quarta-feira, 17 de junho de 2009

DISCIPLINA, SOLIDARIEDADE E VONTADE POLÍTICA, ALGUNS DOS MAIORES PROBLEMAS DA EDUCAÇÃO

Os professores brasileiros são os que mais desperdiçam com outras atividades o tempo que deveria ser dedicado ao ensino. No período em que deveriam estar dando aula, eles cumprem tarefas administrativas (como lista de chamada e reuniões) ou tentam manter a disciplina em sala de aula (em consequência do mau comportamento dos alunos), segundo a conclusão de um dos mais detalhados estudos comparativos sobre as condições de trabalho de professores de 5ª a 8ª séries de 23 países, divulgado ontem pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A pesquisa foi feita em 2007 e 2008, publicado pela Folha.

O professor sabe que muito do tempo dele é roubado por tarefas que não deveriam ser dele.
Precisa muitas vezes fazer a função de psicólogo, pai ou assistente social, já que todos os problemas sociais acabam convergindo para a escola.

Resolve questões que deveriam ser de responsabilidade de outros profissionais.

Perde tempo falando de outros assuntos, em vez de tratar do conteúdo daquela disciplina.

Problema é mundial

O relatório da OCDE mostra que a maioria (71%, maior percentual registrado) dos professores brasileiros começou a dar aulas sem ter passado por um processo de adaptação ou monitoria. A média dos países nesse quesito é de 25%.
Os brasileiros também são dos que mais afirmam (84%) que gostariam de participar de cursos de desenvolvimento profissional. Esse percentual só é maior no México (85%).
As informações foram colhidas em questionários respondidos por diretores e professores de escolas (públicas e privadas) selecionadas por amostra. No Brasil, 5.687 professores responderam ao questionário, aplicado em 2007 e 2008.

Poucos professores passam por um processo de adaptação.

O Secretário da Educação tem que preencher logo as vagas após um concurso para não deixar alunos sem aula. É como trocar o pneu do carro em movimento, quando o ideal seria ter um tempo para preparar melhor o profissional que começará a dar aulas, dizem
os professores.
Esse problema se agrava com a constatação na pesquisa de que os professores brasileiros trabalham com turmas com número de alunos (32, muitas salas começam o ano com 50 alunos ou mais!!!) acima da média (24). Apenas no México, na Malásia e na Coreia do Sul essa relação é maior.
Eles também têm menos experiência em sala de aula do que a média -só 19% dão aula há mais de 20 anos; a média de todas as nações comparadas é 36%. Estão abaixo da média (89,6%) ainda no nível de satisfação com o trabalho: 84,7%, o quarto menor índice.

Diretores
A pesquisa investigou a visão dos diretores sobre problemas que afetam o aprendizado. O Brasil fica acima da média em questões como absenteísmo de docentes, atrasos e falta de formação pedagógica adequada.

VANDALISMO E VIOLÊNCIA

Também foram listados problemas relacionados a alunos, como vandalismo, agressões ou trapaças no momento da prova.

A indisciplina se mostrou um problema mundial. Na média dos países, 60% dos diretores afirmaram ter, em alguma medida, distúrbios em sala de aula provocados pelo problema.
O México tem o maior percentual (72%); o Brasil tem exatamente o índice da média.

ONDE A AUTONOMIA?

Diretores brasileiros foram dos que mais relataram ter pouca ou nenhuma autonomia para contratar, demitir ou promover professores por seu desempenho em sala de aula. No Brasil, só 27% disseram que podem escolher os professores. A média dos países é de 68%.

GEOMETGRIA DISCIPLINAR

Há colégios que mantém uma geometria própia (Foucaultiana?) para evitar a indisciplina e aqueles alunos bagunceiros da "turma do fundão".
Com média de 30 alunos (ao contrário da maioria com quase 50), são largas e mais compridas do que profundas e têm três fileiras de carteiras.

Também não há lugar fixo. Um rodízio é promovido periodicamente para mudar a posição dos estudantes, que acompanham as aulas sempre em pares e estão à distância de poucos palmos dos professores.
Com essas medidas, raramente há expulsão administrativa entre os alunos.
As famílias são convocadas para conversas individuais com a direção da escola. Alunos e pais assinam uma carta-compromisso e fszem matrícula condicionada ao bom comportamento.
"Mantenho a ordem fazendo com que o aluno participe da aula, criando situações em que ele pode ser chamado a qualquer momento", dizem os professores.

E essa participação entra no sistema de avaliação dos alunos. Além das notas em prova, eles recebem nota por bom comportamento, pontualidade e relações interpessoais.

NA SALA COM MAIS DE 30 ALUNOS
PROFESSOR PERDE VINTE MINUTOS

Trabalhos diários que valem nota, diálogo, gritos -cada professor adota sua própria estratégia para conter a indisciplina diária.

As advertências adotadas como única forma de "punir" os alunos bagunceiros, na prática, não surtem efeito.

Seja qual for a tática adotada, para organizar os 36 alunos por turma, em média, e poder começar a matéria do dia, os educadores perdem de 15 a 20 minutos - a aula dura 50.

Entre outras razões, há três principais:

1) alto número de alunos por turma;
2) ausência de perspectiva de ascensão social dos alunos por meio do estudo;
3) falta de acompanhamento, pelos pais, do desempenho dos filhos.

O professor sabe que o primeiro passo é educar os pais dos adolescentes. "Se as mães choram dizendo não saber o que fazer com seus filhos, o que esperar desses jovens?" (e dos professores?!!!)
A participação da família é considerada importante.

Quando isso ocorre, os pais participam. os alunos são educados - bem comportados - também, prestam atenção e se esforçam.

Quando os pais e a comunidade participam,ativamente, do cotidiano da escola, o resultado positivo é visível."

COM APOIO E SOLIDARIEDADE, TUDO MUDA

POR pouco -quatro meses de atraso na mensalidade- que Wilson Ranieri não abandonou os estudos de moda na faculdade. Isso significa que ele não seria o único estilista negro a apresentar suas criações na SPFW (São Paulo Fashion Week).

Professores e colegas se comoveram e fizeram uma "vaquinha" para ajudá-lo a saldar a dívida. "Estava disposto a desistir, não tinha a quem pedir ajuda." Diante dos apelos, a direção da escola concordou que ele assinasse uma promissória facilitando o pagamento. "Naquela época, eu nem mesmo tinha clareza se queria fazer carreira na moda."
Neste ano, pela primeira vez, a questão de raça entrou nos desfiles, após o Ministério Público pedir que uma cota de modelos fosse negra, segundo revela o colunista Gilberto Dimmenstein.

PROUNI, O GRANDE E COMOVENTE EXEMPLO

Pode-se criticar o jornalista Elio Gaspari por vários motivos, mas o seu texto na Folha de hoje sobre o Prouni é comovente e um exemplo de como as coisas podem mudar para melhor se os eternos privilegiados da chamada elite brasileira deixarem seus preconceitos de lado e abrirem a guarda e permitirem (sem obstaculizar politicamente)que a maioria da população participe da vida da sociedade.

Leia o texto:

A cota de sucesso da turma do ProUni


Os pobres que entraram nas universidades
privadas deram uma aula aos demófobos do andar de cima



A DEMOFOBIA pedagógica perdeu mais uma para a teimosa insubordinação dos jovens pobres e negros. Ao longo dos últimos anos o elitismo convencional ensinou que, se um sistema de cotas levasse estudantes negros para as universidades públicas, eles não seriam capazes de acompanhar as aulas e acabariam fugindo das escolas. Lorota.

Cinco anos de vigência das cotas na UFRJ e na Federal da Bahia ensinaram que os cotistas conseguem um desempenho médio equivalente ao dos demais estudantes, com menor taxa de evasão. Quando Nosso Guia criou o ProUni, abrindo o sistema de bolsas em faculdades privadas para jovens de baixa renda (põe baixa nisso, 1,5 salário mínimo per capita de renda familiar para a bolsa integral), com cotas para negros, foi acusado de nivelar por baixo o acesso ao ensino superior.

De novo, especulou-se que os pobres, por serem pobres, teriam dificuldade para se manter nas escolas.

Os repórteres Denise Menchen e Antonio Gois contaram que, pela segunda vez em dois anos, o desempenho dos bolsistas do ProUni ficou acima da média dos demais estudantes que prestaram o Provão. Em 2004, os beneficiados foram cerca de 130 mil jovens que dificilmente chegariam ao ensino superior (45% dos bolsistas do ProUni são afrodescendentes, ou descendentes de escravos, para quem não gosta da expressão).
O DEM (ex-PFL) e a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino foram ao Supremo Tribunal Federal, arguindo a inconstitucionalidade dos mecanismos do ProUni.

Sustentam que a preferência pelos estudantes pobres e as cotas para negros (igualmente pobres) ofendiam a noção segundo a qual todos são iguais perante a lei.

O caso ainda não foi julgado pelo tribunal, mas já foi relatado pelo ministro Carlos Ayres Britto, em voto memorável. Ele lembrou um trecho da Oração aos Moços de Rui Barbosa: "Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real".

A "Oração aos Moços" é de 1921, quando Rui já prevalecera com sua contribuição abolicionista. A discussão em torno do sistema de acesso dos afrodescendentes às universidades teve a virtude de chamar a atenção para o passado e para a esplêndida produção historiográfica sobre a situação do negro brasileiro no final do século 19.

Acaba de sair um livro exemplar dessa qualidade, é "O jogo da Dissimulação - Abolição e Cidadania Negra no Brasil", da professora Wlamyra de Albuquerque, da Federal da Bahia. Ela mostra o que foi o peso da cor. Dezesseis negros africanos que chegaram à Bahia em 1877 para comerciar foram deportados, apesar de serem súditos britânicos. Negros ingleses negros eram, e o Brasil não seria o lugar deles.

A professora Albuquerque transcreve em seu livro uma carta de escravos libertos endereçada a Rui Barbosa em 1889, um ano depois da Abolição. Nela havia um pleito, que demorou para começar a ser atendido, mas que o DEM e os donos de faculdades ainda lutam para derrubar:

"Nossos filhos jazem imersos em profundas trevas. É preciso esclarecê-los e guiá-los por meio da instrução".

A comissão pedia o cumprimento de uma lei de 1871 que prometia educação para os libertos.

Mais de cem anos depois, iniciativas como o ProUni mostraram não só que isso era possível mas que, surgindo a oportunidade, a garotada faria bonito.


A ESTRUTURA VERTICAL DA UNIVERSIDADE

"Estou aqui por uma simples razão: para fazer um protesto veemente contra a intervenção da força policial no campus universitário. [Isso] é um atentado aos direitos mais sagrados que as pessoas têm de discutir, debater e agir sem nenhuma pressão do poder público."
Foi assim que Antonio Candido, 90, um dos mais importantes críticos literários do país e professor emérito da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP começou seu discurso ontem, em um ato de repúdio à repressão na universidade por causa da greve na entidade.

"Não basta propormos como palavra de ordem "Diretas Já'", afirmou a professora Marilena Chaui. "Não é só a escolha de um reitor que vai fazer a diferença. Temos que pensar a maneira pela qual vamos

desestruturar essa estrutura vertical e centralizada que a USP se tornou", disse.

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