mais agride é justamente a mais vista, em pleno horário nobre.
Ali, um personagem de caráter duvidoso -que as resenhas definem como "advogado trabalhista" que "aposta sempre no jeitinho brasileiro"- convence trabalhadores da construção a se ferirem ou se automutilarem com a promessa de polpudas indenizações. Insinua-se até que o "esquema" já teria exitosos precedentes. O que dizer dessa visão de mundo?
Não se nega que haja, entre advogados trabalhistas, maus profissionais que se prestem a semelhantes fraudes. Mas esses não são meros cafajestes bravateiros, como poderia sugerir a história. São criminosos. Não merecem o olhar de simpatia que a figura do "malandro" geralmente inspira. E não são, em absoluto, a regra. Perfazem uma franca e execrável minoria.
Importa lembrar que o Brasil já ocupou por seguidos anos a pouca honrosa liderança do ranking mundial de acidentes de trabalho. Dados da OIT apontam que, em 2008, cerca de 6.000 pessoas morriam por dia no mundo em razão de acidentes e doenças ligadas a atividades laborais. É uma chaga mundial, que vitima especialmente as populações dos países em desenvolvimento.
Quando, porém, generaliza-se a imagem do engodo, transmite-se ao empresário, ao cidadão e até ao trabalhador moralmente débil a ideia de que não temos uma legião de mutilados, mas uma legião de espertalhões.
Esteriliza-se o sentimento de repúdio, convola-se em regra a exceção e transforma-se a vítima em algoz.
Em tais casos, se a liberdade de expressão artística é malconduzida e inspira cuidados, o que há de fazer?
Os mais exaltados acorreriam às barras dos tribunais para obstaculizar a sequência narrativa do folhetim.
A mim, contudo, parecem suficientes o esclarecimento e o protesto públicos pelo mesmo veículo da agressão: a mídia. Deixa-se livre o artista para refletir com os seus botões. Para isso, este artigo.
A liberdade literária, nos folhetins de TV ou em todas as demais manifestações dramatúrgicas, não pode servir de pretexto para desfigurar a realidade, desautorizando instituições legítimas e democráticas. Vale aqui, como lá, a advertência atribuída aos irmãos Goncourt: "No teatro das coisas humanas, o cartaz é quase sempre o contrário da peça".
Pois bem: que o cartaz da livre expressão não oculte, nesses tempos confusos, um enredo de preconceito e desinformação.
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GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO , 36, juiz do trabalho, é vice-presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª Região (Amatra-XV) e professor da Faculdade de Direito da USP. Publicou, entre outras obras, "Direito à Prova e Dignidade Humana".
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quinta-feira, 23 de julho de 2009
quinta-feira, 2 de julho de 2009
A HERANÇA MALDITA DA PRIVATARIA
A impotência das agências reguladores em relação ao comportamento das empresas que cobram a mais ou não prestam serviços adequados aos consumidores tornou-se uma das características da chamada herança maldita do governo fhc.
Agora, o Ministério da Justiça abriu investigação para apurar se a ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) cometeu infração à ordem econômica. A entidade é acusada pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor de orientar suas associadas a continuarem a cobrança pelo ponto extra, apesar da proibição da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
De acordo com nota técnica do Ministério da Justiça, "há indícios de que a atuação da ABTA esteja influenciando o comportamento das empresas no que respeita à cobrança do ponto extra".
A associação também estaria orientando operadoras a não ofertarem o ponto extra a novos clientes. Segundo o Ministério da Justiça, essa conduta poderia ser enquadrada nos artigos 20 (limitar a livre concorrência) e 21 (influenciar a adoção de conduta comercial uniforme).
A Anatel tenta, sem sucesso, impedir a cobrança pelo ponto extra desde junho do ano passado. Desde o início, as operadoras, por meio da ABTA, têm contestado a medida na Justiça. Inicialmente, a ABTA conseguiu liminar mantendo a cobrança. O juiz entendeu, na ocasião, que o regulamento da Anatel não era claro o suficiente.
Depois da decisão, a agência liberou a cobrança, enquanto elaborava nova versão do texto -concluída em abril. Os documentos foram encaminhados ao juiz responsável pela liminar, mas, passados quase três meses, não há definição sobre o tema, e a cobrança segue permitida. Procurada, a ABTA disse que o presidente da associação estava em trânsito e não poderia comentar.
(ou ele está de má vontade, não usa celular, ou o twitter ainda só aceita 140 caracteres!)
Agora, o Ministério da Justiça abriu investigação para apurar se a ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) cometeu infração à ordem econômica. A entidade é acusada pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor de orientar suas associadas a continuarem a cobrança pelo ponto extra, apesar da proibição da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
De acordo com nota técnica do Ministério da Justiça, "há indícios de que a atuação da ABTA esteja influenciando o comportamento das empresas no que respeita à cobrança do ponto extra".
A associação também estaria orientando operadoras a não ofertarem o ponto extra a novos clientes. Segundo o Ministério da Justiça, essa conduta poderia ser enquadrada nos artigos 20 (limitar a livre concorrência) e 21 (influenciar a adoção de conduta comercial uniforme).
A Anatel tenta, sem sucesso, impedir a cobrança pelo ponto extra desde junho do ano passado. Desde o início, as operadoras, por meio da ABTA, têm contestado a medida na Justiça. Inicialmente, a ABTA conseguiu liminar mantendo a cobrança. O juiz entendeu, na ocasião, que o regulamento da Anatel não era claro o suficiente.
Depois da decisão, a agência liberou a cobrança, enquanto elaborava nova versão do texto -concluída em abril. Os documentos foram encaminhados ao juiz responsável pela liminar, mas, passados quase três meses, não há definição sobre o tema, e a cobrança segue permitida. Procurada, a ABTA disse que o presidente da associação estava em trânsito e não poderia comentar.
(ou ele está de má vontade, não usa celular, ou o twitter ainda só aceita 140 caracteres!)
segunda-feira, 22 de junho de 2009
O MITO DA IIDENTIDADE NACIONAL
"Identidade" é uma coleção de ideias e características que definem como vemos a nós mesmos como indivíduos e como parte de um grupo. Criar uma identidade nacional unificada, especialmente em Estados de grande diversidade, é um passo em direção à união, à estabilidade e -para os líderes- ao controle.
ESSE MITO DA IDENTIDADE NACIONAL FAVORECEU A DITADURA MILITAR QUE, ATRAVÉS DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, FORJOU ESSA FARSA, QUE PERMANECE ATÉ HOJE, MAS COMO QUASE TRAGÉDIA E EMPULHAÇÃO. OU COMO UMA PROVA DE QUE ESSA CONCENTRAÇÃO DA MÍDIA NA MÃO CINCO OU SEIS FAMÍLIAS SÓ PODE SER UM RESQUÍCIO DA DITADURA.
ESSE MITO DA IDENTIDADE NACIONAL FAVORECEU A DITADURA MILITAR QUE, ATRAVÉS DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, FORJOU ESSA FARSA, QUE PERMANECE ATÉ HOJE, MAS COMO QUASE TRAGÉDIA E EMPULHAÇÃO. OU COMO UMA PROVA DE QUE ESSA CONCENTRAÇÃO DA MÍDIA NA MÃO CINCO OU SEIS FAMÍLIAS SÓ PODE SER UM RESQUÍCIO DA DITADURA.
sábado, 13 de junho de 2009
Conferência Nacional de Educação
O ensino de um modo geral está muito precário.
Vem aí a Conferência Nacional de Educação com participação expressiva da sociedade.
O que queremos ensinar às crianças?
É preciso que haja diversidade cultural sem homogeneizar e padronizar.
Hannah Arendt tratou da crise da educação, o cinema tem tratado da discriminação em salas de aula, Lacan considerava a educação, assim como a psicanálise, impossíveis.
Foucault fala muito disso em Vigiar e Punir e noutros livros.
Os professores recebem baixos salários, aí o ponto.
Constroem-se grandes escolas que são difíceis
de gerenciar. Daí a questão de como administrá-las. Do ponto de vista da escola. com projetos pedagógicos discutidos na
comunidade.
Vem aí a Conferência Nacional de Educação com participação expressiva da sociedade.
O que queremos ensinar às crianças?
É preciso que haja diversidade cultural sem homogeneizar e padronizar.
Hannah Arendt tratou da crise da educação, o cinema tem tratado da discriminação em salas de aula, Lacan considerava a educação, assim como a psicanálise, impossíveis.
Foucault fala muito disso em Vigiar e Punir e noutros livros.
Os professores recebem baixos salários, aí o ponto.
Constroem-se grandes escolas que são difíceis
de gerenciar. Daí a questão de como administrá-las. Do ponto de vista da escola. com projetos pedagógicos discutidos na
comunidade.
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