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A revolta no mundo árabe por mais democracia e liberdade não foi surpresa para quem acompanha os encontros do processo Fórum Social Mundial
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Foi realizada entre os dias 6 e 11 de fevereiro, em Dakar, no Senegal, com representantes de 123 países e 1.205 organizações, mais uma edição unificada do Fórum Social Mundial. Os encontros unificados se realizam a cada dois anos e, entre um fórum centralizado e outro, são realizados diversos fóruns locais, regionais, nacionais, continentais e temáticos.
Como acontece desde o lançamento do Fórum Social Mundial, em 2001, em Porto Alegre, a grande mídia internacional e brasileira, salvo poucas e honrosas exceções, não cobriu ou cobriu de forma superficial também esta edição.
Apesar de os fóruns contarem com a participação de milhares de pessoas, lideranças sociais e organizações e promoverem inúmeros eventos, como debates, oficinas, assembleias e encontros de articulação política e planejamento de futuras ações, a cobertura da mídia se concentra geralmente em aspectos frívolos e sensacionalistas.
Paralelamente, o Fórum Econômico Mundial de Davos (onde nem a crise financeira mundial foi prevista) tem recebido uma ampla cobertura desta mesma mídia.
Os principais líderes mundiais, a grande mídia e os participantes de Davos (entre os quais Saif al Islam, filho de Gaddafi) confessaram que foram pegos totalmente de surpresa pelos recentes acontecimentos no mundo árabe.
Isso apesar dos fantásticos recursos investidos na busca de informações pela mídia, pelos governos e pelas empresas nos mais diversos serviços de "inteligência" e análises! O jornalista Clóvis Rossi escreveu em sua coluna de 27 de fevereiro, nesta Folha: "Se alguém disser que previu a onda de revoltas que começou em dezembro na Tunísia ou está mentindo ou fez em voz tão baixa que ninguém ouviu".
Até hoje, muitos jornalistas e analistas políticos, por falta de interesse ou por preconceito ideológico, não perceberam a novidade política representada pelo Fórum Social e o que ele produz de concreto.
Não entenderam que o processo engendrado pelo Fórum Social Mundial abre espaço para que organizações sociais das mais variadas regiões e áreas (social, ambiental, direitos humanos, democracia etc.) se encontrem, organizem livremente suas atividades, se aglutinem em torno de interesses comuns, apresentem propostas, se articulem em torno delas e formem redes locais, nacionais e globais, que fortalecem seu poder político para atingir seus objetivos.
O processo do Fórum potencializa o poder da sociedade civil nas suas ações e mobilizações.
A revolta no mundo árabe por mais democracia e liberdade não foi nenhuma surpresa para quem acompanha os diversos encontros da sociedade civil e do processo Fórum Social Mundial. Várias organizações desses países têm participado ativamente nos diversos fóruns.
Só em 2010 foram realizados, no âmbito do processo do Fórum Social Mundial, 55 fóruns sociais pelo mundo, dos quais oito no Egito e em países do norte da África.
Não seria difícil, para qualquer observador despido de preconceitos ideológicos, com vontade de conhecer novos processos políticos, que se dispõe humildemente a rever conceitos e métodos de trabalho, perceber que é fundamental acompanhar menos superficialmente os processos da sociedade civil (e o Fórum Social Mundial é um processo importante, entre vários outros) e que as diversas ações e mobilizações que acontecem hoje no mundo, como aquelas no mundo árabe, não acontecem por acaso.
ODED GRAJEW, 65, empresário, é coordenador-geral da secretaria-executiva da Rede Nossa São Paulo, fundador e presidente emérito do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, idealizador do Fórum Social Mundial, idealizador e ex-presidente da Fundação Abrinq (1990-1998). Foi assessor especial do presidente da República (2003
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sexta-feira, 25 de março de 2011
terça-feira, 8 de março de 2011
Origens do Dia Internacional da Mulher - ADRIANA JACOB CARNEIRO
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A proposta de perpetuar o 8 de março como Dia Internacional da Mulher foi feita no ano de 1921, em homenagem aos acontecimentos de Petrogrado
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A origem do Dia Internacional da Mulher, data significativa na luta pelos direitos das mulheres, vem sendo distorcida no Brasil e em diversos países. Na cobertura midiática, o dia 8 de março é associado a um incêndio que teria acontecido em 1857 em Nova York e provocado a morte de 129 trabalhadoras têxteis. Elas teriam sido queimadas como punição por um protesto por melhores condições de trabalho.
É importante destacar que houve, de fato, um incêndio, só que em 25 de março de 1911 e de forma diferente da narrada pela imprensa.
As chamas começaram quando um trabalhador acendeu um cigarro perto de um monte de tecidos e alastraram-se rapidamente. As portas das escadas de incêndio estavam trancadas por fora, para evitar que os funcionários saíssem mais cedo. O saldo foi de 146 vítimas fatais, 13 homens e 123 mulheres.
No edifício, funciona hoje a Faculdade de Química da Universidade de Nova York. O incêndio na Triangle Shirtwaist Company foi importante para a melhoria das condições de segurança de trabalhadores como um todo, e não apenas das mulheres, já que também havia homens entre as vítimas.
Um ano antes, em 1910, durante o 2º Congresso Internacional de Mulheres Socialistas em Copenhague, a alemã Clara Zetkin propôs que fosse designado um dia para a luta dos direitos das mulheres, sobretudo o direito ao voto.
Ou seja, o Dia Internacional da Mulher já existia antes do incêndio, mas era celebrado em datas variadas a cada ano.
Para compreender a escolha do 8 de março, remontamos ao dia 23 de fevereiro de 1917, 8 de março no calendário gregoriano. Naquela ocasião, as mulheres de Petrogrado, convertidas em chefes de família durante a guerra, saíram às ruas, cansadas da escassez e dos preços altos dos alimentos. No dia seguinte, eram mais de 190 mil.
Apesar da violenta repressão policial do período, os soldados não reagiram: ao contrário, eles se uniram às mulheres.
Aquele protesto espontâneo transformou-se no primeiro momento da Revolução de Outubro. A proposta de perpetuar o 8 de março como Dia Internacional da Mulher foi feita em 1921, em homenagem aos acontecimentos de Petrogrado.
Mas, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, em decorrência dos interesses do poder no período, seu conteúdo emancipatório foi se esvaziando. No fim dos anos 1960, a data foi retomada pela segunda onda do movimento feminista, ficando encoberta sua marca comunista original. Em 1975, a ONU oficializou o 8 de março como o Dia Internacional da Mulher.
Para além da distorção dos fatos históricos, um aspecto diferencia fundamentalmente a participação das mulheres nos dois episódios.
No incêndio da Triangle Shirtwaist, a mulher é vítima da opressão dos patrões e do fogo. Já nos protestos de 1917, ocupa uma posição de protagonismo. Encoberto, o fato deixa de mostrar a participação política das mulheres na construção de uma revolução que tem papel importante para a história mundial.
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ADRIANA JACOB CARNEIRO, jornalista, é mestranda do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia e pesquisadora em gênero e mídia do grupo Miradas Femininas
A proposta de perpetuar o 8 de março como Dia Internacional da Mulher foi feita no ano de 1921, em homenagem aos acontecimentos de Petrogrado
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A origem do Dia Internacional da Mulher, data significativa na luta pelos direitos das mulheres, vem sendo distorcida no Brasil e em diversos países. Na cobertura midiática, o dia 8 de março é associado a um incêndio que teria acontecido em 1857 em Nova York e provocado a morte de 129 trabalhadoras têxteis. Elas teriam sido queimadas como punição por um protesto por melhores condições de trabalho.
É importante destacar que houve, de fato, um incêndio, só que em 25 de março de 1911 e de forma diferente da narrada pela imprensa.
As chamas começaram quando um trabalhador acendeu um cigarro perto de um monte de tecidos e alastraram-se rapidamente. As portas das escadas de incêndio estavam trancadas por fora, para evitar que os funcionários saíssem mais cedo. O saldo foi de 146 vítimas fatais, 13 homens e 123 mulheres.
No edifício, funciona hoje a Faculdade de Química da Universidade de Nova York. O incêndio na Triangle Shirtwaist Company foi importante para a melhoria das condições de segurança de trabalhadores como um todo, e não apenas das mulheres, já que também havia homens entre as vítimas.
Um ano antes, em 1910, durante o 2º Congresso Internacional de Mulheres Socialistas em Copenhague, a alemã Clara Zetkin propôs que fosse designado um dia para a luta dos direitos das mulheres, sobretudo o direito ao voto.
Ou seja, o Dia Internacional da Mulher já existia antes do incêndio, mas era celebrado em datas variadas a cada ano.
Para compreender a escolha do 8 de março, remontamos ao dia 23 de fevereiro de 1917, 8 de março no calendário gregoriano. Naquela ocasião, as mulheres de Petrogrado, convertidas em chefes de família durante a guerra, saíram às ruas, cansadas da escassez e dos preços altos dos alimentos. No dia seguinte, eram mais de 190 mil.
Apesar da violenta repressão policial do período, os soldados não reagiram: ao contrário, eles se uniram às mulheres.
Aquele protesto espontâneo transformou-se no primeiro momento da Revolução de Outubro. A proposta de perpetuar o 8 de março como Dia Internacional da Mulher foi feita em 1921, em homenagem aos acontecimentos de Petrogrado.
Mas, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, em decorrência dos interesses do poder no período, seu conteúdo emancipatório foi se esvaziando. No fim dos anos 1960, a data foi retomada pela segunda onda do movimento feminista, ficando encoberta sua marca comunista original. Em 1975, a ONU oficializou o 8 de março como o Dia Internacional da Mulher.
Para além da distorção dos fatos históricos, um aspecto diferencia fundamentalmente a participação das mulheres nos dois episódios.
No incêndio da Triangle Shirtwaist, a mulher é vítima da opressão dos patrões e do fogo. Já nos protestos de 1917, ocupa uma posição de protagonismo. Encoberto, o fato deixa de mostrar a participação política das mulheres na construção de uma revolução que tem papel importante para a história mundial.
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ADRIANA JACOB CARNEIRO, jornalista, é mestranda do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia e pesquisadora em gênero e mídia do grupo Miradas Femininas
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terça-feira, 1 de março de 2011
Movimentos Sociais - blog do miro - altamiro borges - Autonomia, pressão e inteligência política
A “passividade bovina” não ajuda Dilma
Por Altamiro Borges
O governo Dilma Rousseff não completou ainda nem os “cem dias de trégua” e já causa polêmicas em setores da sociedade que tiveram papel ativo na sua eleição. Alguns se mostram decepcionados e anunciam o seu “desembarque”, adotando posturas típicas de oposição. Outros não toleram qualquer tipo de censura à presidenta e rotulam os críticos de “direitistas”, “afoitos” e outros adjetivos mais baixos. Penso que os dois extremos estão equivocados, erram pela precipitação.
Truque rasteiro da mídia demotucana
Não dá para cair no truque rasteiro da mídia demotucana, que tenta colocar uma cunha entre Lula e Dilma. A presidenta, com seu estilo próprio, representa a continuidade do seu antecessor. Sabe que foi eleita devido à popularidade de Lula, adquirida não por causa de seu carisma – mas graças aos programas sociais de transferência de renda, à valorização do salário mínimo, à postura democrática de diálogo com os movimentos sociais, à política externa altiva e ativa que granjeou respeito mundial.
Seria um suicídio político romper com esta trajetória, que conquistou amplo apoio da sociedade. Dilma sempre demonstrou muita firmeza de convicção no propósito de fazer avançar nestas mudanças. Além disso, o seu governo, apesar de priorizar a aliança com o centrista PMDB, tem forte presença de partidos e personalidades progressistas. Em algumas áreas isto já tem reflexos, como na Secretaria de Direitos Humanos que adota posições avançadas sobre a Comissão da Verdade e na luta contra a homofobia.
Retrocessos no campo econômico
O motivo das críticas, mais uma vez, encontra-se no campo econômico. A exemplo do primeiro mandato de Lula, o novo governo se inicia com medidas ortodoxas na macroeconomia – política monetária de elevação dos juros, política fiscal de corte de gastos e política cambial de libertinagem financeira. É o mesmo tripé de viés neoliberal do primeiro mandato de Lula. Com uma diferença básica: Lula podia argumentar que recebeu uma “herança maldita” de FHC, o que exigia medidas cirúrgicas e duras na economia.
Já Dilma Rousseff não tem como usar o mesmo argumento. Ela recebeu uma “herança bendita” de Lula em vários terrenos e tinha tudo para avançar. Infelizmente, tem predominado a visão administrativista, de evitar “marolas” e acalmar o “deus-mercado”. A oposição de direita e sua mídia já perceberam a contradição e adotam uma tática malandra. Criticam o que as forças progressistas elogiam – como a política de direitos humanos – e elogiam o que elas criticam – a política econômica ortodoxa.
Dois extremos perigosos
Nesta complexa disputa de idéias e projetos, as forças progressistas que garantiram a vitória de Dilma Rousseff também precisam agir com inteligência política. Nem partir para o oposicionismo frontal, que jogaria a sociedade na frustração e seria utilizado pela direita e sua mídia, nem cair na passividade acrítica. A luta política é um permanente jogo de pressões e contrapressões. Hoje não basta mais eleger governos, é preciso co-governar. A direita faz a parte dela, ancorada no principal partido do capital – a mídia.
As forças que desejam o avanço nas mudanças precisam também fazer seu jogo. Não podem ficar como espectadoras – como diz o José Simão, “quem fica parado é poste”. Neste sentido, as centrais sindicais acertaram ao criticar a presidenta pela “falta de diálogo” e ao pressionar o governo por um reajuste maior do salário mínimo. Acertam também aqueles, como muitos blogueiros, que apontam as falhas do governo em vários outros terrenos – como nas posições erráticas diante dos barões da mídia.
Num congresso de professores em São Paulo, João Felício, ainda presidente da CUT, usou uma expressão muito apropriada para a fase atual. Após rejeitar o voluntarismo esquerdista, ele também fez duras críticas à “passividade bovina”, daqueles que dizem amém a tudo o que o governo faz e fala. Referia-se, inclusive, a setores da sua própria central sindical, que não protagonizou uma pressão mais contundente contra a reforma regressiva da Previdência Social, no início do governo Lula.
Os setores progressistas precisam combinar três ingredientes básicos na luta política: autonomia, inteligência política e pressão. Autonomia para garantir o espírito crítico e vigilante. Inteligência para não fazer o jogo da direita. E pressão social para fazer avançar as mudanças. A soma destes ingredientes só fará bem ao governo Dilma, ajudando a alertar e corrigir erros de rota. A “passividade bovina” não ajuda em nada. De puxa-sacos, Brasília já está lotada
Por Altamiro Borges
O governo Dilma Rousseff não completou ainda nem os “cem dias de trégua” e já causa polêmicas em setores da sociedade que tiveram papel ativo na sua eleição. Alguns se mostram decepcionados e anunciam o seu “desembarque”, adotando posturas típicas de oposição. Outros não toleram qualquer tipo de censura à presidenta e rotulam os críticos de “direitistas”, “afoitos” e outros adjetivos mais baixos. Penso que os dois extremos estão equivocados, erram pela precipitação.
Truque rasteiro da mídia demotucana
Não dá para cair no truque rasteiro da mídia demotucana, que tenta colocar uma cunha entre Lula e Dilma. A presidenta, com seu estilo próprio, representa a continuidade do seu antecessor. Sabe que foi eleita devido à popularidade de Lula, adquirida não por causa de seu carisma – mas graças aos programas sociais de transferência de renda, à valorização do salário mínimo, à postura democrática de diálogo com os movimentos sociais, à política externa altiva e ativa que granjeou respeito mundial.
Seria um suicídio político romper com esta trajetória, que conquistou amplo apoio da sociedade. Dilma sempre demonstrou muita firmeza de convicção no propósito de fazer avançar nestas mudanças. Além disso, o seu governo, apesar de priorizar a aliança com o centrista PMDB, tem forte presença de partidos e personalidades progressistas. Em algumas áreas isto já tem reflexos, como na Secretaria de Direitos Humanos que adota posições avançadas sobre a Comissão da Verdade e na luta contra a homofobia.
Retrocessos no campo econômico
O motivo das críticas, mais uma vez, encontra-se no campo econômico. A exemplo do primeiro mandato de Lula, o novo governo se inicia com medidas ortodoxas na macroeconomia – política monetária de elevação dos juros, política fiscal de corte de gastos e política cambial de libertinagem financeira. É o mesmo tripé de viés neoliberal do primeiro mandato de Lula. Com uma diferença básica: Lula podia argumentar que recebeu uma “herança maldita” de FHC, o que exigia medidas cirúrgicas e duras na economia.
Já Dilma Rousseff não tem como usar o mesmo argumento. Ela recebeu uma “herança bendita” de Lula em vários terrenos e tinha tudo para avançar. Infelizmente, tem predominado a visão administrativista, de evitar “marolas” e acalmar o “deus-mercado”. A oposição de direita e sua mídia já perceberam a contradição e adotam uma tática malandra. Criticam o que as forças progressistas elogiam – como a política de direitos humanos – e elogiam o que elas criticam – a política econômica ortodoxa.
Dois extremos perigosos
Nesta complexa disputa de idéias e projetos, as forças progressistas que garantiram a vitória de Dilma Rousseff também precisam agir com inteligência política. Nem partir para o oposicionismo frontal, que jogaria a sociedade na frustração e seria utilizado pela direita e sua mídia, nem cair na passividade acrítica. A luta política é um permanente jogo de pressões e contrapressões. Hoje não basta mais eleger governos, é preciso co-governar. A direita faz a parte dela, ancorada no principal partido do capital – a mídia.
As forças que desejam o avanço nas mudanças precisam também fazer seu jogo. Não podem ficar como espectadoras – como diz o José Simão, “quem fica parado é poste”. Neste sentido, as centrais sindicais acertaram ao criticar a presidenta pela “falta de diálogo” e ao pressionar o governo por um reajuste maior do salário mínimo. Acertam também aqueles, como muitos blogueiros, que apontam as falhas do governo em vários outros terrenos – como nas posições erráticas diante dos barões da mídia.
Num congresso de professores em São Paulo, João Felício, ainda presidente da CUT, usou uma expressão muito apropriada para a fase atual. Após rejeitar o voluntarismo esquerdista, ele também fez duras críticas à “passividade bovina”, daqueles que dizem amém a tudo o que o governo faz e fala. Referia-se, inclusive, a setores da sua própria central sindical, que não protagonizou uma pressão mais contundente contra a reforma regressiva da Previdência Social, no início do governo Lula.
Os setores progressistas precisam combinar três ingredientes básicos na luta política: autonomia, inteligência política e pressão. Autonomia para garantir o espírito crítico e vigilante. Inteligência para não fazer o jogo da direita. E pressão social para fazer avançar as mudanças. A soma destes ingredientes só fará bem ao governo Dilma, ajudando a alertar e corrigir erros de rota. A “passividade bovina” não ajuda em nada. De puxa-sacos, Brasília já está lotada
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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
blog do miro - Movimentos Sociais - CMS abre guerra contra “agenda regressiva"
Reproduzo artigo de Leonardo Wexell Severo, publicado no sítio da CUT:
A plenária nacional da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) elevou o tom contra a “agenda regressiva” imposta pelos interesses do sistema financeiro e sua mídia, decidindo pela realização de uma jornada unificada de lutas, ampla e massiva - já no primeiro semestre - por mudanças na política econômica e pela democratização do Estado.
As entidades populares defenderam a implantação de reformas estruturais - como a agrária, urbana, educacional e política -, e a construção de um novo marco regulatório das comunicações para pôr fim ao oligopólio privado e garantir a mais plena liberdade de expressão.
Com a presença de 80 dirigentes de entidades sindicais, de trabalhadores rurais e urbanos, estudantis, comunitárias, femininas e da negritude, representando 11 estados (AP, BA, ES, MG, MT, PR, RJ, RO, RS, SC, SP) e do Distrito Federal, a plenária realizada nesta sexta-feira (25) na sede central da Apeoesp, na capital paulista, debateu a conjuntura nacional e internacional, apontando formas unitárias de atuação no próximo período “para impedir o retrocesso”.
Conforme o documento aprovado pela plenária da CMS, embora a eleição da presidenta Dilma esteja ligada “à determinação do povo por mais mudanças, pela afirmação da soberania nacional e o aprofundamento da democracia”, “existe forte pressão dos setores conservadores e sua mídia para impor uma agenda regressiva ao próximo período”.
“As ações implantadas nesse início de mandato pela equipe econômica - sob justificativas do controle da inflação e das contas públicas – seguem num caminho diferente do apontado pelas urnas e reproduzem a pauta imposta pelos interesses do setor financeiro, sustentadas no Banco Central”. Exemplo disso, aponta a CMS, “é o aumento dos juros, o congelamento das contratações públicas, o contingenciamento de 50 bilhões de reais e o pouco diálogo no debate sobre o reajuste do salário mínimo”.
Abertura
Presente à mesa de abertura, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, lembrou que o aumento dos gastos de custeio ocorridos durante o governo Lula significou “aumento da transferência de renda” para as parcelas mais necessitadas da população e denunciou que, agora, ”é neste ponto que estão querendo mexer”. Artur salientou que “a agenda do mercado”, que identificou como a pauta dos derrotados nas últimas eleições, não interessa ao povo brasileiro.
O líder cutista alertou que “este namoro da Dilma com a mídia vai durar seis meses e aí depois o governo virá nos procurar para sustentá-lo, como fez em 2005”. Na época, a mobilização da CMS impediu a materialização do golpe contra o presidente Lula, tramado por demos e tucanos em sintonia com os barões da mídia sob o mantra do “combate à corrupção”.
Para Artur, o fundamental neste momento é construir uma “agenda prioritária” dos movimentos sociais para ampliar a pressão, “com diálogo e luta, negociação e mobilização” e garantir um espaço de interlocução com o governo federal. “Assim como os empresários têm interlocução direta, nós também precisamos ter. E não é reuniãozinha, mas um espaço institucional que envolva os ministérios e as autoridades afins para debater e resolver os nossos problemas, que são os do povo brasileiro”, assinalou.
E, saudando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Artur encerrou a intervenção com uma citação histórica da revolucionária Rosa Luxemburgo publicada no jornal do MST: “Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. É preciso auto-disciplina interior, maturidade intelectual, seriedade moral, senso de dignidade e de responsabilidade, todo um renascimento interior do trabalhador. Com homens preguiçosos, levianos, egoístas, irrefletidos e indiferentes não se pode realizar o socialismo”.
Segundo Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da CUT e da direção operativa da CMS, “o mais importante é a existência de uma compreensão comum de que devemos estar unidos e mobilizados, movimento sindical e social, para avançar nas conquistas e barrar qualquer retrocesso”.
“Ficou evidente em cada fala, nas contribuições dos diferentes estados e entidades, que vamos à luta contra o corte de recursos, a suspensão de concursos públicos, a elevação dos juros e o freio à expansão salarial, anunciados recentemente pela equipe econômica. Nosso compromisso é com a melhoria das condições de vida e trabalho dos brasileiros e brasileiras e isso se faz com um Estado indutor, que exerça forte protagonismo no combate às injustiças sociais e regionais que ainda nos infelicitam”, sublinhou.
Rosane citou a recente participação em Dacar, no Fórum Social Mundial, para lembrar do enorme reconhecimento internacional ao papel do governo Lula, que é referência por ter defendido o mercado interno, expandido o salário e o emprego, contrariando a lógica do “ajuste fiscal” propagandeada pelo FMI e pelo Banco Mundial.
Em nome da coordenação do MST, Gilmar Mauro defendeu a democratização da comunicação como um elemento chave para o avanço da democracia no país, e alertou para os riscos do governo evitar mexer “nesse monopólio que criminaliza os movimentos sociais e a pobreza”. O caso Cutrale, onde o MST realizou uma ocupação no interior paulista para denunciar a grilagem de terras públicas – que o próprio INCRA confirmou pertencerem à União – é esclarecedor, citou.
Na época, a mídia privada – mais privada do que mídia – divulgou que os prejuízos causados pelo MST totalizaram R$ 1,2 milhão, referentes aos equipamentos danificados, aos defensivos agrícolas extraviados e à parte da lavoura de laranja derrubada. Embora a Justiça tenha desmentido a calúnia e dado ganho de causa ao MST, declarou Gilmar, “durante um tempo não podíamos sair na rua em Bauru, pois produziu-se um consenso para gerar processos coercitivos”.
Na prática, explicou, esta política de “coerção e consenso” fabricada pelos meios de comunicação a serviço do opressor tenta tornar palatáveis para as amplas maiorias as mais repugnantes formas de violência contra o oprimido. Assim, condenou, nos deixam sem opção, “nos perguntam com que molho queremos ser servidos”. Citando a fala de Artur Henrique, Gilmar disse que é preciso apresentar uma pauta unificada com os seguintes pontos, “não necessariamente nesta ordem”, brincou: reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional, reforma política, democratização da comunicação, combate à criminalização do movimento sindical e da pobreza, defesa do pré-sal para o povo brasileiro, redução da jornada para 40 horas semanais e defesa das lutas sociais, como o passe livre para os estudantes e o combate à violência contra as mulheres.
Balde de água fria
O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Augusto Chagas, denunciou que as medidas que vêm sendo adotadas pela equipe econômica estão na contramão do projeto pelo qual a presidenta Dilma foi eleita e representam “um balde de água fria sobre o aquecimento da possibilidade de desenvolvimento brasileiro”.
“Salário mínimo de R$ 545,00, juros altos, corte assustador de R$ 50 bilhões, congelamento de contratações... E a justificativa para isso é um discurso mentiroso, como é o tal surto inflacionário, os gastos públicos”, protestou Chagas, esclarecendo que a real sangria está nas centenas de bilhões que saem dos cofres públicos para o pagamento de juros aos banqueiros, “uma distribuição de renda às avessas".
Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, destacou que o aumento irrisório dado ao salário mínimo é preocupante, pois mais do que o “valor”, encerra uma concepção que atenta contra o processo de valorização progressiva de um poderoso instrumento de justiça social. Segundo Soninha, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apresentou um estudo em 2007 que comprova um levantamento que o movimento feminista havia realizado anos antes: “a valorização do salário mínimo é uma política fundamental para alterar a condição de vida das mulheres e da população negra”.
Na avaliação do vice-presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Ubiraci Dantas de Oliveira, o argumento falacioso da “pressão inflacionária”, utilizado para frear a política de valorização do salário mínimo, deve ser combatido “uma vez que a inflação é externa e vem da especulação das commodities promovidas pelas multinacionais”.
Portanto, assinalou Bira, “aumento de juros, arrocho salarial e redução do investimento público, além de serem completamente ineficazes para enfrentar o problema, só tornam o país mais vulnerável”. “Nesta luta pela independência e a soberania nacional nós vamos mobilizar todos os patriotas e enquadrar o Palocci e o Mantega, que estão fazendo o jogo do atraso”, acrescentou.
Representando a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Rogério Nunes, declarou que o projeto que elegemos era de continuidade do governo Lula, para aprofundar as mudanças. Mas “ao contrário”, denunciou, o valor de R$ 545 aprovado para o salário mínimo reflete uma concepção retrógrada, desmerecendo uma política de valorização que ajudou a combater os efeitos da crise internacional. A decisão da equipe econômica, condenou Rogério, “é monetarista, retrai o crescimento e o desenvolvimento nacional”.
Para o veterano Gegê, da Central dos Movimentos Populares (CMP), é inadmissível que num governo eleito para fazer mudanças, a equipe econômica se coloque na posição de administradora da crise do capital, tentando jogá-la sobre os ombros dos trabalhadores. “É um comportamento oportunista, eleitoreiro, de gente que pega carona no nosso caminhar. Precisamos enfrentar esta concepção, pois é um peso de tora, difícil de carregar”, frisou.
Pressão sobre o governo e o parlamento
De acordo com o secretário de Políticas Sociais da CUT, Expedito Solaney, a unidade de ação e mobilização da CMS será imprescindível para colocar a pressão das ruas dentro do governo e também do parlamento. Solaney citou especificamente a necessidade da aprovação da PEC 438, que expropria as terras onde for encontrado trabalho escravo. “A Lei Áurea teve dez dias de debate no parlamento, a PEC 438 já tem 10 anos. Precisamos garantir a sua aprovação para que estas pessoas que foram escravizadas passem a ser donas da terra”, defendeu.
Para Lúcia Stumpf, da União Brasileira de Mulheres (UBM), a plenária nacional mostra que os movimentos sociais "estão mais vigorosos do que nunca, no Brasil e no mundo, demonstrando que têm força para mudar a corrente do vento". As propostas apresentadas no Projeto Brasil, aprovado em 31 de maio de 2010 pela CMS, enfatizou, devem ser o foco das reivindicações por "reformas que mudem a estrutura do Estado, democratizando-o na essência".
Em nome do Coletivo Intervozes, João Brant denunciou o emaranhado de interesses escusos que se articulam em torno da mídia hegemônica, sublinhando o papel protagônico dos movimentos sociais para que as deliberações da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) não virem letra morta. A fim de que o novo marco regulatório do setor expresse o desejo e as expectativas da sociedade brasileira, destacou, o momento é de colocar pressão.
A plenária também reafirmou a posição da Assembleia dos Movimentos Sociais, aprovada no Fórum Social Mundial de Dacar, de fazer do 20 de março um Dia Mundial de Luta Contra as Bases Militares dos Estados Unidos e em solidariedade ao povo cubano e palestino, aproveitando a visita do presidente Barack Obama ao Brasil.
Entre outras lideranças, fizeram uso da palavra Edson França, da União de Negros pela Igualdade (Unegro); Yann Evanovick, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e Bartíria Costa, da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam
A plenária nacional da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) elevou o tom contra a “agenda regressiva” imposta pelos interesses do sistema financeiro e sua mídia, decidindo pela realização de uma jornada unificada de lutas, ampla e massiva - já no primeiro semestre - por mudanças na política econômica e pela democratização do Estado.
As entidades populares defenderam a implantação de reformas estruturais - como a agrária, urbana, educacional e política -, e a construção de um novo marco regulatório das comunicações para pôr fim ao oligopólio privado e garantir a mais plena liberdade de expressão.
Com a presença de 80 dirigentes de entidades sindicais, de trabalhadores rurais e urbanos, estudantis, comunitárias, femininas e da negritude, representando 11 estados (AP, BA, ES, MG, MT, PR, RJ, RO, RS, SC, SP) e do Distrito Federal, a plenária realizada nesta sexta-feira (25) na sede central da Apeoesp, na capital paulista, debateu a conjuntura nacional e internacional, apontando formas unitárias de atuação no próximo período “para impedir o retrocesso”.
Conforme o documento aprovado pela plenária da CMS, embora a eleição da presidenta Dilma esteja ligada “à determinação do povo por mais mudanças, pela afirmação da soberania nacional e o aprofundamento da democracia”, “existe forte pressão dos setores conservadores e sua mídia para impor uma agenda regressiva ao próximo período”.
“As ações implantadas nesse início de mandato pela equipe econômica - sob justificativas do controle da inflação e das contas públicas – seguem num caminho diferente do apontado pelas urnas e reproduzem a pauta imposta pelos interesses do setor financeiro, sustentadas no Banco Central”. Exemplo disso, aponta a CMS, “é o aumento dos juros, o congelamento das contratações públicas, o contingenciamento de 50 bilhões de reais e o pouco diálogo no debate sobre o reajuste do salário mínimo”.
Abertura
Presente à mesa de abertura, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, lembrou que o aumento dos gastos de custeio ocorridos durante o governo Lula significou “aumento da transferência de renda” para as parcelas mais necessitadas da população e denunciou que, agora, ”é neste ponto que estão querendo mexer”. Artur salientou que “a agenda do mercado”, que identificou como a pauta dos derrotados nas últimas eleições, não interessa ao povo brasileiro.
O líder cutista alertou que “este namoro da Dilma com a mídia vai durar seis meses e aí depois o governo virá nos procurar para sustentá-lo, como fez em 2005”. Na época, a mobilização da CMS impediu a materialização do golpe contra o presidente Lula, tramado por demos e tucanos em sintonia com os barões da mídia sob o mantra do “combate à corrupção”.
Para Artur, o fundamental neste momento é construir uma “agenda prioritária” dos movimentos sociais para ampliar a pressão, “com diálogo e luta, negociação e mobilização” e garantir um espaço de interlocução com o governo federal. “Assim como os empresários têm interlocução direta, nós também precisamos ter. E não é reuniãozinha, mas um espaço institucional que envolva os ministérios e as autoridades afins para debater e resolver os nossos problemas, que são os do povo brasileiro”, assinalou.
E, saudando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Artur encerrou a intervenção com uma citação histórica da revolucionária Rosa Luxemburgo publicada no jornal do MST: “Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. É preciso auto-disciplina interior, maturidade intelectual, seriedade moral, senso de dignidade e de responsabilidade, todo um renascimento interior do trabalhador. Com homens preguiçosos, levianos, egoístas, irrefletidos e indiferentes não se pode realizar o socialismo”.
Segundo Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da CUT e da direção operativa da CMS, “o mais importante é a existência de uma compreensão comum de que devemos estar unidos e mobilizados, movimento sindical e social, para avançar nas conquistas e barrar qualquer retrocesso”.
“Ficou evidente em cada fala, nas contribuições dos diferentes estados e entidades, que vamos à luta contra o corte de recursos, a suspensão de concursos públicos, a elevação dos juros e o freio à expansão salarial, anunciados recentemente pela equipe econômica. Nosso compromisso é com a melhoria das condições de vida e trabalho dos brasileiros e brasileiras e isso se faz com um Estado indutor, que exerça forte protagonismo no combate às injustiças sociais e regionais que ainda nos infelicitam”, sublinhou.
Rosane citou a recente participação em Dacar, no Fórum Social Mundial, para lembrar do enorme reconhecimento internacional ao papel do governo Lula, que é referência por ter defendido o mercado interno, expandido o salário e o emprego, contrariando a lógica do “ajuste fiscal” propagandeada pelo FMI e pelo Banco Mundial.
Em nome da coordenação do MST, Gilmar Mauro defendeu a democratização da comunicação como um elemento chave para o avanço da democracia no país, e alertou para os riscos do governo evitar mexer “nesse monopólio que criminaliza os movimentos sociais e a pobreza”. O caso Cutrale, onde o MST realizou uma ocupação no interior paulista para denunciar a grilagem de terras públicas – que o próprio INCRA confirmou pertencerem à União – é esclarecedor, citou.
Na época, a mídia privada – mais privada do que mídia – divulgou que os prejuízos causados pelo MST totalizaram R$ 1,2 milhão, referentes aos equipamentos danificados, aos defensivos agrícolas extraviados e à parte da lavoura de laranja derrubada. Embora a Justiça tenha desmentido a calúnia e dado ganho de causa ao MST, declarou Gilmar, “durante um tempo não podíamos sair na rua em Bauru, pois produziu-se um consenso para gerar processos coercitivos”.
Na prática, explicou, esta política de “coerção e consenso” fabricada pelos meios de comunicação a serviço do opressor tenta tornar palatáveis para as amplas maiorias as mais repugnantes formas de violência contra o oprimido. Assim, condenou, nos deixam sem opção, “nos perguntam com que molho queremos ser servidos”. Citando a fala de Artur Henrique, Gilmar disse que é preciso apresentar uma pauta unificada com os seguintes pontos, “não necessariamente nesta ordem”, brincou: reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional, reforma política, democratização da comunicação, combate à criminalização do movimento sindical e da pobreza, defesa do pré-sal para o povo brasileiro, redução da jornada para 40 horas semanais e defesa das lutas sociais, como o passe livre para os estudantes e o combate à violência contra as mulheres.
Balde de água fria
O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Augusto Chagas, denunciou que as medidas que vêm sendo adotadas pela equipe econômica estão na contramão do projeto pelo qual a presidenta Dilma foi eleita e representam “um balde de água fria sobre o aquecimento da possibilidade de desenvolvimento brasileiro”.
“Salário mínimo de R$ 545,00, juros altos, corte assustador de R$ 50 bilhões, congelamento de contratações... E a justificativa para isso é um discurso mentiroso, como é o tal surto inflacionário, os gastos públicos”, protestou Chagas, esclarecendo que a real sangria está nas centenas de bilhões que saem dos cofres públicos para o pagamento de juros aos banqueiros, “uma distribuição de renda às avessas".
Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, destacou que o aumento irrisório dado ao salário mínimo é preocupante, pois mais do que o “valor”, encerra uma concepção que atenta contra o processo de valorização progressiva de um poderoso instrumento de justiça social. Segundo Soninha, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apresentou um estudo em 2007 que comprova um levantamento que o movimento feminista havia realizado anos antes: “a valorização do salário mínimo é uma política fundamental para alterar a condição de vida das mulheres e da população negra”.
Na avaliação do vice-presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Ubiraci Dantas de Oliveira, o argumento falacioso da “pressão inflacionária”, utilizado para frear a política de valorização do salário mínimo, deve ser combatido “uma vez que a inflação é externa e vem da especulação das commodities promovidas pelas multinacionais”.
Portanto, assinalou Bira, “aumento de juros, arrocho salarial e redução do investimento público, além de serem completamente ineficazes para enfrentar o problema, só tornam o país mais vulnerável”. “Nesta luta pela independência e a soberania nacional nós vamos mobilizar todos os patriotas e enquadrar o Palocci e o Mantega, que estão fazendo o jogo do atraso”, acrescentou.
Representando a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Rogério Nunes, declarou que o projeto que elegemos era de continuidade do governo Lula, para aprofundar as mudanças. Mas “ao contrário”, denunciou, o valor de R$ 545 aprovado para o salário mínimo reflete uma concepção retrógrada, desmerecendo uma política de valorização que ajudou a combater os efeitos da crise internacional. A decisão da equipe econômica, condenou Rogério, “é monetarista, retrai o crescimento e o desenvolvimento nacional”.
Para o veterano Gegê, da Central dos Movimentos Populares (CMP), é inadmissível que num governo eleito para fazer mudanças, a equipe econômica se coloque na posição de administradora da crise do capital, tentando jogá-la sobre os ombros dos trabalhadores. “É um comportamento oportunista, eleitoreiro, de gente que pega carona no nosso caminhar. Precisamos enfrentar esta concepção, pois é um peso de tora, difícil de carregar”, frisou.
Pressão sobre o governo e o parlamento
De acordo com o secretário de Políticas Sociais da CUT, Expedito Solaney, a unidade de ação e mobilização da CMS será imprescindível para colocar a pressão das ruas dentro do governo e também do parlamento. Solaney citou especificamente a necessidade da aprovação da PEC 438, que expropria as terras onde for encontrado trabalho escravo. “A Lei Áurea teve dez dias de debate no parlamento, a PEC 438 já tem 10 anos. Precisamos garantir a sua aprovação para que estas pessoas que foram escravizadas passem a ser donas da terra”, defendeu.
Para Lúcia Stumpf, da União Brasileira de Mulheres (UBM), a plenária nacional mostra que os movimentos sociais "estão mais vigorosos do que nunca, no Brasil e no mundo, demonstrando que têm força para mudar a corrente do vento". As propostas apresentadas no Projeto Brasil, aprovado em 31 de maio de 2010 pela CMS, enfatizou, devem ser o foco das reivindicações por "reformas que mudem a estrutura do Estado, democratizando-o na essência".
Em nome do Coletivo Intervozes, João Brant denunciou o emaranhado de interesses escusos que se articulam em torno da mídia hegemônica, sublinhando o papel protagônico dos movimentos sociais para que as deliberações da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) não virem letra morta. A fim de que o novo marco regulatório do setor expresse o desejo e as expectativas da sociedade brasileira, destacou, o momento é de colocar pressão.
A plenária também reafirmou a posição da Assembleia dos Movimentos Sociais, aprovada no Fórum Social Mundial de Dacar, de fazer do 20 de março um Dia Mundial de Luta Contra as Bases Militares dos Estados Unidos e em solidariedade ao povo cubano e palestino, aproveitando a visita do presidente Barack Obama ao Brasil.
Entre outras lideranças, fizeram uso da palavra Edson França, da União de Negros pela Igualdade (Unegro); Yann Evanovick, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e Bartíria Costa, da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam
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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
Gilberto Carvalho - Dilma tem outro estilo, mas a mesma linha”
22/02/2011 - 09:17h
“Dilma tem outro estilo, mas a mesma linha”
Entrevista: Carvalho diz que mínimo de R$ 545 será compensado com descontos a remédios de aposentados
Ruy Baron/Valor
Carvalho em seu gabinete: “O Guido – Mantega – conversa todo mês com empresários. Por que ele não pode conversar com o movimento sindical?”
Cristiano Romero e Paulo de Tarso Lyra | VALOR
Integrante do núcleo decisório do novo governo, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, informou que, depois de segurar a correção do salário mínimo, limitando-a à inflação do ano passado, o governo vai adotar uma política de valorização dos aposentados. A ideia é reduzir os custos de medicamentos para essa parcela da população, a exemplo do que já é feito nos remédios usados para doenças como hipertensão e diabetes. O governo pode, também, rever os valores das aposentadorias.
Carvalho reconheceu, nesta entrevista ao Valor, que o governo teve que conter a evolução do salário mínimo neste momento porque gastou muito nos últimos dois anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. “Todo mundo sabe que em 2009 e 2010 nós enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. Desoneramos, estimulamos, fizemos concessões de toda sorte. 2011 se afigura como um ano em que você precisa controlar. A inflação está batendo na porta”, disse.
“Temos que mandar um sinal claro para a sociedade de que o governo não vai brincar com a economia, não vai aceitar a indexação, porque, no fundo, se tem um prejuízo grande para o trabalhador é a inflação”, acrescentou o ministro. Ele informou que, também por causa da preocupação com a inflação, o governo vai limitar a correção da tabela do Imposto de Renda (IR) a 4,5%. “Nossa resistência de ir além dos 4,5% é por isso. Se dermos 5%, 5,5%, estaremos projetando inflação superior à que estamos perseguindo.”
Responsável pela interlocução com os movimentos sociais, Carvalho disse que a ordem da presidente Dilma Rousseff é aprofundar o diálogo com as entidades que os representam, mas deixou claro que isso não ocorrerá se o MST invadir terras e prédios públicos. “Não vamos nunca ceder desse ponto de vista. As ações vão ocorrer, podem ocorrer, mas depois vai ter que ter recuo. Não somos aqui militantes. Isso aqui não é um partido, é um governo”, avisou. “A Dilma tem outro estilo, mas não tem outra linha. Vai ser diferente do Lula por causa disso: não vai ficar colocando chapeuzinho [das centrais ou do MST].”
Instalado no 4º andar do Palácio do Planalto, Carvalho confessa que sente falta do 3º andar, onde fica o gabinete da presidente e onde ele trabalhou, numa sala contígua à do presidente Lula, durante oito anos. “Eu estava acostumado a trabalhar mais na retaguarda, trabalhando muito, embora mais protegido e menos exposto”, compara.
Em sua espaçosa sala, avista a Praça dos Poderes. Numa mesa de canto, expõe o porta-retrato de padre Alfredinho, suíço que morou numa favela em Crateús (CE) e exerceu grande influência sobre ele. “Na minha juventude, estava num seminário e li um livro dele que contava essa história e mudou minha cabeça. Depois, fui também morar numa favela.”
Valor: Qual foi o papel que a presidente Dilma designou ao senhor?
Gilberto Carvalho: Ela teve uma conversa muito simples comigo. Disse: ‘Gilbertinho, preciso de você porque eu quero que alguém me traga a realidade dos movimentos sociais, as demandas, as carências, as crises, alguém que me sensibilize para esse sofrimento do povo, alguém que diga a verdade. Não quero ser enganada nunca’.
Valor: Na prática, o que significa isso?
Carvalho: Significa que cabe a mim fazer a ponte. Todo ministério tem diálogo com os movimentos sociais. Minha área não tem o monopólio desses contatos, mas é o lugar, digamos, onde se organiza esse diálogo. Começou com o salário mínimo, em que fiz reuniões com as centrais sindicais.
Valor: Central sindical se enquadra no conceito de movimento social?
Carvalho: Sim, as centrais são a ponta de lança, até pela nossa tradição de relação. Estão incluídos também os chamados movimentos populares, como o MST, os movimentos indígena, dos negros, de gays e lésbicas, enfim, todas as formas de organização da sociedade, além das ONGs e das igrejas.
Valor: Como vai se estabelecer essa ponte?
Carvalho: Vamos acompanhar todas as conferências. Ao longo de oito anos, o governo Lula fez 73 conferências temáticas. Queremos democratizar ainda mais essas conferências. O governo tem se apropriado bem das propostas. Algumas, como aquela dos direitos humanos, são polêmicas. O Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), por exemplo, foi fruto de uma conferência.
Valor: Como evitar que o governo vete, no fim, um documento aprovado numa conferência, como ocorreu no caso da criação da Comissão da Verdade?
Carvalho: O problema do PNDH é que a conclusão da conferência foi transformada em decreto do presidente Lula. O governo absorveu na totalidade as propostas. Você não tem condição de colocar [no início da discussão] um filtro e dizer ‘olha, isso aqui não pode ser discutido’. A sociedade discute tudo e depois o governo é que vai dizer o que vai cumprir ou não.
Valor: Quais serão os canais de diálogo, além das conferências?
Carvalho: As mesas de negociação. Agora em março, por exemplo, vamos receber a pauta da Contag (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura) por causa do ‘Grito da Terra’. Daqui a pouco, chega o MST com o ‘Abril Vermelho’. Depois, tem a ‘Marcha das Margaridas’, movimento das mulheres agricultoras. Há a questão dos servidores públicos, cujo debate é no Ministério do Planejamento, mas aqui eles têm uma interlocução. Além disso, estamos buscando não ficar apenas na espera.
“Todo mundo sabe que enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. 2011 é o ano em que se deve controlar”
Valor: De que forma?
Carvalho: A ideia é estabelecer mesas permanentes de conversas.
Valor: Por exemplo?
Carvalho: O Guido [Mantega, ministro da Fazenda] conversa todo mês com os empresários. Por que ele não pode conversar com o movimento sindical? Vou tentar construir essa ponte. Vou chamar também os movimentos para discutir políticas nossas. Por exemplo: vamos fazer a desoneração da folha de pessoal. É importante chamar as centrais para conversar. Portanto, o plano é deixar o governo mais permeável a essa participação, a sugestões. É claro que, como ficou demonstrado agora na questão do salário mínimo, não tem conversa desse tipo sem tensão.
Valor: Durante a votação do salário mínimo no Congresso as centrais se juntaram à oposição para tentar derrotar o governo. Como o senhor explica esse fato?
Carvalho: É muito natural a tensão e a disputa entre governo e movimentos sociais. Não cabe aos movimentos serem cooptados por nós. Cabe a eles lutar, combater, porque eles trazem bandeiras que são históricas. Cabe ao governo receber essas demandas e tentar atendê-las no limite máximo, naquilo que julgamos prudente, responsável, ampliando os direitos sociais.
Valor: Por que não houve negociação no caso do salário mínimo?
Carvalho: Aí foi diferente. Não estávamos iniciando uma discussão. Tínhamos uma discussão já realizada. Então, para nós este ano não haveria discussão. Porque era um acordo [firmado em 2007] que julgamos como uma enorme vitória. Como houve essa circunstância em que o PIB de 2009 foi negativo e, na campanha eleitoral, o [José] Serra trouxe o debate dos R$ 600, isso provocou a retomada de um debate que já havia sido feito. Mas nós nos apressamos em dizer, desde a primeira conversa aqui, com o Nelson Barbosa [secretário-executivo do Ministério da Fazenda] e o Carlos Lupi [ministro do Trabalho], que o governo [sempre] negocia, mas que nesse caso não haveria negociação. ‘Querem discutir a correção do IR? Vamos discutir, mas o salário mínimo não está em discussão’.
Valor: O governo trocou uma coisa pela outra?
Carvalho: De forma alguma. O IR é outra frente de negociação. Dissemos às centrais que não havia razão para mudar a regra do mínimo. Por duas razões. Primeiro, eu disse a eles, ‘porque é uma conquista de vocês. Se a gente mudar agora, vocês estão nos autorizando no ano que vem, quando o aumento for de 12%, 13%, a rediscutir’. Este é o risco, inclusive desse questionamento que está se fazendo agora do decreto [que permite ao governo fixar anualmente o valor do mínimo sem passar novamente pelo Congresso].
Valor: Por que conter a evolução do mínimo?
Carvalho: Porque este é um ano muito especial. Todo mundo sabe que em 2009 e 2010 nós enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. Desoneramos, estimulamos, fizemos concessões de toda sorte. 2011 se afigura como um ano em que você precisa controlar. A inflação está batendo na porta, tivemos que fazer um corte no orçamento que não é catastrófico, é um corte sobretudo de planos, projetos, mas é um corte importante. Temos que mandar um sinal claro para a sociedade de que o governo não vai brincar com a economia, não vai aceitar a indexação, porque, no fundo, se tem um prejuízo grande para o trabalhador é a inflação.
Valor: Por que as centrais sindicais, na sua avaliação, não aceitam essa tese?
Carvalho: Tem uma cultura nossa, que é a cultura sindicalista. Nunca esqueço de uma greve nossa, de 1979, em Curitiba, em que conseguimos 70% de aumento e, mesmo assim, não conseguimos repor a inflação naquele ano. Temos uma cultura de reivindicação que prioriza mais o índice do que propriamente a perda inflacionária. Depois, tem um problema: existem seis centrais sindicais e há uma disputa enorme entre elas para ver quem é mais combativa e quem não trai a sua base. A Força Sindical está dizendo agora que a CUT não foi combativa na questão do salário mínimo. É uma cultura que eu acho ruim, que deixa de cumprir um papel mais amplo, mais responsável. Não quero dizer que elas são irresponsáveis e admito que não podemos esperar das centrais uma conduta que não seja a de lutar pelos direitos dos trabalhadores porque, seja como for, é verdade também que o mínimo, criado pela Constituição de 1946, segundo o Dieese, deveria ser hoje de mais de R$ 2,3 mil. Há uma defasagem histórica. O problema é que você não vai repor isso da noite para o dia. Vamos fazendo uma política de valorização que corrige distorções, mas o país não aguentaria estabelecer um mínimo de R$ 2 mil. Seria uma completa loucura.
Valor: O presidente Lula unificou o movimento sindical em torno dele. O Ministério do Trabalho é comandado pelo PDT e pela Força Sindical, adversária histórica da CUT. O senhor teme dificuldades nessa relação nos próximos anos?
Carvalho: A unificação em torno do governo se fez no final do governo. Em 2006, o Paulinho [Paulo Pereira da Silva, deputado e presidente da Força] não fez campanha para o Lula. O apoio se deu depois de muita construção, muito convencimento, de uma política evidentemente muito favorável aos trabalhadores. Foi quase uma rendição. Eles não podiam ficar contra a base. Não vai ser diferente em relação à Dilma. O Lula epidermicamente tinha uma linguagem que ajudava muito, uma sedução. A Dilma tem outro estilo, mas não tem outra linha. A ordem no governo é para que haja diálogo. Vai ser diferente do Lula por causa disso: ela não vai ficar colocando chapeuzinho.
Não somos militantes; Dilma vai ser diferente do Lula porque não vai por chapeuzinho [das centrais ou do MST]
Valor: O senhor não teme um rompimento com a Força Sindical, por exemplo?
Carvalho: Conversei nesta mesa com o Paulinho no dia da votação do mínimo: ‘Quero combinar uma coisa com vocês: não vamos queimar pontes.’ O governo não tem prazer em vencer um aliado, que são as forças sindicais. É uma disputa que estamos achando correta dentro da nossa responsabilidade. Muitos temas ainda vão se colocar. Vencido o mínimo, vamos discutir o IR, depois outras questões, como os aposentados e a desoneração da folha. Não acho provável que haja uma ruptura, a menos que haja uma enorme crise e, se as bases estiverem descontentes com o governo, pode ocorrer. Mas ninguém ali queima nota de R$ 100. Se as bases acharem que o governo está certo, o dirigente sindical não vai fazer uma aventura de romper porque tem um monte de eleição sindical este ano.
Valor: No caso dos aposentados, o que vai ser discutido?
Carvalho: Uma política geral de valorização dos aposentados.
Valor: De que forma?
Carvalho: Vamos pensar a questão da Saúde. Uma das coisas que pesam no bolso dos aposentados é o preço dos medicamentos. Já temos uma linha de medicamentos para hipertensão e diabetes. Vamos avaliar para outras doenças.
Valor: Pode ter algo em relação ao valor do benefício?
Carvalho: Pode vir a ter, não vou dizer que não.
Valor: O ex-presidente Lula chamou as centrais de “oportunistas”, criticando-as por causa da posição delas em relação ao salário mínimo. Ele fez isso a pedido da presidente Dilma?
Carvalho: Não. Eu é que manifestei a ele, lá em Dacar, umas preocupações que a gente estava tendo.
Valor: Em relação a quê?
Carvalho: Eu disse a ele: ‘Estão tentando abrir uma cunha entre você e a Dilma, dizendo que no seu tempo tinha tudo e que com a Dilma não vai ter nada. E na imprensa já se tenta colocar que a Dilma é séria, responsável, e você era gastador’.
Valor: Como ele reagiu?
Carvalho: Ele respondeu: ‘Você tem toda a razão. Na primeira oportunidade eu vou dar uma dura porque esses caras [os sindicalistas] estão querendo jogar fora um acordo que eu fiz com eles. Não admito uma coisa dessas, foi difícil, nós costuramos, não estou entendendo’. Foi uma avaliação dele. E logo depois de conversa, ele deu aquela declaração.
Valor: Em quanto o governo admite corrigir a tabela do IR?
Carvalho: Já asseguramos 4,5%, que é o centro da meta de inflação. Votado o salário mínimo no Senado, vamos dar uma olhada no orçamento para ver se é possível ir além. É pouco provável. Se for 4,5%, eu não vou chamar as centrais para conversar à toa.
Valor: O senhor não teme que as regras de correção do salário mínimo e da tabela do IR dificultem o controle da inflação no Brasil, à medida que reintroduzem mecanismos de indexação da economia?
Carvalho: É evidente que tem que tomar cuidado. Nossa resistência no IR de ir além dos 4,5% é por isso. Se dermos 5%, 5,5%, estaremos projetando inflação superior à que estamos perseguindo. Mas sabemos que o salário mínimo tem uma prevalência da questão social. As centrais argumentam com razão que o sujeito, quando recebe um aumento salarial, vai para uma faixa superior e o Leão come quase tudo que ele ganhou. [A correção da tabela] é mais uma questão de justiça. E a gente aposta que a economia continuará crescendo 4,5%, 5%, então, a arrecadação de impostos não vai ser prejudicada. Agora, estamos muito de olho na coisa da inflação. Vamos ter uma política muito severa para impedir a volta da inflação.
Valor: A presidente deixou claro, durante a campanha, que o MST é um movimento aliado, mas que ela não permitirá ilegalidades, como invasões de prédios públicos nem fazendas produtivas. O que muda na relação com o MST?
Carvalho: Nada. O Lula tinha aquela bonomia toda, mas ele nunca aliviou. Vocês não imaginam quantas vezes o MST esteve aqui, invadindo prédios públicos e pedindo audiência com o presidente, e ele dizia: ‘Não, eu só converso depois que eles saírem’. Não vou enganar vocês dizendo que vamos passar quatro anos sem que o MST ocupe terras, isso é uma bobagem. Eles têm autonomia. Vamos tentar azeitar ao máximo o Incra, que tem uma estrutura muito difícil, enferrujada, muito desgastada. Vamos fazer um acordo para estimular muito a qualificação dos assentamentos, como as cooperativas. Agora, você tem um passivo de gente debaixo de lona.
Valor: O governo tem ideia de quantos estão nessa situação?
Carvalho: É difícil saber, mas esse número diminuiu muito a partir do emprego quase pleno que temos na economia no momento. Houve um tempo em que uma das grandes fontes do MST era o pessoal da periferia das grandes cidades, o que também trouxe muitos problemas para eles porque eram pessoas que iam para o campo sem ter vocação rural. Eles sabem. Não temos dúvida de que há ainda um passivo a ser coberto, de gente que precisa de terra, então, não é que não vai ter mais reforma agrária. Vai continuar tendo, mas vamos trabalhar fortemente na qualificação do assentamento porque a pior coisa que pode acontecer com o MST é um assentamento que vire uma favela rural.
Valor: Mas como o governo vai lidar com as invasões?
Carvalho: O que você não pode nunca imaginar é que vá haver criminalização do movimento neste governo. Não tem margem nenhuma para isso. Vamos tentar persuadir os companheiros de que é muito importante o diálogo. E, para dialogar com o governo, não podemos dialogar nos acumpliciando com a ilegalidade. Não vamos nunca ceder desse ponto de vista. As ações vão ocorrer, podem ocorrer, mas depois vai ter que ter recuo. Não somos aqui militantes, isso aqui não é um partido, isso aqui é um governo. Nem sempre você pode fazer o que gostaria. Tem que agir dentro dos parâmetros. A fala da presidente vai nessa linha.
Postado por Luis Favre
“Dilma tem outro estilo, mas a mesma linha”
Entrevista: Carvalho diz que mínimo de R$ 545 será compensado com descontos a remédios de aposentados
Ruy Baron/Valor
Carvalho em seu gabinete: “O Guido – Mantega – conversa todo mês com empresários. Por que ele não pode conversar com o movimento sindical?”
Cristiano Romero e Paulo de Tarso Lyra | VALOR
Integrante do núcleo decisório do novo governo, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, informou que, depois de segurar a correção do salário mínimo, limitando-a à inflação do ano passado, o governo vai adotar uma política de valorização dos aposentados. A ideia é reduzir os custos de medicamentos para essa parcela da população, a exemplo do que já é feito nos remédios usados para doenças como hipertensão e diabetes. O governo pode, também, rever os valores das aposentadorias.
Carvalho reconheceu, nesta entrevista ao Valor, que o governo teve que conter a evolução do salário mínimo neste momento porque gastou muito nos últimos dois anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. “Todo mundo sabe que em 2009 e 2010 nós enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. Desoneramos, estimulamos, fizemos concessões de toda sorte. 2011 se afigura como um ano em que você precisa controlar. A inflação está batendo na porta”, disse.
“Temos que mandar um sinal claro para a sociedade de que o governo não vai brincar com a economia, não vai aceitar a indexação, porque, no fundo, se tem um prejuízo grande para o trabalhador é a inflação”, acrescentou o ministro. Ele informou que, também por causa da preocupação com a inflação, o governo vai limitar a correção da tabela do Imposto de Renda (IR) a 4,5%. “Nossa resistência de ir além dos 4,5% é por isso. Se dermos 5%, 5,5%, estaremos projetando inflação superior à que estamos perseguindo.”
Responsável pela interlocução com os movimentos sociais, Carvalho disse que a ordem da presidente Dilma Rousseff é aprofundar o diálogo com as entidades que os representam, mas deixou claro que isso não ocorrerá se o MST invadir terras e prédios públicos. “Não vamos nunca ceder desse ponto de vista. As ações vão ocorrer, podem ocorrer, mas depois vai ter que ter recuo. Não somos aqui militantes. Isso aqui não é um partido, é um governo”, avisou. “A Dilma tem outro estilo, mas não tem outra linha. Vai ser diferente do Lula por causa disso: não vai ficar colocando chapeuzinho [das centrais ou do MST].”
Instalado no 4º andar do Palácio do Planalto, Carvalho confessa que sente falta do 3º andar, onde fica o gabinete da presidente e onde ele trabalhou, numa sala contígua à do presidente Lula, durante oito anos. “Eu estava acostumado a trabalhar mais na retaguarda, trabalhando muito, embora mais protegido e menos exposto”, compara.
Em sua espaçosa sala, avista a Praça dos Poderes. Numa mesa de canto, expõe o porta-retrato de padre Alfredinho, suíço que morou numa favela em Crateús (CE) e exerceu grande influência sobre ele. “Na minha juventude, estava num seminário e li um livro dele que contava essa história e mudou minha cabeça. Depois, fui também morar numa favela.”
Valor: Qual foi o papel que a presidente Dilma designou ao senhor?
Gilberto Carvalho: Ela teve uma conversa muito simples comigo. Disse: ‘Gilbertinho, preciso de você porque eu quero que alguém me traga a realidade dos movimentos sociais, as demandas, as carências, as crises, alguém que me sensibilize para esse sofrimento do povo, alguém que diga a verdade. Não quero ser enganada nunca’.
Valor: Na prática, o que significa isso?
Carvalho: Significa que cabe a mim fazer a ponte. Todo ministério tem diálogo com os movimentos sociais. Minha área não tem o monopólio desses contatos, mas é o lugar, digamos, onde se organiza esse diálogo. Começou com o salário mínimo, em que fiz reuniões com as centrais sindicais.
Valor: Central sindical se enquadra no conceito de movimento social?
Carvalho: Sim, as centrais são a ponta de lança, até pela nossa tradição de relação. Estão incluídos também os chamados movimentos populares, como o MST, os movimentos indígena, dos negros, de gays e lésbicas, enfim, todas as formas de organização da sociedade, além das ONGs e das igrejas.
Valor: Como vai se estabelecer essa ponte?
Carvalho: Vamos acompanhar todas as conferências. Ao longo de oito anos, o governo Lula fez 73 conferências temáticas. Queremos democratizar ainda mais essas conferências. O governo tem se apropriado bem das propostas. Algumas, como aquela dos direitos humanos, são polêmicas. O Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), por exemplo, foi fruto de uma conferência.
Valor: Como evitar que o governo vete, no fim, um documento aprovado numa conferência, como ocorreu no caso da criação da Comissão da Verdade?
Carvalho: O problema do PNDH é que a conclusão da conferência foi transformada em decreto do presidente Lula. O governo absorveu na totalidade as propostas. Você não tem condição de colocar [no início da discussão] um filtro e dizer ‘olha, isso aqui não pode ser discutido’. A sociedade discute tudo e depois o governo é que vai dizer o que vai cumprir ou não.
Valor: Quais serão os canais de diálogo, além das conferências?
Carvalho: As mesas de negociação. Agora em março, por exemplo, vamos receber a pauta da Contag (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura) por causa do ‘Grito da Terra’. Daqui a pouco, chega o MST com o ‘Abril Vermelho’. Depois, tem a ‘Marcha das Margaridas’, movimento das mulheres agricultoras. Há a questão dos servidores públicos, cujo debate é no Ministério do Planejamento, mas aqui eles têm uma interlocução. Além disso, estamos buscando não ficar apenas na espera.
“Todo mundo sabe que enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. 2011 é o ano em que se deve controlar”
Valor: De que forma?
Carvalho: A ideia é estabelecer mesas permanentes de conversas.
Valor: Por exemplo?
Carvalho: O Guido [Mantega, ministro da Fazenda] conversa todo mês com os empresários. Por que ele não pode conversar com o movimento sindical? Vou tentar construir essa ponte. Vou chamar também os movimentos para discutir políticas nossas. Por exemplo: vamos fazer a desoneração da folha de pessoal. É importante chamar as centrais para conversar. Portanto, o plano é deixar o governo mais permeável a essa participação, a sugestões. É claro que, como ficou demonstrado agora na questão do salário mínimo, não tem conversa desse tipo sem tensão.
Valor: Durante a votação do salário mínimo no Congresso as centrais se juntaram à oposição para tentar derrotar o governo. Como o senhor explica esse fato?
Carvalho: É muito natural a tensão e a disputa entre governo e movimentos sociais. Não cabe aos movimentos serem cooptados por nós. Cabe a eles lutar, combater, porque eles trazem bandeiras que são históricas. Cabe ao governo receber essas demandas e tentar atendê-las no limite máximo, naquilo que julgamos prudente, responsável, ampliando os direitos sociais.
Valor: Por que não houve negociação no caso do salário mínimo?
Carvalho: Aí foi diferente. Não estávamos iniciando uma discussão. Tínhamos uma discussão já realizada. Então, para nós este ano não haveria discussão. Porque era um acordo [firmado em 2007] que julgamos como uma enorme vitória. Como houve essa circunstância em que o PIB de 2009 foi negativo e, na campanha eleitoral, o [José] Serra trouxe o debate dos R$ 600, isso provocou a retomada de um debate que já havia sido feito. Mas nós nos apressamos em dizer, desde a primeira conversa aqui, com o Nelson Barbosa [secretário-executivo do Ministério da Fazenda] e o Carlos Lupi [ministro do Trabalho], que o governo [sempre] negocia, mas que nesse caso não haveria negociação. ‘Querem discutir a correção do IR? Vamos discutir, mas o salário mínimo não está em discussão’.
Valor: O governo trocou uma coisa pela outra?
Carvalho: De forma alguma. O IR é outra frente de negociação. Dissemos às centrais que não havia razão para mudar a regra do mínimo. Por duas razões. Primeiro, eu disse a eles, ‘porque é uma conquista de vocês. Se a gente mudar agora, vocês estão nos autorizando no ano que vem, quando o aumento for de 12%, 13%, a rediscutir’. Este é o risco, inclusive desse questionamento que está se fazendo agora do decreto [que permite ao governo fixar anualmente o valor do mínimo sem passar novamente pelo Congresso].
Valor: Por que conter a evolução do mínimo?
Carvalho: Porque este é um ano muito especial. Todo mundo sabe que em 2009 e 2010 nós enfiamos o pé no acelerador para sair da crise. Desoneramos, estimulamos, fizemos concessões de toda sorte. 2011 se afigura como um ano em que você precisa controlar. A inflação está batendo na porta, tivemos que fazer um corte no orçamento que não é catastrófico, é um corte sobretudo de planos, projetos, mas é um corte importante. Temos que mandar um sinal claro para a sociedade de que o governo não vai brincar com a economia, não vai aceitar a indexação, porque, no fundo, se tem um prejuízo grande para o trabalhador é a inflação.
Valor: Por que as centrais sindicais, na sua avaliação, não aceitam essa tese?
Carvalho: Tem uma cultura nossa, que é a cultura sindicalista. Nunca esqueço de uma greve nossa, de 1979, em Curitiba, em que conseguimos 70% de aumento e, mesmo assim, não conseguimos repor a inflação naquele ano. Temos uma cultura de reivindicação que prioriza mais o índice do que propriamente a perda inflacionária. Depois, tem um problema: existem seis centrais sindicais e há uma disputa enorme entre elas para ver quem é mais combativa e quem não trai a sua base. A Força Sindical está dizendo agora que a CUT não foi combativa na questão do salário mínimo. É uma cultura que eu acho ruim, que deixa de cumprir um papel mais amplo, mais responsável. Não quero dizer que elas são irresponsáveis e admito que não podemos esperar das centrais uma conduta que não seja a de lutar pelos direitos dos trabalhadores porque, seja como for, é verdade também que o mínimo, criado pela Constituição de 1946, segundo o Dieese, deveria ser hoje de mais de R$ 2,3 mil. Há uma defasagem histórica. O problema é que você não vai repor isso da noite para o dia. Vamos fazendo uma política de valorização que corrige distorções, mas o país não aguentaria estabelecer um mínimo de R$ 2 mil. Seria uma completa loucura.
Valor: O presidente Lula unificou o movimento sindical em torno dele. O Ministério do Trabalho é comandado pelo PDT e pela Força Sindical, adversária histórica da CUT. O senhor teme dificuldades nessa relação nos próximos anos?
Carvalho: A unificação em torno do governo se fez no final do governo. Em 2006, o Paulinho [Paulo Pereira da Silva, deputado e presidente da Força] não fez campanha para o Lula. O apoio se deu depois de muita construção, muito convencimento, de uma política evidentemente muito favorável aos trabalhadores. Foi quase uma rendição. Eles não podiam ficar contra a base. Não vai ser diferente em relação à Dilma. O Lula epidermicamente tinha uma linguagem que ajudava muito, uma sedução. A Dilma tem outro estilo, mas não tem outra linha. A ordem no governo é para que haja diálogo. Vai ser diferente do Lula por causa disso: ela não vai ficar colocando chapeuzinho.
Não somos militantes; Dilma vai ser diferente do Lula porque não vai por chapeuzinho [das centrais ou do MST]
Valor: O senhor não teme um rompimento com a Força Sindical, por exemplo?
Carvalho: Conversei nesta mesa com o Paulinho no dia da votação do mínimo: ‘Quero combinar uma coisa com vocês: não vamos queimar pontes.’ O governo não tem prazer em vencer um aliado, que são as forças sindicais. É uma disputa que estamos achando correta dentro da nossa responsabilidade. Muitos temas ainda vão se colocar. Vencido o mínimo, vamos discutir o IR, depois outras questões, como os aposentados e a desoneração da folha. Não acho provável que haja uma ruptura, a menos que haja uma enorme crise e, se as bases estiverem descontentes com o governo, pode ocorrer. Mas ninguém ali queima nota de R$ 100. Se as bases acharem que o governo está certo, o dirigente sindical não vai fazer uma aventura de romper porque tem um monte de eleição sindical este ano.
Valor: No caso dos aposentados, o que vai ser discutido?
Carvalho: Uma política geral de valorização dos aposentados.
Valor: De que forma?
Carvalho: Vamos pensar a questão da Saúde. Uma das coisas que pesam no bolso dos aposentados é o preço dos medicamentos. Já temos uma linha de medicamentos para hipertensão e diabetes. Vamos avaliar para outras doenças.
Valor: Pode ter algo em relação ao valor do benefício?
Carvalho: Pode vir a ter, não vou dizer que não.
Valor: O ex-presidente Lula chamou as centrais de “oportunistas”, criticando-as por causa da posição delas em relação ao salário mínimo. Ele fez isso a pedido da presidente Dilma?
Carvalho: Não. Eu é que manifestei a ele, lá em Dacar, umas preocupações que a gente estava tendo.
Valor: Em relação a quê?
Carvalho: Eu disse a ele: ‘Estão tentando abrir uma cunha entre você e a Dilma, dizendo que no seu tempo tinha tudo e que com a Dilma não vai ter nada. E na imprensa já se tenta colocar que a Dilma é séria, responsável, e você era gastador’.
Valor: Como ele reagiu?
Carvalho: Ele respondeu: ‘Você tem toda a razão. Na primeira oportunidade eu vou dar uma dura porque esses caras [os sindicalistas] estão querendo jogar fora um acordo que eu fiz com eles. Não admito uma coisa dessas, foi difícil, nós costuramos, não estou entendendo’. Foi uma avaliação dele. E logo depois de conversa, ele deu aquela declaração.
Valor: Em quanto o governo admite corrigir a tabela do IR?
Carvalho: Já asseguramos 4,5%, que é o centro da meta de inflação. Votado o salário mínimo no Senado, vamos dar uma olhada no orçamento para ver se é possível ir além. É pouco provável. Se for 4,5%, eu não vou chamar as centrais para conversar à toa.
Valor: O senhor não teme que as regras de correção do salário mínimo e da tabela do IR dificultem o controle da inflação no Brasil, à medida que reintroduzem mecanismos de indexação da economia?
Carvalho: É evidente que tem que tomar cuidado. Nossa resistência no IR de ir além dos 4,5% é por isso. Se dermos 5%, 5,5%, estaremos projetando inflação superior à que estamos perseguindo. Mas sabemos que o salário mínimo tem uma prevalência da questão social. As centrais argumentam com razão que o sujeito, quando recebe um aumento salarial, vai para uma faixa superior e o Leão come quase tudo que ele ganhou. [A correção da tabela] é mais uma questão de justiça. E a gente aposta que a economia continuará crescendo 4,5%, 5%, então, a arrecadação de impostos não vai ser prejudicada. Agora, estamos muito de olho na coisa da inflação. Vamos ter uma política muito severa para impedir a volta da inflação.
Valor: A presidente deixou claro, durante a campanha, que o MST é um movimento aliado, mas que ela não permitirá ilegalidades, como invasões de prédios públicos nem fazendas produtivas. O que muda na relação com o MST?
Carvalho: Nada. O Lula tinha aquela bonomia toda, mas ele nunca aliviou. Vocês não imaginam quantas vezes o MST esteve aqui, invadindo prédios públicos e pedindo audiência com o presidente, e ele dizia: ‘Não, eu só converso depois que eles saírem’. Não vou enganar vocês dizendo que vamos passar quatro anos sem que o MST ocupe terras, isso é uma bobagem. Eles têm autonomia. Vamos tentar azeitar ao máximo o Incra, que tem uma estrutura muito difícil, enferrujada, muito desgastada. Vamos fazer um acordo para estimular muito a qualificação dos assentamentos, como as cooperativas. Agora, você tem um passivo de gente debaixo de lona.
Valor: O governo tem ideia de quantos estão nessa situação?
Carvalho: É difícil saber, mas esse número diminuiu muito a partir do emprego quase pleno que temos na economia no momento. Houve um tempo em que uma das grandes fontes do MST era o pessoal da periferia das grandes cidades, o que também trouxe muitos problemas para eles porque eram pessoas que iam para o campo sem ter vocação rural. Eles sabem. Não temos dúvida de que há ainda um passivo a ser coberto, de gente que precisa de terra, então, não é que não vai ter mais reforma agrária. Vai continuar tendo, mas vamos trabalhar fortemente na qualificação do assentamento porque a pior coisa que pode acontecer com o MST é um assentamento que vire uma favela rural.
Valor: Mas como o governo vai lidar com as invasões?
Carvalho: O que você não pode nunca imaginar é que vá haver criminalização do movimento neste governo. Não tem margem nenhuma para isso. Vamos tentar persuadir os companheiros de que é muito importante o diálogo. E, para dialogar com o governo, não podemos dialogar nos acumpliciando com a ilegalidade. Não vamos nunca ceder desse ponto de vista. As ações vão ocorrer, podem ocorrer, mas depois vai ter que ter recuo. Não somos aqui militantes, isso aqui não é um partido, isso aqui é um governo. Nem sempre você pode fazer o que gostaria. Tem que agir dentro dos parâmetros. A fala da presidente vai nessa linha.
Postado por Luis Favre
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segunda-feira, 15 de novembro de 2010
mídia - Centrais criam rede de comunicação na AL
Reproduzo artigo de Leonardo Wexell Severo, publicado no sítio da Agência Latinoamericana de Informação (Alai):
“As frentes de guerra número um, dois e três estão nos meios de comunicação e no controle da opinião pública”. As palavras do jornalista basco Unai Aranzadi, transmitidas em vídeo aos participantes da Conferência Sindical sobre Democratização da Comunicação, definiram as discussões do encontro realizado em Montevidéu nos dias 1° e 2 de novembro. Segundo Aranzadi, os grandes meios seguem alguns “padrões de manipulação e de silêncio impostos pelos conglomerados privados” para prostituir a informação em troca da liberdade de empresa e do discurso único do “partido do capital”.
Promovida pela Confederação Sindical de Trabalhadores/as das Américas, com a participação de centrais sindicais, organizações sociais e especialistas de mais de 20 países latino-americanos, a Conferência destacou a necessidade de mais protagonismo dos trabalhadores na luta pela liberdade de expressão – considerada um “valor indispensável para a construção de uma sociedade mais justa”.
A atuação dos meios de comunicação de massa foi condenada pelos participantes enquanto se repetiam as denúncias de desrespeito, por parte de quem faz uso indevido de concessões públicas, das mais elementares normas de disputa democrática. Foram mencionados desde o recente caso brasileiro – onde o candidato da oposição à presidência, José Serra, foi supostamente “agredido” por uma bolinha de papel – até o racismo contra o presidente boliviano Evo Morales e as críticas a presidente Cristina Fernández, que aprovou uma lei para disciplinar os abusos dos meios de comunicação na Argentina.
O secretário geral da CSA, Víctor Báez, mencionou exemplos concretos da necessidade de construir um poder em rede para contrapor as mentiras difundidas contra a soberania e a liberdade dos povos. Víctor falou do caso dos mineiros chilenos. Os 33 mineiros estiveram 70 dias debaixo da terra, com os meios de comunicação privados falando muito mais da ação de resgate e ocultando as verdadeiras causas do desastre: a falta de investimentos em segurança por parte da empresa, a ausência de fiscalização por parte do governo. Por força da mobilização popular, o governo teve que fechar minhas privadas que se encontravam nas mesmas condições.
“O movimento sindical chileno falou das causas do acidente, mas a denúncia acabou isolada e a verdadeira notícia não foi difundida porque não havia uma rede articulada para fazer isso”, avaliou Báez. “O desmoronamento na mina de San José nos lembrou do fato ocorrido no México, em Pasta de Conchos, onde muitos trabalhadores ficaram enterrados a 100 metros de profundidade, sem qualquer auxílio. E o dirigente sindical que denunciou o acidente teve que se exilar no Canadá”.
Imposição de um modelo
Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da Central Única de Trabalhadores (CUT), do Brasil, destacou a necessidade política e ideológica de se construir um novo marco para regular o setor. Na conferência de Montevidéu, Rosane disse que algumas das medidas a serem tomadas foram debatidas democraticamente pela sociedade brasileira e aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação, devendo agora serem materializadas na Consolidação das Leis Sociais do país.
“A democratização da comunicação é um passo essencial para o aprofundamento da democracia e é um elemento fundamental para a valorização dos seres humanos. Com sua concepção neoliberal de Estado mínimo, os privatistas tentaram nos impor seus contra-valores, confundindo liberdade de imprensa com liberdade de empresa”, acrescentou Rosane. Como contrapartida ao cenário hegemônico dos grandes meios de comunicação no Brasil, a secretária da CUT apontou que a central sindical investiu na estruturação de seus próprios canais de TV e rádio que começaram a transmitir sua programação recentemente.
Como lembrou o uruguaio Aram Aharonian, fundador da Telesur e dirigente do Observatório Comunicação e Democracia, da Venezuela, é fundamental que o movimento sindical se articule com os movimentos sociais para a disputa de projetos na arena midiática. “Três décadas atrás, para impor-se um modelo político-econômico tínhamos que recorrer às armas, com um saldo de milhares de mortos, desaparecidos e torturados. Hoje, os meios de comunicação de massa levam o bombardeio da mensagem hegemônica diretamente à sala de nossas casas, 24 horas por dia”.
A criação de uma rede de comunicação sindical
Segundo o pensamento de Aharonian, “atualmente são as grandes corporações que manejam o latifúndio midiático, que criam imaginários coletivos virtuais e decidem quem tem a palavra, quem é o protagonista e o antagonista, enquanto trabalham para que as grandes maiorias sigam mudas e invisíveis”. Para combater esta “verdadeira ditadura midiática”, defendeu o jornalista, é preciso “reivindicar e transformar em realidade o sentido etimológico da comunicação, que implica diálogo, interação e intercâmbio para construir consensos entre as partes envolvidas no processo”. Aharonian destacou a importância da proposta da CSA para estruturar redes para construir um movimento contra-hegemônico com vistas a incentivar ações espalhadas no continente, tornando-as muito mais fortes e eficientes.
Gustavo Gómez Germano, diretor nacional de telecomunicações do Uruguai, ressaltou que, na América latina, por muitas razões, está se produzindo um processo de revisão das leis sobre os meios de comunicação, em especial os eletrônicos, com o rádio e TV. “Na verdade, trata-se de um processo de re-regulação, porque a regulação anterior habilitava e fomentava a concentração dos meios de comunicação nas mãos de uns poucos, ao mesmo tempo em que obstaculizava o acesso às grandes maiorias”.
De acordo com Gómez, os Estados devem revisar e reformar suas legislações e realizar controles adequados para reverter e impedir a formação de monopólios e oligopólios no controle dos meios de comunicação. “Se o Estado não desempenha um papel ativo, a democratização não será possível, o livre jogo da oferta e da demanda não diminuirá os abismos existentes em nossas sociedades”, acrescentou.
Novo internacionalismo
Álvaro Padrón, da Fundação Friedrich Ebert, entidade que apoiou a Conferência de Montevidéu, disse que o momento é de um “novo internacionalismo, com nova base pragmática, mais unidade e mais pluralidade”. Segundo Padrón, questões que eram marginais agora ganham mais transcendência no embate de idéias, pondo em questão a concentração dos meios. A conformação de uma rede de comunicação sindical, acrescentou, é uma tarefa urgente para colocar as entidades em uma nova posição de ação democratizadora. Assim, será possível virar a página do neoliberalismo que ainda asfixia muitos Estados nacionais.
Omar Rincón, também da Fundação Friedrich Ebert, acredita que estamos assistindo a “uma batalha inédita pelo relato do país e pela hegemonia política, onde os meios privados criaram sua própria realidade, que representa os donos desses meios que expressam pouca transparência informativa e econômica”.
O representante do Coletivo Intervozes, do Brasil, Pedro Eckman, resgatou a trajetória de luta dos movimentos sociais pela liberdade de expressão e demonstrou como os interesses dos grandes barões da comunicação e da livre empresa entraram em contradição frente aos direitos comunicacionais. Eckman defendeu a necessidade de mais articulação com o conjunto dos movimentos sociais para que caminhem juntos na consolidação das redes contra-hegemônicas. E explicou que “não é necessário reinventar a roda, uma vez que já há muita experiência acumulada. Basta fortalecer as alianças”.
A Agência Latinoamericana de Informação (ALAI) esteve representada na Conferência de Montevidéu por Osvaldo León, para quem o momento favorece uma campanha sincronizada pela democratização da comunicação. “Nunca esteve tão claro o papel danoso dos grandes oligopólios midiáticos, que encarnam uma agressão ao verdadeiro papel e à responsabilidade dos meios de comunicação. Pluralidade e diversidade não entram nestes meios que aí estão. Por isso, nós defendemos a necessidade de investir e contar com instrumentos próprios. Se não dizemos nossa própria palavra, os outros vão dizê-la por nós”.
“As frentes de guerra número um, dois e três estão nos meios de comunicação e no controle da opinião pública”. As palavras do jornalista basco Unai Aranzadi, transmitidas em vídeo aos participantes da Conferência Sindical sobre Democratização da Comunicação, definiram as discussões do encontro realizado em Montevidéu nos dias 1° e 2 de novembro. Segundo Aranzadi, os grandes meios seguem alguns “padrões de manipulação e de silêncio impostos pelos conglomerados privados” para prostituir a informação em troca da liberdade de empresa e do discurso único do “partido do capital”.
Promovida pela Confederação Sindical de Trabalhadores/as das Américas, com a participação de centrais sindicais, organizações sociais e especialistas de mais de 20 países latino-americanos, a Conferência destacou a necessidade de mais protagonismo dos trabalhadores na luta pela liberdade de expressão – considerada um “valor indispensável para a construção de uma sociedade mais justa”.
A atuação dos meios de comunicação de massa foi condenada pelos participantes enquanto se repetiam as denúncias de desrespeito, por parte de quem faz uso indevido de concessões públicas, das mais elementares normas de disputa democrática. Foram mencionados desde o recente caso brasileiro – onde o candidato da oposição à presidência, José Serra, foi supostamente “agredido” por uma bolinha de papel – até o racismo contra o presidente boliviano Evo Morales e as críticas a presidente Cristina Fernández, que aprovou uma lei para disciplinar os abusos dos meios de comunicação na Argentina.
O secretário geral da CSA, Víctor Báez, mencionou exemplos concretos da necessidade de construir um poder em rede para contrapor as mentiras difundidas contra a soberania e a liberdade dos povos. Víctor falou do caso dos mineiros chilenos. Os 33 mineiros estiveram 70 dias debaixo da terra, com os meios de comunicação privados falando muito mais da ação de resgate e ocultando as verdadeiras causas do desastre: a falta de investimentos em segurança por parte da empresa, a ausência de fiscalização por parte do governo. Por força da mobilização popular, o governo teve que fechar minhas privadas que se encontravam nas mesmas condições.
“O movimento sindical chileno falou das causas do acidente, mas a denúncia acabou isolada e a verdadeira notícia não foi difundida porque não havia uma rede articulada para fazer isso”, avaliou Báez. “O desmoronamento na mina de San José nos lembrou do fato ocorrido no México, em Pasta de Conchos, onde muitos trabalhadores ficaram enterrados a 100 metros de profundidade, sem qualquer auxílio. E o dirigente sindical que denunciou o acidente teve que se exilar no Canadá”.
Imposição de um modelo
Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da Central Única de Trabalhadores (CUT), do Brasil, destacou a necessidade política e ideológica de se construir um novo marco para regular o setor. Na conferência de Montevidéu, Rosane disse que algumas das medidas a serem tomadas foram debatidas democraticamente pela sociedade brasileira e aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação, devendo agora serem materializadas na Consolidação das Leis Sociais do país.
“A democratização da comunicação é um passo essencial para o aprofundamento da democracia e é um elemento fundamental para a valorização dos seres humanos. Com sua concepção neoliberal de Estado mínimo, os privatistas tentaram nos impor seus contra-valores, confundindo liberdade de imprensa com liberdade de empresa”, acrescentou Rosane. Como contrapartida ao cenário hegemônico dos grandes meios de comunicação no Brasil, a secretária da CUT apontou que a central sindical investiu na estruturação de seus próprios canais de TV e rádio que começaram a transmitir sua programação recentemente.
Como lembrou o uruguaio Aram Aharonian, fundador da Telesur e dirigente do Observatório Comunicação e Democracia, da Venezuela, é fundamental que o movimento sindical se articule com os movimentos sociais para a disputa de projetos na arena midiática. “Três décadas atrás, para impor-se um modelo político-econômico tínhamos que recorrer às armas, com um saldo de milhares de mortos, desaparecidos e torturados. Hoje, os meios de comunicação de massa levam o bombardeio da mensagem hegemônica diretamente à sala de nossas casas, 24 horas por dia”.
A criação de uma rede de comunicação sindical
Segundo o pensamento de Aharonian, “atualmente são as grandes corporações que manejam o latifúndio midiático, que criam imaginários coletivos virtuais e decidem quem tem a palavra, quem é o protagonista e o antagonista, enquanto trabalham para que as grandes maiorias sigam mudas e invisíveis”. Para combater esta “verdadeira ditadura midiática”, defendeu o jornalista, é preciso “reivindicar e transformar em realidade o sentido etimológico da comunicação, que implica diálogo, interação e intercâmbio para construir consensos entre as partes envolvidas no processo”. Aharonian destacou a importância da proposta da CSA para estruturar redes para construir um movimento contra-hegemônico com vistas a incentivar ações espalhadas no continente, tornando-as muito mais fortes e eficientes.
Gustavo Gómez Germano, diretor nacional de telecomunicações do Uruguai, ressaltou que, na América latina, por muitas razões, está se produzindo um processo de revisão das leis sobre os meios de comunicação, em especial os eletrônicos, com o rádio e TV. “Na verdade, trata-se de um processo de re-regulação, porque a regulação anterior habilitava e fomentava a concentração dos meios de comunicação nas mãos de uns poucos, ao mesmo tempo em que obstaculizava o acesso às grandes maiorias”.
De acordo com Gómez, os Estados devem revisar e reformar suas legislações e realizar controles adequados para reverter e impedir a formação de monopólios e oligopólios no controle dos meios de comunicação. “Se o Estado não desempenha um papel ativo, a democratização não será possível, o livre jogo da oferta e da demanda não diminuirá os abismos existentes em nossas sociedades”, acrescentou.
Novo internacionalismo
Álvaro Padrón, da Fundação Friedrich Ebert, entidade que apoiou a Conferência de Montevidéu, disse que o momento é de um “novo internacionalismo, com nova base pragmática, mais unidade e mais pluralidade”. Segundo Padrón, questões que eram marginais agora ganham mais transcendência no embate de idéias, pondo em questão a concentração dos meios. A conformação de uma rede de comunicação sindical, acrescentou, é uma tarefa urgente para colocar as entidades em uma nova posição de ação democratizadora. Assim, será possível virar a página do neoliberalismo que ainda asfixia muitos Estados nacionais.
Omar Rincón, também da Fundação Friedrich Ebert, acredita que estamos assistindo a “uma batalha inédita pelo relato do país e pela hegemonia política, onde os meios privados criaram sua própria realidade, que representa os donos desses meios que expressam pouca transparência informativa e econômica”.
O representante do Coletivo Intervozes, do Brasil, Pedro Eckman, resgatou a trajetória de luta dos movimentos sociais pela liberdade de expressão e demonstrou como os interesses dos grandes barões da comunicação e da livre empresa entraram em contradição frente aos direitos comunicacionais. Eckman defendeu a necessidade de mais articulação com o conjunto dos movimentos sociais para que caminhem juntos na consolidação das redes contra-hegemônicas. E explicou que “não é necessário reinventar a roda, uma vez que já há muita experiência acumulada. Basta fortalecer as alianças”.
A Agência Latinoamericana de Informação (ALAI) esteve representada na Conferência de Montevidéu por Osvaldo León, para quem o momento favorece uma campanha sincronizada pela democratização da comunicação. “Nunca esteve tão claro o papel danoso dos grandes oligopólios midiáticos, que encarnam uma agressão ao verdadeiro papel e à responsabilidade dos meios de comunicação. Pluralidade e diversidade não entram nestes meios que aí estão. Por isso, nós defendemos a necessidade de investir e contar com instrumentos próprios. Se não dizemos nossa própria palavra, os outros vão dizê-la por nós”.
sábado, 13 de novembro de 2010
Luiz Dulci e o governo Lula - A elite chama de populismo a democratização das decisões
A liderança pública do presidente Lula é sempre denunciada pelos liberais como de tipo populista, ou de tipo carismático personalista. Essa caracterização contrasta com o ethos participativo estimulado pelo governo. Quais são, depois de oito anos, as principais conquistas democráticas nessa área?
Luiz Dulci -- Lula não tem nada de populista. Ele sempre defendeu uma sociedade civil forte e independente, o contrário do que faz o populismo. Sempre apoiou os movimentos populares autônomos e críticos. Ajudou a construir muitos deles, nos últimos 35 anos. Aliás, seu carisma, que é essencialmente vinculado a um projeto coletivo de emancipação social, e não personalista, afirmou-se justamente nesse trabalho árduo, cotidiano de conscientização e organização das classes populares. E o governo Lula empenhou-se, desde o início, em construir uma nova relação do Estado com a sociedade. Uma relação de diálogo permanente e de respeito pela autonomia dos movimentos. E, principalmente, de democratização das decisões. O próprio Lula tem dito que a democracia participativa é uma das maiores conquistas, uma das marcas do seu governo, a ser preservada e ampliada. De fato, houve uma mudança completa no modo de elaborar as políticas públicas. Mudou também, estruturalmente, a forma de implementá-las e avaliá-las. Antes, as políticas eram decididas exclusivamente pelos técnicos e dirigentes dos ministérios. Só os gestores públicos participavam. A partir de 2003, a população invadiu o processo (e foi convidada a invadilo). As políticas passaram a ser formuladas junto com os movimentos sociais nas conferências, conselhos e mesas de diálogo. O maior exemplo disso são as conferências de políticas públicas. Já foram realizadas 73 conferências nacionais, sobre os mais diversos temas. Desenvolvimento, geração de emprego e renda, inclusão social, saúde, educação, meio ambiente, direitos das mulheres, igualdade racial, reforma agrária, juventude, direitos humanos, ciência e tecnologia, comunicação, diversidade sexual, democratização da cultura, reforma urbana, segurança pública, entre muitos outros. Até os brasileiros que vivem no exterior já puderam participar de duas conferências, com delegados de dezenas de países. Elas têm, como se sabe, um formato congressual. Começam nos municípios, depois há os encontros estaduais, que finalmente convergem para o evento-síntese em Brasília. Mais de 5 milhões de pessoas participaram dessas conferências, nas suas várias etapas. Também os conselhos de políticas públicas, que hoje existem em todas as áreas, com efetiva presença da sociedade civil, cumprem papel fundamental. Diversos deles foram inteiramente reformulados e democratizados; outros, que haviam sido extintos no período neoliberal, foram recriados. É o caso do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea). E outros foram implantados por Lula, como os conselhos de Desenvolvimento Econômico e Social, da Juventude, das Cidades, de Participação Social no Mercosul etc. Sem falar nas mesas permanentes de diálogo: a mesa com as centrais sindicais sobre a valorização do salário mínimo; a mesa tripartite canavieiros usineiros governo; e as mesas da agricultura familiar, das mulheres camponesas, do funcionalismo, dos atingidos por barragens, da moradia popular... Todos os grandes projetos do governo Lula, inclusive o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, foram previamente debatidos com a sociedade civil.
As conferências nacionais temáticas não são em geral deliberativas, mas participam do sistema decisório do governo, desde a construção de agenda, de prioridades, até a viabilização de compromissos assumidos com os delegados. Quais são as funções das conferências nacionais na experiência de construção de políticas públicas do governo Lula?
Luiz Dulci --As conferências são deliberativas, sim, pois discutem e aprovam propostas a serem encaminhadas ao Executivo e ao Legislativo. O que elas não são é impositivas, pois isso seria descabido no regime democrático. Trata-se, justamente, de superar essa falsa dicotomia entre representação e participação. Na democracia contemporânea, as instituições representativas são imprescindíveis, ainda que, no caso brasileiro, careçam de reformas profundas. Mas elas não excluem o que Boaventura Santos chamou de uma escuta forte à sociedade. O governo não pode e não deve transferir suas responsabilidades às conferências. Ele as compartilha. Delegados dos ministérios participam ativamente dos grupos de trabalho e das plenárias. Opinam, divergem, concordam, interagem o tempo todo com os cidadãos e os militantes sociais. O próprio presidente Lula compareceu a dezenas de conferências. Isso significa que o governo é parte integrante do processo e compromete-se a levar em conta seus resultados. As deliberações das conferências incidiram fortemente nas políticas públicas implementadas pelo nosso governo. Muitas se tornaram projetos de lei, já aprovados, ou estão em tramitação no Congresso Nacional. Outras, por meio de decretos ou portarias, foram imediatamente postas em prática. E, mesmo quando não era possível concretizá-las de imediato, incorporaram-se à agenda de debates do governo e do país.
Em que medida a discussão e a definição do orçamento nacional podem ser democratizadas? O âmbito nacional impõe obstáculo diverso ao da experiência consagrada do orçamento participativo municipal?
Luiz Dulci -- Em princípio, acho que a democracia participativa pode ser adotada com proveito em todas as esferas de governo. A escuta forte que mencionei será sempre valiosa, por mais complexas e especializadas que sejam algumas políticas. Nas 73 conferências, sem exceção, foram debatidas questões orçamentárias e aprovadas demandas de inversão de prioridades na alocação de recursos. Os conselhos também discutem intensamente temas orçamentários e monitoram de perto a execução dos investimentos públicos. E é claro que as reivindicações negociadas nas mesas permanentes têm impacto direto no orçamento, em benefício dos setores populares. O governo Lula sempre acolheu essas preocupações. No entanto, penso que o chamado ciclo orçamentário isto é, o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e o Orçamento propriamente dito (Loas) também pode ser, de alguma maneira, objeto de interlocução específica com a sociedade civil. Já acumulamos uma boa experiência nesse sentido. Mas é preciso encontrar a forma adequada
para fazê-lo. Não acredito, sinceramente, na transposição mecânica do orçamento participativo municipal para o âmbito federal. O OP local tem um caráter de participação direta, inclusive do cidadão individual, que é impossível manter num universo potencial de quase 200 milhões de pessoas. Além disso, a escala territorial é outra, os condicionamentos institucionais são completamente diferentes, o próprio Congresso Nacional tem atribuições na matéria que as Câmaras de Vereadores não possuem. Mas nessa área também é importante a participação social. Será preciso bolar um formato ao mesmo tempo legítimo e eficaz. Talvez ela possa ser feita por meio de entidades populares representativas. A Secretaria-Geral da Presidência chegou a propor aos movimentos sociais um conselho de acompanhamento do ciclo orçamentário. No próximo governo, quem vier a coordenar o diálogo com a sociedade civil poderia, quem sabe, retomar essa ideia.
Em que grau se pode falar na projeção de um sistema federal de participação? Como esse sistema se relacionaria com as funções e a representação do Congresso Nacional?
Luiz Dulci -- Os canais de participação criados e/ou recriados pelo governo Lula conferências, conselhos, mesas de diálogo, ouvidorias etc. já constituem, na prática, um embrião desse sistema. O desafio agora é consolidá-lo, garantindo maior integração entre seus vários instrumentos (das conferências com os conselhos, por exemplo). Além disso, será importante ampliar a qualificação específica para os processos participativos, tanto no governo quanto nos movimentos sociais. Foi o que procuramos fazer com o Programa de Formação de Conselheiros, promovido pela Secretaria-Geral em parceria com a UFMG. Além de quadros do governo, 4.372 lideranças e militantes sociais frequentaram os cursos, gerando uma boa massa crítica. Entre as monografias aprovadas, há algumas que abrem novas perspectivas teóricas e práticas para a democracia participativa. Criar no governo federal a figura do gestor de participação social seria um grande avanço. E é claro que será necessário institucionalizar, mantendo sua flexibilidade política e organizativa, todos os canais que ainda não estão garantidos em lei. Quanto ao Congresso Nacional, como já disse, acho que participação e representação podem e devem ser complementares. Não se trata de substituir uma pela outra, mas de criar entre elas uma saudável dialética política, na qual as duas têm muito a ganhar. Aliás, a Constituição Federal prevê a participação social tanto no Executivo como no Legislativo, com as audiências públicas e os projetos de lei de iniciativa popular.
Na história brasileira, consagrouse, com a herança do período varguista, o formato corporativo de representação de interesses. Em que medida o ethos participativo estimulado pelo governo Lula se relaciona com essa tradição e em que sentido procura ultrapassar seus limites?
Luiz Dulci --Acho que é preciso fazer uma distinção. Nem tudo o que é setorial é corporativo . Há interesses setoriais que não são puramente particulares nem exclusivistas, ou seja, eles não se chocam com os interesses gerais da população. Pelo contrário: servem a eles. É o caso da luta da área da saúde em defesa do SUS, por exemplo, ou da mobilização dos trabalhadores pelo salário mínimo, que é um poderoso fator de desenvolvimento. Mas é importante que os movimentos sociais não sejam setorialistas, que eles dêem conta de inserir suas causas específicas num projeto global de sociedade, capaz de universalizar direitos. Acho que isso está ocorrendo. A luta da agricultura familiar tornou-se também a luta pela segurança alimentar. As centrais sindicais, além dos temas trabalhistas, discutem com o governo aspectos estruturais da política econômica, como a redução dos juros, a ampliação do crédito, os incentivos ao mercado interno, a descentralização industrial. Na verdade, negociam cada vez mais uma estratégia nacional de desenvolvimento. Na crise financeira internacional, isso ficou muito evidente. De imediato, governo e centrais pactuaram um conjunto de medidas para evitar a recessão, sustentar a atividade produtiva e garantir o nível de emprego.
Como a experiência de participação do governo Lula se vincula às tradições dos movimentos sociais? Como fugir aos dilemas da cooptação e do conflito?
Luiz Dulci -- Muitos dos movimentos sociais brasileiros se constituíram na luta contra a ditadura. Com uma cultura, por isso mesmo, fortemente defensiva, autoprotetora, de enorme desconfiança em relação ao Estado. E não podia ser diferente, pois naquela época reagíamos ao Estado-repressor, ao Estado-tecnocrata, ao Estado-cooptador (não raro, essas dimensões se mesclavam). Essa desconfiança se acentuou durante o período neoliberal, com a privatização avassaladora e o empenho sistemático para desconstituir a sociedade civil, desagregá-la, pulverizá-la. No governo Lula, o maior desafio foi inverter essa equação. Fazer com que as classes populares, e suas organizações, assumissem uma atitude criativa perante o Estado. Fazer com que pensassem o Estado como potencialmente a serviço das maiorias sociais. E se dispusessem a interferir nas decisões do Estado, disputando democraticamente as suas escolhas. O que implicava, necessariamente, aproximar-se dele, apropriar-se de um saber sobre as políticas públicas, sem abrir mão da independência nem do direito à crítica. Exercendo a autonomia numa relação politizada com o Estado e não por virar as costas a ele ou por manter-se longe dele, numa atitude de negação absoluta, que acaba por ser paralisante. Estou convencido de que a maioria dos movimentos sociais soube renovar-se culturalmente e assumir um novo protagonismo, sem o qual não haveria sustentação popular para as reformas sociais promovidas pelo governo Lula. É preciso dizer que, nesses oito anos, a imprensa conservadora fez campanha permanente para desqualificar os movimentos sociais e sua relação com o governo. Usou para isso três armas poderosas: a invisibilidade, a desmoralização e a aberta criminalização. Ela simplesmente escondeu, cancelou do noticiário, as principais mobilizações populares do período e as conquistas obtidas, no afã de carimbar as entidades civis como omissas, cooptadas. A julgar pelas TVs, rádios, revistas e jornais, com raríssimas exceções, é como se não tivessem existido as três grandes marchas da classe trabalhadora pelo emprego e pelo salário, cada uma delas levando a Brasília 40 mil, 50 mil participantes; ou os Gritos da Terra, realizados anualmente em todo o país; ou as enormes caravanas da agricultura familiar e da reforma agrária; sem falar nas esplêndidas Marchas das Margaridas, que nunca contaram com menos de 30 mil mulheres do campo; ou as diversas e massivas jornadas de luta estudantil em defesa da escola pública; e os dias nacionais da consciência negra e dos direitos das mulheres, entre tantos exemplos que poderíamos citar, nos mais variados setores da vida brasileira. Toda essa vitalidade democrática foi, na verdade, deliberadamente omitida para não desmentir a tese preconcebida da desmobilização completa dos movimentos e de sua suposta estatização . Em alguns casos, tentou-se criminalizá-los, promovendo CPIs (das ONGs e do MST), quebra de sigilos bancários de militantes, processos judiciais etc. Caso contrário, essa mídia teria que admitir que, se não há mais manifestações contra a Alca, é porque derrotamos a proposta da Alca, e hoje avança a integração soberana dos povos do continente; se não há mais atos públicos contra as privatizações, é porque não há mais privatizações, e sepultou-se o dogma destrutivo do Estado mínimo ; se não há protestos contra o desemprego e o arrocho salarial, é porque o país criou, durante o governo Lula, 14 milhões de novos postos de trabalho e a classe trabalhadora teve expressivos ganhos reais, com forte elevação da massa salarial. O que eles não percebem é que, hoje, os movimentos sociais não estão mais na fase de resistência. Junto com o país, passaram à ofensiva. Já não lutam para impedir a supressão de direitos, como acontecia nos governos de Fernando Henrique, e sim para ampliá-los e universalizá-los. Mobilizam-se, a partir de sua autonomia, para aproveitar os espaços de democracia participativa e alargá-los ainda mais. Querem intensificar o atual ciclo de crescimento econômico, distribuindo cada vez melhor os seus frutos. Lutam para que os recursos do pré-sal beneficiem o conjunto da população e sejam de fato destinados à igualdade social e à revolução educacional, cultural e científica a que o país almeja.
Luiz Dulci -- Lula não tem nada de populista. Ele sempre defendeu uma sociedade civil forte e independente, o contrário do que faz o populismo. Sempre apoiou os movimentos populares autônomos e críticos. Ajudou a construir muitos deles, nos últimos 35 anos. Aliás, seu carisma, que é essencialmente vinculado a um projeto coletivo de emancipação social, e não personalista, afirmou-se justamente nesse trabalho árduo, cotidiano de conscientização e organização das classes populares. E o governo Lula empenhou-se, desde o início, em construir uma nova relação do Estado com a sociedade. Uma relação de diálogo permanente e de respeito pela autonomia dos movimentos. E, principalmente, de democratização das decisões. O próprio Lula tem dito que a democracia participativa é uma das maiores conquistas, uma das marcas do seu governo, a ser preservada e ampliada. De fato, houve uma mudança completa no modo de elaborar as políticas públicas. Mudou também, estruturalmente, a forma de implementá-las e avaliá-las. Antes, as políticas eram decididas exclusivamente pelos técnicos e dirigentes dos ministérios. Só os gestores públicos participavam. A partir de 2003, a população invadiu o processo (e foi convidada a invadilo). As políticas passaram a ser formuladas junto com os movimentos sociais nas conferências, conselhos e mesas de diálogo. O maior exemplo disso são as conferências de políticas públicas. Já foram realizadas 73 conferências nacionais, sobre os mais diversos temas. Desenvolvimento, geração de emprego e renda, inclusão social, saúde, educação, meio ambiente, direitos das mulheres, igualdade racial, reforma agrária, juventude, direitos humanos, ciência e tecnologia, comunicação, diversidade sexual, democratização da cultura, reforma urbana, segurança pública, entre muitos outros. Até os brasileiros que vivem no exterior já puderam participar de duas conferências, com delegados de dezenas de países. Elas têm, como se sabe, um formato congressual. Começam nos municípios, depois há os encontros estaduais, que finalmente convergem para o evento-síntese em Brasília. Mais de 5 milhões de pessoas participaram dessas conferências, nas suas várias etapas. Também os conselhos de políticas públicas, que hoje existem em todas as áreas, com efetiva presença da sociedade civil, cumprem papel fundamental. Diversos deles foram inteiramente reformulados e democratizados; outros, que haviam sido extintos no período neoliberal, foram recriados. É o caso do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea). E outros foram implantados por Lula, como os conselhos de Desenvolvimento Econômico e Social, da Juventude, das Cidades, de Participação Social no Mercosul etc. Sem falar nas mesas permanentes de diálogo: a mesa com as centrais sindicais sobre a valorização do salário mínimo; a mesa tripartite canavieiros usineiros governo; e as mesas da agricultura familiar, das mulheres camponesas, do funcionalismo, dos atingidos por barragens, da moradia popular... Todos os grandes projetos do governo Lula, inclusive o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, foram previamente debatidos com a sociedade civil.
As conferências nacionais temáticas não são em geral deliberativas, mas participam do sistema decisório do governo, desde a construção de agenda, de prioridades, até a viabilização de compromissos assumidos com os delegados. Quais são as funções das conferências nacionais na experiência de construção de políticas públicas do governo Lula?
Luiz Dulci --As conferências são deliberativas, sim, pois discutem e aprovam propostas a serem encaminhadas ao Executivo e ao Legislativo. O que elas não são é impositivas, pois isso seria descabido no regime democrático. Trata-se, justamente, de superar essa falsa dicotomia entre representação e participação. Na democracia contemporânea, as instituições representativas são imprescindíveis, ainda que, no caso brasileiro, careçam de reformas profundas. Mas elas não excluem o que Boaventura Santos chamou de uma escuta forte à sociedade. O governo não pode e não deve transferir suas responsabilidades às conferências. Ele as compartilha. Delegados dos ministérios participam ativamente dos grupos de trabalho e das plenárias. Opinam, divergem, concordam, interagem o tempo todo com os cidadãos e os militantes sociais. O próprio presidente Lula compareceu a dezenas de conferências. Isso significa que o governo é parte integrante do processo e compromete-se a levar em conta seus resultados. As deliberações das conferências incidiram fortemente nas políticas públicas implementadas pelo nosso governo. Muitas se tornaram projetos de lei, já aprovados, ou estão em tramitação no Congresso Nacional. Outras, por meio de decretos ou portarias, foram imediatamente postas em prática. E, mesmo quando não era possível concretizá-las de imediato, incorporaram-se à agenda de debates do governo e do país.
Em que medida a discussão e a definição do orçamento nacional podem ser democratizadas? O âmbito nacional impõe obstáculo diverso ao da experiência consagrada do orçamento participativo municipal?
Luiz Dulci -- Em princípio, acho que a democracia participativa pode ser adotada com proveito em todas as esferas de governo. A escuta forte que mencionei será sempre valiosa, por mais complexas e especializadas que sejam algumas políticas. Nas 73 conferências, sem exceção, foram debatidas questões orçamentárias e aprovadas demandas de inversão de prioridades na alocação de recursos. Os conselhos também discutem intensamente temas orçamentários e monitoram de perto a execução dos investimentos públicos. E é claro que as reivindicações negociadas nas mesas permanentes têm impacto direto no orçamento, em benefício dos setores populares. O governo Lula sempre acolheu essas preocupações. No entanto, penso que o chamado ciclo orçamentário isto é, o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e o Orçamento propriamente dito (Loas) também pode ser, de alguma maneira, objeto de interlocução específica com a sociedade civil. Já acumulamos uma boa experiência nesse sentido. Mas é preciso encontrar a forma adequada
para fazê-lo. Não acredito, sinceramente, na transposição mecânica do orçamento participativo municipal para o âmbito federal. O OP local tem um caráter de participação direta, inclusive do cidadão individual, que é impossível manter num universo potencial de quase 200 milhões de pessoas. Além disso, a escala territorial é outra, os condicionamentos institucionais são completamente diferentes, o próprio Congresso Nacional tem atribuições na matéria que as Câmaras de Vereadores não possuem. Mas nessa área também é importante a participação social. Será preciso bolar um formato ao mesmo tempo legítimo e eficaz. Talvez ela possa ser feita por meio de entidades populares representativas. A Secretaria-Geral da Presidência chegou a propor aos movimentos sociais um conselho de acompanhamento do ciclo orçamentário. No próximo governo, quem vier a coordenar o diálogo com a sociedade civil poderia, quem sabe, retomar essa ideia.
Em que grau se pode falar na projeção de um sistema federal de participação? Como esse sistema se relacionaria com as funções e a representação do Congresso Nacional?
Luiz Dulci -- Os canais de participação criados e/ou recriados pelo governo Lula conferências, conselhos, mesas de diálogo, ouvidorias etc. já constituem, na prática, um embrião desse sistema. O desafio agora é consolidá-lo, garantindo maior integração entre seus vários instrumentos (das conferências com os conselhos, por exemplo). Além disso, será importante ampliar a qualificação específica para os processos participativos, tanto no governo quanto nos movimentos sociais. Foi o que procuramos fazer com o Programa de Formação de Conselheiros, promovido pela Secretaria-Geral em parceria com a UFMG. Além de quadros do governo, 4.372 lideranças e militantes sociais frequentaram os cursos, gerando uma boa massa crítica. Entre as monografias aprovadas, há algumas que abrem novas perspectivas teóricas e práticas para a democracia participativa. Criar no governo federal a figura do gestor de participação social seria um grande avanço. E é claro que será necessário institucionalizar, mantendo sua flexibilidade política e organizativa, todos os canais que ainda não estão garantidos em lei. Quanto ao Congresso Nacional, como já disse, acho que participação e representação podem e devem ser complementares. Não se trata de substituir uma pela outra, mas de criar entre elas uma saudável dialética política, na qual as duas têm muito a ganhar. Aliás, a Constituição Federal prevê a participação social tanto no Executivo como no Legislativo, com as audiências públicas e os projetos de lei de iniciativa popular.
Na história brasileira, consagrouse, com a herança do período varguista, o formato corporativo de representação de interesses. Em que medida o ethos participativo estimulado pelo governo Lula se relaciona com essa tradição e em que sentido procura ultrapassar seus limites?
Luiz Dulci --Acho que é preciso fazer uma distinção. Nem tudo o que é setorial é corporativo . Há interesses setoriais que não são puramente particulares nem exclusivistas, ou seja, eles não se chocam com os interesses gerais da população. Pelo contrário: servem a eles. É o caso da luta da área da saúde em defesa do SUS, por exemplo, ou da mobilização dos trabalhadores pelo salário mínimo, que é um poderoso fator de desenvolvimento. Mas é importante que os movimentos sociais não sejam setorialistas, que eles dêem conta de inserir suas causas específicas num projeto global de sociedade, capaz de universalizar direitos. Acho que isso está ocorrendo. A luta da agricultura familiar tornou-se também a luta pela segurança alimentar. As centrais sindicais, além dos temas trabalhistas, discutem com o governo aspectos estruturais da política econômica, como a redução dos juros, a ampliação do crédito, os incentivos ao mercado interno, a descentralização industrial. Na verdade, negociam cada vez mais uma estratégia nacional de desenvolvimento. Na crise financeira internacional, isso ficou muito evidente. De imediato, governo e centrais pactuaram um conjunto de medidas para evitar a recessão, sustentar a atividade produtiva e garantir o nível de emprego.
Como a experiência de participação do governo Lula se vincula às tradições dos movimentos sociais? Como fugir aos dilemas da cooptação e do conflito?
Luiz Dulci -- Muitos dos movimentos sociais brasileiros se constituíram na luta contra a ditadura. Com uma cultura, por isso mesmo, fortemente defensiva, autoprotetora, de enorme desconfiança em relação ao Estado. E não podia ser diferente, pois naquela época reagíamos ao Estado-repressor, ao Estado-tecnocrata, ao Estado-cooptador (não raro, essas dimensões se mesclavam). Essa desconfiança se acentuou durante o período neoliberal, com a privatização avassaladora e o empenho sistemático para desconstituir a sociedade civil, desagregá-la, pulverizá-la. No governo Lula, o maior desafio foi inverter essa equação. Fazer com que as classes populares, e suas organizações, assumissem uma atitude criativa perante o Estado. Fazer com que pensassem o Estado como potencialmente a serviço das maiorias sociais. E se dispusessem a interferir nas decisões do Estado, disputando democraticamente as suas escolhas. O que implicava, necessariamente, aproximar-se dele, apropriar-se de um saber sobre as políticas públicas, sem abrir mão da independência nem do direito à crítica. Exercendo a autonomia numa relação politizada com o Estado e não por virar as costas a ele ou por manter-se longe dele, numa atitude de negação absoluta, que acaba por ser paralisante. Estou convencido de que a maioria dos movimentos sociais soube renovar-se culturalmente e assumir um novo protagonismo, sem o qual não haveria sustentação popular para as reformas sociais promovidas pelo governo Lula. É preciso dizer que, nesses oito anos, a imprensa conservadora fez campanha permanente para desqualificar os movimentos sociais e sua relação com o governo. Usou para isso três armas poderosas: a invisibilidade, a desmoralização e a aberta criminalização. Ela simplesmente escondeu, cancelou do noticiário, as principais mobilizações populares do período e as conquistas obtidas, no afã de carimbar as entidades civis como omissas, cooptadas. A julgar pelas TVs, rádios, revistas e jornais, com raríssimas exceções, é como se não tivessem existido as três grandes marchas da classe trabalhadora pelo emprego e pelo salário, cada uma delas levando a Brasília 40 mil, 50 mil participantes; ou os Gritos da Terra, realizados anualmente em todo o país; ou as enormes caravanas da agricultura familiar e da reforma agrária; sem falar nas esplêndidas Marchas das Margaridas, que nunca contaram com menos de 30 mil mulheres do campo; ou as diversas e massivas jornadas de luta estudantil em defesa da escola pública; e os dias nacionais da consciência negra e dos direitos das mulheres, entre tantos exemplos que poderíamos citar, nos mais variados setores da vida brasileira. Toda essa vitalidade democrática foi, na verdade, deliberadamente omitida para não desmentir a tese preconcebida da desmobilização completa dos movimentos e de sua suposta estatização . Em alguns casos, tentou-se criminalizá-los, promovendo CPIs (das ONGs e do MST), quebra de sigilos bancários de militantes, processos judiciais etc. Caso contrário, essa mídia teria que admitir que, se não há mais manifestações contra a Alca, é porque derrotamos a proposta da Alca, e hoje avança a integração soberana dos povos do continente; se não há mais atos públicos contra as privatizações, é porque não há mais privatizações, e sepultou-se o dogma destrutivo do Estado mínimo ; se não há protestos contra o desemprego e o arrocho salarial, é porque o país criou, durante o governo Lula, 14 milhões de novos postos de trabalho e a classe trabalhadora teve expressivos ganhos reais, com forte elevação da massa salarial. O que eles não percebem é que, hoje, os movimentos sociais não estão mais na fase de resistência. Junto com o país, passaram à ofensiva. Já não lutam para impedir a supressão de direitos, como acontecia nos governos de Fernando Henrique, e sim para ampliá-los e universalizá-los. Mobilizam-se, a partir de sua autonomia, para aproveitar os espaços de democracia participativa e alargá-los ainda mais. Querem intensificar o atual ciclo de crescimento econômico, distribuindo cada vez melhor os seus frutos. Lutam para que os recursos do pré-sal beneficiem o conjunto da população e sejam de fato destinados à igualdade social e à revolução educacional, cultural e científica a que o país almeja.
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Paulo Cezar da Rosa - Movimentos sociais e religiosos hoje são objetos da política
12 de novembro de 2010 às 11:19h
cartcapital
O final do século passado foi o melhor momento para os movimentos sociais no Brasil. Sindicatos e movimentos tinham bandeiras a defender e bases dispostas a lutar. Foi, também, o melhor momento da religiosidade popular. Comunidades eclesiais de base, pastorais operárias, e organizações que misturavam a fé com a luta contra a opressão e a esperança numa vida melhor, tinham larga audiência no Brasil pós-Ditadura Militar.
Os anos 80 e 90 também foram os da esquerda brasileira. Depois da luta armada, a esquerda se jogou na aventura da disputa da hegemonia na sociedade por meios pacíficos. Enraizada neste período nas universidades, as organizações que sucederam a guerrilha urbana se somaram aos trabalhadores organizados em sindicatos e aos movimentos eclesiais de base para fundar o PT.
Deu no que deu. Deu em Lula presidente por oito anos. De 2002 a 2010 vivemos a afirmação de um projeto de nação com espaço para todos. Foram os anos de glória da luta social no Brasil.
Hoje, contudo, além de reconhecer que o país mudou, é preciso identificar a abertura de um novo período. E perceber que a mudança em curso tem um lado negativo para os movimentos sociais, para a religiosidade popular, e até para a esquerda. Por quê? Porque o Estado brasileiro se fortalece e as demandas populares vem sendo atendidas, esvaziando a luta social e o cenário de injustiças. Ao mesmo tempo, não se vê uma renovação dos movimentos, dos sindicatos, das lutas sociais.
De sujeitos a objetos da política
Sim, sei que a afirmação de que a mudança é negativa para a esquerda é questionável. Mas vamos às duas anteriores, que são certeiras. Os movimentos sociais nos últimos anos, de sujeitos da política no Brasil, vem se tornando objetos das políticas governamentais. Não se trata aqui de condenar o Bolsa Família, a política do salário mínimo, o Pró-UNI, o Minha Casa-Minha Vida, etc. Todos os programas governamentais, que respondem às demandas históricas dos movimentos sociais, são conquistas e devem ser vistas como tais.
Todavia, estamos hoje vivendo uma mudança de relação de poder muito importante. Hoje, temos um Estado forte na questão social e uma sociedade fraca. Os movimentos sociais, que no final do século passado eram protagonistas políticos, apontavam novos caminhos para a sociedade, hoje são meros objetos das políticas governamentais. O mesmo ocorre com a religião.
A prova disso está na análise do perfil dos eleitos na última eleição. Também o debate se deu sob essa lógica. Mais do que ser objeto da política, a religiosidade do povo brasileiro foi objeto da pior política. O mesmo relativamente às demandas populares. O salário mínimo, o Bolsa família, o Pro-UNI – todos viraram pais da ideia e todos se tornaram seus defensores radicais.
Os sindicalistas em baixa
Procure no seu Estado a votação obtida por lideranças sindicais para o parlamento estadual ou federal. Com raras exceções, em geral explicadas por fatores externos ao sindicalismo, os líderes sindicais tiveram poucos votos. Procure também a votação de lideranças populares ou religiosas. A situação é parecida. Os líderes sociais e religiosos do final do século passado estão entrando a segunda década do século XXI em baixa.
Muito ainda será dito a respeito da genialidade de Lula ao indicar Dilma Roussef para sucedê-lo. Mas creio que poucos dirão o seguinte: Luiz Inácio Lula da Silva, tendo a opção de prolongar a liderança dos movimentos sociais no país, promovendo a candidatura de algum companheiro do movimento sindical (como Jacques Vagner, por exemplo, entre tantos outros), ou de revigorar sua aliança com os setores religiosos (as alternativas também eram variadas), fez a opção de colocar a frente do país uma militante de esquerda.
Os desafios da esquerda
Ou seja, hoje, passados quase trinta anos de desenvolvimento do movimento que mudou o Brasil para melhor, a sua principal liderança coloca nas mãos da esquerda brasileira – ou seja, nas mãos de Dilma Roussef – os destinos do país e do próprio movimento social.
Esta esquerda, formada no combate à ditadura e herdeira de combates históricos na sociedade, hoje está colocada diante de seu maior desafio. Se Dilma der certo, a esquerda será vitoriosa. Mas a esquerda brasileira precisa entender que, para Dilma dar certo, vai precisar como nunca nos próximos anos dos movimentos sociais e da fé do povo.
Ou seja, seus governos precisam fortalecer, e não enfraquecer, os movimentos sociais e associativos do povo. Precisam, como nunca, reinventar a esquerda no país. E para reinventar a esquerda, os elementos essenciais são a união dos de baixo (ou seja, sindicatos e associações fortes) e a fé no futuro.
Paulo Cezar da Rosa
Paulo Cezar da Rosa é jornalista e publicitário. Publicou o livro O Marketing e a Comunicação da Esquerda. É diretor da Veraz Comunicação e da Red Marketing, ambas sediadas em Porto Alegre. paulocezar@veraz.com.br
cartcapital
O final do século passado foi o melhor momento para os movimentos sociais no Brasil. Sindicatos e movimentos tinham bandeiras a defender e bases dispostas a lutar. Foi, também, o melhor momento da religiosidade popular. Comunidades eclesiais de base, pastorais operárias, e organizações que misturavam a fé com a luta contra a opressão e a esperança numa vida melhor, tinham larga audiência no Brasil pós-Ditadura Militar.
Os anos 80 e 90 também foram os da esquerda brasileira. Depois da luta armada, a esquerda se jogou na aventura da disputa da hegemonia na sociedade por meios pacíficos. Enraizada neste período nas universidades, as organizações que sucederam a guerrilha urbana se somaram aos trabalhadores organizados em sindicatos e aos movimentos eclesiais de base para fundar o PT.
Deu no que deu. Deu em Lula presidente por oito anos. De 2002 a 2010 vivemos a afirmação de um projeto de nação com espaço para todos. Foram os anos de glória da luta social no Brasil.
Hoje, contudo, além de reconhecer que o país mudou, é preciso identificar a abertura de um novo período. E perceber que a mudança em curso tem um lado negativo para os movimentos sociais, para a religiosidade popular, e até para a esquerda. Por quê? Porque o Estado brasileiro se fortalece e as demandas populares vem sendo atendidas, esvaziando a luta social e o cenário de injustiças. Ao mesmo tempo, não se vê uma renovação dos movimentos, dos sindicatos, das lutas sociais.
De sujeitos a objetos da política
Sim, sei que a afirmação de que a mudança é negativa para a esquerda é questionável. Mas vamos às duas anteriores, que são certeiras. Os movimentos sociais nos últimos anos, de sujeitos da política no Brasil, vem se tornando objetos das políticas governamentais. Não se trata aqui de condenar o Bolsa Família, a política do salário mínimo, o Pró-UNI, o Minha Casa-Minha Vida, etc. Todos os programas governamentais, que respondem às demandas históricas dos movimentos sociais, são conquistas e devem ser vistas como tais.
Todavia, estamos hoje vivendo uma mudança de relação de poder muito importante. Hoje, temos um Estado forte na questão social e uma sociedade fraca. Os movimentos sociais, que no final do século passado eram protagonistas políticos, apontavam novos caminhos para a sociedade, hoje são meros objetos das políticas governamentais. O mesmo ocorre com a religião.
A prova disso está na análise do perfil dos eleitos na última eleição. Também o debate se deu sob essa lógica. Mais do que ser objeto da política, a religiosidade do povo brasileiro foi objeto da pior política. O mesmo relativamente às demandas populares. O salário mínimo, o Bolsa família, o Pro-UNI – todos viraram pais da ideia e todos se tornaram seus defensores radicais.
Os sindicalistas em baixa
Procure no seu Estado a votação obtida por lideranças sindicais para o parlamento estadual ou federal. Com raras exceções, em geral explicadas por fatores externos ao sindicalismo, os líderes sindicais tiveram poucos votos. Procure também a votação de lideranças populares ou religiosas. A situação é parecida. Os líderes sociais e religiosos do final do século passado estão entrando a segunda década do século XXI em baixa.
Muito ainda será dito a respeito da genialidade de Lula ao indicar Dilma Roussef para sucedê-lo. Mas creio que poucos dirão o seguinte: Luiz Inácio Lula da Silva, tendo a opção de prolongar a liderança dos movimentos sociais no país, promovendo a candidatura de algum companheiro do movimento sindical (como Jacques Vagner, por exemplo, entre tantos outros), ou de revigorar sua aliança com os setores religiosos (as alternativas também eram variadas), fez a opção de colocar a frente do país uma militante de esquerda.
Os desafios da esquerda
Ou seja, hoje, passados quase trinta anos de desenvolvimento do movimento que mudou o Brasil para melhor, a sua principal liderança coloca nas mãos da esquerda brasileira – ou seja, nas mãos de Dilma Roussef – os destinos do país e do próprio movimento social.
Esta esquerda, formada no combate à ditadura e herdeira de combates históricos na sociedade, hoje está colocada diante de seu maior desafio. Se Dilma der certo, a esquerda será vitoriosa. Mas a esquerda brasileira precisa entender que, para Dilma dar certo, vai precisar como nunca nos próximos anos dos movimentos sociais e da fé do povo.
Ou seja, seus governos precisam fortalecer, e não enfraquecer, os movimentos sociais e associativos do povo. Precisam, como nunca, reinventar a esquerda no país. E para reinventar a esquerda, os elementos essenciais são a união dos de baixo (ou seja, sindicatos e associações fortes) e a fé no futuro.
Paulo Cezar da Rosa
Paulo Cezar da Rosa é jornalista e publicitário. Publicou o livro O Marketing e a Comunicação da Esquerda. É diretor da Veraz Comunicação e da Red Marketing, ambas sediadas em Porto Alegre. paulocezar@veraz.com.br
domingo, 17 de outubro de 2010
Movimentos populares lançam manifesto pró-Dilma
Movimentos populares assinam manifesto publicado nesta sexta-feira (15) na página do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em apoio à candidata Dilma Rousseff.
Além do MST, outros movimentos de luta pela terra e entidades como o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e a Marcha Mundial de Mulheres (MMM) também assinam o manifesto.
Ao contrário de outros manifestos, que se concentram no balanço do governo Lula, a carta Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil faz um balanço do primeiro turno das eleições, considerando uma vitória a eleição de muitos governadores e parlamentares progressistas, sobretudo no Senado. A derrota eleitoral da governadora Yeda Crusius (RS) é tratada como uma vitória especial para os movimentos, pois consideram que este governo "se notabilizou, juntamente com o governo tucano de São Paulo, pelo controle da mídia, criminalização dos movimentos sociais e repressão à luta pela Reforma Agrária, aos movimentos de moradia e ao movimento dos professores da rede pública estadual".
O documento questiona ainda os propósitos da candidatura de Marina Silva, denuncia a campanha baixa feita pelo candidato José Serra e critica o papel da chamada grande mídia no processo. As organizações classificam Serra de "inimigo" das bandeiras e lutas do movimento, que são pautadas no manfesto, e também o identificam como representante das "forças direitistas e fascistas do país".
Após apresentar as principais bandeiras defendidas pelas entidades, o manifesto termina com a declaração de apoio e a conclamação da militância para "eleger Dilma Rousseff presidente do Brasil".
Leia a íntegra do manifesto:
Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil
No início do processo eleitoral deste ano, os movimentos sociais e a Via Campesina Brasil tomaram a decisão política de empenhar esforços para eleger o maior número possível de parlamentares e governadores identificados com as bandeiras populares da classe trabalhadora, com o aprofundamento da democracia e soberania brasileira e com políticas que combatam a concentração da propriedade e da renda em nosso país.
Quanto à eleição presidencial, as organizações populares que compõem a Via Campesina decidiram lutar para que não houvesse a vitória eleitoral de uma proposta neoliberal, representando pela candidatura do tucano José Serra.
Passando o primeiro turno dessa campanha eleitoral, realizado em 3 de outubro, queremos, com este comunicado ao povo brasileiro, manifestar nossa decisão política frente às eleições deste ano.
Avaliação do 1º turno
As renovações que aconteceram nas Assembleias estaduais, na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, além da eleição e reeleição de governadores progressistas, são alvissareiras. No Senado Federal, especialmente, fomos vitoriosos com a eleição de companheiros e companheiras identificadas com as nossas lutas e com a não eleição de senadores que se notabilizaram pela perseguição aos movimentos sociais, identificados com os interesses do agronegócio.
Destacamos como vitória a derrota eleitoral do governo tucano de Yeda Crusius, no Rio Grande do Sul, que se notabilizou, juntamente com o governo tucano de São Paulo, pelo controle da mídia, criminalização dos movimentos sociais e repressão à luta pela Reforma Agrária, aos movimentos de moradia e ao movimento dos professores da rede pública estadual.
Em relação às campanhas presidenciais, não transcorreram debates em torno de projetos políticos e dos problemas principais que afetam a população brasileira. A campanha de Dilma Rousseff (PT) buscou apenas, de forma pragmática, divulgar o desenvolvimento econômico e as políticas sociais do governo Lula, apoiando-se na popularidade e nos enorme índices de aprovação do atual governo. Com essa estratégia, obteve quase 47% dos votos, que foram insuficientes para vencer no primeiro turno.
A candidatura de José Serra (PSDB) nos surpreendeu, não por sua identificação com as políticas neoliberais, e sim pelo baixo nível da sua campanha presidencial. Foi agressivo e perseguiu jornalistas em entrevistas, tentou interferir em julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), espalhou mentiras e acusações infundadas.
Chegou a usar a própria esposa, que percorreu as ruas de Niterói (RJ) dizendo que Dilma Rousseff “é a favor de matar as criancinhas”. Somente uma candidatura sem nenhum compromisso com a ética e com a verdade, contando com o total controle sobre a mídia, pode desenvolver uma campanha de tão baixo nível. A biografia do candidato já é a maior derrotada nestas eleições.
A candidatura de Marina Silva (PV) cumpriu o objetivo a que se propôs: provocar o segundo turno nesta campanha eleitoral. O tempo dirá se o seu êxito serviu para fortalecer a democracia ou simplesmente foi utilizada pelas forças conservadoras, para que retornassem ao governo.
Já as candidaturas identificadas com os partidos de esquerda, que utilizaram o espaço eleitoral para defender os interesses da classe trabalhadora, infelizmente tiveram uma votação inexpressiva.
O descenso social que temos há duas décadas em nosso país, a fragmentação das organizações da classe trabalhadora e a fragilidade da política de comunicação com a sociedade certamente influíram no resultado eleitoral. Cabe uma auto-crítica aos partidos políticos que se limitam apenas às campanhas eleitorais para dialogar com a sociedade. E que não falte daqui pra frente trabalho de base e a formação política permanente.
As eleições deste ano demonstraram o poder nefasto e antidemocrático da mídia. Mas, por outro lado, foi potencializada uma rede de comunicadores independentes, comprometidos com a liberdade de expressão e com o direito à informação, e que enfrentam aguerridamente o monopólio dos meios de comunicação em nosso país. São avanços rumo à democratização da informação e na construção de uma comunicação democrática e plural, com a participação da sociedade.
O 2º Turno
Nós reafirmamos nosso compromisso em defesa das bandeiras de lutas da classe trabalhadora e na construção de um país democrático, socialmente justo e soberano. Independentemente do governo eleito, seja ele qual for, iremos lutar de forma intransigente pela expansão das liberdades e dos direitos democráticos oprimidos.
Vamos lutar também por mudanças nas instituições e serviços públicos, em benefício da ampla maioria da população; combater aos monopólios para o desenvolvimento com soberania e distribuição de renda; defender as conquistas trabalhistas, a redução da jornada de trabalho, o direito de greve para os servidores públicos; a Previdência Social pública, de boa qualidade, pelo fim do fator previdenciário
Defendemos também a realização de uma reforma urbana, com moradia, saneamento básico, transporte público e segurança; a construção de serviços de saúde universal e de boa qualidade; reformas na educação pública e promoção da cultura nacional-popular com caráter universal; o fim do latifúndio, limite do capital estrangeiro sobre os nossos recursos naturais e a realização de uma Reforma Agrária anti-latifundiária; a implantação de novas relações da sociedade com o meio ambiente e efetivação uma política externa de autodeterminação, solidariedade aos povos e que priorize a integração dos povos do continente latino-americano e do Caribe.
Infelizmente, os avanços do governo Lula em direção a essas bandeiras democrático-populares foram insuficientes, em em que pese o acerto de sua política externa. Também nos preocupa constatar que, no arco de alianças da candidatura de Dilma Rousseff, há forças políticas que se contrapõem a essas demandas sociais.
Porém, temos uma certeza: José Serra, por sua campanha, pelo seu governo no Estado de São Paulo e pelos oito anos de governo FHC, tornou-se o inimigo dessas bandeiras de lutas. Pelo caráter anti-democrático e anti-popular dos partidos que compõem sua aliança eleitoral e por sua personalidade autoritária, estamos convictos que uma possível vitória sua significará um retrocesso para os movimentos sociais e populares em nosso país, para as conquistas democráticas em nosso continente e uma maior subordinação ao império dos Estados Unidos. Esse retrocesso não queremos que aconteça.
Nossa posição nessa conjuntura
Assim, os movimentos sociais e a Via Campesina Brasil afirmam o seu apoio e compromisso de lutar para eleger a candidata Dilma Rousseff para o cargo de presidenta do Brasil. Queremos nos juntar aos movimentos sindicais, populares, estudantis, religiosos e progressistas para promover debates com a sociedade, desmascarar a propaganda enganosa dos neoliberais e autoritários e exigir avanços na democracia, nas políticas públicas que favoreçam a população, no combate aos corruptos e corruptores e na democratização do poder em nosso país.
Precisamos derrotar a candidatura Serra, que representa as forças direitistas e fascistas do país. Devemos seguir organizando o povo para que lute por seus direitos e mudanças sociais, mantendo sempre nossa autonomia política frente aos governos.
Conclamamos a militância de todos os movimentos sociais, os lutadores e lutadoras do povo brasileiro, para se engajarem nessa luta, que é importantíssima para a classe trabalhadora.
Vamos à luta!! Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil.
Via Campesina Brasil
Movimento dos Atingidos por Barragens- MAB
Movimento das Mulheres Camponesas- MMC
Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra- MST
Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil- FEAB
Assembléia Popular- PE
Centro de Estudos Barão de Itararé
Fórum Brasileiro de Economia Solidária
Marcha Mundial das Mulheres- MMM
Movimento Camponês Popular- MCP
Rede Brasileira de Integração dos Povos- REBRIP
Rede de Educação Cidadã Sudeste- RECID
Sindicato dos Engenheiros do Paraná- Senge-PR
Uniao de Estudantes Afrodescendentes-UNEAFRO
Além do MST, outros movimentos de luta pela terra e entidades como o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e a Marcha Mundial de Mulheres (MMM) também assinam o manifesto.
Ao contrário de outros manifestos, que se concentram no balanço do governo Lula, a carta Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil faz um balanço do primeiro turno das eleições, considerando uma vitória a eleição de muitos governadores e parlamentares progressistas, sobretudo no Senado. A derrota eleitoral da governadora Yeda Crusius (RS) é tratada como uma vitória especial para os movimentos, pois consideram que este governo "se notabilizou, juntamente com o governo tucano de São Paulo, pelo controle da mídia, criminalização dos movimentos sociais e repressão à luta pela Reforma Agrária, aos movimentos de moradia e ao movimento dos professores da rede pública estadual".
O documento questiona ainda os propósitos da candidatura de Marina Silva, denuncia a campanha baixa feita pelo candidato José Serra e critica o papel da chamada grande mídia no processo. As organizações classificam Serra de "inimigo" das bandeiras e lutas do movimento, que são pautadas no manfesto, e também o identificam como representante das "forças direitistas e fascistas do país".
Após apresentar as principais bandeiras defendidas pelas entidades, o manifesto termina com a declaração de apoio e a conclamação da militância para "eleger Dilma Rousseff presidente do Brasil".
Leia a íntegra do manifesto:
Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil
No início do processo eleitoral deste ano, os movimentos sociais e a Via Campesina Brasil tomaram a decisão política de empenhar esforços para eleger o maior número possível de parlamentares e governadores identificados com as bandeiras populares da classe trabalhadora, com o aprofundamento da democracia e soberania brasileira e com políticas que combatam a concentração da propriedade e da renda em nosso país.
Quanto à eleição presidencial, as organizações populares que compõem a Via Campesina decidiram lutar para que não houvesse a vitória eleitoral de uma proposta neoliberal, representando pela candidatura do tucano José Serra.
Passando o primeiro turno dessa campanha eleitoral, realizado em 3 de outubro, queremos, com este comunicado ao povo brasileiro, manifestar nossa decisão política frente às eleições deste ano.
Avaliação do 1º turno
As renovações que aconteceram nas Assembleias estaduais, na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, além da eleição e reeleição de governadores progressistas, são alvissareiras. No Senado Federal, especialmente, fomos vitoriosos com a eleição de companheiros e companheiras identificadas com as nossas lutas e com a não eleição de senadores que se notabilizaram pela perseguição aos movimentos sociais, identificados com os interesses do agronegócio.
Destacamos como vitória a derrota eleitoral do governo tucano de Yeda Crusius, no Rio Grande do Sul, que se notabilizou, juntamente com o governo tucano de São Paulo, pelo controle da mídia, criminalização dos movimentos sociais e repressão à luta pela Reforma Agrária, aos movimentos de moradia e ao movimento dos professores da rede pública estadual.
Em relação às campanhas presidenciais, não transcorreram debates em torno de projetos políticos e dos problemas principais que afetam a população brasileira. A campanha de Dilma Rousseff (PT) buscou apenas, de forma pragmática, divulgar o desenvolvimento econômico e as políticas sociais do governo Lula, apoiando-se na popularidade e nos enorme índices de aprovação do atual governo. Com essa estratégia, obteve quase 47% dos votos, que foram insuficientes para vencer no primeiro turno.
A candidatura de José Serra (PSDB) nos surpreendeu, não por sua identificação com as políticas neoliberais, e sim pelo baixo nível da sua campanha presidencial. Foi agressivo e perseguiu jornalistas em entrevistas, tentou interferir em julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), espalhou mentiras e acusações infundadas.
Chegou a usar a própria esposa, que percorreu as ruas de Niterói (RJ) dizendo que Dilma Rousseff “é a favor de matar as criancinhas”. Somente uma candidatura sem nenhum compromisso com a ética e com a verdade, contando com o total controle sobre a mídia, pode desenvolver uma campanha de tão baixo nível. A biografia do candidato já é a maior derrotada nestas eleições.
A candidatura de Marina Silva (PV) cumpriu o objetivo a que se propôs: provocar o segundo turno nesta campanha eleitoral. O tempo dirá se o seu êxito serviu para fortalecer a democracia ou simplesmente foi utilizada pelas forças conservadoras, para que retornassem ao governo.
Já as candidaturas identificadas com os partidos de esquerda, que utilizaram o espaço eleitoral para defender os interesses da classe trabalhadora, infelizmente tiveram uma votação inexpressiva.
O descenso social que temos há duas décadas em nosso país, a fragmentação das organizações da classe trabalhadora e a fragilidade da política de comunicação com a sociedade certamente influíram no resultado eleitoral. Cabe uma auto-crítica aos partidos políticos que se limitam apenas às campanhas eleitorais para dialogar com a sociedade. E que não falte daqui pra frente trabalho de base e a formação política permanente.
As eleições deste ano demonstraram o poder nefasto e antidemocrático da mídia. Mas, por outro lado, foi potencializada uma rede de comunicadores independentes, comprometidos com a liberdade de expressão e com o direito à informação, e que enfrentam aguerridamente o monopólio dos meios de comunicação em nosso país. São avanços rumo à democratização da informação e na construção de uma comunicação democrática e plural, com a participação da sociedade.
O 2º Turno
Nós reafirmamos nosso compromisso em defesa das bandeiras de lutas da classe trabalhadora e na construção de um país democrático, socialmente justo e soberano. Independentemente do governo eleito, seja ele qual for, iremos lutar de forma intransigente pela expansão das liberdades e dos direitos democráticos oprimidos.
Vamos lutar também por mudanças nas instituições e serviços públicos, em benefício da ampla maioria da população; combater aos monopólios para o desenvolvimento com soberania e distribuição de renda; defender as conquistas trabalhistas, a redução da jornada de trabalho, o direito de greve para os servidores públicos; a Previdência Social pública, de boa qualidade, pelo fim do fator previdenciário
Defendemos também a realização de uma reforma urbana, com moradia, saneamento básico, transporte público e segurança; a construção de serviços de saúde universal e de boa qualidade; reformas na educação pública e promoção da cultura nacional-popular com caráter universal; o fim do latifúndio, limite do capital estrangeiro sobre os nossos recursos naturais e a realização de uma Reforma Agrária anti-latifundiária; a implantação de novas relações da sociedade com o meio ambiente e efetivação uma política externa de autodeterminação, solidariedade aos povos e que priorize a integração dos povos do continente latino-americano e do Caribe.
Infelizmente, os avanços do governo Lula em direção a essas bandeiras democrático-populares foram insuficientes, em em que pese o acerto de sua política externa. Também nos preocupa constatar que, no arco de alianças da candidatura de Dilma Rousseff, há forças políticas que se contrapõem a essas demandas sociais.
Porém, temos uma certeza: José Serra, por sua campanha, pelo seu governo no Estado de São Paulo e pelos oito anos de governo FHC, tornou-se o inimigo dessas bandeiras de lutas. Pelo caráter anti-democrático e anti-popular dos partidos que compõem sua aliança eleitoral e por sua personalidade autoritária, estamos convictos que uma possível vitória sua significará um retrocesso para os movimentos sociais e populares em nosso país, para as conquistas democráticas em nosso continente e uma maior subordinação ao império dos Estados Unidos. Esse retrocesso não queremos que aconteça.
Nossa posição nessa conjuntura
Assim, os movimentos sociais e a Via Campesina Brasil afirmam o seu apoio e compromisso de lutar para eleger a candidata Dilma Rousseff para o cargo de presidenta do Brasil. Queremos nos juntar aos movimentos sindicais, populares, estudantis, religiosos e progressistas para promover debates com a sociedade, desmascarar a propaganda enganosa dos neoliberais e autoritários e exigir avanços na democracia, nas políticas públicas que favoreçam a população, no combate aos corruptos e corruptores e na democratização do poder em nosso país.
Precisamos derrotar a candidatura Serra, que representa as forças direitistas e fascistas do país. Devemos seguir organizando o povo para que lute por seus direitos e mudanças sociais, mantendo sempre nossa autonomia política frente aos governos.
Conclamamos a militância de todos os movimentos sociais, os lutadores e lutadoras do povo brasileiro, para se engajarem nessa luta, que é importantíssima para a classe trabalhadora.
Vamos à luta!! Vamos eleger Dilma Rousseff presidenta do Brasil.
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sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Entidades elaboram manifesto pró-Dilma e contra “inimigos das lutas populares”
Uma contraofensiva da Via Campesina, dos movimentos populares e dos setores progressistas das igrejas católica e protestante, em favor da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, deverá ganhar as ruas na próxima semana.
O manifesto da Via Campesina, conclama a militância de todos os movimentos sociais do País a se engajarem na campanha de Dilma para "derrotar as forças direitistas e fascistas, representadas pelo candidato do PSDB, José Serra".
O outro documento, que está sendo preparado por grupos progressistas católicos e protestantes, é para se contrapor à ação de setores religiosos que, às vésperas do primeiro turno, fizeram campanha anti-Dilma e anti-PT, sob o argumento de que candidata e o partido eram "abortistas".
O líder da bancada petista na Câmara, deputado Fernando Ferro (PT-PE), considerou importante a iniciativa das entidades.
De acordo com o parlamentar, os movimentos sociais não podem se calar perante a onda de inverdades que lançada contra a candidata petista, com o intuito de enganar a população brasileira. "Uma ofensiva contra a carga de preconceito, calúnia e conservadorismo da direita facista brasileira é muito bem vinda. Eles (a direita) estão querendo dividir o País, exigindo a compatibilização da política com a religião. Este tipo de proposta não cabe em um País laico, como o Brasil", afirmou Ferro.
O documento articulado pela Via Campesina reitera sua posição de autonomia em relação ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva, cujos avanços "foram insuficientes, em que pese os acertos de sua política externa". O candidato do PSDB, José Serra, todavia, é colocado como "inimigo das bandeiras de luta populares", pela sua atuação à frente do governo paulista e pelos oito anos dos governos tucanos de Fernando Henrique Cardoso
O manifesto da Via Campesina, conclama a militância de todos os movimentos sociais do País a se engajarem na campanha de Dilma para "derrotar as forças direitistas e fascistas, representadas pelo candidato do PSDB, José Serra".
O outro documento, que está sendo preparado por grupos progressistas católicos e protestantes, é para se contrapor à ação de setores religiosos que, às vésperas do primeiro turno, fizeram campanha anti-Dilma e anti-PT, sob o argumento de que candidata e o partido eram "abortistas".
O líder da bancada petista na Câmara, deputado Fernando Ferro (PT-PE), considerou importante a iniciativa das entidades.
De acordo com o parlamentar, os movimentos sociais não podem se calar perante a onda de inverdades que lançada contra a candidata petista, com o intuito de enganar a população brasileira. "Uma ofensiva contra a carga de preconceito, calúnia e conservadorismo da direita facista brasileira é muito bem vinda. Eles (a direita) estão querendo dividir o País, exigindo a compatibilização da política com a religião. Este tipo de proposta não cabe em um País laico, como o Brasil", afirmou Ferro.
O documento articulado pela Via Campesina reitera sua posição de autonomia em relação ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva, cujos avanços "foram insuficientes, em que pese os acertos de sua política externa". O candidato do PSDB, José Serra, todavia, é colocado como "inimigo das bandeiras de luta populares", pela sua atuação à frente do governo paulista e pelos oito anos dos governos tucanos de Fernando Henrique Cardoso
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quinta-feira, 30 de setembro de 2010
A organização política dos movimentos sociais
blog luisnassif, qui, 30/09/2010 - 09:38
Coluna Econômica
São inevitáveis os paralelos entre o Brasil, de hoje, e o processo que no século 19 transformou os Estados Unidos na maior economia do planeta.
Primeiro, a criação de uma base econômica moderna, convivendo com um setor excluído da economia. Depois, a pressão do lado moderno para ampliar o mercado de consumo.
Quando se chega nesse estágio, há maiores facilidades políticas para a implementação de políticas de inclusão social. Esse movimento inclui milhões de pessoas não apenas no mercado de consumo, mas no mercado político.
Há um conflito inicial, com os setores já incluídos. Passada essa etapa, há um salto na política graças a um enorme movimento de organização social.
***
O Brasil está em pleno processo dessa explosão da organização social.
Há organizações histórias, como as irmandades religiosas, as Igrejas, clubes sociais tipo Rotary e Lyons, as Santas Casas de Misericórdia, Associações Comerciais, federações de indústrias.
Agora a organização social se espraia sobre novos setores da economia.
Recentemente os economistas Ricardo Abramovay, Reginaldo Magalhães** e Mônica Schroder prepararam um paper sobre as organizações brasileiras de agricultura familiar. O trabalho analisou a experiência da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF) e do sistema Cresol, de Crédito Solidário, conjunto de cooperativas sindicais.
***
O trabalho constata que na Europa esse tipo de abordagem territorial, em torno de associações, tem sido elemento relevante para políticas de inovação tecnológica.
Enquanto sindicatos têm uma abordagem mais setorial, organizações sociais territorializadas tendem a ampliar os laços com outros agentes locais, como universidades, sindicados, sociedade civil organizada.
Segundo o trabalho, quanto mais os grupos ganhem acesso às instituições políticas, mais a política institucionalizada substituirá o protesto, como ferramenta de participação política.
***
Jorge Castañeda define como "explosão das bases" esse aumento da participação de organizações populares na tomada de decisão em relação ao uso de recursos públicos. Mas, segundo o trabalho, ainda há dúvidas se esse tipo de organização poderia estimular os dois favores essenciais de desenvolvimento local: a aprendizagem e a inovação.
***
O ponto central reside na chamada "governança" - a capacidade de cada movimento permitir a participação de todos e a prestação de contas. Aí entra o estudo das diferenças entre a FETRAF e o sistema Cresol, sistema cooperativo com mais de 70 mil sócios.
Segundo o trabalho, o sindicalismo da FETRAF permite avanços mas restringe-se ao atendimento de demandas dos segmentos profissionais que ela representa. Já as cooperativas de crédito – oriundas das Comunidades Eclesiais de Base, assim como a FETRAF – trabalham em cima da inovação e da aprendizagem.
Nos próximos anos haverá a gradativa inclusão de todos os movimentos sociais ao jogo político. Será a graduação final da democracia brasileira
Coluna Econômica
São inevitáveis os paralelos entre o Brasil, de hoje, e o processo que no século 19 transformou os Estados Unidos na maior economia do planeta.
Primeiro, a criação de uma base econômica moderna, convivendo com um setor excluído da economia. Depois, a pressão do lado moderno para ampliar o mercado de consumo.
Quando se chega nesse estágio, há maiores facilidades políticas para a implementação de políticas de inclusão social. Esse movimento inclui milhões de pessoas não apenas no mercado de consumo, mas no mercado político.
Há um conflito inicial, com os setores já incluídos. Passada essa etapa, há um salto na política graças a um enorme movimento de organização social.
***
O Brasil está em pleno processo dessa explosão da organização social.
Há organizações histórias, como as irmandades religiosas, as Igrejas, clubes sociais tipo Rotary e Lyons, as Santas Casas de Misericórdia, Associações Comerciais, federações de indústrias.
Agora a organização social se espraia sobre novos setores da economia.
Recentemente os economistas Ricardo Abramovay, Reginaldo Magalhães** e Mônica Schroder prepararam um paper sobre as organizações brasileiras de agricultura familiar. O trabalho analisou a experiência da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF) e do sistema Cresol, de Crédito Solidário, conjunto de cooperativas sindicais.
***
O trabalho constata que na Europa esse tipo de abordagem territorial, em torno de associações, tem sido elemento relevante para políticas de inovação tecnológica.
Enquanto sindicatos têm uma abordagem mais setorial, organizações sociais territorializadas tendem a ampliar os laços com outros agentes locais, como universidades, sindicados, sociedade civil organizada.
Segundo o trabalho, quanto mais os grupos ganhem acesso às instituições políticas, mais a política institucionalizada substituirá o protesto, como ferramenta de participação política.
***
Jorge Castañeda define como "explosão das bases" esse aumento da participação de organizações populares na tomada de decisão em relação ao uso de recursos públicos. Mas, segundo o trabalho, ainda há dúvidas se esse tipo de organização poderia estimular os dois favores essenciais de desenvolvimento local: a aprendizagem e a inovação.
***
O ponto central reside na chamada "governança" - a capacidade de cada movimento permitir a participação de todos e a prestação de contas. Aí entra o estudo das diferenças entre a FETRAF e o sistema Cresol, sistema cooperativo com mais de 70 mil sócios.
Segundo o trabalho, o sindicalismo da FETRAF permite avanços mas restringe-se ao atendimento de demandas dos segmentos profissionais que ela representa. Já as cooperativas de crédito – oriundas das Comunidades Eclesiais de Base, assim como a FETRAF – trabalham em cima da inovação e da aprendizagem.
Nos próximos anos haverá a gradativa inclusão de todos os movimentos sociais ao jogo político. Será a graduação final da democracia brasileira
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Um ato em defesa da liberdade de expressão
Brizola Neto,
Do blog Tijolaço:
O discurso histórico de Lula em Campinas, no qual apontou a manipulação da grande imprensa nessas eleições e anunciou que ela seria derrotada no dia 3 de outubro, acendeu o pânico nas hostes midiáticas tradicionais.
Quase não houve jornais – e foram raros os colunistas – que não escrevessem contra o presidente, acusando-o de atentar contra a liberdade de imprensa e de não saber lidar com a crítica. As entidades patronais, como a Associação Nacional de Jornais e a Sociedade Interamericana de Imprensa, foram mobilizados para redigir notas de protesto e a oposição, naturalmente, endossou o caro para tentar tirar uma casquinha eleitoral.
O bombardeio voltou-se hoje ao ato contra o golpismo midiático, que acontece amanhã na sede do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo. Sem compromisso com a verdade, os jornais acusam o PT de organizar o protesto, como se o ato fosse produto de um partido.
A verdade que a grande mídia oculta é que esse ato reúne uma parcela representativa da socieddade, que não tolera mais as manipulações que se repetem a cada eleição. E essa parcela não é representada ou dirigida pelo PT, como tentam fazer crer os jornais e seus colunistas. Ao contrário, eles partiram da mesma internet que eles glorificam quando trata de futilidades.
O ato foi convocado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, que reúne em seu conselho consultivo 54 jornalistas, blogueiros, acadêmicos, veículos progressistas e movimentos sociais ligados à luta pela democratização da comunicação.
A grande imprensa procura disseminar o raciocínio maniqueista de que Lula coloca o povo contra a elite, que seria “formada por pessoas que perdem tempo com leituras e que por isso se julgam no direito de avaliar criticamente o desempenho dos governantes”, como escreveu o Estadão em seu editorial de ontem.
O elitismo expresso pelo Estadão é o de que só essa parcela da sociedade tem capacidade de crítica e compreensão política. O povo, os movimentos sociais, coitados, são massa de manobra.
Os organizadores do ato contra o golpismo midiático podem ser incluídos entre a elite no sentido de formação educacional e cultural e, mesmo assim, estão contra as manipulações da imprensa. E nem precisariam ter tais qualificações. Bastaria serem brasileiros indignados com o que lêem, ouvem e vêem todos os dias nos noticiários.
Mas a liberdade que defendem só tem um lado. O deles.
Os verdadeiros defensores da liberdade de imprensa e expressão são os que se manifestam nesse momento contra as baixarias da velha mídia, que chama Lula de Chávez, mas que se equipara cada vez mais a militante mídia venezuelana, que partidariza seu noticiário e se transforma na imagem reversa daquilo que critica no poder.
Porque sagrada não é a liberdade das empresas de comunicação, embora elas tenham todo o direito de existir, dentro das regras sociais conhecidas com “lei”. Sagrada é a liberdade de informação, onde cada um é uma boca, um ouvido, um olho, um voto.
Do blog Tijolaço:
O discurso histórico de Lula em Campinas, no qual apontou a manipulação da grande imprensa nessas eleições e anunciou que ela seria derrotada no dia 3 de outubro, acendeu o pânico nas hostes midiáticas tradicionais.
Quase não houve jornais – e foram raros os colunistas – que não escrevessem contra o presidente, acusando-o de atentar contra a liberdade de imprensa e de não saber lidar com a crítica. As entidades patronais, como a Associação Nacional de Jornais e a Sociedade Interamericana de Imprensa, foram mobilizados para redigir notas de protesto e a oposição, naturalmente, endossou o caro para tentar tirar uma casquinha eleitoral.
O bombardeio voltou-se hoje ao ato contra o golpismo midiático, que acontece amanhã na sede do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo. Sem compromisso com a verdade, os jornais acusam o PT de organizar o protesto, como se o ato fosse produto de um partido.
A verdade que a grande mídia oculta é que esse ato reúne uma parcela representativa da socieddade, que não tolera mais as manipulações que se repetem a cada eleição. E essa parcela não é representada ou dirigida pelo PT, como tentam fazer crer os jornais e seus colunistas. Ao contrário, eles partiram da mesma internet que eles glorificam quando trata de futilidades.
O ato foi convocado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, que reúne em seu conselho consultivo 54 jornalistas, blogueiros, acadêmicos, veículos progressistas e movimentos sociais ligados à luta pela democratização da comunicação.
A grande imprensa procura disseminar o raciocínio maniqueista de que Lula coloca o povo contra a elite, que seria “formada por pessoas que perdem tempo com leituras e que por isso se julgam no direito de avaliar criticamente o desempenho dos governantes”, como escreveu o Estadão em seu editorial de ontem.
O elitismo expresso pelo Estadão é o de que só essa parcela da sociedade tem capacidade de crítica e compreensão política. O povo, os movimentos sociais, coitados, são massa de manobra.
Os organizadores do ato contra o golpismo midiático podem ser incluídos entre a elite no sentido de formação educacional e cultural e, mesmo assim, estão contra as manipulações da imprensa. E nem precisariam ter tais qualificações. Bastaria serem brasileiros indignados com o que lêem, ouvem e vêem todos os dias nos noticiários.
Mas a liberdade que defendem só tem um lado. O deles.
Os verdadeiros defensores da liberdade de imprensa e expressão são os que se manifestam nesse momento contra as baixarias da velha mídia, que chama Lula de Chávez, mas que se equipara cada vez mais a militante mídia venezuelana, que partidariza seu noticiário e se transforma na imagem reversa daquilo que critica no poder.
Porque sagrada não é a liberdade das empresas de comunicação, embora elas tenham todo o direito de existir, dentro das regras sociais conhecidas com “lei”. Sagrada é a liberdade de informação, onde cada um é uma boca, um ouvido, um olho, um voto.
sexta-feira, 17 de julho de 2009
LULA SE EMOCIONA AO FALAR DO BOLSA-FAMÍLIA
Bolsa Família só não tem valor para
quem pode dar gorjeta de R$ 50, diz Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que programas como o Bolsa Família não têm valor para ele, que pode dar R$ 50 de gorjeta, mas são uma "revolução" para quem precisa.
A afirmação foi feita durante discurso no 51º Congresso da UNE (União Nacional de Estudantes). Antes da chegada do presidente, a plateia se dividia entre apoiar a candidatura presidencial da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e a do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), que não compareceu. Dilma acompanhou Lula.
No início do discurso, o presidente foi interrompido: "Lula, guerreiro do povo brasileiro." Feito silêncio, criticou os que condenam os programas do governo.
"Diziam que era populismo, assistencialismo. Pode ser, porque não passa de dar assistência a uma pessoa. Mas para mim, que posso tomar cerveja num boteco e dar R$ 50 de gorjeta, não tem nenhum valor, mas imagina para uma mãe pobre. Quem nasceu sem precisar não sente, mas quem nunca teve isso e tem acesso é tanto quanto uma revolução".
Ao falar do Luz para Todos, o presidente se emocionou e interrompeu o discurso para beber água. Ele também citou o Prouni, o fim do vestibular e a ampliação do número de universidades públicas e escolas técnicas.
Após o encontro, os participantes do congresso fizeram uma manifestação em defesa da Petrobras, uma das patrocinadoras do evento. De acordo com a organização, cerca de 10 mil participaram do ato. Ao chegar à sede da estatal, o movimento sofreu uma dissidência, principalmente de pessoas ligadas ao PSOL, que usavam camisetas com a inscrição "fora Sarney".
quem pode dar gorjeta de R$ 50, diz Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que programas como o Bolsa Família não têm valor para ele, que pode dar R$ 50 de gorjeta, mas são uma "revolução" para quem precisa.
A afirmação foi feita durante discurso no 51º Congresso da UNE (União Nacional de Estudantes). Antes da chegada do presidente, a plateia se dividia entre apoiar a candidatura presidencial da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e a do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), que não compareceu. Dilma acompanhou Lula.
No início do discurso, o presidente foi interrompido: "Lula, guerreiro do povo brasileiro." Feito silêncio, criticou os que condenam os programas do governo.
"Diziam que era populismo, assistencialismo. Pode ser, porque não passa de dar assistência a uma pessoa. Mas para mim, que posso tomar cerveja num boteco e dar R$ 50 de gorjeta, não tem nenhum valor, mas imagina para uma mãe pobre. Quem nasceu sem precisar não sente, mas quem nunca teve isso e tem acesso é tanto quanto uma revolução".
Ao falar do Luz para Todos, o presidente se emocionou e interrompeu o discurso para beber água. Ele também citou o Prouni, o fim do vestibular e a ampliação do número de universidades públicas e escolas técnicas.
Após o encontro, os participantes do congresso fizeram uma manifestação em defesa da Petrobras, uma das patrocinadoras do evento. De acordo com a organização, cerca de 10 mil participaram do ato. Ao chegar à sede da estatal, o movimento sofreu uma dissidência, principalmente de pessoas ligadas ao PSOL, que usavam camisetas com a inscrição "fora Sarney".
quinta-feira, 9 de julho de 2009
A IMPRENSA É FOLHETINESCA, DETETIVESCA, GUILHOTINESCA!?
Os jornalistas "estenderam sobre a sociedade uma teia assombrosa que absorve denúncias vindas de fontes anônimas, lembrando os comitês de salvação pública da Revolução Francesa que alimentaram de sangue a guilhotina nos anos do terror."
O artigo de hoje na Folha de São Paulo do escritor Carlos Heitor Cony corajosamente expõe a força descomunal da imprensa no Brasil. Confessa que vários segmentos sociais sentem desconforto (certamente um eufemismo) em relação à atuação detetivesca da grande mídia que lembra "1984", de Orwel.
FOLHETINESCA, DETETIVESCA, GUILHOTINESCA
CARLOS HEITOR CONY
Eu, pecador, me confesso
RIO DE JANEIRO - Antes, no melhor das festas, se alguém duvidasse, a imprensa já era tida como quarto poder, uma instituição que exercia um poder paralelo. Na verdade, não é um poder, mas uma força. Com as novas técnicas de comunicação e com a sacralidade das fontes, ela se transformou no escoadouro dos descontentamentos (lícitos ou não), dos ressentimentos (pessoais ou grupais), das pressões e compressões de uma sociedade heterogênea que inclui desde índios e menores inimputáveis até políticos e empresários que podem roubar.
Esse caldo em ebulição seria a matéria que justificaria a existência e a expressão do Estado que, no caso brasileiro, antecedeu a Nação.
Abriu-se um vácuo e, nele, a força da comunicação encontrou o seu espaço. E o fez com exuberante boa vontade. Não é a vida nacional que pauta a imprensa. É a imprensa que pauta a vida nacional, através de seus órgãos mais excitáveis.
Dá a régua e o compasso. A classe política empacou, ataca e se defende a esmo, desarticuladamente, de acordo com a direção e a intensidade dos petardos que recebe.
Mas quem acusa a imprensa? Quem se atreve a mostrar e demonstrar que o gigante também tem, como todos os gigantes, os seus pés de barro? Há desconforto em todas as classes, juízes, militares, empresários e policiais em relação aos jornalistas. Eles se transformaram em detetives, em esmiuçadores de contas de luz e telefone, de depósitos bancários, declarações de Imposto de Renda, despesas nos postos de gasolina e nas agências dos Correios.
Estenderam sobre a sociedade uma teia assombrosa que absorve denúncias vindas de fontes anônimas, lembrando os comitês de salvação pública da Revolução Francesa que alimentaram de sangue a guilhotina nos anos do terror.
(ACHO QUE O CONY SÓ ESQUECEU DE CITAR OS MAIS PREJUDICADOS PELA GRANDE MÍDIA, OS MOVIMENTOS SOCIAIS E POPULARES COMO O MST, POR EXEMPLO, SINDICATOS,PARTIDOS POLÍTICOS QUE NÃO ACEITAM A PAUTA SELETIVA DESSA MÍDIA DITA GOLPISTA).
O artigo de hoje na Folha de São Paulo do escritor Carlos Heitor Cony corajosamente expõe a força descomunal da imprensa no Brasil. Confessa que vários segmentos sociais sentem desconforto (certamente um eufemismo) em relação à atuação detetivesca da grande mídia que lembra "1984", de Orwel.
FOLHETINESCA, DETETIVESCA, GUILHOTINESCA
CARLOS HEITOR CONY
Eu, pecador, me confesso
RIO DE JANEIRO - Antes, no melhor das festas, se alguém duvidasse, a imprensa já era tida como quarto poder, uma instituição que exercia um poder paralelo. Na verdade, não é um poder, mas uma força. Com as novas técnicas de comunicação e com a sacralidade das fontes, ela se transformou no escoadouro dos descontentamentos (lícitos ou não), dos ressentimentos (pessoais ou grupais), das pressões e compressões de uma sociedade heterogênea que inclui desde índios e menores inimputáveis até políticos e empresários que podem roubar.
Esse caldo em ebulição seria a matéria que justificaria a existência e a expressão do Estado que, no caso brasileiro, antecedeu a Nação.
Abriu-se um vácuo e, nele, a força da comunicação encontrou o seu espaço. E o fez com exuberante boa vontade. Não é a vida nacional que pauta a imprensa. É a imprensa que pauta a vida nacional, através de seus órgãos mais excitáveis.
Dá a régua e o compasso. A classe política empacou, ataca e se defende a esmo, desarticuladamente, de acordo com a direção e a intensidade dos petardos que recebe.
Mas quem acusa a imprensa? Quem se atreve a mostrar e demonstrar que o gigante também tem, como todos os gigantes, os seus pés de barro? Há desconforto em todas as classes, juízes, militares, empresários e policiais em relação aos jornalistas. Eles se transformaram em detetives, em esmiuçadores de contas de luz e telefone, de depósitos bancários, declarações de Imposto de Renda, despesas nos postos de gasolina e nas agências dos Correios.
Estenderam sobre a sociedade uma teia assombrosa que absorve denúncias vindas de fontes anônimas, lembrando os comitês de salvação pública da Revolução Francesa que alimentaram de sangue a guilhotina nos anos do terror.
(ACHO QUE O CONY SÓ ESQUECEU DE CITAR OS MAIS PREJUDICADOS PELA GRANDE MÍDIA, OS MOVIMENTOS SOCIAIS E POPULARES COMO O MST, POR EXEMPLO, SINDICATOS,PARTIDOS POLÍTICOS QUE NÃO ACEITAM A PAUTA SELETIVA DESSA MÍDIA DITA GOLPISTA).
segunda-feira, 6 de julho de 2009
ERA DA REALIDADE OCULTA
É o ocultamento da realidade que permite a fixação da ordem existente, consagrando o Brasil como modelo da desigualdade e das injustiças sociais, diz o sociólogo Zander Navarro, da UFRS.
Para ele, a reinação do autoengano, da ingenuidade subcapitalista e do irracionalismo religioso, faz com que o pensamento mágico prospera em todos os poros de nossa sociedade.
Os governantes e nossas elites incentivam como podem a ampliação dessa sociabilidade ilusória.
Conclusão: acho que o pensamento e o senso crítico foram domesticados.
Navarro diz que os sociólogos "se refugiaram no comodismo das universidades públicas e se conformaram à domesticação de seu papel crítico? Por que se confinam, cada vez mais, aos estudos hiperespecializados, ao hermetismo narcísico ou à produção estéril que se repete em guetos de autoexaltação?"
(Há muitos doutores e poucos pensadores? Darcy Ribeiro, para muitos desses doutores, nem conta nas suas teses).
Na tradição de "A Imaginação Sociológica", de Wright Mills, é urgente a recuperação da capacidade analítica da sociologia, confrontando todas as formas de poder, de dominação e de produção das hierarquias com as suas manifestações na ordem social, diz o professor.
Para ele, a reinação do autoengano, da ingenuidade subcapitalista e do irracionalismo religioso, faz com que o pensamento mágico prospera em todos os poros de nossa sociedade.
Os governantes e nossas elites incentivam como podem a ampliação dessa sociabilidade ilusória.
Conclusão: acho que o pensamento e o senso crítico foram domesticados.
Navarro diz que os sociólogos "se refugiaram no comodismo das universidades públicas e se conformaram à domesticação de seu papel crítico? Por que se confinam, cada vez mais, aos estudos hiperespecializados, ao hermetismo narcísico ou à produção estéril que se repete em guetos de autoexaltação?"
(Há muitos doutores e poucos pensadores? Darcy Ribeiro, para muitos desses doutores, nem conta nas suas teses).
Na tradição de "A Imaginação Sociológica", de Wright Mills, é urgente a recuperação da capacidade analítica da sociologia, confrontando todas as formas de poder, de dominação e de produção das hierarquias com as suas manifestações na ordem social, diz o professor.
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quarta-feira, 17 de junho de 2009
DISCIPLINA, SOLIDARIEDADE E VONTADE POLÍTICA, ALGUNS DOS MAIORES PROBLEMAS DA EDUCAÇÃO
Os professores brasileiros são os que mais desperdiçam com outras atividades o tempo que deveria ser dedicado ao ensino. No período em que deveriam estar dando aula, eles cumprem tarefas administrativas (como lista de chamada e reuniões) ou tentam manter a disciplina em sala de aula (em consequência do mau comportamento dos alunos), segundo a conclusão de um dos mais detalhados estudos comparativos sobre as condições de trabalho de professores de 5ª a 8ª séries de 23 países, divulgado ontem pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A pesquisa foi feita em 2007 e 2008, publicado pela Folha.
O professor sabe que muito do tempo dele é roubado por tarefas que não deveriam ser dele.
Precisa muitas vezes fazer a função de psicólogo, pai ou assistente social, já que todos os problemas sociais acabam convergindo para a escola.
Resolve questões que deveriam ser de responsabilidade de outros profissionais.
Perde tempo falando de outros assuntos, em vez de tratar do conteúdo daquela disciplina.
Problema é mundial
O relatório da OCDE mostra que a maioria (71%, maior percentual registrado) dos professores brasileiros começou a dar aulas sem ter passado por um processo de adaptação ou monitoria. A média dos países nesse quesito é de 25%.
Os brasileiros também são dos que mais afirmam (84%) que gostariam de participar de cursos de desenvolvimento profissional. Esse percentual só é maior no México (85%).
As informações foram colhidas em questionários respondidos por diretores e professores de escolas (públicas e privadas) selecionadas por amostra. No Brasil, 5.687 professores responderam ao questionário, aplicado em 2007 e 2008.
Poucos professores passam por um processo de adaptação.
O Secretário da Educação tem que preencher logo as vagas após um concurso para não deixar alunos sem aula. É como trocar o pneu do carro em movimento, quando o ideal seria ter um tempo para preparar melhor o profissional que começará a dar aulas, dizem
os professores.
Esse problema se agrava com a constatação na pesquisa de que os professores brasileiros trabalham com turmas com número de alunos (32, muitas salas começam o ano com 50 alunos ou mais!!!) acima da média (24). Apenas no México, na Malásia e na Coreia do Sul essa relação é maior.
Eles também têm menos experiência em sala de aula do que a média -só 19% dão aula há mais de 20 anos; a média de todas as nações comparadas é 36%. Estão abaixo da média (89,6%) ainda no nível de satisfação com o trabalho: 84,7%, o quarto menor índice.
Diretores
A pesquisa investigou a visão dos diretores sobre problemas que afetam o aprendizado. O Brasil fica acima da média em questões como absenteísmo de docentes, atrasos e falta de formação pedagógica adequada.
VANDALISMO E VIOLÊNCIA
Também foram listados problemas relacionados a alunos, como vandalismo, agressões ou trapaças no momento da prova.
A indisciplina se mostrou um problema mundial. Na média dos países, 60% dos diretores afirmaram ter, em alguma medida, distúrbios em sala de aula provocados pelo problema.
O México tem o maior percentual (72%); o Brasil tem exatamente o índice da média.
ONDE A AUTONOMIA?
Diretores brasileiros foram dos que mais relataram ter pouca ou nenhuma autonomia para contratar, demitir ou promover professores por seu desempenho em sala de aula. No Brasil, só 27% disseram que podem escolher os professores. A média dos países é de 68%.
GEOMETGRIA DISCIPLINAR
Há colégios que mantém uma geometria própia (Foucaultiana?) para evitar a indisciplina e aqueles alunos bagunceiros da "turma do fundão".
Com média de 30 alunos (ao contrário da maioria com quase 50), são largas e mais compridas do que profundas e têm três fileiras de carteiras.
Também não há lugar fixo. Um rodízio é promovido periodicamente para mudar a posição dos estudantes, que acompanham as aulas sempre em pares e estão à distância de poucos palmos dos professores.
Com essas medidas, raramente há expulsão administrativa entre os alunos.
As famílias são convocadas para conversas individuais com a direção da escola. Alunos e pais assinam uma carta-compromisso e fszem matrícula condicionada ao bom comportamento.
"Mantenho a ordem fazendo com que o aluno participe da aula, criando situações em que ele pode ser chamado a qualquer momento", dizem os professores.
E essa participação entra no sistema de avaliação dos alunos. Além das notas em prova, eles recebem nota por bom comportamento, pontualidade e relações interpessoais.
NA SALA COM MAIS DE 30 ALUNOS
PROFESSOR PERDE VINTE MINUTOS
Trabalhos diários que valem nota, diálogo, gritos -cada professor adota sua própria estratégia para conter a indisciplina diária.
As advertências adotadas como única forma de "punir" os alunos bagunceiros, na prática, não surtem efeito.
Seja qual for a tática adotada, para organizar os 36 alunos por turma, em média, e poder começar a matéria do dia, os educadores perdem de 15 a 20 minutos - a aula dura 50.
Entre outras razões, há três principais:
1) alto número de alunos por turma;
2) ausência de perspectiva de ascensão social dos alunos por meio do estudo;
3) falta de acompanhamento, pelos pais, do desempenho dos filhos.
O professor sabe que o primeiro passo é educar os pais dos adolescentes. "Se as mães choram dizendo não saber o que fazer com seus filhos, o que esperar desses jovens?" (e dos professores?!!!)
A participação da família é considerada importante.
Quando isso ocorre, os pais participam. os alunos são educados - bem comportados - também, prestam atenção e se esforçam.
Quando os pais e a comunidade participam,ativamente, do cotidiano da escola, o resultado positivo é visível."
COM APOIO E SOLIDARIEDADE, TUDO MUDA
POR pouco -quatro meses de atraso na mensalidade- que Wilson Ranieri não abandonou os estudos de moda na faculdade. Isso significa que ele não seria o único estilista negro a apresentar suas criações na SPFW (São Paulo Fashion Week).
Professores e colegas se comoveram e fizeram uma "vaquinha" para ajudá-lo a saldar a dívida. "Estava disposto a desistir, não tinha a quem pedir ajuda." Diante dos apelos, a direção da escola concordou que ele assinasse uma promissória facilitando o pagamento. "Naquela época, eu nem mesmo tinha clareza se queria fazer carreira na moda."
Neste ano, pela primeira vez, a questão de raça entrou nos desfiles, após o Ministério Público pedir que uma cota de modelos fosse negra, segundo revela o colunista Gilberto Dimmenstein.
PROUNI, O GRANDE E COMOVENTE EXEMPLO
Pode-se criticar o jornalista Elio Gaspari por vários motivos, mas o seu texto na Folha de hoje sobre o Prouni é comovente e um exemplo de como as coisas podem mudar para melhor se os eternos privilegiados da chamada elite brasileira deixarem seus preconceitos de lado e abrirem a guarda e permitirem (sem obstaculizar politicamente)que a maioria da população participe da vida da sociedade.
Leia o texto:
A cota de sucesso da turma do ProUni
Os pobres que entraram nas universidades
privadas deram uma aula aos demófobos do andar de cima
A DEMOFOBIA pedagógica perdeu mais uma para a teimosa insubordinação dos jovens pobres e negros. Ao longo dos últimos anos o elitismo convencional ensinou que, se um sistema de cotas levasse estudantes negros para as universidades públicas, eles não seriam capazes de acompanhar as aulas e acabariam fugindo das escolas. Lorota.
Cinco anos de vigência das cotas na UFRJ e na Federal da Bahia ensinaram que os cotistas conseguem um desempenho médio equivalente ao dos demais estudantes, com menor taxa de evasão. Quando Nosso Guia criou o ProUni, abrindo o sistema de bolsas em faculdades privadas para jovens de baixa renda (põe baixa nisso, 1,5 salário mínimo per capita de renda familiar para a bolsa integral), com cotas para negros, foi acusado de nivelar por baixo o acesso ao ensino superior.
De novo, especulou-se que os pobres, por serem pobres, teriam dificuldade para se manter nas escolas.
Os repórteres Denise Menchen e Antonio Gois contaram que, pela segunda vez em dois anos, o desempenho dos bolsistas do ProUni ficou acima da média dos demais estudantes que prestaram o Provão. Em 2004, os beneficiados foram cerca de 130 mil jovens que dificilmente chegariam ao ensino superior (45% dos bolsistas do ProUni são afrodescendentes, ou descendentes de escravos, para quem não gosta da expressão).
O DEM (ex-PFL) e a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino foram ao Supremo Tribunal Federal, arguindo a inconstitucionalidade dos mecanismos do ProUni.
Sustentam que a preferência pelos estudantes pobres e as cotas para negros (igualmente pobres) ofendiam a noção segundo a qual todos são iguais perante a lei.
O caso ainda não foi julgado pelo tribunal, mas já foi relatado pelo ministro Carlos Ayres Britto, em voto memorável. Ele lembrou um trecho da Oração aos Moços de Rui Barbosa: "Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real".
A "Oração aos Moços" é de 1921, quando Rui já prevalecera com sua contribuição abolicionista. A discussão em torno do sistema de acesso dos afrodescendentes às universidades teve a virtude de chamar a atenção para o passado e para a esplêndida produção historiográfica sobre a situação do negro brasileiro no final do século 19.
Acaba de sair um livro exemplar dessa qualidade, é "O jogo da Dissimulação - Abolição e Cidadania Negra no Brasil", da professora Wlamyra de Albuquerque, da Federal da Bahia. Ela mostra o que foi o peso da cor. Dezesseis negros africanos que chegaram à Bahia em 1877 para comerciar foram deportados, apesar de serem súditos britânicos. Negros ingleses negros eram, e o Brasil não seria o lugar deles.
A professora Albuquerque transcreve em seu livro uma carta de escravos libertos endereçada a Rui Barbosa em 1889, um ano depois da Abolição. Nela havia um pleito, que demorou para começar a ser atendido, mas que o DEM e os donos de faculdades ainda lutam para derrubar:
"Nossos filhos jazem imersos em profundas trevas. É preciso esclarecê-los e guiá-los por meio da instrução".
A comissão pedia o cumprimento de uma lei de 1871 que prometia educação para os libertos.
Mais de cem anos depois, iniciativas como o ProUni mostraram não só que isso era possível mas que, surgindo a oportunidade, a garotada faria bonito.
A ESTRUTURA VERTICAL DA UNIVERSIDADE
"Estou aqui por uma simples razão: para fazer um protesto veemente contra a intervenção da força policial no campus universitário. [Isso] é um atentado aos direitos mais sagrados que as pessoas têm de discutir, debater e agir sem nenhuma pressão do poder público."
Foi assim que Antonio Candido, 90, um dos mais importantes críticos literários do país e professor emérito da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP começou seu discurso ontem, em um ato de repúdio à repressão na universidade por causa da greve na entidade.
"Não basta propormos como palavra de ordem "Diretas Já'", afirmou a professora Marilena Chaui. "Não é só a escolha de um reitor que vai fazer a diferença. Temos que pensar a maneira pela qual vamos
desestruturar essa estrutura vertical e centralizada que a USP se tornou", disse.
O professor sabe que muito do tempo dele é roubado por tarefas que não deveriam ser dele.
Precisa muitas vezes fazer a função de psicólogo, pai ou assistente social, já que todos os problemas sociais acabam convergindo para a escola.
Resolve questões que deveriam ser de responsabilidade de outros profissionais.
Perde tempo falando de outros assuntos, em vez de tratar do conteúdo daquela disciplina.
Problema é mundial
O relatório da OCDE mostra que a maioria (71%, maior percentual registrado) dos professores brasileiros começou a dar aulas sem ter passado por um processo de adaptação ou monitoria. A média dos países nesse quesito é de 25%.
Os brasileiros também são dos que mais afirmam (84%) que gostariam de participar de cursos de desenvolvimento profissional. Esse percentual só é maior no México (85%).
As informações foram colhidas em questionários respondidos por diretores e professores de escolas (públicas e privadas) selecionadas por amostra. No Brasil, 5.687 professores responderam ao questionário, aplicado em 2007 e 2008.
Poucos professores passam por um processo de adaptação.
O Secretário da Educação tem que preencher logo as vagas após um concurso para não deixar alunos sem aula. É como trocar o pneu do carro em movimento, quando o ideal seria ter um tempo para preparar melhor o profissional que começará a dar aulas, dizem
os professores.
Esse problema se agrava com a constatação na pesquisa de que os professores brasileiros trabalham com turmas com número de alunos (32, muitas salas começam o ano com 50 alunos ou mais!!!) acima da média (24). Apenas no México, na Malásia e na Coreia do Sul essa relação é maior.
Eles também têm menos experiência em sala de aula do que a média -só 19% dão aula há mais de 20 anos; a média de todas as nações comparadas é 36%. Estão abaixo da média (89,6%) ainda no nível de satisfação com o trabalho: 84,7%, o quarto menor índice.
Diretores
A pesquisa investigou a visão dos diretores sobre problemas que afetam o aprendizado. O Brasil fica acima da média em questões como absenteísmo de docentes, atrasos e falta de formação pedagógica adequada.
VANDALISMO E VIOLÊNCIA
Também foram listados problemas relacionados a alunos, como vandalismo, agressões ou trapaças no momento da prova.
A indisciplina se mostrou um problema mundial. Na média dos países, 60% dos diretores afirmaram ter, em alguma medida, distúrbios em sala de aula provocados pelo problema.
O México tem o maior percentual (72%); o Brasil tem exatamente o índice da média.
ONDE A AUTONOMIA?
Diretores brasileiros foram dos que mais relataram ter pouca ou nenhuma autonomia para contratar, demitir ou promover professores por seu desempenho em sala de aula. No Brasil, só 27% disseram que podem escolher os professores. A média dos países é de 68%.
GEOMETGRIA DISCIPLINAR
Há colégios que mantém uma geometria própia (Foucaultiana?) para evitar a indisciplina e aqueles alunos bagunceiros da "turma do fundão".
Com média de 30 alunos (ao contrário da maioria com quase 50), são largas e mais compridas do que profundas e têm três fileiras de carteiras.
Também não há lugar fixo. Um rodízio é promovido periodicamente para mudar a posição dos estudantes, que acompanham as aulas sempre em pares e estão à distância de poucos palmos dos professores.
Com essas medidas, raramente há expulsão administrativa entre os alunos.
As famílias são convocadas para conversas individuais com a direção da escola. Alunos e pais assinam uma carta-compromisso e fszem matrícula condicionada ao bom comportamento.
"Mantenho a ordem fazendo com que o aluno participe da aula, criando situações em que ele pode ser chamado a qualquer momento", dizem os professores.
E essa participação entra no sistema de avaliação dos alunos. Além das notas em prova, eles recebem nota por bom comportamento, pontualidade e relações interpessoais.
NA SALA COM MAIS DE 30 ALUNOS
PROFESSOR PERDE VINTE MINUTOS
Trabalhos diários que valem nota, diálogo, gritos -cada professor adota sua própria estratégia para conter a indisciplina diária.
As advertências adotadas como única forma de "punir" os alunos bagunceiros, na prática, não surtem efeito.
Seja qual for a tática adotada, para organizar os 36 alunos por turma, em média, e poder começar a matéria do dia, os educadores perdem de 15 a 20 minutos - a aula dura 50.
Entre outras razões, há três principais:
1) alto número de alunos por turma;
2) ausência de perspectiva de ascensão social dos alunos por meio do estudo;
3) falta de acompanhamento, pelos pais, do desempenho dos filhos.
O professor sabe que o primeiro passo é educar os pais dos adolescentes. "Se as mães choram dizendo não saber o que fazer com seus filhos, o que esperar desses jovens?" (e dos professores?!!!)
A participação da família é considerada importante.
Quando isso ocorre, os pais participam. os alunos são educados - bem comportados - também, prestam atenção e se esforçam.
Quando os pais e a comunidade participam,ativamente, do cotidiano da escola, o resultado positivo é visível."
COM APOIO E SOLIDARIEDADE, TUDO MUDA
POR pouco -quatro meses de atraso na mensalidade- que Wilson Ranieri não abandonou os estudos de moda na faculdade. Isso significa que ele não seria o único estilista negro a apresentar suas criações na SPFW (São Paulo Fashion Week).
Professores e colegas se comoveram e fizeram uma "vaquinha" para ajudá-lo a saldar a dívida. "Estava disposto a desistir, não tinha a quem pedir ajuda." Diante dos apelos, a direção da escola concordou que ele assinasse uma promissória facilitando o pagamento. "Naquela época, eu nem mesmo tinha clareza se queria fazer carreira na moda."
Neste ano, pela primeira vez, a questão de raça entrou nos desfiles, após o Ministério Público pedir que uma cota de modelos fosse negra, segundo revela o colunista Gilberto Dimmenstein.
PROUNI, O GRANDE E COMOVENTE EXEMPLO
Pode-se criticar o jornalista Elio Gaspari por vários motivos, mas o seu texto na Folha de hoje sobre o Prouni é comovente e um exemplo de como as coisas podem mudar para melhor se os eternos privilegiados da chamada elite brasileira deixarem seus preconceitos de lado e abrirem a guarda e permitirem (sem obstaculizar politicamente)que a maioria da população participe da vida da sociedade.
Leia o texto:
A cota de sucesso da turma do ProUni
Os pobres que entraram nas universidades
privadas deram uma aula aos demófobos do andar de cima
A DEMOFOBIA pedagógica perdeu mais uma para a teimosa insubordinação dos jovens pobres e negros. Ao longo dos últimos anos o elitismo convencional ensinou que, se um sistema de cotas levasse estudantes negros para as universidades públicas, eles não seriam capazes de acompanhar as aulas e acabariam fugindo das escolas. Lorota.
Cinco anos de vigência das cotas na UFRJ e na Federal da Bahia ensinaram que os cotistas conseguem um desempenho médio equivalente ao dos demais estudantes, com menor taxa de evasão. Quando Nosso Guia criou o ProUni, abrindo o sistema de bolsas em faculdades privadas para jovens de baixa renda (põe baixa nisso, 1,5 salário mínimo per capita de renda familiar para a bolsa integral), com cotas para negros, foi acusado de nivelar por baixo o acesso ao ensino superior.
De novo, especulou-se que os pobres, por serem pobres, teriam dificuldade para se manter nas escolas.
Os repórteres Denise Menchen e Antonio Gois contaram que, pela segunda vez em dois anos, o desempenho dos bolsistas do ProUni ficou acima da média dos demais estudantes que prestaram o Provão. Em 2004, os beneficiados foram cerca de 130 mil jovens que dificilmente chegariam ao ensino superior (45% dos bolsistas do ProUni são afrodescendentes, ou descendentes de escravos, para quem não gosta da expressão).
O DEM (ex-PFL) e a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino foram ao Supremo Tribunal Federal, arguindo a inconstitucionalidade dos mecanismos do ProUni.
Sustentam que a preferência pelos estudantes pobres e as cotas para negros (igualmente pobres) ofendiam a noção segundo a qual todos são iguais perante a lei.
O caso ainda não foi julgado pelo tribunal, mas já foi relatado pelo ministro Carlos Ayres Britto, em voto memorável. Ele lembrou um trecho da Oração aos Moços de Rui Barbosa: "Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real".
A "Oração aos Moços" é de 1921, quando Rui já prevalecera com sua contribuição abolicionista. A discussão em torno do sistema de acesso dos afrodescendentes às universidades teve a virtude de chamar a atenção para o passado e para a esplêndida produção historiográfica sobre a situação do negro brasileiro no final do século 19.
Acaba de sair um livro exemplar dessa qualidade, é "O jogo da Dissimulação - Abolição e Cidadania Negra no Brasil", da professora Wlamyra de Albuquerque, da Federal da Bahia. Ela mostra o que foi o peso da cor. Dezesseis negros africanos que chegaram à Bahia em 1877 para comerciar foram deportados, apesar de serem súditos britânicos. Negros ingleses negros eram, e o Brasil não seria o lugar deles.
A professora Albuquerque transcreve em seu livro uma carta de escravos libertos endereçada a Rui Barbosa em 1889, um ano depois da Abolição. Nela havia um pleito, que demorou para começar a ser atendido, mas que o DEM e os donos de faculdades ainda lutam para derrubar:
"Nossos filhos jazem imersos em profundas trevas. É preciso esclarecê-los e guiá-los por meio da instrução".
A comissão pedia o cumprimento de uma lei de 1871 que prometia educação para os libertos.
Mais de cem anos depois, iniciativas como o ProUni mostraram não só que isso era possível mas que, surgindo a oportunidade, a garotada faria bonito.
A ESTRUTURA VERTICAL DA UNIVERSIDADE
"Estou aqui por uma simples razão: para fazer um protesto veemente contra a intervenção da força policial no campus universitário. [Isso] é um atentado aos direitos mais sagrados que as pessoas têm de discutir, debater e agir sem nenhuma pressão do poder público."
Foi assim que Antonio Candido, 90, um dos mais importantes críticos literários do país e professor emérito da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP começou seu discurso ontem, em um ato de repúdio à repressão na universidade por causa da greve na entidade.
"Não basta propormos como palavra de ordem "Diretas Já'", afirmou a professora Marilena Chaui. "Não é só a escolha de um reitor que vai fazer a diferença. Temos que pensar a maneira pela qual vamos
desestruturar essa estrutura vertical e centralizada que a USP se tornou", disse.
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