sábado, 29 de agosto de 2020

SÓ FRE MIA QUEM TINHA MEDO DA PANDEMIA?

vendo tudo / ninguém acredita

NESSE COCE, COCE,É TOSSE OU EJACULAÇÃO PRECOCE!!!

MANUAL POÉTICO: NÃO SUPRIMA O RITMO POR CAUSA DE UMA RIMA CUIDADO COM A OBRA-PRIMA

APONTE O DEDO OU DIGA BY BY QUEM TEM MEDO DO STEPHEN FRY

SE ME DIFAMARES E ME CHAMARES DE DAMARES JURO POR DEUS VOU PROS PALMARES

NÃO SE REPRIMA E NEM COMA SUA PRIMA CUIDADO COM A OBRA,PRIMA!

QUE MAL PERGUNTE SEU BESTUNTO, QUANDO SUA BOSTA DE RESPOSTA SERÁ BOA?

NUM MUNDO DE INIQUIDADES O QUE FICA SÃO IMPUNIDADES

disse de bobéia pra irma la douce : quero ser o mousse dessa sua geléia

dia do canhoto: aqui em casa tb somos maioria - eu, o meu ego e o superego, fora os heterônimos e o escambau

ex fingem que nada sentem

NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA PEDRA : QUEM NÃO SE FLAGRA QUE ESSA NAU FRAGA!?

NINGUÉM TEM IDEIA DE QUE A PATULÉIA NÃO TÁ SÓ DE BOBÉIA

CONCORDE, NÃO SE REMORDA, ACORDE (ABAIXO O RESSENTIMENTO)

a imprensa é muito séria, se vc pagar eles publicam a verdade(juca chaves)imagine qto pagaram à grande mídia pra quebrar o país.

o que é o que é: se calo, escuto o chicotear na noite. se falo,quebro o encanto do vazio celestial.

o que existe entre dois sons musicais?

o poeta é como um pássaro que observa as ruínas e lança vôo às cores divinas

OS POETAS ESTÃO ENCERRADOS EM SUAS CASAS, ISOLADOS, COMO OS SEUS RAROS LEITORES

gregor samsa acordou e disse que ia viver a partir de agora além da metanormose

os da bufunfa dizem com empáfia : não corremos risco, ganhamos tudo com muitos juros e espoliação, sem reclamação!!!!

é dose:além de asfódelos, agora as flordelis

o bolsignaro fodeu com o povo no campo dos asfódelos(hades, na mitologia)

e o michê que ninguém falou? (michê é quantia paga a quem se prostitui por bem menos do que 89 mil)

o poeta se equilibra na dança caosgósmica da geléia geral

quando crescer vou navegar em mares nunca dantes navegados

minha cara perereca por que me fizeste envergonhar por tão mesquinha merreca(89 milhões em ação?) c/ particip.de lourival reis

cara perereca por que me fizeste passar tanta vergonha por essa mesquinha merreca de 89 milhões?

o poeta não é suicida - é a vida que é fodida

NADA NO MAR DE TUBARÕES?

VI VENDO E APRENDENDO

TEMPO PANDEMINIÔNICO ESSE (pandemia,bolsomínons e pandemônio): FAZ PARECER O INFERNO DE DANTE UM PLAYGROUND

A CORTESÃ: "QUE COR TESÃO: 89 MILHÃO!!!!"

CURTA TUDO O QUE PODE CURTIR PORQUE O TEMPO É CURTO

CURTA O COURO DADO ANTES QUE O DONO DOS DADOS LEVE O TESOURO ROUBADO

BOLSIGNARO É NECRO SIN ISTRIONICO

Exclua ou oculte isso Curta ou suma disso

responda ou faça um comentário - não faça onda, senão serás chamado de otário

o mundo não é uma ilha, disse o galanteador,quem dá a todos compartilha

no tempo do onça, o cara pinçava frases pra pensar, hoje punça dados da rede de encher a pança e nem pensar

a teresa urban diz que tá lá no céu ajudando os amigos a resistirem por aqui

A MICHÊ QUE MI CHECOU 89 MILHÕES DIZ QUE A PASTORA ASSASSINA FLORDELIS É "AMADA IRMÃ EM CRISTO"

VENHA TUDO A NÓS - AO VOSSO REINO NADA

VISTA POR TRÁS TÁ TODO MUNDO INVERTIDO

ANINHO NO CAMINHO UM NINHO DE PÁSSAROS

quem emudece, dança no ritmo da festança

a imagem precisa do espelho só com isso se revela?

curtiu quem o partiu?

A VIDA NÃO É ARMA ZEN DE SECOS E MOLHADOS NEM UM REGIME EM LIQUIDAÇÃO!

PRESCRITO NO TAPETÃO O CRIME GOLPISTA - AQUI SÓ QUEM PAGA É O PROSCRITO

MUDO TEMPO: ANTES OBSCENO ERA 69, AGORA É 89!!!!

VELHOS TEMPOS EM QUE SÓ O 69 ERA OBSCENO!!!!

SER OU NÃO SER À-TOA

O POETA CAE POETANDO DE SUAVES RIMAS E PORRADAS

ESSE TRAÍRA BUNDÃO DO CACETE TEM QUE DEIXAR DE TRAIR O POVO E IR CACHIMBAR FORMIGA NO CAFUNDÓ DO JUDAS

e se for do verbo ir e nem é do verbo ser?

 A imagem pode conter: texto

Verissimo sugere a Guedes “taxar igrejas em vez de livros. Não é uma boa ideia?”


Lá pelos séculos IV e V aconteceram mudanças na história cultural e intelectual do Ocidente que podem ser descritas, simplificando um pouco, como substituições no futebol: saem paganismo e racionalismo gregos, entram empiricismo romano e cristianismo.

O apóstolo Paulo já fizera pouco nas suas pregações da “sapiência dos sábios” gregos e da “lógica vazia dos seus filósofos”, em contraste com a sabedoria do Cristo, iniciando a conquista do pensamento ocidental pelo cristianismo, que avançaria no começo do século IV com o imperador Constantino abrindo caminho para a cristã ser a única religião do império.

Para garantir o apoio dos teólogos e praticantes da nova e triunfante religião, Constantino iniciou outra tradição da Igreja, além do anti-intelectualismo de Paulo e dos conflitos reincidentes entre doutrina cristã e ciência: estabeleceu que nem o clero nem as autoridades mais altas da Igreja precisavam pagar impostos. Assim, além do prestígio e do poder na Terra e da certeza de um lugar no Céu pela eternidade, os bispos tinham acesso a prazeres mundanos e riquezas não tributáveis. Bispos disputavam entre si os favores de patronos ricos e do próprio imperador do momento.

Pelo que se sabe dele, Constantino foi um bom imperador, bom na guerra, bom e generoso na vitória e competente como administrador do seu império, que manteve unido por mais tempo do que qualquer outro “césar” depois de Augusto. Não se sabe se foi um cristão convicto ou se usou a Igreja para fins políticos e práticos, mas o fato é que a grande migração da história, do racionalismo grego para o irracionalismo romano, para o que um estudioso da época chamou de “mistério, mágica e autoridade” da Igreja de Roma, não teria acontecido sem ele. E olha aí, Paulo Guedes: taxar igrejas em vez de livros. Não é uma boa ideia?

é quase como a palavra rever - salive a palavra-valise e babe de satisfação!

como disse um personagem machadiano - não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria

quem vai herdar nossa miséria? pergunta o excelente poeta. machado era tão genial que prenunciou a pergunta e lascou - : Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria.(tirou o cavalo da chuva)

DESCULPA PRA PESSOA JUSTIFICAR SEU DISTANCIAMENTO SOCIAL : ESTÁ ENREDADA NAS PALAVRAS E NÃO CONSEGUE SE LIVRAR DELAS.

Não ponho o dedo na ferida de medo de perder a boa vida

navegar é preciso mas ir e voltar é pra quem tem siso ou perdeu o juízo (desfecho do poeta e músico ronald josé magalhães)

QUEM MAIS TEM NÃO SE CONTÉM E AINDA QUER LEVAR MAIS AINDA DE QUEM JÁ NADA TEM

SONHO - COMO NÃO TE-LO? DESDE QUE NÃO SEJA MAIS UM PESADELO

bolsignaro é como pilatos - lava as mãos só pra anunciar a crucificação do povo,mas não pra se livrar da pandemia

OS LAVAJATEIROS TRAIRAM O PAÍS POR IGNORANCIA, POR PRAZER MESMO OU POR OUTRA COISA?

um poço de problemas com asfixiantes pêndulos

 A imagem pode conter: texto que diz "Não. obrigado. Se eu deitar ficaremos aqui para sempre. 8 fablonagasetutst"

a rosa fala: / com essa beleza/ tudo se cala

TEMPO PANDEMINIÔNICO ESSE (pandemia,bolsomínons e pandemônio): FAZ PARECER O INFERNO DE DANTE UM PLAYGROUND

o poeta não é suicida - é a vida que é fodida

o poeta se equilibra na dança caosgósmica da geléia geral

os absorvidos pelo novo leviatã a tecnologia, aquela desenhada segundo os antropólogos pagos pelos capitalistas, absorveu a mobilização social e desbloqueou as energias revolucionárias dos sujeitos através do ato de clicar nos aplicativos (Cancela, 2019).

o que mais gera cliques pode ser igual à verdade, para programar o que entendemos como razão.

 

Ekaitz Cancela, jornalista

Na verdade, essa forma de entender o conhecimento, mais próxima do modelo publicitário de Ogilvy do que do conceito de verdade de Kant, levou ao que se chamou de pós-verdade ou era das notícias falsas de instâncias liberais. Uma perspectiva menos idealista afirmaria que a mercantilização absoluta da esfera pública tem sido o gatilho para a extrema direita consolidar sua agenda política racista no imaginário coletivo da sociedade.

você clica e o outro enche sua bolsa com seus dados

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manual das transformações estruturais : os sujeitos históricos vêem o capitalismo como catástrofe.(Ekaitz Cancela, jornalista)

como omonstro coletador de dados da internet engole quem clica o dia inteiro

 entenda como funciona a internet

Ekaitz Cancela, jornalista

Devemos entender a internet como um meio de produção onde prevalecem as leis de propriedade privada e essas empresas como poderes capazes de expandir a forma de mercadoria para mais áreas do corpo social e monetizar os dados que se produzem em cada interação emocional, ação política ou Social. Nada que Karl Marx e Friedrich Engels não expressassem: "A burguesia não pode existir se não estiver revolucionando incessantemente os instrumentos de produção, vale dizer, todo o sistema de produção e com ele todo o regime social

manual do vírus revolucionário: a epidemia ajudou as empresas da rede a se desenvolverem como jamais se desenvolveriam sem ele.

manual do vírus evangelizador: “O coronavírus se tornou um magnífico evangelizador que alcançou o que um intenso trabalho comercial teria alcançado em vários anos. Apenas em algumas semanas de confinamento vimos que o equivalente a cinco anos avançou em termos de crescimento do mercado, com um aumento inusitado na compra de serviços em nuvem ”(Santos, 2020). de um diretor da Telefónica Tech Cloud

somos absorvidos pelo novo leviatã: a tecnologia, aquela desenhada segundo os antropólogos pagos pelos capitalistas, absorveu a mobilização social e desbloqueou as energias revolucionárias dos sujeitos através do ato de clicar nos aplicativos (Cancela, 2019).

o que mais gera cliques pode ser igual à verdade, para programar o que entendemos como razão. Ekaitz Cancela, jornalista

 Na verdade, essa forma de entender o conhecimento, mais próxima do modelo publicitário de Ogilvy do que do conceito de verdade de Kant, levou ao que se chamou de pós-verdade ou era das notícias falsas de instâncias liberais. Uma perspectiva menos idealista afirmaria que a mercantilização absoluta da esfera pública tem sido o gatilho para a extrema direita consolidar sua agenda política racista no imaginário coletivo da sociedade.


manual do capitalismo digital: Essa ideologia consolida a resiliência do sistema em um momento de profunda crise de produtividade, seja em busca de aliados em governos autoritários asiáticos, em lideranças neofascistas que viajam pelo globo ou entre aqueles que preferem se autodenominar executivos social-democratas.

eu clico e a extrema direita consolida sua agenda política racista no imaginário coletivo da sociedade.

sem democracia plena,continuaremos a ser dominados pela política do ódio e da exclusão social

manual de virulentos milagres: as ações que mais subiram na bolsa foram as da área tecnológica - da rede social....

Segundo o Bank of America, Microsoft, Apple, Amazon, Alphabet (Google) e Facebook ocupam 22% do S&P 500, bolsa dos eua.

manual dos virulentos milagres: , no primeiro trimestre do ano, a receita da Microsoft cresceu 15%, para mais de 35 bilhões de dólares, e o lucro, por sua vez, aumentou 22%, para 10.750 milhões de dólares. O Facebook registrou receita de US $ 17.440 milhões, um aumento de 18%, com um lucro que dobrou para US $ 4,9 bilhões. A Alphabet, empresa controladora do Google, também aumentou a receita do primeiro trimestre em 13%, para US $ 41,2 bilhões.

a fortuna de Jeff Bezos (amazon) aumentou em 14 bilhões. Será que foi por isso que colocaram uma guilhotina na porta da casa dele?

manual do internauta: caça-clique: termo relativo ao conteúdo da internet que é destinado à geração de receita de publicidade.

Relicário (Oswald de Andrade): No baile da Corte Foi o conde d’Eu quem disse Pra Dona Benvinda Que farinha de Suruí Pinga de Parati Fumo de Baependi É comê bebê pitá e caí

Imagine se tivéssemos todos os livros e assuntos que quiséssemos em nossos arquivos personalizados a qq.hora.

manual utópico:reorganizar aliança com os movimentos sociais para criação de infraestruturas digitais soberanas.(Ekaitz Cancela)

Em Busca da Utopia Socialista Perdida: Planejamento Algorítmico


A INTERNET É UM MEIO DE PRODUÇÃO ONDE REGE AS LEIS DE PROPRIEDADE PRIVADA

Ekaitz Cancela, jornalista e pesquisador sobre as transformações estruturais do capitalismo

Como no tempo do prisioneiro de Bari, o presente é um tempo de enormes incertezas. O pessimismo da inteligência nos levaria a afirmar que a saída da mais grave crise de saúde do século passado terá como consequência direta o aumento das desigualdades econômicas e a perpetuação das hierarquias sociais herdadas da recessão de 2008.

Em vez disso, o otimismo da vontade nos obriga a compreender a experiência atual de maneira semelhante a um choque 1 /. Depois de mais de uma década imerso em uma espécie de estado de vigília, em grande parte induzido pelas tecnologias da informação, os sujeitos históricos agora veem o capitalismo como uma catástrofe.

Esse momento, carregado de dialética, exige uma compreensão socialista da situação que se sustenta pelos movimentos políticos que buscam a conquista dos meios de produção em seu tempo algorítmico. Para fazer isso, a esquerda precisa imaginar uma utopia diferente do Vale do Silício e projetar instituições democráticas para governar seu tempo histórico.

Toda análise materialista deve partir da compreensão de um acontecimento: o desenvolvimento acelerado das tecnologias digitais teve como consequência o aprisionamento de sujeitos na dinâmica estrutural da economia global. Em linhas gerais, a publicidade microssegmentada, facilitada pelos algoritmos do Google e do Facebook, cumpre a função de direcionar os usuários para o consumo de produtos e serviços, garantindo assim a demanda.

Por outro lado, as redes logísticas da Amazon não só centralizaram a distribuição e garantiram o livre fluxo de mercadorias em um momento de crise sistêmica, mas também lançaram as bases digitais para que o mercado se consolide como elemento organizador da vida social. E dado que muitas das interações com os aplicativos ocorrem graças ao software Microsoft ou ao hardware da Apple, parece não haver alternativa para a base material da economia digital ser de propriedade capitalista.

Não é necessário recorrer a explicações neoclássicas para entender os motivos. A necessidade de sobreviver à concorrência real do mercado e garantir taxas de retorno futuras levou as empresas de tecnologia a desenvolver uma estratégia para manter sua vantagem competitiva: extrair e acumular dados2 /.

Devemos entender a internet como um meio de produção onde prevalecem as leis de propriedade privada e essas empresas como poderes capazes de expandir a forma de mercadoria para mais áreas do corpo social e monetizar os dados que se produzem em cada interação emocional, ação política ou Social. Nada que Karl Marx e Friedrich Engels não expressassem: "A burguesia não pode existir se não estiver revolucionando incessantemente os instrumentos de produção, vale dizer, todo o sistema de produção e com ele todo o regime social".

Claro, os dois pensadores nunca imaginaram que um vírus fosse capaz de acelerar esse processo. Ou dito de forma um pouco mais vulgar, nas palavras do diretor da Telefónica Tech Cloud: “O coronavírus se tornou um magnífico evangelizador que alcançou o que um intenso trabalho comercial teria alcançado em vários anos. Apenas em algumas semanas de confinamento vimos que o equivalente a cinco anos avançou em termos de crescimento do mercado, com um aumento inusitado na compra de serviços em nuvem ”(Santos, 2020).

Desse modo, entendemos que a epidemia provocada pelo coronavírus consolidou a hegemonia das duas ideologias dominantes: a neoliberal (policial mau) e a solucionista (policial mau) (Morozov, 2020). A primeira é bem conhecida, pois se caracteriza pela ampliação da competição para qualquer aspecto da vida e pela rejeição frontal da possibilidade de agregar conhecimentos sobre os meios de produção disponíveis e as preferências individuais, ou seja, ao planejamento central. (Hayek, 1945).

Segundo o filósofo austríaco, o processo evolutivo é marcado pelo individualismo, que se torna essencial para a prosperidade cultural e, portanto, a sobrevivência do sistema capitalista (Santamaría, 2019). A segunda ideologia não é tão conhecida, embora esteja intimamente relacionada a esta última ideia.

A principal consequência do sonho induzido pelo aparato técnico é cancelar toda a imaginação política em torno da forma como a coordenação ocorre em uma sociedade. Entende que existem sujeitos que atuam exclusivamente como consumidores, start-ups ou empresas privadas, em sua maioria fundados por empresários (capitalistas com boa nomenclatura) e mercados que funcionam perfeitamente através do sistema de preços.

Essa ideologia consolida a resiliência do sistema em um momento de profunda crise de produtividade, seja em busca de aliados em governos autoritários asiáticos, em lideranças neofascistas que viajam pelo globo ou entre aqueles que preferem se autodenominar executivos social-democratas.

No que se refere ao modo de funcionamento do chamado capitalismo digital, as empresas de tecnologia têm se especializado em desenhar soluções para os problemas que esse modelo de produção tem gerado (Morozov, 2021). Por outro lado, no plano político observamos que a tecnologia, aquela desenhada segundo os antropólogos pagos pelos capitalistas, absorveu a mobilização social e desbloqueou as energias revolucionárias dos sujeitos através do ato de clicar nos aplicativos (Cancela, 2019).

Do ponto de vista filosófico, poderíamos acrescentar que o positivismo do Vale do Silício culmina na extrema objetividade depositada em seus modelos algorítmicos. Partindo desse pressuposto, basta acumular grandes quantidades de dados sobre as preferências do usuário, o que mais gera cliques pode ser igual à verdade, para programar o que entendemos como razão.

Na verdade, essa forma de entender o conhecimento, mais próxima do modelo publicitário de Ogilvy do que do conceito de verdade de Kant, levou ao que se chamou de pós-verdade ou era das notícias falsas de instâncias liberais. Uma perspectiva menos idealista afirmaria que a mercantilização absoluta da esfera pública tem sido o gatilho para a extrema direita consolidar sua agenda política racista no imaginário coletivo da sociedade.

Essas são as três frentes que a intelectualidade progressista deve enfrentar para atacar o sistema e liderar a luta contra o sistema ao lado da classe não possuidora. Por enquanto, embora a pandemia tenha enfraquecido sua posição, ela também abriu uma brecha para o ato político, um conceito bem diferente de algum tipo de momento populista. Tanto para elucidar o cenário de lutas quanto para traçar sua saída, a transformação pela qual passa a economia global será brevemente explicada a seguir.

Em vez de acabar com o capitalismo ou o neoliberalismo, duas coisas muito diferentes que a esquerda que adere ao pensamento de Ernesto Laclau e Stuart Hall confunde com frequência obscena, a epidemia acelerou algumas das tendências estruturais da primeira e levou a lógica da primeira a novos horizontes. segundo.

Digamos que, em meio à crise de consumo e produção, as poucas empresas que estão negociando em alta na bolsa e que lucram são as empresas de tecnologia3 /. A evidência é clara.

Segundo o Bank of America, o quinteto formado por Microsoft, Apple, Amazon, Alphabet (Google) e Facebook ocupa 22% do S&P 500, o índice carro-chefe da bolsa de valores dos Estados Unidos (Thépot, 2020). Por outro lado, no primeiro trimestre do ano, a receita da Microsoft cresceu 15%, para mais de 35 bilhões de dólares, e o lucro, por sua vez, aumentou 22%, para 10.750 milhões de dólares. O Facebook registrou receita de US $ 17.440 milhões, um aumento de 18%, com um lucro que dobrou para US $ 4,9 bilhões. A Alphabet, empresa controladora do Google, também aumentou a receita do primeiro trimestre em 13%, para US $ 41,2 bilhões.

A subsidiária da Apple na Espanha triplicou seu lucro no ano passado, declarando lucro de 42,30 milhões de euros em comparação com 13 milhões no ano anterior. E embora a gigante do comércio eletrônico tivesse um faturamento de apenas 32.185 milhões em seus grandes mercados na Europa, incluindo a Espanha, sua subsidiária de computação em nuvem cresceu 149%, para 4.786 milhões, e a fortuna de Jeff Bezos aumentou em 14 bilhões.

Em grande parte, esses ganhos se devem à consolidação do mercado de serviços em nuvem (Khalid, 2020). No entanto, não se pode ignorar que em 2017 essas seis empresas pagaram 31,7 milhões de imposto sobre as sociedades na Espanha, 8% a menos que no ano anterior.

Um keynesiano ou marxista comum, mas também um membro do movimento Flat-Earthing, usaria esses dados para sustentar o romance de Orwell de 1984 e defender a teoria do monopólio, equivalente ao pensamento conspiratório na teoria econômica. Ambos partem de uma premissa pela qual uma série de empresas fiscalizam os cidadãos, o que culmina em demandas políticas que buscam garantir direitos individuais garantidos pelo Estado, como a privacidade ou o anonimato na internet, e na confusão ricardiana que entende o excesso de lucratividade como receita econômica; Um mal-entendido que acaba fortalecendo posições como Elizabeth Warren ou Margrethe Vestager, ambas baseadas na necessidade de garantir a competição nos mercados livres.

Certamente, o coronavírus apenas aumentou a competição capitalista, principal característica desse sistema, e intensificou a guerra entre firmas e mesmo entre indústrias. Longe de testemunhar algum tipo de extração passiva de valor, as empresas de tecnologia da Ásia e do Ocidente expandiram seus investimentos no que Marx chamou de capital fixo, ou seja, o maquinário necessário para navegar na economia digital4 /.

Por isso, mais do que monopólios, devemos entender essas corporações como capital regulatório. Tendo em vista que a competição no mercado é um processo de seleção darwiniano pelo qual sobrevivem e crescem aquelas com menores custos de produção, a tecnologia dessas empresas torna-se um ativo fundamental para boa parte das empresas, principalmente aquelas que desejam reduzir custos. tempos de trabalho ou aumentar sua intensidade (Shaik, 2018: 508).

Ou seja, o que os profetas de Davos, como Klaus Schwab, chamaram de Quarta Revolução Industrial, não aconteceu por mágica, mas como consequência de mudanças na produção. Portanto, a única conclusão que podemos tirar da epidemia é que o poder dos capitalistas está consolidado.

Vamos agora nos referir à forma como a ideologia neoliberal e as tecnologias de informação convergiram durante a epidemia para consolidar sua agenda, a partir dos seguintes eixos: reversão dos serviços públicos, flexibilização do mercado de trabalho, emancipação do cidadão por meio do consumo e, ainda mais notoriamente após a crise de 2008, a substituição da dívida pela poupança.

Para exemplificar o primeiro evento, podemos olhar para a recente iniciativa de um grupo de ONGs lideradas pela Fundação Bill e Melinda Gates em conjunto com o Google para expandir os pagamentos digitais em países africanos (Morris, 2020). Não é novidade que nas últimas décadas os modelos de negócios no campo da saúde pública global proliferaram graças aos esforços do filantrocapitalista e fundador da Microsoft (Birn, 2014).

Agora é uma questão de contar com a boa reputação das instituições de caridade para consolidar o fenômeno que tem sido denominado financeirização digital, a fusão entre as interações digitais e as transações financeiras para a comercialização de serviços públicos (Jain e Gabor, 2020).

Apesar deste evento, a privatização por meio da apologia da digitalização, também pode ser observada no Ocidente. O Google e a Microsoft, com a ajuda de Palantir, desenvolveram o aplicativo que o serviço público do Reino Unido (NHS) está usando para gerenciar a epidemia de acordo com os dogmas da eficiência neoliberal (Ghosh e Hamilton, 2020 )

Na verdade, o Departamento de Educação do país que deu à luz Margaret Thatcher também assinou um acordo com o Google e a Microsoft para usar suas plataformas para fins educacionais. Quando os serviços públicos dependem de infraestruturas digitais privadas para coletar dados e fazê-los funcionar, a ideologia neoliberal terá sido completada com sucesso (Magalhães, 2020).

Por outro lado, a epidemia também impulsionou a digitalização do local de trabalho e a automação dos processos produtivos devido à necessidade das empresas reduzirem custos. Em uma pesquisa da firma de auditoria EY com mais de 2.900 executivos seniores de empresas globais, cerca de 36% dos entrevistados disseram que já estão acelerando seus investimentos em automação em resposta à pandemia de coronavírus (Graham, 2020).

Ao mesmo tempo, os capitalistas precisam aumentar a pressão sobre a força de trabalho para ter uma força de trabalho precária muito maior e controlar com mais precisão as tarefas dos trabalhadores. Ambas as lógicas estão presentes por trás do que os profetas do Vale do Silício chamam de “promoção do teletrabalho”, ou seja, “a revolução no local de trabalho” (Cole, 2020).

Isso explica porque os usuários do Microsoft Teams aumentaram de 32 para 44 milhões (eram 20 milhões em novembro) durante as semanas após as medidas de bloqueio, ou a empresa chinesa AliExpress (de propriedade da Alibaba) instalou um sistema nos computadores. de seus funcionários na Espanha para penalizar os trabalhadores que demoram mais de 30 segundos para mover o mouse durante a jornada de trabalho. Viva a Classe 4.0 de Gerenciamento!

A respeito da convergência dos dois processos descritos, a privatização da gestão da saúde e a exploração do trabalho, Dara Khosrowshahi é chamada a aparecer (Feiner, 2020). Confrontado com a pressão crescente para fornecer cuidados de saúde e outras proteções aos seus trabalhadores, o CEO do Uber defendeu uma visão de fornecer benefícios de cuidados de saúde aos trabalhadores com base nas horas de trabalho a tempo inteiro.

Esta empresa integrou a vida financeira dos seus colaboradores numa aplicação desenvolvida com o apoio do BBVA. Uma ideia que se aproxima de uma espécie de darwinismo social pautado pelos interesses de lucratividade do capital. O trabalhador passa grande parte de sua vida ocupada no trabalho para ter acesso ao sistema de saúde e, assim, manter-se seguro para continuar desenvolvendo o processo produtivo.

Ao mesmo tempo, o parco dinheiro que você ganha com a venda de sua força de trabalho está disponível instantaneamente, mas apenas para desaparecer imediatamente depois, a fim de sobreviver à montanha de dívidas de que você precisa para sobreviver ao mês. Nesse contexto, o grande sonho da nova aspiracional classe média é ter um tempinho livre para comprar uma assinatura de uma plataforma de streaming e consumir séries ou filmes em loop.

Mais uma vez, a epidemia apenas desarmou os trabalhadores, ideológica e materialmente, bem como a sociedade civil em geral. Derrubou boa parte dos obstáculos que o capital encontrou para expandir a lógica mercantil nos últimos redutos da vida humana. Neste momento, a posição da classe não possuidora na luta pelos meios de produção não poderia ser mais precária, mas ainda há a possibilidade de desenhar alternativas e imaginar uma utopia diferente da capitalista.

As mesmas tecnologias que permitem aos capitalistas consolidar seu domínio são aquelas que podem selar seu caixão. Na verdade, esse foi o leitmotiv dos experimentos de planejamento central usando tecnologias de informação que puderam ser ouvidos no 22º Congresso do Partido Comunista da União Soviética em 1961, quando Nikita Khrushchev declarou que era imperativo acelerar a aplicação de tecnologias. para a economia planejada. Em um momento em que os sucessos do Sputnik no espaço sideral e, portanto, o domínio da URSS sobre o Ocidente estavam sendo celebrados, a gestão cibernética da economia foi vista pela primeira vez como uma alternativa real ao sistema capitalista sob o slogan das máquinas para O comunismo.

Desde exemplos bem conhecidos na Espanha, a crise tecnológica da União Soviética tem sido associada à lógica do sistema estatista: prioridade do poder militar; controle político-ideológico da informação pelo Estado; os princípios burocráticos da economia centralmente planejada; isolamento do resto do mundo e a incapacidade de modernizar tecnologicamente alguns segmentos da economia e da sociedade sem modificar todo o sistema em que esses elementos interagem entre si (Castells, 2001). Mas também, como explicou Kees van der Pijl (2020), foi além da industrialização como motor de recuperação e planejamento com o auxílio de computadores, pois perseguiu o processo de descoberta de resultados por meio da injeção de informações em sistemas computacionais para em seguida, organize a produção.

A outra experiência com métodos de planejamento digital foi o projeto Cybersyn, realizado sob a liderança do governo de Unidade Popular de Salvador Allende. Stafford Beer (1978), que o liderou, entendeu a sociedade como um sistema baseado na adaptação e no aprendizado.

Desta forma, graças aos avanços da cibernética e da informática, ele tentou projetar fábricas que, dentro de um setor nacionalizado, respondessem aos problemas das cadeias de abastecimento, mas também ao conflito interno que ocorre com os trabalhadores. Isso ocorria por meio de redes de transmissão de dados que comunicavam o governo com os diversos níveis de gestão e produção em que a empresa estava organizada (Medina, 2006).

Ainda que se deva destacar o reduzido orçamento do país e reconhecer o potencial de gestão da economia nacional de forma descentralizada (durante a crise de outubro, foram os trabalhadores que optaram pela reabertura das fábricas e o sistema permitiu ao governo de Allende coordenar os esforços dos trabalhadores ), o golpe de estado militar iniciado por Augusto Pinochet pôs fim a qualquer indício de utopia socialista.

Desde então, a imaginação política das forças de esquerda está em quarentena e não surgiu nenhuma ofensiva estruturada contra os porta-vozes de Hayek.

Em geral, as propostas deixaram de afirmar que, de uma vez por todas, os desenvolvimentos nas tecnologias digitais levarão a uma ordem econômica baseada no planejamento mais eficiente do que uma baseada na propriedade individual, contrato e troca para proclamações vazias. sobre planejamentos democráticos que bebem de comparações errôneas sobre o poder central da Amazônia e a capacidade do Estado (Phillips e Rozworski, 2019; Palka, 2020). Ou seja, a intelectualidade socialista não tem conseguido superar o debate sobre o Cálculo Social iniciado na Guerra Fria, quando o contexto performático da sociedade era muito diferente do atual.

Argumentamos que é urgente superar a dicotomia exclusivamente ideológica entre planejadores socialistas e tecnocratas encarregados de administrar o mercado. Nesse sentido, vale a pena determo-nos em três propostas de conceber instituições fora da lógica da competição que aproveitem as novas formas de coordenação social e de inovação oferecidas pelas tecnologias digitais.

O primeiro, partindo de uma versão progressiva da infraestrutura de feedback de Hayek, seria chamado de solidariedade como processo de descoberta. Baseia-se na máxima de que cada um de acordo com as suas necessidades através de mecanismos externos ao mercado e critérios altruístas. O segundo é o design não comercial, isto é, métodos de coordenação social em questões não relacionadas à produção e ao consumo. O terceiro, o planejamento automatizado, tem como foco a coordenação descentralizada da esfera econômica (Morozov, 2019). Como isso poderia ser implementado na prática?

Partamos do facto de que a esquerda, e especificamente a espanhola, compreende a necessidade de enfrentar a lógica da concorrência no que se refere à criação de conhecimento e também tenta repensar as instituições a ela associadas, como os meios de comunicação.

Por exemplo, em vez de promover mídias digitais regidas pela lógica clickbait para deslumbrar o eleitorado com os mesmos métodos dos pseudojornais da direita, promoveria espaços onde não prevalece a dinâmica de mercado. Vamos imaginar a criação de bibliotecas ou arquivos digitais (enormes conjuntos de dados) organizados por tópicos relevantes para a compreensão da história espanhola, como a Guerra Civil. Em vez de centralizar a decisão sobre as questões culturais na burocracia atualmente ocupada pelo governo, os usuários teriam ferramentas digitais para criar seus arquivos personalizados, segmentados por fontes, palavras-chave, etc.

Sem falar nas facilidades que significariam para as universidades exportarem esse modelo para o conhecimento acadêmico. Para tal, não permitiria que as referidas Instituições (públicas!) Iniciassem o processo de digitalização individualmente, com o mínimo apoio do Ministério, dependendo assim das infra-estruturas dos gigantes tecnológicos, como propõe Manuel Castells ocultar5 /.

Em vez disso, o governo deveria liderar o desenho de uma infraestrutura de comunicação pública, indexando a produção das diferentes universidades e meios de comunicação nacionais, entre outras fontes (que poderiam ser incluídas ou excluídas por deliberação pública), ou daria suporte às infraestruturas existentes. Estamos falando de Red Iris, para expulsar o Banco Santander ou o Google da gestão dos correios.

A única maneira de algum tipo de planejamento algorítmico funcionar requer alterar e repensar algumas das instituições, especialmente aquelas que fornecem respostas para problemas sociais existentes.

Uma coisa é entender a tecnologia de acordo com a ideologia solucionista, que entende os sujeitos que devem buscar soluções para seus problemas por meio do mercado, e outra é facilitar aos cidadãos o uso de dados para encontrar soluções conjuntas e a partir disso. Promover métodos de coordenação social usando, por exemplo, avanços em aprendizado de máquina e linguagem natural. Para isso, torna-se imprescindível ir da assembleia ao hackathon, pelo menos uma versão que permita desencadear toda a potencialidade do conhecimento social geral descrito nas passagens dos Grundrisse.

Comecemos pelo fato de que há uma série de necessidades nos postos públicos de saúde, ou mesmo energia em alguns bairros. As tecnologias de aprendizado de máquina podem ser usadas para alimentar máquinas capazes de compreender a complexidade de cada situação, a fim de fazer, ou sugerir, previsões que permitem a distribuição ideal de recursos.

Obviamente, para que um algoritmo bem treinado consiga atribuir a cada cidadão uma renda ou determinados recursos com base em sua localização geográfica ou posição social, é necessário criar diferentes classificações. Ao contrário das propostas de governança neoliberal, ou seja, monitorar e quantificar temas para reproduzir vieses de classe, gênero e raça, o design de qualquer tecnologia deve respeitar os critérios de privacidade desde o design, mostrar os códigos que utiliza e abrir ao escrutínio das decisões propostas.

Precisamente porque nada disto pode acontecer sem uma infra-estrutura de feedback que se estabelece em cima de boa parte das infra-estruturas existentes, torna-se necessário questionar as diversas privatizações ocorridas nos últimos anos e exigir a nacionalização das empresas que também recolhem dados enormes sobre as atividades desenvolvidas por: Telefónica, desde o consumo de serviços culturais às comunicações e movimentos; BBVA, se falamos de gasto do cidadão, ou Endesa, referindo-se ao consumo de energia.

Imagine que as plataformas dessas empresas oferecem um serviço semelhante ao que oferecem agora, embora substituindo a pressão do sistema de preços por incentivos democraticamente acordados para usar o feedback que produzimos para fins diferentes daqueles usados ​​por uma empresa como o Facebook.

Se este último cria perfis digitais para promover as formas de consumismo de que o capitalismo necessita para existir, sem dar atenção a nenhuma outra consideração que não seja aumentar a lucratividade, uma proposta alternativa seria a implementação de sensores que favoreçam a redução do custo da energia elétrica, o poluição ou reciclagem. E que o fazem por meio de plataformas descentralizadas e anônimas.

Sem dúvida, para eliminar as barreiras burocráticas a determinadas ajudas públicas, não é necessário um banco, mas sim tecnologias financeiras que criem perfis precisos dos cidadãos, respeitem a privacidade e permitam a criação de catálogos onde se registam deficiências materiais. E, claro, em vez de cobrar juros, dê um salário mínimo.

Também poderia ser feita menção à forma como uma plataforma como a Telefónica, outrora pública, poderia favorecer pequenas produções de documentários ou séries sobre ciências e humanidades baseadas em contribuições de cidadãos, que poderiam ser financiadas por meio de um misto de crowdfunding solidário e orçamentos públicos em vez de pagar por uma assinatura ou publicidade. Claro, para culminar essa utopia de planejamento algorítmico socialista, a noção de burocrata ou conceitos como lei e democracia devem ser levados a novos limites.

Estabelecer um método de utilização do Big Data para que os cidadãos, não apenas as classes menos abastadas, expressem suas necessidades de consumo é fundamental para organizar a produção de tal forma que não seja necessário um papel forte do Estado, muito menos a agência do Planejamento central.

Se os produtores podem acessar informações sobre padrões de consumo e, ao mesmo tempo, classificar seus produtos em uma plataforma que funciona como uma enorme lista de compras, não há necessidade de planos quinquenais.

Em vez disso, recursos computacionais para extrair, processar e armazenar grandes quantidades de dados. No entanto, para realizar este processo, não são necessários grandes gastos com inteligência artificial (apenas o investimento anual da Amazon em Pesquisa e Desenvolvimento é de 18 bilhões de dólares), muito menos permitir que esta empresa instale data centers na Espanha.

Em vez disso, conduza a produção de manufatura por meio de impressoras 3D ou iniciativas públicas para automatizar os processos de produção usando tecnologias flexíveis, de baixo custo, de código aberto e muito mais ecologicamente corretas. Nesse contexto, as abordagens individualistas do teletrabalho ou do empreendedorismo não fazem mais sentido, uma vez que os espaços de trabalho deixam de ser fábricas que utilizam métodos de taylorismo digital e passam a ser ecossistemas de inovação pautados por imperativos como o cuidado com a comunidade ou com o colaboração entre os povos.

Não resta muito tempo para supor que o mundo mudou mais na última década do que no século passado. Em um momento caracterizado por uma crise de saúde sem precedentes históricos, a única forma de imaginar novas utopias socialistas e vencer a luta contra os capitalistas implica que as forças de esquerda reorganizem sua aliança com os movimentos sociais para a criação de infraestruturas digitais soberanas.

Notas

1 / Não estamos nos referindo à definição vulgar encontrada na maioria das análises atuais, com base em Naomi Klein (2007). Devemos nos afastar daqueles que, voltando seu olhar para a obra de Milton Friedman, apresentam a teoria keynesiana como a única utopia possível. Por isso, com choque, nos referimos à conotação filosófica presente na obra de Walter Benjamin. Seria uma experiência sobre os tempos modernos que precede o ato revolucionário de "puxar o freio de mão".

2 / O conceito de competição real em detrimento da versão keynesiana de competição perfeita é desenvolvido por Anwar Shaik (2016: 259-322).

3 / Referimo-nos ao GAFAM (Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft), em detrimento do que poderíamos definir como start-ups que começaram recentemente a abrir o capital, nomeadamente Uber e Airbnb. Essas empresas dispensaram 14% (3.700 pessoas) e 25% de sua força de trabalho (1.900), respectivamente. Como afirmado há alguns meses, "o capitalismo de plataforma está começando a parecer mais um experimento especulativo arriscado conduzido por plutocratas ricos do que uma proposta de negócio sólida com um futuro duradouro" (Peter Fleming, Carl Rhodes, Kyoung-Hee Yu, 2019 )

4 / Após a epidemia desencadeada pelo coronavírus, o Alibaba anunciou que dobrará os gastos com computação em nuvem para US $ 28 bilhões nos próximos três anos. Uma quantia inferior aos 34,6 bilhões que a Amazon investiu ou aos 18,1 bilhões da Microsoft em 2019, que juntas controlam quase 50% do investimento nessa infraestrutura.

5 / Beatriz Asuar, Castells: “Você tem que estar pronto para estabelecer plenamente o ensino e as avaliações online”, Pública, 11/05/2020.

Referências

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NÓS A SÓS MAS SEM VOZ

domingo, 23 de agosto de 2020

O MONSTRO QUE ENGOLE TUDO O QUE PRODUZIMOS NA REDE NO CAPITALISMO DE VIGILÂNCIA

 Quanto custará ao jornalismo aceitar o dinheiro de Google e Facebook?, por Rogério Christofoletti

Há, pelo menos, duas razões para que o jornalismo olhe com desconfiança para Google e Facebook: eles contribuíram para tornar mais aguda a sua crise financeira, e eles ajudam a disseminar notícias falsas e discursos de ódio.

Por Jornal GGN -17/08/2020

Fausto firma seu pacto com Mefistófeles, no traço de Julius Nisle (1812-1850). Wikimedia Commons.
do objETHOS
Quanto custará ao jornalismo aceitar o dinheiro de Google e Facebook?
por Rogério Christofoletti
Têm sido cada vez mais frequentes as ações de big techs para “salvar o jornalismo”. São programas de treinamento e capacitação, impulsos para a inovação, desenvolvimento de soluções tecnológicas e até incentivo a pequenos e grandes negócios. Entre as corporações preocupadas com o jornalismo, destacam-se Google e Facebook que têm feito grande alarde de seus gestos em toda a parte. Em um cenário de crise catastrófica no setor, esses movimentos deveriam ser comemorados, mas não podemos nos enganar: há um preço a pagar pela ajuda dos maiores conglomerados do planeta. Resta saber se jornalistas e organizações de mídia estão dispostos a arcar com as consequências de receber recursos daqueles que não são propriamente seus aliados.

Há, pelo menos, duas razões para que o jornalismo olhe com desconfiança para Google e Facebook: eles contribuíram para tornar mais aguda a sua crise financeira, e eles ajudam a disseminar notícias falsas e discursos de ódio. Em menos de duas décadas, as duas big techs sugaram imensos oceanos de verbas publicitárias que antes irrigavam os negócios jornalísticos. Hoje, estima-se que, juntas, elas abocanhem dois terços de tudo o que se gasta com publicidade na internet mundial. Dinheiro é um recurso escasso e inelástico. Quer dizer: para ir a um lugar, ele tem que sair de outro. Neste sentido, é claro que Google e Facebook drenaram grande volume daquilo que era a principal forma de sustentar jornais, revistas, sites e emissoras de rádio e televisão mundo afora. Não é, portanto, exagerado dizer que Google e Facebook colaboraram com a crise, ajudando a quebrar muitos negócios no setor. Alguém poderá dizer que os serviços de anúncios que eles criaram vêm viabilizando também parte do mercado, mas não vamos tapar o sol com a peneira: depois de Google e Facebook, o mercado jornalístico encolheu em tamanho e pluralidade, seus ganhos reduziram e as “oportunidades” criadas não reverteram a crise.

Para além disso, é cada vez mais claro que as big techs são os motores mais potentes para difusão de notícias falsas, discursos de ódio e teorias conspiratórias. É nesses ambientes que a ultra-polarização das sociedades é intensificada e um rizomático ecossistema de desinformação floresceu e se estabeleceu. Alguém poderá dizer que Google e Facebook oferecem apenas as plataformas onde isso acontece e que a responsabilidade é das pessoas e grupos que se dedicam a isso. De novo: não podemos fechar os olhos para a realidade. Google e Facebook não fornecem só os ambientes onde mentira e intolerância se espalham, mas também definem os termos de uso e têm total controle sobre os algoritmos que regem a distribuição dos conteúdos. Isto é, poderiam coibir o ódio com mais firmeza e ajudar a frear a desinformação, mas fazem muito menos do que está ao seu alcance por uma razão simples: isso afetaria o coração de seus negócios. Google e Facebook vivem à base do uso de suas plataformas e da disseminação de conteúdos viralizantes, independente se são verdadeiros ou não, se são socialmente inflamatórios ou não.

Porque ajudam a quebrar empresas jornalísticas e porque contribuem para espalhar desinformação, Facebook e Google não são amigas do jornalismo, nem estão genuinamente preocupadas com ele. Mas por que eles vêm lhe estendendo a mão?

Leia também: Responsabilizar, ou não responsabilizar: a condição de chefes de Estado no direito internacional penal, por Hannah De Gregorio Leão
O investimento

Vamos pegar o exemplo brasileiro. O país é o principal mercado consumidor de notícias e entretenimento da América Latina, certamente uma das mais atraentes vitrines para qualquer fornecedor de produtos ou serviços. Aqui também o jornalismo enfrenta severas dificuldades para manter empregos e empresas, mas quantas fundações locais ou poderosos fundos de investimento incentivam o negócio de notícias no país? Talvez não caibam nos dedos de uma mão… Quantos super-ricos tentam “salvar o jornalismo” local? Embora o país tenha dois nomes de peso entre os 100 maiores bilionários do planeta, não se ouve falar de boas ações de Joseph Safra (56º na lista da Forbes) e Jorge Paulo Lemann (86º), que juntos acumulam mais de 40 bilhões de dólares. O jornalismo nacional deveria esperar essa ajuda? Melhor não…

Google e Facebook criaram programas de auxílio ao jornalismo porque esses gastos cabem em suas planilhas, não custam tanto e causam ótima impressão social.

A Google News Iniciative alardeia que quer construir “um futuro mais forte para o jornalismo”. Para isso, atua em três planos: cria produtos “para atender às necessidades das organizações de notícias e expandir seus negócios digitais”; firma parcerias “para resolver os desafios mais importantes da indústria jornalística”; e desenvolve e apoia “programas para impulsionar a inovação” no setor. É uma estratégia abrangente, robusta e muito atenta às demandas de profissionais e empresas. Ao mesmo tempo em que oferecem cursos de capacitação e ações de educação para a mídia, promovem gincanas de inovação, apoiam meios como Azmina, Jota, Estadão e O Globo, e criam projetos como a Rede Digital Premium de Jornais e o Impacto.Jor. As soluções apresentadas pelo gigante do Vale do Silício passam todos por seus canais, como o YouTube, GooglePlay e Google News. Fora do Brasil, a iniciativa do Google alcança associações empresariais como a Global Editors Network, Online News Association e Associação Mundial de Jornais, passa por centros formativos e escolas de jornalismo, como o Poynter, e alcança empreendimentos de qualificação profissional, como o Trust Project (Projeto Credibilidade, no Brasil).

Facebook tem sido menos agressivo nesse mercado, mas está por trás de iniciativas como o recém-lançado curso da Abraji “Reconstrução do Jornalismo Local”, o Atlas da Notícia, o robô Fátima (de Aos Fatos) e o projeto Vaza Falsiane, ambos dedicados a combater notícias falsas. Aliás, o projeto Comprova, consórcio nacional de veículos para checagem de fatos, tem apoio de Facebook e Google. Você leu certo: Facebook e Google ajudando a combater o ambiente de desinformação que tanto alimentam e fazem crescer…

É importante dizer que tem muita gente séria, competente e comprometida com o jornalismo concorrendo nessas frentes e este texto não é um julgamento ético de suas iniciativas. Sem linhas estatais de financiamento e sem fontes privadas locais de auxílio, jornalistas e organizações de mídia brilham os olhos quando Google e Facebook anunciam disposição para ajudar. A situação é tão dramática que não precisa muito: basta que as big techs criem programas como o Inovation Challenge e o Google News Lab, ou ainda os aceleradores de Vídeo Digital e de Notícias Locais, do Facebook. Profissionais, coletivos e até grupos de mídia bem estabelecidos disputam a cotoveladas as oportunidades oferecidas. A crise faz com que todos busquem o escasso dinheiro disponível.

Leia também: Bolsonaro e a modernização conservadora, por Jorge Alexandre Neves
Apoiar o jornalismo, mesmo que com recursos muitíssimo limitados, é um ótimo negócio para Google e Facebook. Primeiro porque adoça seus balanços sociais, pois investir em jornalismo é apoiar a democracia, fortalecer as instituições e defender a liberdade de expressão. Segundo porque aumenta o uso de seus produtos por profissionais e empresas, criando verdadeira dependência de pequenas redações às suítes de serviços Google/Facebook. Terceiro porque, ao estender a mão para empresários e jornalistas, ajuda a uniformizar o discurso social e atenuar eventuais pressões do público. Despejar alguns milhões de dólares em ações difusas e bem capilarizadas causa uma impressão de que as big techs estão mesmo ajudando o jornalismo, e que apenas boas intenções liberam os caixas dessas gigantes da internet. Sejamos francos: it’s just business, baby!

A fatura

Não podemos nos dar ao luxo de sermos ingênuos. Faz tempo que o slogan “don’t be evil” não faz mais sentido para o Google. Faz tempo que Facebook deixou de ser só uma rede social de amigos. Os maiores players da internet estão entre as marcas mais valiosas do capitalismo global, e seus movimentos interferem no desenvolvimento tecnológico mundial, moldam comportamentos sociais, definem prioridades econômicas e estremecem alguns pilares da democracia. Nunca houve empreendimentos privados dessa natureza e alcance, e não é exagero dizer que Google e Facebook projetem sombras sobre países inteiros com sua influência e poder. Eles são o mais próximo do que imaginou Dave Eggers em seu romance distópico, O Círculo, onde uma empresa de tecnologia cria tanta dependência humana que ensaia absorver em sua plataforma digital o próprio processo político. É de totalitarismo que estamos tratando; de totalitarismo privado no capitalismo de vigilância e de sedução pelo solucionismo tecnológico.

Então, o jornalismo não deve aceitar o dinheiro de Facebook e Google?

Se a questão fosse fácil assim, não teríamos um problema. Na verdade, estamos diante de um dilema ético que nos obriga a pensar qual o custo disso. Ao se vincular a Google e Facebook, jornalistas e organizações de mídia colocam em risco sua liberdade editorial? Projetos apoiados por eles terão autonomia para criticar e cobrir com rigor os movimentos desses gigantes? Iniciativas de checagem de fatos vão se sentir à vontade para apontar os dedos às plataformas que estimulam a mentira e a confusão? Poderão cobrar delas ações mais efetivas para estrangular um ecossistema de desinformação que corrói as democracias, esgarça o tecido social e deteriora o jornalismo? Há outros caminhos para salvar o jornalismo local, que não os sinalizados por Google e Facebook?

Ouso em dizer que a crise do jornalismo não passa necessariamente por eles, embora não possa também ignorá-los. Um dos grandes problemas do tecno-solucionismo é minar a nossa imaginação e nos fazer acreditar que todas as saídas são tecnológicas e precisam pagar pedágio no Vale do Silício. Não são. O mundo, seus problemas e diversidades são maiores que a Califórnia; a inteligência e engenho humanos não respeitam geografias, e a internet é muito mais do que os jardins murados que nos legaram.

Leia também: Alguém ainda se espanta com os números Datafolha de Bolsonaro?, por Wilson Ferreira
As soluções para a crise do jornalismo não precisam necessariamente passar por Facebook e Google, mas taxar conglomerados como esses ou obrigá-los a remunerar empresas e jornalistas pela reutilização dos conteúdos que produzem são saídas possíveis e viáveis. Legisladores também podem apresentar propostas de financiamento público do jornalismo, tendo em vista que o serviço que prestam pode ser enquadrado em finalidade social. Governantes podem ter políticas transparentes, técnicas e equilibradas de distribuição de verbas públicas ou mesmo de incentivo à mídia, entendendo que é um setor econômico que merece socorro, como foi feito com bancos e instituições financeiras. A sociedade pode se organizar para aderir a sistemas de sustentação compartilhada de pequenas e médias empresas de notícia, se considerar que vale a pena pagar essa conta.

Enfim, não é fácil abrir mão do pouco dinheiro disponível para salvar o jornalismo. Mas a fatura de cobrança virá, e ela pode significar perda de autonomia, independência, liberdade, senso crítico e credibilidade. O jornalismo já cometeu erro parecido recentemente, quando relegou às redes sociais e à plataformas uma etapa de seu processo produtivo: a distribuição das notícias e conteúdos. Deu de bandeja parte de seu trabalho e, com isso, se distanciou mais ainda do público. Não aceitar o dinheiro pode não ser a melhor saída, mas recebê-lo acriticamente pode representar a volta de um pacto parecido como que fez o Fausto, de Goethe. Quanto custará aceitar ao jornalismo aceitar o dinheiro de Facebook e Google? Está na hora de falarmos sobre isso.

Rogério Christofoletti – Professor de Jornalismo na UFSC e pesquisador do objETHOS