quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

IBGE - SEGURANÇA - 47% dos brasileiros se sentem inseguros

Dados do IBGE se referem à sensação da pessoa no local onde vive; local mais apontado como seguro é a casa

Pará registra a menor sensação de segurança, seguido de RJ e DF; 7,3% da população foi vítima de roubo ou furto

ITALO NOGUEIRA
JANAINA LAGE
DO RIO

Quase a metade dos brasileiros com dez anos ou mais (47,2%) se sentem inseguros na cidade onde vivem, mostra a pesquisa Características da Vitimização e do Acesso à Justiça no Brasil, do IBGE.
A pesquisa é feita com base nos dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2009.
O Pará é o Estado onde a sensação de segurança é mais baixa. Na região metropolitana de Belém, apenas 14,6% dos entrevistados se sentem seguros. O Rio aparece em segundo lugar e o Distrito Federal, em terceiro.
São Paulo está em 11º lugar entre os Estados, mas na região metropolitana a sensação de insegurança é maior e atinge 65% das pessoas.
O estudo mostra ainda que 7,3% da população foi vítima de roubo ou furto entre setembro de 2008 e setembro de 2009, o que representa 11,9 milhões de pessoas.
A última pesquisa do IBGE sobre o tema, de 1988, indicava taxa de 5,4% -esse levantamento não questionou a sensação de segurança.
"O Brasil mudou muito de 1988 para cá. Passou por crises recessivas e viveu uma fase forte de desemprego. É um período em que aumentou o processo de urbanização. Quanto mais a população se urbaniza, maior é a tendência de ocorrerem conflitos", disse o presidente do IBGE, Eduardo Pereira Nunes.
Segundo o estudo, 76,9 milhões declararam que se sentem inseguros, o equivalente a 47,2%. Nas áreas urbanas, a taxa sobe: 50,3%.

PERÍMETRO SEGURO
"O sentimento de insegurança faz com que as pessoas se encolham, façam cada vez menos atividades ou fiquem mais tempo num perímetro seguro", diz o sociólogo Gláucio Soares, especialista em pesquisa de vitimização.
Para ele, porém, não há necessariamente correlação direta entre a incidência de crimes e a sensação de segurança. "Os chilenos, por exemplo, percebem um risco de homicídios altíssimo, embora o país tenha taxa de assassinatos baixa", diz ele.
Para o IBGE, as pesquisas brasileira e chilena não são totalmente comparáveis.
A aposentada Eda Martins Magalhães, 70, diz que a insegurança no Rio não impede que ela saia de casa. Mas afirma que caminha na rua "com um olho no padre e o outro na missa".
"No ônibus, você não sabe quem está dentro. Na calçada, não sabe com quem está andando. Já fui roubada no supermercado", diz.
Embora esteja em segundo no ranking, o Rio teve a segunda taxa mais baixa de roubos e furtos do país.
Para o sociólogo Luiz Flávio Sapori, "o problema do crime do Rio não é a quantidade, mas a qualidade". "Há domínio territorial por tráfico e milícia, uma afronta maior ao poder do Estado."
Quem mais sofre roubos são homens jovens com renda alta. Apesar disso, os homens disseram se sentir mais seguros do que as mulheres.
O estudo mostrou ainda que 1,6% das pessoas foram agredidas no período. Em 1988, foi 1%. Um quarto das mulheres declarou ter sido vítima do cônjuge. Quase metade não foi à polícia denunciar a agressão sofrida

Parte das vítimas de roubo não procura polícia

DO RIO

Mais da metade das vítimas de roubo não procurou a polícia, aponta o IBGE. O principal motivo, segundo a pesquisa, é a falta de confiança nas corporações.
O instituto estima que 3,1 milhões entre os 6 milhões que foram roubados no período não notificaram a polícia. O estudo revela, também, a subnotificação dos crimes.
Para a pesquisadora do Cesec (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania), a socióloga Julita Lemgruber, a subnotificação contribui "para que a polícia não tenha clareza do que acontece em termos de criminalidade".
Na avaliação dela, a desconfiança na polícia é provocada por casos de corrupção. O problema é agravado, diz, em razão da falta de mecanismos de controle externo das corporações que aproximem a população dos agentes.
Entre os que sofreram furtos, a subnotificação chega a 62,3%, taxa considerada comum em todo o mundo.
O principal motivo apontado pelos entrevistados é a "falta de provas" contra quem consideram suspeito, seguido da falta de importância do objeto roubado.
Não acreditar na polícia foi resposta de 23,1% das vítimas de furto no período.
De acordo com o IBGE, a Justiça foi a instância mais procurada para a solução de conflitos, seguido da polícia e do Procon.

ANÁLISE

Estatísticas criminais no Brasil vivem "apagão" que atrapalha o planejamento

CLÁUDIO BEATO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A situação das estatísticas criminais no Brasil é grave.
Gestores estaduais e federais contam com poucas informações confiáveis, obrigando-os a planejar às cegas, sem direção clara e com uma noção apenas pálida se o que se faz funciona ou não.
Infelizmente, o "apagão" das estatísticas criminais nem sequer está na pauta de nossos problemas de segurança pública.
Diante desse quadro, as pesquisas de vitimização - quando se pergunta às pessoas diretamente se elas foram vítimas ou não de crimes, se procuraram ou não a polícia e por que o fizeram ou deixaram de fazer- tornam-se instrumento importante para vislumbrar essa zona cinzenta entre o que foi registrado oficialmente e os delitos que não chegam ao conhecimento das autoridades.
Mais que isso, permitem fazer uma avaliação mais consistente acerca das polícias e da satisfação em relação aos seus serviços, bem como do sentimento de insegurança da população.
São reveladoras, portanto, da alma e do espírito da população no que tange à segurança pública.
O suplemento de vitimização da Pnad vem compor mais de uma dezena de outras pesquisas feitas a nível regional para tentar chegar a um retrato mais fidedigno da criminalidade, além de outra similar já realizada pelo IBGE em 1988.
Seus resultados vêm corroborar o que tem sido revelado nas outras enquetes: o brasileiro não se sente seguro nas grandes cidades, e poucos procuram as autoridades para registrar os crimes dos quais são vítimas.
Mais que isso, existe uma grande diferença de sentimentos e vítimas entre os grupos sociais.
Entretanto, pesquisas de vitimização, por sua importância, centralidade e necessidade como instrumento de política pública, merecem muito mais que um suplemento da Pnad.
Elas devem ser ferramentas completas e aprofundadas para a compreensão de alguns fatores causais, a fim de que políticas públicas possam ser formuladas a partir de seus achados,

Casa é a "ilha de segurança" dos que têm renda maior

Segundo o IBGE, 82,8% de brasileiros que ganham mais que cinco salários se sentem seguros onde moram

59,4% das casas tinham algum dispositivo de segurança em 2009; nas áreas urbanas, índice de uso subiu para 64,9%

ELIANE TRINDADE
DE SÃO PAULO

DO RIO

Mesmo vizinha de um edifício que sofreu arrastão recentemente, a paulistana Janette Tavano Bacal, 43, sente-se segura quando atravessa os dois portões que a separam da avenida Higienópolis, onde mora em um condomínio de classe média alta na região central da capital.
"Eu me sinto segura dentro de casa, mesmo sendo uma ilusão, já que não há segurança em lugar nenhum", diz a jornalista.
Janette faz coro com os 82,8% de brasileiros que têm renda per capita maior que cinco salários mínimos. Eles se sentem seguros em casa, segundo pesquisa realizada pelo IBGE. Na mesma faixa de renda, 41,4% sentem-se seguros em relação à cidade onde vivem.
A sensação de segurança de Janette é dada por medidas básicas, como o controle de entrada de pessoas e carros do condomínio, feito por uma barreira de dois portões.
Segundo a pesquisa do IBGE, 59,4% das residências no país tinham, em 2009, algum dispositivo de segurança. Na área urbana, a presença sobe para 64,9%. A grade é a mais comum em casas, e o olho mágico, em apartamentos.
"Os investimentos em segurança são altos entre os que têm mais renda. Aquilo que era segurança com investimento pequeno há algum tempo já virou padrão.
Trancas, ferrolhos e grades, por exemplo. Chegando ao cúmulo dos condomínios fechados", analisa o sociólogo Gláucio Soares.

ESTRESSE
A busca por mais segurança fez Janette se mudar para um condomínio na Granja Viana. Por seis anos ela viveu em uma das 500 casas do lugar, cercadas de verde e vigiadas por seguranças.
A tranquilidade durou até o ano passado, quando a família decidiu retornar ao antigo apartamento em São Paulo. "Estávamos cansados do estresse diário para chegar em casa por estradas inseguras", conta Janette.
Temiam os frequentes assaltos e sequestros relâmpados na Raposo Tavaves e na estrada secundária que dava acesso ao condomínio. "Dentro dos muros, eu me sentia segura", recorda-se ela

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