– Histórico parte 1
às 15:45 | | Editoria Especial 3
Por Francisco Filho
Muito em breve essas duas indústrias poderão se chocar, e quem vai sair perdendo é o consumidor. Durante um bom tempo a TV aberta veio ganhando o jogo pela luta da audiência. E isto, não pela qualidade da programação, mas por políticas de comunicação que restringiam o mercado de TV paga no Brasil.
Samuel Possebon, em seu livro, TV por Assinatura: 20 anos de evolução, remonta o passado dá indústria de TV paga no Brasil. O início desta atividade no Brasil foi muito similar ao que ocorreu nos EUA. No princípio, as cidades onde a transmissão por ar era precária, uma antena era instalada em local adequado e cabos eram ligados e espalhados pela pequena cidade, diretamente nos aparelhos de televisão. O sistema foi chamado de CATV (Community Antenna Television) e a cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi a precursora desta modalidade de distribuição de conteúdo. Na década de 70 havia dezenas de prestadoras de CATV. Cidades maiores como São José dos Campos, Santos, São Bernardo do Campo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Campinas, contavam com o serviço. Em 1971, o grupo Globo de Comunicações criou a TVC – Televisão por Cabos Ltda – com objetivo de estudar o mercado de cabo difusão. Iniciava na Barra da Tijuca, no condomínio Barramares, uma experiência na transmissão de conteúdo da TV aberta em horários alternativos. Em 1978, em uma reportagem da revista Veja, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho (o Boni), declarou que “as pesquisas demonstram que as pessoas ainda preferem as estações comerciais” e ao comentar sobre a expansão do setor nos EUA naquela época, afirmou: “a Globo não teme a concorrências dessas inovações”.
O fato era de que a prestação de serviços de TV paga, até então por cabo, eram operações de CATV isoladas e que apenas levavam o sinal da TV aberta a regiões precárias. Este quadro começaria a mudar apenas no final dos anos 80. Em 1989, a primeira norma regulatória que dava início ao mercado de TV paga foi promulgada por meio da portaria 250 de 13 de dezembro daquele ano e criava o DISTV – Serviço de Distribuição de Sinais de Televisão – o que acabou por gerar a primeira onde da distribuição de licenças para prestação dos serviços. Os pioneiros desta primeira fase como Raul Melo Fajardo implantou o serviço no interior do estado de São Paulo na cidade de Presidente Prudente, o que acabou por levar a criação da TV Cabo Anastácio. Melo, juntamente com outros empresários, fundou a ABRACOM – que anos mais tarde se tornaria a ABTA –Associação Brasileira de TV por Assinatura – com principal objetivo de dar peso e organizações às iniciativas quase informais e desorganizadas de empresários locais.
Outras iniciativas na Região Sul do país com, Aloísio Nestor Knob possibilitou que outros empresários investissem no novo negócio, inclusive a família Sirotsky (Grupo RBS). No início dos anos 80, o empresário cearense, Anselmo Mororó, ao estudar marketing no EUA, teve contato com a tecnologia do MDS (Multipoint Distribution Service), que utiliza a faixa de 2,5 Ghz do espectro radioelétrico. Ao retornar ao Brasil, Anselmo iniciou, de uma forma amadora, a transmitir filmes para amigos em um circuito fechado de TV a parir de um vídeo cassete. Cada dia mais e mais pessoas queriam aderir ao serviço. Somente assim, Mororó decidiu transformar a iniciativa em um projeto empresarial. Em 1989, Mororó obteve do Ministério da Comunicação autorização para explorar a faixa de 2,5 Ghz e fundou a TV Show em 1991. Carlos Lins Albuquerque (filho do Senador José Lins Albuquerque, que havia feito a ligação entre Mororó e o MC), iniciou a TV Filme em Brasília.
Em 1991, a partir do ataque dos EUA ao Iraque, a TV Filme retransmitia o sinal da CNN, o que fez os negócios da TV Filme explodirem com pedido das embaixadas e inclusive, do Gabinete da Presidência, para que o sinal chegasse ao Presidente Collor. Neste momento, entra Jogo da TV paga no Brasil o Grupo Abril. Ao ver sua tentativa frustrada de conseguir a outorga da extinta TV Tupi, o grupo buscava outras formas de entrar no segmento de televisão. O Grupo Abril via naquilo que era chamado de “nova TV”, uma alternativa à TV aberta. Depois de algumas investidas no canal segmentado MTV e da compra de espaço em emissoras como Bandeirantes e TV Gazeta, o grupo investiu na TV paga, com intenção de cobrar pela assinatura do cliente e pretendia lançar um canal por assinatura. A estratégia do grupo era fazer algo totalmente diferente do que a Globo vinha fazendo na TV aberta. Mas os planos do Grupo Abril foram frustrados depois que o Governo Federal observou que a Lei de Radiodifusão não previa este tipo de serviço. O Ministro das Comunicações na época deu duas opções ao grupo: devolver o canal, ou mantê-lo até que a legislação permitisse o modelo de TV paga. O grupo optou por manter o canal. O ministro na época era Antonio Carlos Magalhães.
A partir daí, a história da TV paga no Brasil se torna um emaranhado político, onde pressões de todos os lados tentam hora segurar o mercado, hora expandi-lo. Nome de figuras ilustres como Álvaro Pacheco, José Sarney, família Marinho, Daniel Dantas, dentre outros, começaram a formar o mercado de TV paga no Brasil, afialiadas da Rede Globo (RBS) foram umas das primeiras a receber outorgas de TV paga, recém regulamentadas pelo decreto 95.744 de 23 de dezembro de 1988. O Grupo Abril conseguiu a licença para operar na cidade de São Paulo, mas somente depois de outros três grupos conseguirem a mesma autorização, o que obviamente incluía sua maior rival a TV Globo.
O resultado dessa luta política foi que depois de 1997, mais nenhuma licença para exploração do serviço de TV paga foi concedida no Brasil. Já se foram 13 anos sem que novas empresas entrassem na concorrência permitindo preços menores, investimento em infra-estrutura e alternativa a TV aberta. Até que a Anatel, neste ano (2010), por força de medida cautelar, iniciasse o estudo de mais de 900 pedidos de outorga que haviam sido feitos durante este período e aceitasse que novos pedidos fossem realizados. Juntamente com esta ação o Governo Federal implementa o PNBL – Plano Nacional de Banda Larga – que irá permitir que pequenas prestadoras de TV paga ofereçam acesso a Internet a preços mais baixos que as concorrentes NET, Embratel e BrOI, que juntas detem 70% do mercado de Banda Larga no Brasil, e ainda, por meio do PL 116, pretende autorizar as empresas de Telecom a prestar o serviço de TV paga.
Estas ações estão levando a TV paga e a TV aberta a um novo confronto. Tema do próximo texto. Aguade...
Fonte:
TV por Assinatura: 20 anos de evolução. Samuel Possebon.Editora: Save Produções Editoriais, 2009
TV aberta X TV paga – Histórico parte 2
nlo luisnassif,
Por Francisco Filho
No primeiro post , vimos que a história da TV a cabo no Brasil teve um início muito parecido com os outros veículos de comunicação no país. Foi através do pioneirismo e da determinação de homens de visão. Durante a fase inicial, ações isoladas em locais onde a recepção da TV aberta era deficiente, motivaram empresários a entrar em um negócio ainda novo e muito arriscado. Ações até mesmo artesanais, como a da TV Filme em Brasília, onde seus proprietários se revezavam para trocar as fitas de filmes no aparelho de U-matic*.
Porém, esta fase passou e a indústria da TV paga começou a chamar a atenção das grandes empresas de comunicação no país. Mais precisamente da Rede Globo de Comunicações e do Grupo Abril, que juntas protagonizaram a segunda fase da história da TV paga no Brasil e em lados opostos, mas com uma mesma visão: optaram pelo sistema de DTH como forma de distribuição e não o cabo e direcionaram o negócio para a classe A e B. Houve tentativas para implantar a TV paga na classe C, mas o foco sempre foi nas classes mais economicamente ativas.
As primeiras licenças de operação para as DISTV não chamaram a atenção das duas empresas em um primeiro momento. Elas acabaram caindo nas mãos de muitos oportunistas que depois as negociavam com outros empresários. Em 1989, a RBS foi um dos poucos grupos de comunicação que adquiriram ao todo 16 licenças, para onde o grupo possuía empresas de televisão. Porém, levaria algum tempo para que essas licenças se tornassem efetivamente empresas de TV a cabo.
Nos anos seguintes, depois de uma cansativa e cara experiência da TV Globo na utilização da Banda C (antenas parabólicas) na tentativa de vender os recém criados canais do sistema Globosat para condomínios no Rio de Janeiro, a Globo percebeu que o modelo não daria certo. Era caro e dispendioso manter o negócio focado nos condomínios. Em 1992, a Globo decide dividir as atividades de produção, de programação e de distribuição e cria uma nova empresa: a Globocabo. Porém, como havia ficado de fora das primeiras licenças das DISTV sai a procura de empresas para comprar ou associar. Depois de negócios e parcerias com empresas de DISTV (RBS e EPTV foram a primeiras a se associarem) formou-se a InterNet. Que tempos depois viria a se tornar a NET, maior empresa de TV paga no país. Atualmente a participação da Globo na operadora é pequena. Outras empresas como a Multicanal também estavam no jogo correndo por fora.
O sistema de transmissão Banda Ku (antenas de 60 centímetros a um metro), movimentou o mercado de TV paga como nunca antes. Foi época de maior concorrência entre a TV Globo, que se aliou a Rupert Murdoch e a SKY, e o Grupo Abril, sócia da Direct TV (TVA). Durante vários anos as duas marcas competiram no Brasil até que Murdoch comprasse a Diretc TV fundindo as duas marcas. A desvalorização do Real no Governo FHC foi um duro golpe para as duas empresas. Do dia para a noite viram suas dividas em dólares quase triplicarem. O grupo Abril saia do mercado de TV paga para nunca mais voltar.
O mercado veio se estruturando e ficando claramente definido. A Globo e a Sky isoladas na modalidade de DTH e uma série de empresas atuando na modalidade a cabo. Por volta de 1993, uma onde de privatizações era comandada pelo Governo FHC e a privatização da Telebrás era uma delas. Naquele tempo as Teles tinham autonomia estratégica em seus estados e algumas delas começaram a incomodar as empresas de TV a cabo quando tentaram entrar neste segmento. A Telemig foi a primeira das Teles a planejar a criação de uma rede de transmissão de dados, voz e vídeo. Isto ia de encontro aos interesses dos empresários e pela primeira vez, colocou a empresa pública em choque com as empresas de TV por assinatura. As Teles de São Paulo e Brasília apontavam nesta mesma direção. A pressão ao Governo foi tanta que o Ministério das Comunicações decidiu que as Teles só poderiam atuar desta forma com quem já possuísse as licenças para operação.
Naquela época, a Telebrás já pensava em um plano de banda larga para interligar todo o país a RENAV – Rede Nacional de Alta Velocidade – em 1994, onde pretendia se conectar com as operadoras de TV por assinatura de menor capacidade. Alguns grupos chegaram a firmar contratos com a Telebrasília, um deles liderados por Daniel Dantas, o outro grupo chamado de multiponto, possuía entre seus quadros ex-diretores da Globosat. Mas, a Lei do Cabo de 1995 e posteriormente a privatização da Telebrás frustrou a concretização da rede nacional de Banda Larga. Pelo menos naquela época, pois o Governo atual fez renascer o projeto.
Talvez tudo ficasse como antes, caso não surgisse uma nova tecnologia: a Internet. A internet fez com que as empresas de TV a cabo ganhassem uma grande importância comercial, pois sua infra-estrutura poderia ser utilizada para possibilitar acesso de internet de alta velocidade. Nos EUA foi um tempo conturbado de grandes fusões e aquisições que movimentou o mercado de TV paga e internet. E mais, atraiu o interesse das grandes empresas de Telecomunicações que estavam perdendo espaço para a internet na transmissão de voz.
Mas há um entrave legal. A Lei do Cabo de 1995 impede que empresas de telecomunicações entrem no mercado de TV por assinatura e também que sejam sócias ou proprietárias de empresas de TV a cabo. Por isso, a PLC 116 tem causado tantas discussões. Os radiodifusores, muitos ligados a empresas de TV a cabo, são contra a entrada das Telecom no jogo. Posição que ABTA tinha até certo tempo atrás, mas que hoje já vê como aceitável (veja aqui).
Com a entrada das Teles no mercado de TV paga um novo contexto será criado e novamente o mercado irá se movimentar, o que pode fazer o número e assinantes crescer a ponto de incomodar as emissoras de TV aberta. Prova disto foi o discurso de Roberto Irineu Marinho (Globo), um dos precursores da TV paga no Brasil, na abertura do Congresso da ABTA 2010.
Marinho afirmou:
No que toca à distribuição, há regras, absolutamente incongruentes. No cabo, a legislação parece ter buscado certa inspiração na Constituição, e limitou a propriedade estrangeira das empresas distribuidoras em 49%. Quando a distribuição por satélite se tornou viável, a legislação correspondente não impôs restrição alguma. Ou seja, o assinante é potencialmente o mesmo, mas, por cabo, só pode receber o sinal dos canais das mãos de empresas majoritariamente brasileiras e, por satélite, de qualquer empresa, nacional ou estrangeira. No que toca à programação e à produção - aos canais propriamente ditos - nenhuma das restrições à propriedade estrangeira previstas na Constituição e que atingem as empresas brasileiras de mídia em geral foi levada em conta. Para muitos, esta foi uma omissão grave que levou a TV por assinatura a um quadro concorrencial potencialmente danoso aos interesses nacionais. Outra corrente, porém, afirma que não há desacordo com a Constituição: por ser um sistema fechado, com acesso mediante pagamento, o mercado de programadores e produtores de TV por assinatura não estaria alcançado pelas restrições que a Constituição impõe à radiodifusão, aqui entendida em sentido estrito, como o rádio e a televisão com acesso livre e gratuito. De um jeito ou de outro, é fato que os produtores e programadores brasileiros que atuam na TV por assinatura concorrem com gigantes internacionais, com um poder de fogo muito superior ao nosso: custo de produção já amortizado pela exibição mundo afora, mínimas estruturas repetidoras no Brasil e um faturamento mundial muitas vezes mais alto.
Paralelamente às mudanças da TV por assinatura vem sendo implantada no Brasil a TV Digital aberta e interativa. O palco está montado, Uma guerra anunciada?
Aguarde o próximo post.
Fonte:
* TV por Assinatura: 20 anos de evolução. Samuel Possebon.Editora: Save Produções Editoriais, 2009.
terça-feira, 21 de setembro de 2010
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